Publicado no DOE - GO em 7 abr 2025
Consulta sobre possibilidade de retorno à empresa de origem de crédito outorgado do álcool anidro recebido em transferência por outra empresa que não o liquidou com débitos do ICMS.
Nestes autos, (...), expõe para ao final consultar o seguinte:
Trata-se de pedido de autorização para retorno de crédito outorgado emitido pela empresa (...), que realizou transferência de crédito à empresa (...) para extinção de débito tributário. Porém, constatou-se que o crédito transferido não foi utilizado para a finalidade específica de extinção do débito, conforme estipulado pela Instrução Normativa GSF nº 1348/2017.
Por meio do RELATÓRIO Nº 462 / 2024 ECONOMIA/GECOM-05557, a Auditora Fiscal (...) esclarece que, nos termos do inciso V do artigo 14 da referida norma, ficou determinado que o crédito transferido somente pode ser utilizado para extinção de débito, sob pena de nulidade da transferência. Com isso, a operação realizada pode ser interpretada como nula devido à não utilização do crédito para a finalidade prevista.
Contudo, verifica-se um conflito entre a aplicação do artigo 14, inciso V, da IN nº 1348/2017, e o artigo 6º, inciso II, da IN nº 715/2005, que veda expressamente o retorno do crédito ao estabelecimento de origem. Dessa forma, surge a necessidade de análise aprofundada para solução do pedido.
Diante de exposto, encaminhem-se os autos à Gerência de Orientação Tributária (GEOT), com nossa solicitação de seja realizado o seguinte:
1. Estudo técnico sobre a aplicação das duas instruções normativas no caso em questão.
2. Deliberação sobre a prevalência da nulidade da operação, conforme previsto na IN nº 1348/2017, sobre a vedação expressa da IN nº 715/2005.
3. Orientação quanto à possibilidade e à forma de implementação do retorno do crédito ao estabelecimento de origem em casos de nulidade por não utilização do crédito.
Trata-se de processo em que a empresa (...) requer o retorno de crédito outorgado no valor de R$ 443.357,85, transferido para a empresa (...) para extinção parcial de débito tributário desta referente ao auto de infração nº (...), conforme permitido pela Instrução Normativa nº 1.348/17, que dispõe sobre a implementação das medidas facilitadoras para quitação de débitos para com a fazenda pública estadual, relacionadas com o ICMS e com o ITCD, instituídas pela Lei nº 19.738/17, tendo em vista a não realização da liquidação parcial do débito referente ao auto de infração com o crédito outorgado transferido em virtude de manifestação desfavorável da Superintendência de Recuperação de Créditos, por meio do Parecer nº 1968/19-SRC.
Com efeito, prescreve a citada instrução normativa:
Art. 3º As seguintes medidas facilitadoras para quitação de débitos compreendem:
(...)
VII - permissão para pagamento do débito por meio de crédito acumulado na escrita do sujeito passivo ou recebido em transferência, nos limites previstos nesta instrução.
(...)
Art. 14. O contribuinte que pretender utilizar crédito acumulado na liquidação total ou parcial do crédito tributário favorecido deve pagar à vista, em moeda, pelo menos 40% (quarenta por cento) do valor do crédito favorecido até a data de 10 de dezembro de 2018, observado o seguinte:
I - o crédito de ICMS pode ser utilizado até 21 de janeiro de 2019 para a liquidação total ou parcial do crédito tributário favorecido após a imputação do valor referido no caput;
(...)
IV - o crédito acumulado deve referir-se ao valor constante na Escrituração Fiscal Digital - EFD - referente ao período de apuração de outubro de 2018;
V - o crédito recebido em transferência para os fins do Programa, somente pode ser utilizado para extinção de débito, sob pena de nulidade da transferência e sem prejuízo da aplicação das penalidades correspondentes à utilização indevida de crédito.
(...)
Art. 15. O sujeito passivo interessado em utilizar ou transferir para terceiro crédito de ICMS acumulado para liquidação de crédito tributário favorecido, deve emitir Nota Fiscal Eletrônica - NF-e, modelo 55, e registrá-la na Escrituração Fiscal Digital - EFD -, nos termos previstos na legislação tributária.
(...)
