Mercado esportivo pode virar opção para contadores


10 nov 2010 - Contabilidade / Societário

Consulta de PIS e COFINS

Os ídolos do futebol brasileiro e argentino foram passados para trás por seus empresários. As histórias retratadas nos filmes Pelé Para Sempre e La Mano di Dios (sobre Maradona) mostram que os maiores ícones dos gramados do Brasil e Argentina poderiam ter uma história diferente se ambos tivessem mais atenção na gestão financeira de suas carreiras. Em ambos os casos, o desvio não chegou a trazer grande impacto devido ao tamanho de seu sucesso e de suas contas bancárias. Mas diferentemente deles, outros atletas que descuidam da contabilidade acabam com destinos trágicos.

Isso porque os altos salários oferecidos em algumas modalidades - sobretudo no futebol - podem ser um fator para atrair pessoas de má-fé. Mas a trajetória de Pepe “o Gordo” e Guillermo Coppola, empresários de Pelé e Maradona, respectivamente, que causaram danos financeiros aos dois craques do futebol, não pode servir de parâmetro. Na prática, a ausência de gestores financeiros na carreira de atletas de qualquer esporte representa um fator de desvantagem por permitir que dificuldades com patrocínio possam prejudicar o desempenho profissional.

O fato traz à tona a reflexão sobre a necessidade de profissionais qualificados para gerenciar uma carreira esportiva. Além disso, o período que antecede eventos do porte de Olimpíadas e Copa do Mundo pode proporcionar ao Brasil muitos incentivos financeiros, bem como pode abrir mercado para a atuação de contadores que estejam interessados em atuar no segmento da contabilidade esportiva.

As razões que levam uma empresa a apostar em um atleta ou em uma equipe variam de acordo com fatores como o nível de exibição, o grau de intimidade com a paixão do público e também o nível social das pessoas que praticam o esporte. Entre os esportes mais patrocinados na atualidade estão o futebol, em disparado no primeiro lugar, e vôlei, basquete e futsal. O tênis, apesar de não proporcionar tanta visibilidade para um patrocinador, costuma oferecer altas premiações nas competições por ser um esporte de elite.  


Patrocínio versus “paitrocínio”
Em muitos casos, quem impulsiona a carreira dos atletas, ainda na sua fase de formação, são os pais, que sonham em ver seus pupilos ocupando o primeiro lugar do pódio de competições, nos mais variados esportes. Os valores do Investimento para a realização deste sonho variam muito de acordo com a modalidade esportiva e o nível competitivo dos filhos-atletas.Os primeiros custos costumam estar relacionados ao valor da mensalidade do clube e a mensalidade das escolinhas. Soma-se a isso a compra de acessórios. Por exemplo, no caso de um tenista, os pais teriam o custo com os materiais do tênis, com a mensalidade do clube e mais a mensalidade do treinador ou da aula.

No caso da natação, geralmente são infraestrutura. Ginásio (piscina) luz, equipamentos. Depois vem a parte com gastos pessoais, como treinadores, preparadores físicos. Finalmente viagens, alimentação e estadia, além de inscrições em provas e eventos.

Já os custos para investir na formação de um atleta de alto rendimento variam entre despesas de transporte, alimentação, manutenção de uma equipe multidisciplinar, uniforme, viagens para competições, intercâmbios no Brasil e no exterior, manutenção de infraestrutura apropriada, aquisição de materiais, auxílio nas despesas de educação, manutenção de profissionais técnicos qualificados para os treinamentos e em alguns casos auxílio-moradia.

Busca por recursos é desafio para amadores
Em Porto Alegre, o Grêmio Náutico União é um dos poucos que têm patrocínio para equipes de esporte amador. O recebimento dos valores repassados pelos patrocinadores aos clubes e atletas depende muito do tipo de contrato realizado. O Gerente de Esportes do Grêmio Náutico União, Carlos Eduardo Berwanger, explica que, se for um atleta profissional, ele receberá em forma de salário e de direitos de imagem.

Segundo Berwanger, o Clube não tem retorno direto nem imediato dos investimentos, mas com bons atletas, é possível conquistar diferentes espaços nas mídias, o que pode atrair novos associados, divulgar a marca e atrair Investimentos ou negócios para o Clube. “Não saberia precisar quanto repercute este Investimento individual em termos de valores, pois muitas são as variáveis associadas a este processo”, afirma Berwanger. Poderá ainda ser patrocinado individualmente e receber praticamente integralmente o valor do patrocínio, invertendo-se a primeira situação.

Ainda, se o clube for patrocinado, o atleta poderá receber uma ajuda de custo. Essa busca por patrocínios, porém, é grande desafio para esportes que não têm a mesma visibilidade do futebol e do volei, por exemplo.

