Inflação volta à agenda das empresas


4 mai 2011 - Contabilidade / Societário

Teste Grátis por 5 dias

Conjuntura: Empresários negociam com fornecedores, enquanto primeiros sinais de desaceleração aparecem
 

 

A inflação voltou à agenda dos executivos, que intensificaram as negociações com os fornecedores de insumos, matérias-primas e serviços em uma tentativa de minimizar o repasse do aumento de custos para o preço final, segundo relato, ao Valor, dos dirigentes de grandes empresas brasileiras presentes à cerimônia de entrega do prêmio Executivo de Valor, ontem em São Paulo. Os repasses, contudo, estão sendo feitos.

As pressões de custos aumentaram, segundo os empresários, justamente no momento em que alguns setores começam a sentir os primeiros sinais de desaceleração do nível de atividade. Eles ainda são tímidos, mas já apareceram tanto no setor financeiro, como para os fabricantes de bens de consumo duráveis, embora ainda estejam fora do cenário da indústria de alimentos ou de bens semiduráveis. Enquanto voltam a lidar com a inflação, a falta de mão de obra qualificada é outro item de preocupação, até porque a necessidade de manter os atuais funcionários tem exigido a concessão de maiores aumentos salariais.

Para conter a pressão inflacionária e não aumentar os preços dos ingressos, a rede Cinemark intensificou as negociações com seus fornecedores, diz seu presidente, Marcelo Bertini. "Por enquanto estamos sendo bem-sucedidos nessa estratégia. Mas não sei mais quanto tempo conseguimos segurar." As negociações salariais em alguns Estados, diz, causaram aumentos mais altos que os previstos inicialmente, o que resultou no aumento dos ingressos. "O problema é que eles estão superando o aumento da produtividade", diz.

Problema para alguns setores, a queda do dólar tem sido um alento para a Positivo Informática. Como a maioria dos componentes usados pela companhia para montar seus computadores é cotado em dólar, o real valorizado acaba compensando a pressão inflacionária que surge com o aumento nos preços das commodities, explica Hélio Rotenberg, presidente da empresa. Com relação ao custo da mão-de-obra, ele diz que a empresa vem tomando medidas para aumentar a produtividade de seus funcionários e também tem se movimentado para garantir que não faltem profissionais preparados.

Na Ambev, as pressões inflacionárias das commodities estão tendo um impacto significativo nos negócios porque os custos estão sendo afetados por insumos como malte, açúcar, alumínio e importação de latas, diz o presidente João Castro Neves. "Isso já nos levou a reajustar nossos preços, percentual que repassamos sempre em linha com a inflação. Mesmo assim, temos conseguido bons resultados por nos mantermos focados em produtividade e inovação, além de um controle rigoroso de gastos", afirma Castro Neves.

O segmento de bebidas já sentiu a retração na demanda. "Desde o fim do ano passado o nosso setor vem apresentando sinais de desaquecimento causados por uma desaceleração no aumento de renda disponível, aumento de preços, além da influência do clima", diz.

André Esteves, presidente do banco BTG Pactual, também já sentiu alguma desaceleração no ritmo das atividades no primeiro trimestre deste ano. "Já deu para perceber que o PIB [Produto Interno Bruto] deste ano não repetirá os 7,5% de 2010. Ficará dentro dos 4%", diz.

Nas operações da varejista Lojas Renner, o impacto veio principalmente do preço do algodão. Segundo o presidente da companhia, José Galló, a alta chega a 160% desde o início do ano passado e trouxe um aumento de custos para a rede de 10% a 12%. "Mas temos conseguido repassar esses reajustes para os preços dos produtos", afirma Galló. Para reduzir custos, a empresa também usou mais materiais sintéticos. Na Hering, o aumento do preço do algodão e da pressão inflacionária levou a empresa a reajustar os preços em média 10% no primeiro trimestre. Fábio Hering, presidente da empresa, acredita que a estratégia do governo de usar a importação como plataforma de controle da inflação pode desestimular o avanço da indústria nacional.

A Renner, informa Galló, ainda não registrou queda de demanda, mesmo com o aumento da taxa básica de juros, ao contrário do que a Whirlpool já percebe. José Drummond Júnior, presidente da empresa, explica que ela já vive um momento de desaceleração. "Continuamos em um ritmo positivo: estamos crescendo menos, mas sobre uma base alta."

Na empresa, a solução encontrada para o aumento dos preços de matérias-primas foi a negociação com os fornecedores e o repasse de preços ao consumidor, realizado este mês. "Essas medidas recompuseram os preços, fazendo frente aos impactos que já aconteceram", informou Drummond. Ele ressaltou ainda que a alta dos salários já vem sendo sentida pela Whirlpool nos últimos três anos.

A inflação ainda não afetou os negócios das operadoras de serviços CPFL e Nextel. O presidente da CPFL, Wilson Ferreira Jr., diz que o custo que mais preocupa o setor hoje é o da mão de obra mais qualificada. Ele afirma, no entanto, que a empresa está conseguindo treinar os profissionais que necessita. "Não colocamos um eletricista na rua sem dar dois a três meses de capacitação." Sérgio Chaia, presidente da Nextel, concorda. Para ele, o maior desafio hoje é trazer mais pessoas qualificadas para a empresa. A Nextel contratou no ano passado cerca de mil funcionários e planeja contratar o mesmo este ano. "Enfrentamos o apagão da mão de obra, e nossa preocupação é remunerar bem nossos funcionário. Não é o custo que nos preocupa e sim a oferta de profissionais", diz ele.

A alternativa apresentada pelo presidente da Azul, Pedro Janot, para conter os efeitos da escalada do petróleo e da inflação das commodities no setor aéreo é investir em produtividade, tecnologia e revisão de processos. "Temos de continuar a ganhar dinheiro", diz.

