Publicado no DOM - Florianópolis em 19 dez 2025
Estabelece critérios objetivos para a classificação de riscos de perda em ações judiciais, disciplina os procedimentos para o levantamento e o fornecimento de informações destinadas ao provisionamento contábil e à elaboração do Anexo de Riscos Fiscais, e institui o plano de ação para seu integral cumprimento no âmbito do Município de Florianópolis e de suas entidades da Administração Pública Indireta.
O PROCURADOR-GERAL DO MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS, no uso das
atribuições que lhe são conferidas pelo disposto no art. 4º da Lei Complementar
Municipal nº 500, de 10 de novembro de 2014, e no art. 82, inciso I da Lei Orgânica
do Município de Florianópolis,
CONSIDERANDO a imperiosa necessidade de a Administração Pública pautar
sua atuação pelos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade
e eficiência, insculpidos no artigo 37, caput, da Constituição da República Federativa
do Brasil, bem como pelos princípios da responsabilidade e transparência na gestão
fiscal;
CONSIDERANDO o que dispõe a Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de
2000, conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que em seu artigo 4º, §
3º, determina que a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) conterá Anexo de Riscos
Fiscais, onde serão avaliados os passivos contingentes e outros riscos capazes de
afetar as contas públicas, informando as providências a serem tomadas, caso se
concretizem;
CONSIDERANDO a necessidade de aprimorar os mecanismos de governança
fiscal e de gestão de passivos do Município de Florianópolis, em conformidade com
as Normas Brasileiras de Contabilidade Aplicadas ao Setor Público (NBC TSP),
editadas pelo Conselho Federal de Contabilidade, que estabelecem a obrigatoriedade
do reconhecimento, mensuração e evidenciação dos passivos contingentes, de modo
a assegurar que as demonstrações contábeis representem fidedignamente a posição
patrimonial e financeira do ente público;
CONSIDERANDO as conclusões exaradas pelo Egrégio Tribunal de Contas do
Estado de Santa Catarina (TCE/SC) no bojo do Relatório de Auditoria Financeira do
Balanço Geral do Município de Florianópolis referente ao exercício de 2024 (Processo
@PCP 25/00038569 | Relatório nº DGO 740/2025), especialmente o apontamento
constante do item 3.1.8, o qual identificou "Distorção em montante e impacto não
estimados no Passivo, devido à inconsistência em provisões constituídas e ao não
reconhecimento de provisões para perdas em processos judiciais", evidenciando uma
vulnerabilidade nos controles internos e na fidedignidade das informações
patrimoniais declaradas;
CONSIDERANDO as deliberações firmadas na reunião realizada em 10 de
outubro de 2025, com a presença de representantes da Secretaria Municipal da
Fazenda, da Secretaria Municipal da Administração, da Secretaria Municipal de
Infraestrutura e Manutenção da Cidade, da Procuradoria-Geral do Município, da
Secretaria Executiva de Gestão por Resultados e da Controladoria-Geral do
Município, conforme Ata de Reunião constante do Processo PMF I 00223346/2025,
que consignou, em seu item 5.c, a expressa determinação para que a Procuradoria-
Geral do Município apresente um plano de ação para o atendimento da demanda de
classificação das sentenças judiciais desfavoráveis ao Município e suas entidades
vinculadas;
CONSIDERANDO a sugestão, acolhida na referida reunião, de adoção de
metodologias e critérios já consolidados em outras esferas da Administração Pública,
notadamente os normativos emitidos pela Advocacia-Geral da União (AGU) e pela
Procuradoria-Geral do Estado de Santa Catarina (PGE/SC), como forma de alinhar as
práticas municipais às melhores práticas de gestão de riscos fiscais e contábeis, em
especial a metodologia estabelecida na Portaria GAB/PGE nº 102/2021 do Estado de
Santa Catarina;
CONSIDERANDO, por fim, a necessidade de instituir um fluxo de trabalho
permanente, sistematizado e uniforme no âmbito da Procuradoria-Geral do Município
para a identificação, mensuração, classificação, monitoramento e comunicação dos
riscos de perda decorrentes de demandas judiciais, de forma a prover a Contabilidade
Geral do Município com informações tempestivas e confiáveis para a correta constituição de provisões e para a elaboração do Anexo de Riscos Fiscais, em estrito
cumprimento às normas de regência e às determinações dos órgãos de controle,
RESOLVE:
CAPÍTULO I
DAS DISPOSIÇÕES PRELIMINARES
Art. 1º Esta Instrução Normativa estabelece os critérios para a classificação da
probabilidade de perda em ações judiciais em que o Município de Florianópolis ou
suas entidades da Administração Pública Indireta figurem no polo passivo, e disciplina
o plano de ação e os procedimentos para o levantamento, a mensuração, a
consolidação e o fornecimento periódico de informações para fins de provisionamento
contábil e de subsidio à elaboração do Anexo de Riscos Fiscais da Lei de Diretrizes
Orçamentárias.
