Publicado no DOE - DF em 26 nov 2025
ICMS. Peticionamento promovido por pessoa jurídica de direito privado. Embalagens. Insumo ou material de uso e consumo. Menção a posicionamentos de outras Unidades Federadas. Consulta formulada sem identificação de dispositivo da legislação tributária do Distrito Federal cuja interpretação suscite dúvida objetiva. Ausência dos requisitos legais veiculados pelo Decreto Distrital nº 33.269/2011. Inadmissibilidade da Consulta.
Processo SEI nº: 04044-00042280/2025-16
ICMS. Peticionamento promovido por pessoa jurídica de direito privado. Embalagens. Insumo ou material de uso e consumo. Menção a posicionamentos de outras Unidades Federadas. Consulta formulada sem identificação de dispositivo da legislação tributária do Distrito Federal cuja interpretação suscite dúvida objetiva. Ausência dos requisitos legais veiculados pelo Decreto distrital nº 33.269/2011. Inadmissibilidade da Consulta.
RELATÓRIO
1. Os Autos versam sobre peticionamento promovido por pessoa jurídica de direito privado através do qual a Consulente, em curta exposição, assim se manifesta:
Prezados,
A empresa XXX (sigilo fiscal), inscrita no CNPJ sob o nº XXX (sigilo fiscal), estabelecida no Distrito Federal, vem, por meio desta, apresentar consulta formal nos termos da legislação vigente, com o objetivo de obter esclarecimento quanto à classificação tributária das embalagens utilizadas no processo de fabricação e comercialização de polpas de frutas.
Contextualização:
No processo produtivo, as polpas de frutas são embaladas e distribuídas da seguinte forma:
1. Embalagem primária: envolve diretamente a polpa de 100 gramas.
2. Embalagem secundária: acondiciona 10 unidades de polpas de 100 gramas (totalizando 1 kg).
3. Embalagem terciária: utilizada para armazenar e transportar diversos pacotes de 1 kg, com capacidade de 10 kg a 20 kg.
Resumo do fluxo de embalagem:
As polpas de 100g são agrupadas em sacos de 1kg, que posteriormente são armazenados em sacos maiores, com capacidade para até 20kg, para fins de transporte e logística.
Fundamentação:
Em consultas tributárias realizadas em outras unidades da federação, como São Paulo e Mato Grosso, foi reconhecido que embalagens que acompanham o produto até o consumidor final — incluindo caixas de papelão e sacos plásticos — podem ser consideradas insumos, não ocasionando o recolhimento de Diferencial de Alíquota na compra interestadual.
Exemplos de fundamentação incluem:
* Resposta à Consulta Tributária nº 25.074/2022 – SEFAZ/SP
* Resposta à Consulta nº 86 de 26/05/2020 – SEFAZ/MT
* Nota Explicativa SEFAZ nº 2 de 11/07/2023
Dúvida:
Diante do exposto, solicitamos o posicionamento da SEEC/DF quanto à classificação tributária das embalagens descritas acima. Especificamente, desejamos saber se tais embalagens podem ser consideradas insumos, para fins de não recolhimento de diferencial de alíquota, ou se devem ser tratadas como materiais de uso e consumo.
2. Nesse curto contexto, os Autos foram enviados à Coordenação de Atendimento ao Contribuinte (COATE), a fim de se promover o preparo/saneamento processual, com esteio nos arts. 74 e 75 do Decreto distrital nº 33.269/2011 (Documento SEI nº 180181901), e, em seguida, retornaram a essa Gerência, com o objetivo de “análise do mérito” (Documento SEI nº 181072676).
ANÁLISE
3. Ab initio, registre-se o fato de a Autoridade Fiscal promover a análise da matéria consultada plenamente vinculada à legislação tributária.
4. A faculdade de se formular consulta é um direito subjetivo do sujeito passivo em caso de dúvida, clara e objetiva, sobre a interpretação e aplicação da legislação tributária do Distrito Federal a determinada situação de fato, relacionada a tributo do qual seja contribuinte inscrito no Cadastro Fiscal do Distrito Federal, ou pelo qual seja responsável.
5. Entenda-se Dúvida (substantivo feminino) a ausência de convicção diante de duas ou mais opiniões ou possibilidades. Ex.: tinha dúvida entre a aplicação da legislação A ou da legislação B a determinada situação de fato.
6. A Dúvida é concêntrica ao Não Saber, porém com este não se confunde, haja vista ser genérico a certo tema, ultrapassando a fronteira jurídica da ausência de convicção diante de duas ou mais opiniões ou possibilidades. A dúvida jurídica decorre de um conflito de entendimentos, e não da ignorância normativa.