Art. 16. Após a emissão das NF-e e o pagamento do valor referido no inciso II do art. 14, o sujeito passivo deve, no prazo de 20 (vinte) dias, preencher requerimento para utilização de crédito de ICMS para extinção de débito no site www.sefaz.go.gov.br, no qual deverá informar:
I - seus dados e os dados do remetente do crédito, se for o caso;
II - o valor do crédito acumulado, próprio e de terceiros, que pretende utilizar;
III - o código da chave de acesso das Notas Fiscais Eletrônicas - NF-e correspondentes ao crédito recebido em transferência e ao crédito utilizado na extinção do débito;
IV - o número do documento de arrecadação correspondente ao pagamento referido no inciso II do art. 14.
Art. 17. Após o preenchimento do requerimento referido no art. 16, a Delegacia Regional de Fiscalização - DRF - ou Gerência Especial a que estiver circunscrito o sujeito passivo deve realizar auditoria de verificação do crédito utilizado, mediante processo administrativo próprio.
(...)
Art. 18. Concluída a auditoria de verificação do crédito, os autos devem ser encaminhados ao Superintendente de Recuperação de Créditos que, dentro de 180 (cento e oitenta) dias, contados da data de recebimento, homologará o crédito utilizado na extinção do débito.
Denota-se da leitura da instrução normativa, nos trechos acima transcritos, que não há qualquer vínculo do tipo de transferência de crédito do ICMS tratado na mesma, com as espécies, condições, e formas de transferência de crédito de ICMS cuidados na Instrução Normativa nº 715/05-GSF, pois, aquela tem uma finalidade autônoma e específica para quitação de parcela de auto de infração, não se prestando para abatimento de débitos escriturais, enquanto esta tem as condições, formas e especificações próprias para compensação com débitos da escrita fiscal.
Destarte, não se aplica a vedação constante do art. 6º, inciso II, da Instrução Normativa nº 715/05-GSF à situação em comento.
Espancado o possível conflito de normas, infere-se que o dispositivo do inciso V do art. 14 da Instrução Normativa nº 1.348/17-GSF impõe uma destinação única para o crédito tributário do ICMS recebido em transferência, qual seja, a quitação parcial de auto de infração, e fixa uma consequência imediata para a não concretização desta destinação única: a nulidade da transferência.
Posto isso, a única alternativa possível já foi exemplarmente exposta pela auditora fiscal que se manifestou no processo mediante o RELATÓRIO Nº 462/2024 ECONOMIA/GECOM-05557, a qual transcrevo a seguir para clareza da solução à consulta. Veja-se:
Diante da não utilização do crédito para a finalidade específica estabelecida no programa, a operação pode ser interpretada como nula, uma vez que não cumpriu o objetivo exigido pela norma. Assim, por lógica jurídica, um ato nulo deve ser desfeito, permitindo, em tese, o retorno do crédito ao estabelecimento de origem, já que a finalidade do crédito não foi concretizada.
A conclusão, portanto, é que a transferência do crédito do ICMS é nula, devendo adotar-se procedimentos para o seu retorno ao estabelecimento de origem, por intermédio de emissão de nota fiscal eletrônica, modelo 55, própria, de forma a desfazer os efeitos da nota fiscal que foi emitida para a transferência do crédito do ICMS em referência.
Posto isso, orientamos à (...) da forma seguinte:
QUESTÃO 1. Estudo técnico sobre a aplicação das duas instruções normativas no caso em questão.
RESPOSTA: A Instrução Normativa nº 1.348/17-GSF é autônoma, relativamente à Instrução Normativa nº 715/05-GSF, por suas próprias formas, condições, especificidades e finalidades.
QUESTÃO 2. Deliberação sobre a prevalência da nulidade da operação, conforme previsto na IN nº 1348/2017, sobre a vedação expressa da IN nº 715/2005.
RESPOSTA: A operação é nula, devendo o crédito de ICMS transferido retornar ao estabelecimento de origem.
QUESTÃO 3. Orientação quanto à possibilidade e à forma de implementação do retorno do crédito ao estabelecimento de origem em casos de nulidade por não utilização do crédito.
RESPOSTA: Deve-se proceder ao desfazimento da transferência do crédito do ICMS, mediante a emissão de nota fiscal eletrônica, modelo 55, própria, com registro a crédito na EFD do estabelecimento de origem.
É o parecer.
GOIANIA, 07 de abril de 2025.
DAVID FERNANDES DE CARVALHO
Auditor Fiscal da Receita Estadual