Art. 2º As disposições desta Instrução Normativa aplicam-se a todas as ações
judiciais, de qualquer natureza, ajuizadas em desfavor da Administração Pública
Direta do Município de Florianópolis, bem como de suas autarquias e fundações
públicas.
Parágrafo único. Incluem-se no escopo desta norma as ações individuais e
coletivas, os incidentes processuais, os recursos em todas as instâncias e as ações
de controle concentrado de constitucionalidade que possam, direta ou indiretamente,
gerar obrigações financeiras para o erário municipal.
Art. 3º Para os fins desta Instrução Normativa, considera-se:
I -Passivo Contingente: uma obrigação possível que resulta de eventos
passados e cuja existência será confirmada apenas pela ocorrência ou não de um ou
mais eventos futuros incertos não totalmente sob o controle da entidade; ou uma
obrigação presente que resulta de eventos passados, mas que não é reconhecida
porque não é provável que uma saída de recursos que incorporam benefícios
econômicos ou potencial de serviços seja exigida para liquidar a obrigação ou o valor
da obrigação não pode ser mensurado com suficiente confiabilidade.
II -Risco Fiscal: a possibilidade da ocorrência de eventos que venham a
impactar desfavoravelmente as contas públicas, compreendendo os passivos contingentes e outros riscos capazes de afetar o equilíbrio fiscal e a execução
orçamentária.
III -Demandas Repetitivas: a multiplicidade de ações judiciais que, embora
propostas individualmente, possuem fundamento em idêntica questão de direito e
apresentam potencial de gerar impacto financeiro significativo em seu conjunto.
CAPÍTULO II
DOS CRITÉRIOS DE CLASSIFICAÇÃO DOS RISCOS
Art. 4º A classificação das ações judiciais quanto à probabilidade de perda, a
ser realizada e periodicamente reavaliada pelo Procurador do Município responsável
pelo acompanhamento do feito, observará os seguintes critérios objetivos:
I - Classificação como Risco Provável, que abrange as seguintes hipóteses:
a) Ação judicial já transitada em julgado, em fase de cumprimento de sentença
ou execução contra a Fazenda Pública, desde que a obrigação não tenha sido
integralmente satisfeita e o título executivo não se enquadre nas hipóteses de
exclusão previstas no artigo 5º desta Instrução Normativa;
b) Ação judicial de conhecimento, ação de controle concentrado de
constitucionalidade ou recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida, que
versem sobre conjunto de ações judiciais fundadas em idêntica questão de direito,
com decisão de mérito proferida por órgão colegiado do Supremo Tribunal Federal
(STF) desfavorável à Fazenda Pública Municipal;
c) Ação judicial de conhecimento ou recurso especial representativo de
controvérsia com decisão de mérito proferida por órgão colegiado do Superior Tribunal
de Justiça (STJ) ou do Tribunal Superior do Trabalho (TST) desfavorável à Fazenda
Pública Municipal, desde que não haja matéria constitucional pendente de apreciação
pelo STF; e
d) Decisão de mérito desfavorável à Fazenda Pública Municipal em Incidente
de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) no âmbito do Tribunal de Justiça de
Santa Catarina (TJSC), que não tenha matéria passível de apreciação pelo STF ou
STJ; e
e) "Decisão de mérito proferida por órgão colegiado de Tribunal de 2ª Instância
desfavorável ao Município, quando os recursos aos Tribunais Superiores não possuírem efeito suspensivo ou quando houver jurisprudência pacífica contra a tese
municipal.
II - Classificação como Risco Possível, que abrange as seguintes hipóteses:
a) Ação judicial em fase de conhecimento, recurso extraordinário sobre
processo individual ou recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida,
desde o ajuizamento da ação ou o reconhecimento da repercussão geral até a
prolação de decisão de mérito por órgão colegiado do STF desfavorável à Fazenda
Pública Municipal;
b) Ação judicial de conhecimento ou recurso especial representativo de
controvérsia com decisão de mérito proferida por órgão colegiado do Superior Tribunal
de Justiça (STJ) ou do Tribunal Superior do Trabalho (TST) desfavorável à Fazenda
Pública Municipal, na hipótese de haver matéria constitucional passível de apreciação
pelo STF; e
c) Decisão de mérito desfavorável à Fazenda Pública Municipal em Incidente
de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) no âmbito do Tribunal de Justiça de
Santa Catarina (TJSC), na hipótese de haver matéria passível de apreciação pelo STF
ou STJ.
