Jornada de trabalho passará a ser controlada com maior transparência


16 jul 2010 - Trabalho / Previdência

Substituição Tributária

O horário da jornada de trabalho dos brasileiros passará a ser controlado com maior transparência pelas empresas que utilizam sistemas eletrônicos para o registro de ponto de seus empregados. No mês que vem, entra em vigor a Portaria nº 1.510 do Ministério do Trabalho, que disciplina o registro de marcações de pontos automatizados nas organizações. A intenção é regulamentar o uso desses marcadores e melhorar o controle das horas trabalhadas pelos funcionários, além de evitar sonegação de impostos e adulterações em casos de ações judiciais. De acordo com estimativas de fabricantes, a medida deve afetar 480 mil empresas com aproximadamente 1 milhão desses equipamentos instalados em todo o país.

Desse modo, todas as organizações com mais de 10 funcionários que utilizam mecanismos de marcação eletrônica deverão se enquadrar nas normas estabelecidas pelo governo. A principal delas diz respeito ao novo tipo de registrador que deverá ser utilizado. Diferente dos aparelhos vendidos atualmente no mercado, o equipamento incorpora uma pequena impressora, com bobina de papel, para que o empregado possa imprimir e guardar os comprovantes de entrada e saída cada vez que bater o ponto durante o expediente. Esses registros poderão ser utilizados pelo funcionário em caso de uma eventual necessidade de comprovação de horas-extras trabalhadas em ações na Justiça. Além disso, a portaria exige que o novo aparelho tenha um software inviolável que impede a alteração dos dados armazenados relacionados à folha de pessoal.

Prejuízo
Análises realizadas pelo governo revelam que a falta de uma regulamentação nessa área facilita fraudes e manipulação de dados — sobretudo em relação aos registros de horas-extras —, causando prejuízos, inclusive, aos cofres públicos. Um levantamento da Secretaria de Inspeção do Trabalho mostra que R$ 20,3 bilhões referentes a hora-extras não são pagos aos trabalhadores brasileiros todos os anos. Ao deixar de registrar o trabalho adicional dos empregados, a sonegação à Previdência Social pode chegar a R$ 4,1 bilhões. Ao analisar os desvios referentes ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), o rombo é de mais de R$ 1,6 bilhão.

 
Para Jorge Cunha, coordenador de obras da Multicon, mudança tornará cálculos mais práticos
A empresa de engenharia Multicon trocou o ponto mecânico pelo eletrônico no ano passado e, desde então, os seus 150 funcionários têm as jornadas devidamente registradas no fim do mês. “Para a organização, é mais prático, já que não precisamos mais calcular as horas-extras manualmente. Tudo é feito por meio do software, o que agiliza nossa vida”, relatou o coordenador de obras da empresa, Jorge Cunha. No entanto, ele também assinala um ponto negativo. “Os trabalhadores saem para o almoço na mesma hora, então se forma uma fila em frente ao equipamento. Como o custo para se adquirir mais um aparelho não é barato, eles perdem um tempo para anotar a entrada e a saída”, disse. Os produtos homologados custam entre R$ 2 mil a R$ 4 mil.

Nem todas
A portaria não obriga, porém, o uso do novo aparelho em todas as empresas. Aquelas que já utilizam sistemas de marcação de ponto manual ou mecânico não precisam fazer a mudança. Para o vice-presidente da fabricante Dimep Sistemas, Dimas de Melo Pimenta III, as vantagens não atingem somente as empresas e os trabalhadores. “A própria Justiça brasileira será beneficiada, já que existe um volume enorme referente a processos trabalhistas circulando nos tribunais”, destacou. Ele acredita que aproximadamente 40% das empresas que utilizam sistemas eletrônicos deverão trocar seus equipamentos para atender à nova legislação até o fim do ano.


DO CÓDIGO DE BARRAS À ÍRIS
O registro do horário de entrada e saída dos funcionários nas empresas não é algo necessariamente novo, mas, ao longo dos anos, as tecnologias utilizadas nesses processos evoluíram e incorporaram recursos, principalmente no que diz respeito a identificação dos funcionários. Para realizar essas marcações, diferentes tipos de mecanismos podem ser utilizados, como a leitura de código de barras, de tarjas magnéticas ou smart cards (cartões inteligentes com chip que armazena informações). Duas outras alternativas também começam a ganhar força: os cartões de proximidade, que se comunica por meio de rádio para liberar o acesso do funcionário em um estabelecimento, e sistemas baseados em biometria, que utilizam identificações físicas das pessoas, como a digital ou a íris, para liberar o acesso a um local.

Fiesp dispara contra medida

O novo ponto eletrônico regulamentado pelo Ministério do Trabalho não é uma medida de consenso. Por meio de nota, a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) declarou que as micro e pequenas empresas sentirão um impacto maior por conta do elevado custo dos equipamentos. A entidade acredita ainda que, além do comprometimento no Orçamento dessas organizações, outro aspecto a ser considerado é a possibilidade de se aumentar a animosidade nas relações de trabalho.

O argumento é que novos mecanismos de fiscalização e manutenção da regularidade poderão ser entendidos como um ato de desconfiança do empregador pelo funcionário. Além disso, segundo a Fiesp, a obrigatoriedade da entrega de um comprovante físico a cada marcação do empregado é altamente dispendiosa e não resolve os problemas existentes. “Os empregados serão obrigados a guardar os comprovantes fornecidos durante toda a relação contratual, pois eles serão as únicas provas dos horários que de fato trabalharam”, afirmou a entidade.

A federação também alertou que as regras não serão a solução para os problemas de fraudes e imprecisões nos registros de frequência. “O sistema apresenta pontos de alta vulnerabilidade, como a porta USB para coleta de informações existentes no equipamento de registro. O mecanismo expõe dados pessoais dos trabalhadores, desrespeitando seu direito constitucional à privacidade”, disparou. A entidade defende a suspensão temporária da nova regra para que a indústria e os representantes dos trabalhadores tenham mais tempo para discutir a questão. O governo, no entanto, já bateu o martelo e deu como prazo final o dia 21 de agosto para a portaria entrar em vigor.


Fonte: Correio Braziliense