7. O "não saber" caracteriza-se pela ausência total de conhecimento ou informação sobre determinado tema, não configurando conflito interpretativo. Trata-se de um questionamento meramente procedimental, voltado à obtenção de informações básicas, como, por exemplo, desconhecer qual norma disciplina certo regime tributário.
8. A dúvida jurídica, tal como exigida no âmbito da Consulta Tributária, pressupõe a existência de ao menos duas interpretações possíveis sobre a aplicação da legislação tributária a uma situação de fato concreta e claramente delimitada. Ou seja, decorre de um conflito de entendimentos (repita-se), e não da ignorância normativa.
9. Por essa razão, a Consulta Tributária não se presta a convalidar teses, confirmar entendimentos já formados ou suprir lacunas de conhecimento genérico.
10. Na ausência de descrição clara e objetiva da dúvida, a Consulta será inadmissível quanto ao quesito em análise.
11. Noutra toada, se a situação apresentada já estiver regulamentada, definida ou declarada em disposição literal de legislação, bem como disciplinada em ato normativo, inclusive em Solução de Consulta, ou orientação publicados antes de sua apresentação, a Consulta será ineficaz.
12. A faculdade de formular Consulta se estende aos órgãos da Administração Pública e às entidades representativas das categorias econômicas ou profissionais, relativamente às atividades desenvolvidas por seus representados.
13. Uma vez exercida essa faculdade, o pronunciamento da Autoridade Fiscal poderá se operar em três sentidos, quais sejam: Inadmissibilidade da Consulta, Ineficácia de Consulta e Consulta Eficaz (arts. 76 a 80 do Decreto distrital nº 33.269/2011).
14. O instituto da consulta administrativa tributária se materializa por meio de um procedimento tributário de caráter preventivo, envolvendo determinado fato de duvidoso enquadramento tributário, que possa gerar insegurança jurídica em relação à situação fática, com força vinculante para a Administração, acaso seja favorável ao contribuinte, guardando força normativa até que outro ato a modifique ou revogue.
Todavia, não é vinculativa para o sujeito passivo, uma vez que este poderá provocar o Judiciário para se pronunciar, com espeque no inciso XXXV do art. 5º da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/1988).
15. Por outro lado, avulta importância registrar a Consulta não ser o instrumento adequado para se questionar o lançamento tributário, ou seu início por meio de uma ação fiscal, bem como inscrição de crédito tributário em dívida ativa, haja vista o instrumento adequado ser a Impugnação, a Revisão e/ou o Recurso.
16. O caso versado nos Autos enseja claramente uma Inadmissibilidade de Consulta. Isso porque a Consulente apontou questionamentos desacompanhados de qualquer texto normativo relativo à legislação tributária do Distrito Federal que enseje dúvida objetiva envolvendo sua interpretação ou aplicação a determinada situação de fato, mas apenas mencionou Consultas Tributárias de outros Entes da Federação, bem como mencionou Nota Explicativa de origem não identificada, sem fornecer cópia ou transcrição de seu conteúdo para análise.
17. Nada obstante, a título de esclarecimento e cortesia, sem caráter vinculativo algum, informamos a classificação fiscal de mercadorias encontrar‑se regulada por meio de normas provenientes da Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB), que dispõe a Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM) ser o instrumento que identifica mercadorias para efeitos tributários, aduaneiros e estatísticos.
18. Segundo o Parecer Normativo RFB nº 6, de 20/12/2018, “a classificação fiscal de mercadorias é de competência de autoridades tributárias e aduaneiras. No Brasil, tal atribuição é exercida pelos Auditores-Fiscais da RFB”. Assim, a competência para dirimir dúvidas e emitir interpretação oficial é da RFB.
19. Embora os Estados e o Distrito Federal possam atuar na fiscalização, não podem substituir a RFB na definição da NCM/SH.
20. Partindo-se para o conceito de “insumos” versus “material de uso ou consumo” no âmbito do ICMS, há o entendimento de que embalagens que se incorporam fisicamente ao produto ou que o acompanham até o destino final podem ser tratadas como insumos ou matérias‑primas para fins de crédito (Informativo nº 666 do STJ).
21. Faz-se necessário se atentar à distinção entre “acompanhamento até o consumidor final” e uso exclusivo no processo de produção, bem como se o bem é destacado e tributado.