III - Classificação como Risco Remoto, que abrange todas as ações judiciais
que não se enquadrem nas classificações de risco provável ou possível, previstas nos
incisos I e II do caput deste artigo.
Art. 5º A aplicação dos critérios de classificação definidos no artigo 4º
observará as seguintes disposições complementares:
§ 1º Nas hipóteses de enquadramento em Risco Provável, conforme o inciso I
do artigo 4º, quando o processo estiver pendente de julgamento de embargos de
declaração ou de pedido de modulação de efeitos com plausibilidade de acolhimento,
excepcionalmente o risco poderá ser classificado como possível, devendo o
Procurador do Município responsável justificar fundamentadamente as circunstâncias
que motivam essa classificação.
§ 2º Para os efeitos da estimativa de risco e do provisionamento contábil,
devem ser excluídas do levantamento as seguintes demandas: a) Ações em fase de
execução cujo título judicial exequendo tenha sido declarado inválido, inexigível ou tenha sua eficácia suspensa por decisão judicial superveniente; e b) Ações judiciais
para as quais a obrigação de pagamento já tenha sido integralmente inscrita em
precatório ou Requisição de Pequeno Valor (RPV), ou cujo pagamento integral já
tenha sido efetuado na esfera judicial ou administrativa e c) Ações cujo impacto
orçamentário fique abaixo do montante de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) ou
com alta probabilidade de extinção sem ônus.
§ 3º Excepcionalmente, desde que devidamente justificado pelo Procurador
responsável e com a chancela do respectivo Subprocurador-Geral, poderão ser
incluídas na classificação de Risco Provável ou Risco Possível outras ações judiciais
não abrangidas pelos critérios fixados nos incisos I e II do artigo 4º, em razão de
particularidades fáticas ou jurídicas do caso concreto que indiquem elevada
probabilidade de êxito da parte adversa.
§ 4º Não se aplica o limite de valor previsto na alínea 'd' do § 2º às ações que,
embora individualmente inferiores a esse montante, versem sobre idêntica tese
jurídica classificada como 'Demandas Repetitivas' (Art. 3º, III), cujo impacto financeiro
global estimado ultrapasse o valor de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) ".
CAPÍTULO III
DO PLANO DE AÇÃO E DOS PROCEDIMENTOS OPERACIONAIS
Seção I
Da Identificação, Mensuração e Registro dos Riscos
Art. 6º Compete a cada Procurador do Município, no exercício de suas
atribuições, realizar a classificação inicial de todas as ações judiciais sob sua
responsabilidade, de acordo com os critérios estabelecidos no Capítulo II, e proceder
à sua reavaliação contínua ao longo da tramitação processual, sempre que houver
fato processual relevante que justifique a alteração da classificação.
Art. 7º A mensuração do impacto financeiro potencial de cada demanda judicial
será realizada com base na melhor estimativa disponível, considerando, conforme o
caso:
I - Os valores líquidos pleiteados na petição inicial, devidamente atualizados;
II - Os valores apurados em laudos periciais judiciais ou pareceres técnicos;
III - As estimativas de cálculo elaboradas pelos setores técnicos da
Administração Municipal; ou
IV - Cálculos e projeções realizados pela própria Procuradoria-Geral do
Município.
Parágrafo único. A estimativa de impacto financeiro deverá ser registrada de
forma clara e objetiva, consignando a metodologia de cálculo utilizada, e não implica,
em nenhuma hipótese, reconhecimento da dívida ou concordância com os valores
pleiteados pela parte autora, servindo exclusivamente para fins contábeis e de
planejamento fiscal.
Art. 8º O registro da classificação do risco e da estimativa de impacto financeiro
deverá ser efetuado diretamente no sistema de controle processual utilizado pela
Procuradoria-Geral do Município, em campo próprio a ser desenvolvido para essa
finalidade, garantindo a rastreabilidade e a integridade das informações.
Seção II
Do Fluxo de Informações e da Consolidação dos Dados
Art. 9º Fica instituído, no âmbito da Procuradoria-Geral do Município, o Núcleo
de Acompanhamento de Riscos Fiscais Judiciais (NARJ), a ser composto por
Procuradores do Município designados pelo Procurador-Geral, com a atribuição de
centralizar, consolidar, revisar e validar as informações sobre riscos judiciais.