A falta de patrocínios leva alguns atletas a abandonarem as competições. “É extremamente difícil e depende da possibilidade de geração de negócios para a marca investidora e patrocinadora. Acredito que seja mais fácil para aquelas modalidades que apresentem melhores oportunidades para as empresas investidoras”, afirma. Essa dificuldade existe mesmo para atletas de destaque, o que varia mais é a modalidade. Berwanger ressalta que nas modalidades coletivas, o reconhecimento depende do bom desempenho da equipe como um todo, e nas individuais, do reconhecimento e da visibilidade que esta modalidade possui na sociedade. “Poucas são as pessoas que conhecem as modalidades da esgrima e do remo, por exemplo”.

Salários dependem de nível competitivo
 O educador físico Lucas Pretto, conhece na prática a rotina de Custeio e financiamento de atletas. Treinador de natação, triatlon, corrida e nadador amador, Pretto começou a treinar triatlon com 19 anos. Com 20 anos começou a ganhar as provas estaduais. Em seguida, foi para a seleção brasileira de triatlon, e em 2006 foi campeão individual amador na modalidade. Ao ingressar na categoria profissional, sentiu na pele a dificuldade da busca por patrocínio, mas sempre pode contar com auxílio dos pais. “O meu retorno financeiro no triatlon eram as premiações e mais nada”. Em 2009, ele foi o 3º brasileiro e 6º geral no Iron Man, que é o maior evento da América Latina. Pretto explica que, no caso da natação, o maior retorno é a mídia que o atleta proporciona.

“Hoje em dia, com a Lei Federal de Incentivo ao Esporte, grandes empresas estão passando a investir nos clubes de natação”. Ele cita os clubes Pinheiros (SP) e Minas TC (MG) como exemplos de entidades esportivas que já têm atletas com excelentes salários, bancados por empresas de grande porte, como bancos e multinacionais, através da lei. Mas para ter um bom financiamento privado, é preciso oferecer atrativos. “O clube precisa de resultado para isso, ou seja, tem que formar campeões ou manter uma excelente estrutura de treino”, ressalta o treinador. Além do bom desempenho dos atletas, a maneira de gerenciar seus projetos de parceira também influencia na captação. De acordo com o nível competitivo, o salário de um bom atleta de natação pode chegar a altas somas, em torno dos R$ 10 mil. Mas essa quantia é uma realidade de poucos atletas no Brasil e chega a ser ínfima perto do que recebem os atletas de futebol ou vôlei. No caso da natação brasileira, o atleta Cesar Cielo é o detentor de um dos maiores salários na atualidade. No Rio Grande do Sul, historicamente, sempre foi mais difícil do que em outros estados conseguir incentivos para os talentos locais. Nomes como Mosiah Rodrigues (ginástica artística) e até mesmo o campeão mundial João Derly (judô) já passaram anos sem patrocínio ou apoio digno de seus resultados.

“As atuais políticas de incentivo fiscal ao esporte estão tentando mudar isso, mas, talvez com exceção ao vôlei e o basquete, que têm o campeonato transmitido na TV, nosso esporte olímpico ainda sofre com a falta de patrocínios”, afirma Pretto. A visibilidade atingida permite a esportes como o vôlei, basquete e futsal melhores chances de conquistar patrocinadores. Esportes ligados a grandes clubes com melhor estrutura organizacional e bom apelo político também têm mais fácil acesso aos patrocínios, por causa da lei federal de incentivo ao esporte. Pretto atribui a atual situação à falta de Investimento na base do esporte (ensino) e pouco apoio fora da temporada de grandes eventos. “Acho que a única maneira de investir na carreira de atletas é ter um gestor, alguém que pense na parte de recursos, mas isso tem que ser através de lei de incentivo fiscal”, finaliza.

Esporte é novo filão para o profissional contábil
FREDY VIEIRA/JC
 
Venda de jogadores é responsável pelo equilíbrio de contas, diz Salerno  
Quem pensa que o mundo dos esportes só abre mercado para atletas, treinadores e gestores de carreira está enganado. O mercado do futebol é também um grande filão para os profissionais da contabilidade. A frase do coordenador administrativo das Categorias de Base do Grêmio, Mauro Rocha, denota uma realidade pouco conhecida fora dos bastidores.

Foi pensando no gerenciamento das finanças de seus atletas que desde 2009 o Grêmio iniciou um projeto para levar informação e instruir os seus jogadores em relação ao cuidado financeiro das suas carreiras. Em um final de semana de formação, os jogadores em vias de assinar contrato profissional e seus familiares recebem orientações sobre a legislação, noções de orçamento, percentuais, riscos da carreira, previdência, entre outros assuntos. “Muitos vêm de camadas populares e não têm muita noção de gestão financeira”, explica.

A venda de um atleta também é um dos itens abordados, por ser uma questão que pode transformar radicalmente a vida de um jogador, e também por ser um dos principais tópicos de receita.

“Por mais que não seja uma renda constante, que dê suporte operacional mensal, é o fator responsável por equilibrar as contas no final do ano”, explica o contador do clube, Paulo Salerno.

As vendas acontecem em épocas predeterminadas, quando há a abertura das janelas de vendas dos jogadores para o exterior, sempre no início e no meio do ano. “Sem sombra de dúvida, qualquer clube depende da venda de atletas. Clube que não vende atletas certamente fecha no vermelho”, complementa o contador.