22. No Distrito Federal, o art. 48 do RICMS/DF (Decreto distrital nº 18.955/1997) assim disciplina:
Art. 48. É devido ao Distrito Federal o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna desta Unidade Federada e a interestadual, nas operações e prestações interestaduais que destinem:
I - bens ou serviços a contribuinte do imposto definido neste Regulamento, estabelecido no Distrito Federal, na condição de consumidor ou usuário final;
II - bens ou serviços a consumidor final, não contribuinte do imposto, localizado no Distrito Federal.
23. Destarte, a simples qualificação de “insumo” não afasta automaticamente a incidência do DIFAL, a menos que haja previsão normativa ou convênio concedendo tratamento especial.
24. De acordo com a Consulente, há o processo produtivo de polpas de frutas, a utilização de embalagem primária (100 g), de embalagem secundária (agrupamento de 10×100g) e de embalagem terciária (sacos maiores de transporte com capacidade de até 20 kg) para logística.
25. É razoável deduzir a embalagem primária e a secundária acompanharem o produto até o consumidor final, presumivelmente permanecendo com ele (embalagem de 100 g e embalagem de 1 kg).
26. Já a embalagem terciária destina‑se ao transporte/distribuição logística, de modo que é razoável deduzir não permanecer com consumidor final, sendo descarregada no estabelecimento de recebimento.
27. Assim, as embalagens primária e secundária, que acompanham o produto até o consumidor final, têm forte argumento de estarem vinculadas ao produto (polpa de frutas) e serem, portanto, insumos ou componentes da mercadoria vendida.
28. A embalagem terciária de transporte/logística, por sua vez, não permanece com o consumidor final, de modo que tende a ser tratada como material de uso ou consumo ou bem de acondicionamento/remoção, não justificando a qualificação de “insumo”.
29. Avulta importância registrar os posicionamentos acerca da matéria de outros Entes Federados, embora relevantes para interpretar a prática, não vincularem o Distrito Federal, porque cada Unidade Federada pode disciplinar tratamento interno à luz da LCnº 87/1996.
30. Diante do exposto, a título de opção, a Consulente poderá seguir as orientações procedimentais a serem fornecidas pela Secretaria de Estado de Economia do Distrito Federal, que podem ser obtidas através do Atendimento Virtual.
Nesse sentido, recomenda-se à Consulente acessar a página eletrônica desta Subsecretaria de Receita (https://www.receita.fazenda.df.gov.br/), dirigindo-se, inicialmente, para a aba “Perguntas Frequentes”, onde poderá inteirar-se sobre o tópico de seu interesse.
Não sendo suficientes as orientações lá disponibilizadas, a Consulente poderá acessar, no endereço acima especificado, a aba “Atendimento Virtual” (https://www2.agencianet.fazenda.df.gov.br/Atendimento/SAC#/Home) e seguir as orientações indicadas.
31. Note-se a Declaração de Inadmissibilidade de Consulta não comportar a interposição de recurso voluntário, conforme dicção do parágrafo único do art. 79 do Decreto distrital nº 33.269/2011.
CONCLUSÃO
32. Em razão de todo o exposto, com espeque no inciso I do art. 5º da Lei ordinária distrital nº 4.717/2011, sugiro a inadmissibilidade desta formulação de Consulta, por estar em dissonância com os termos do Decreto distrital nº 33.269/2011, não devendo ser aplicado o disposto no caput dos arts. 79, 80 e 82 do mesmo Diploma Normativo.
33. À consideração superior.
Brasília/DF, 04 de novembro de 2025
ZENÓBIO FARIAS BRAGA SOBRINHO
Auditor-Fiscal da Receita do Distrito Federal
Matrícula 109.123-9
De acordo.
Encaminhamos à análise desta Coordenação o Parecer supra.
Brasília/DF, 05 de novembro de 2025
LUÍSA MATTA MACHADO FERNANDES SOUZA
Gerência de Esclarecimento de Normas
Gerente
Aprovo o Parecer supra e assim decido, declarando a inadmissibilidade da presente Consulta, nos termos do que dispõe a alínea “a” do inciso VI do art. 1º da Ordem de Serviço SUREC nº 14, de 26 de fevereiro de 2025 (Diário Oficial do Distrito Federal nº 42, de 28 de fevereiro de 2025, págs. 3 e 4).
Encaminhe-se para publicação, nos termos do inciso III do art. 411 da Portaria nº 544, de 11 de julho de 2025.
Brasília/DF, 17 de novembro de 2025
MATEUS TORRES CAMPOS
Coordenação de Tributação
Coordenador