Desaceleração não é a palavra do cotidiano das empresas ligadas ao agronegócio. No setor sucroalcooleiro, que ainda vive um desequilíbrio entre a oferta e a demanda de seus dois principais derivados - etanol e açúcar - os preços têm subido devido ao fato de a demanda crescer em um ritmo mais acelerado que a oferta, diz José Carlos Grubisich, presidente da ETH. Já a gigante JBS encara a valorização de sua matéria-prima (boi gordo) como um fator que reflete diretamente no maior faturamento da empresa. "Nosso custo fixo diminui uma vez que o preço médio do produto que vendemos aumenta. No mercado de commodities não é possível não repassar os preços", diz Joesley Batista, presidente do conselho da JBS.

Para driblar as pressões inflacionárias e reduzir os custos na compra de matérias-primas a Natura adotou um programa de atualização da plataforma de fornecedores, em que está renegociando os contratos e ampliando a base de oferta. "Estamos buscando novos fornecedores, que serão selecionados a partir de indicadores socioambientais", diz Alessandro Carlucci, presidente da empresa.

Como toda a indústria, as pressões inflacionárias provenientes das matérias-primas e do aumento dos salários têm influenciado os negócios da Suzano e da WEG. Para a Suzano, os custos que mais pesam são os do petróleo (atrapalham a logística) e dos insumos químicos, como a soda cáustica.

Harry Schmelzer Jr., presidente da WEG, por sua vez, tenta diversificar seus investimentos, para se ajustar ao aumento nos custos das matérias-primas e da contratação de pessoal. "Estamos investindo no Brasil, mas também estamos colocando mais velocidade para aumentar nossos investimentos produtivos no México, Índia e China. Nós precisamos ter um hedge natural das nossas operações internacionais", explica.

 

Executivos destacam atenção dada pelo novo governo à gestão pública
 

Os executivos estão bastante animados com o começo do governo Dilma Rousseff. Elogiam a disposição da presidente de focar na melhora da gestão pública e também veem com bons olhos a disposição em enfrentar a inflação, embora alguns avaliem que O Banco Central deveria ser mais incisivo no combate à aceleração das expectativas inflacionárias.

O estilo gerencial de Dilma ganhou a simpatia do presidente da Whirlpool, José Drummond Júnior. "Faltava um perfil como esse no Brasil, que envolvesse uma execução profissional." A prioridade à gestão agrada também o presidente da CPFL, Wilson Ferreira Jr. "Eu sou suspeito para falar, pois já tinha uma relação próxima quando ela era ministra, e sabia que ela era uma pessoa muito focada na gestão. É uma evolução que nós precisávamos e que é importante nesse momento."

O presidente da Lojas Renner, José Galló, é outro que avalia positivamente o governo por enfatizar a gestão. "No começo, parecia que havia duas correntes de pensamento sobre o controle da inflação, mas agora parece que já houve um alinhamento sobre a questão dentro do governo", diz. Para ele, a inflação é hoje a grande preocupação do mercado, e as novas medidas macroprudenciais de combate à inflação adotadas pelo Banco Central podem gerar dúvidas, mas os resultados devem começar aparecer nos próximos meses.

A disposição em combater a inflação é o aspecto mais positivo do começo do governo Dilma também para Marcelo Bertini, presidente da rede Cinemark. O executivo destaca, no entanto, que o processo precisa ser feito com cuidado. "Historicamente, o Brasil perdeu a oportunidade de fazer ajustes ao transferir a responsabilidade do combate à inflação para a sociedade. O governo precisa fazer o dever de casa de controle e melhoria de seus gastos".

Para o banqueiro André Esteves, presidente do BTG Pactual, são boas notícias deste começo de mandato as medidas fiscais anunciadas e a concessão dos aeroportos. "Ainda é só o começo, mas é já um bom sinal."

As medidas que visam a desaceleração da economia, para a conquista do crescimento sustentável, agradaram ao presidente da Ambev, João Castro Neves. Nesse sentido, ele reafirma que a Ambev vai investir R$ 2,5 bilhões para aumentar sua capacidade produtiva.

O presidente da Fiat, Cledorvino Belini, afirma ter ficado satisfeito com a posição negociadora e agressiva da presidente na última comitiva da qual participou, na China. "As boas relações internacionais do Brasil nos dão confiança. Nós pretendemos investir R$ 10 bilhões até 2014".

A disposição da presidente em enfrentar grandes questões do Brasil foi elogiada por André Gerdau, presidente do grupo Gerdau. "Ela e sua equipe estão discutindo os maiores desafios do país, como a competitividade, além do câmbio e impostos." Para ele, um ponto positivo foi o corte anunciado nos gastos públicos, mas o grande desafio é a reforma tributária. "O país tem uma carga de impostos muito alta sobre a produção".

Hélio Rotenberg, presidente da Positivo Informática, diz que os primeiros meses do governo têm representado um "ótimo começo", destacando a atenção dispensada a seu segmento. "O governo está muito focado na inclusão digital."

Alessandro Carlucci, presidente da Natura, foi mais comedido. Para o executivo, ainda é muito cedo para fazer uma avaliação do governo Dilma, mas ele acredita que o Banco Central foi muito lento no combate à inflação. "Além do encarecimento dos preços dos produtos por causa da alta das commodities, há menos oferta no mercado gerando inflação de demanda."

Houve também quem se dissesse surpreendido positivamente pelo governo, como Sérgio Chaia, presidente da Nextel. "Ela conseguiu seguir uma linha própria de ação, mostrando-se muito preocupada em atacar problemas de infraestrutura e cobrando muito os seus ministros."


Fonte: Valor Econômico