Segundo ele, a relação histórica da realização deste Investimento que o clube faz nas categorias de base é extremamente rentável, superavitária. Nos últimos 12 anos, o Grêmio vendeu jogadores que suportam o Investimento nos últimos 30, ou mais. Para cada jogador que dá certo, treina-se em torno de 200.

Mesmo assim, se comprovou numericamente que a relação custo/benefício das categorias de base é muito boa, mas ela tem que ser muito bem administrada. “É um Investimento mensal em cerca de 200 meninos, para tirar um grande atleta em 2 a 3 anos”, afirma Rocha.  Fora os atletas da equipe principal, hoje o Grêmio tem cerca de 190 meninos em formação, desde a categoria sub12 até a sub20. Todos os que têm mais de 16 anos já são profissionalizados.

A cada ano, cerca de 30 atletas se desligam, transformando-se em passivos. “Nesse universo, tem atletas nos quais se investiu meia dúzia de meses, e outros que foram investidos alguns anos. Esse custo tem que ser diluído no atleta que deu certo.”

Para Rocha, coordenador administrativo das Categorias de Base do Grêmio, há duas questões que devem ser pensadas quando se fala no Custeio de atletas de futebol: o gerenciamento profissional e a direção executiva do futebol.

Para ele, o futebol ainda paga um Preço histórico por ser administrado em cima de paixão e romantismo. “A Lei Pelé, que trouxe uma reformulação da legislação futebolística, é baseada na legislação da Europa, onde os clubes são empresas”, afirma. Ele defende que por mais romântico e afetivo que seja o Clube, a questão contábil, financeira e econômica tem que ser encarada de forma profissional.

Pesquisa revela quanto um clube aplica em atletas
O custo médio de formação de um jogador da categoria de base em um grande clube de futebol é em torno de R$ 76 mil por ano. O cálculo médio, feito no mês de dezembro de 2009, é proveniente de uma pesquisa realizada pelas contadoras Letícia Medeiros da Silva e Milene Martins Moraes, para a realização de um trabalho de conclusão de curso, na Faculdade de Ciências Contábeis do IPA.

O projeto foi realizado no Grêmio Football Porto Alegrense e teve como objetivo analisar os custos da formação de um atleta de futebol.  “A ideia era justamente fazer uma pesquisa diferente e aliar a contabilidade com algo que fosse de gosto da estudante”, explica a professora e orientadora Letícia Medeiros da Silva. Após ter conversado com vários professores, a então estudante Milene não teve dúvida. Falou com um colega de aula, que trabalhava no financeiro do Grêmio, e pediu ajuda para chegar ao contador Paulo Salerno.

A pesquisa, que recentemente foi apresentada no XVII Congresso Brasileiro de Custos, em Minas Gerais, ficou focada no setor da contabilidade do clube. Milene não teve contato com os jogadores da base, mas aproveitou o tempo de estágio no financeiro do seu time do coração para absorver novos conhecimentos.

Para realizar o levantamento de como se estrutura a categoria de base, foi feito o entendimento operacional do clube de futebol. Entre os gastos para a formação de um atleta, estão custos de pessoal, operacionais, hospedagem alimentação, viagens, transporte. Porém, o custo não é nada perto do que o clube ganha.

A conclusão da pesquisa é que não é intenção do clube formar o atleta para vender, mas é um dos seus principais fatores de sobrevivência. “De 1997 a 2008, o volume de receita com a renda foi bem maior do que o custo. Em 2007, com a venda do Anderson e Lucas, os ganhos foram de R$ 52 milhões comparados a um Investimento de R$ 6 milhões”, afirmam as pesquisadoras. Milene explica que, muitas vezes, os torcedores não chegam a conhecer o atleta, pois antes mesmo de ele virar profissional, já foi identificado por algum olheiro estrangeiro e vendido para times do exterior.

A contadora informa ainda que outra fonte de renda do time é o percentual de 5% sob o valor da transferência de ex-atletas para outro clube, através dos chamados Mecanismos de Solidariedade. Um exemplo de atleta que vive essa situação é  Ronaldinho Gaúcho.

Incentivos transcendem eventos
Incentivos e abatimentos que incluem o setor de infraestrutura e permeiam produtos esportivos, patrocínio a eventos e outros são algumas das opções que as empresas gaúchas estão encontrando para assegurar seus Investimentos para a Copa de 2014, da qual Porto Alegre é uma das cidades-sede. O tema foi discutido nesta semana em Porto Alegre, em encontro promovido pela Fiergs por meio dos Conselhos de Assuntos Tributários, Legais e Financeiros e de Infraestrutura, em parceria com os escritórios Xavier Advogados e Demarest&Almeida.
Entre os incentivos disponíveis, está a isenção de IPI incidente sobre produtos de procedência estrangeira ou industrializados no País até 31 de dezembro de 2013 para os equipamentos e material esportivos importados, sem similar nacional, e para os produtos do mesmo tipo adquiridos diretamente de fabricante nacional.


Fonte: Jornal do Comércio – RS