Parágrafo Único: Em caso de divergência entre a classificação realizada pelo
Procurador responsável pelo feito e a revisão efetuada pelo NARJ, prevalecerá a
classificação definida pelo NARJ, cabendo recurso fundamentado ao Procurador-
Geral.
Art. 10. O fluxo de informações para a consolidação dos dados de riscos fiscais
judiciais observará a seguinte periodicidade e procedimento:
I - Ao final de cada quadrimestre civil, os Procuradores do Município deverão,
até o quinto dia útil do mês subsequente, revisar e, se necessário, atualizar a
classificação de risco e a estimativa de impacto financeiro de todas as ações judiciais
sob sua responsabilidade, certificando a conformidade das informações no sistema
de controle processual.
II - O Núcleo de Acompanhamento de Riscos Fiscais Judiciais (NARJ) extrairá
os dados do sistema e elaborará, até o décimo quinto dia do mês subsequente ao
encerramento do quadrimestre, um relatório consolidado contendo a totalidade das
demandas classificadas como de risco provável e possível, bem como um resumo das
demandas com maior impacto financeiro potencial.
III - O relatório consolidado será submetido à aprovação do Procurador-Geral
do Município e, posteriormente, encaminhado formalmente à Secretaria Municipal da
Fazenda, por meio da Contabilidade Geral do Município, até o vigésimo dia do mês
subsequente ao encerramento do quadrimestre.
Parágrafo Único: Sem prejuízo da periodicidade quadrimestral, o Procurador
responsável deverá comunicar imediatamente ao NARJ qualquer decisão judicial ou
evento processual que implique alteração de risco ou de valor superior a R$
1.000.000,00 (um milhão de reais), para fins de alerta antecipado à Secretaria da
Fazenda.
Art. 11. O relatório consolidado a ser encaminhado à Secretaria Municipal da
Fazenda deverá conter, no mínimo, as seguintes informações para cada processo ou
grupo de demandas repetitivas classificado como de risco provável ou possível:
I - Número do processo judicial e juízo de tramitação;
II - Principais partes envolvidas;
III - Resumo sucinto da lide e do pedido principal;
IV - Situação processual atualizada;
V - Estimativa do impacto financeiro; e
VI - Classificação do risco, conforme os critérios desta Instrução Normativa.
Art. 12. O relatório consolidado de riscos fiscais será remetido periodicamente
à Controladoria-Geral do Município, visando subsidiar as atividades de controle
interno, auditoria de gestão fiscal e o monitoramento das determinações do Tribunal
de Contas do Estado.
§ 1º A atuação da Controladoria-Geral limitra-se-á à verificação da
conformidade dos procedimentos e da metodologia aplicados, sendo vedada a ingerência na análise do mérito jurídico ou na estratégia processual adotada pelos
Procuradores do Município.
§ 2º É assegurado à Controladoria-Geral o acesso às memórias de cálculo e
aos fundamentos da classificação de risco, resguardado o sigilo das informações que
possam comprometer a defesa do Município em juízo.
CAPÍTULO IV
DAS DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS E FINAIS
Art. 13. Como medida inicial e prioritária para a implementação desta Instrução
Normativa, fica estabelecido o prazo de 180 (cento e oitenta) dias, a contar da data
de sua publicação, para que todos os Procuradores do Município realizem o
levantamento e a classificação inaugural da totalidade da carteira de processos
judiciais ativos sob sua responsabilidade.
Parágrafo único. O cumprimento do disposto no caput será coordenado e
monitorado pelo Núcleo de Acompanhamento de Riscos Fiscais Judiciais (NARJ), que
reportará o andamento dos trabalhos ao Procurador-Geral do Município.
Art. 14. Em atenção à deliberação específica constante da Ata de Reunião do
Processo PMF I 00223346/2025 e à necessidade de provisionamento contábil para o
encerramento do exercício de 2025, a Procuradoria-Geral do Município deverá, em
caráter de urgência, concluir o levantamento e a classificação de todas as ações
judiciais com risco provável de perda, apresentando à Contabilidade Geral do
Município um relatório específico com estimativas de valor confiáveis para o devido
reconhecimento em provisões contábeis.
Art. 15. Os casos omissos e as dúvidas surgidas na aplicação desta Instrução
Normativa serão dirimidos pelo Procurador-Geral do Município.
Art. 16. Esta Instrução Normativa entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 17. Revogam-se as disposições em contrário.
Publique-se e cumpra-se.
Florianópolis, 19 de dezembro de 2025.