Resposta à Consulta COPAT Nº 88 DE 13/10/2025


 


ICMS. Transferência interestadual de mercadorias entre estabelecimentos de mesma titularidade. Não incidência.


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DA CONSULTA

Trata-se a presente de consulta formulada por empresa estabelecida em Santa Catarina, que realiza transferências interestaduais de mercadorias industrializadas e insumos para filial de mesma titularidade localizada em outra unidade da Federação.

A consulente expõe que, em virtude da decisão do STF na ADC 49 e da subsequente Lei Complementar nº 204/2023, as transferências entre estabelecimentos da mesma titularidade não constituem fato gerador do ICMS, sendo assegurada a manutenção dos créditos. Aduz, ainda, que a regulamentação do tema teria estabelecido como regra a transferência dos créditos de ICMS ao estabelecimento destinatário, mas previu a faculdade de o contribuinte optar por equiparar a transferência a uma operação tributada.

No caso concreto, a consulente informa que a filial destinatária possui um regime especial de diferimento, impedindo-a de aproveitar imediatamente os créditos transferidos. Por essa razão, a consulente pretende optar por não transferir os créditos, mantendo-os no estabelecimento remetente em Santa Catarina.

Diante do exposto, a consulente apresenta os seguintes questionamentos:

(a) A transferência dos créditos de ICMS ao estabelecimento destinatário em outra unidade da Federação é obrigatória, ou o contribuinte pode optar por não a realizar?

(b) Caso a transferência seja facultativa, pode o estabelecimento remetente em Santa Catarina optar por equiparar a transferência a uma operação tributada, destacando o ICMS na nota fiscal, com o objetivo de manter e aproveitar os créditos no próprio estabelecimento de origem?

O processo foi analisado no âmbito da Gerência Regional conforme determinado pelas Normas Gerais de Direito Tributário de Santa Catarina.

A autoridade fiscal verificou as condições de admissibilidade.

É o relatório, passo à análise.

LEGISLAÇÃO

Lei Complementar nº 87/96, art. 12, § 4º; Lei nº 10.297/1996, arts. 4º, §§ 5º e 6º, 31-A e 31-E; RICMS/SC, arts. 39-B a 39-F; Convênio ICMS 109/2024.

FUNDAMENTAÇÃO

Em 29/12/2023, foi publicada a Lei Complementar n° 204/2023, que alterou a Lei Complementar n° 87/96 (Lei Kandir) dispondo que “não se considera ocorrido o fato gerador do imposto na saída de mercadoria de estabelecimento para outro de mesma titularidade, mantendo-se o crédito relativo às operações e prestações anteriores em favor do contribuinte, inclusive nas hipóteses de transferências interestaduais (art. 12, § 4°)”.

Em decorrência desse novo tratamento tributário foi celebrado entre as unidades federadas o Convênio ICMS 178/2023, no qual ficou acordado que nas transferências interestaduais de bens e mercadorias entre estabelecimentos de mesma titularidade o crédito deve ser transferido para a unidade de destino; além disso, o citado ato convenial estabeleceu a forma de apuração do valor do crédito a ser transferido.

O Convênio ICMS 178/2023, por sua vez, foi revogado pelo Convênio ICMS nº 109/2024, que possibilitou, por opção do contribuinte, a transferência de mercadoria para estabelecimento pertencente ao mesmo titular de forma equiparada a operação sujeita à ocorrência do fato gerador do imposto.

As novas regras aplicáveis às operações de transferência de bens e mercadoria entre estabelecimentos de mesma titularidade, dadas pela Lei Complementar n° 204/2023, e pelo Convênio ICMS 109/2024, foram inseridas na Lei nº 10.297/1996 pelas Leis nº 18.900/2024 e 19.172/2025, prevendo as regras de transferência de créditos (arts. 31-A e 31-E, da Lei nº 10.297/1996).

“Art. 4º .....................................................................................

I – da saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte;

.................................................................................................

§ 5º Não se considera ocorrido o fato gerador do imposto na saída de mercadorias de estabelecimento para outro de mesma titularidade, mantendo-se o crédito relativo às operações e prestações anteriores em favor do contribuinte, inclusive nas hipóteses de transferências interestaduais em que os créditos serão assegurados ao estabelecimento:

I – destinatário de transferência de mercadorias provenientes de outro estabelecimento do mesmo titular, localizado em outra unidade da Federação, recebidos por meio de transferência de crédito, limitados aos percentuais estabelecidos nos termos do inciso IV do § 2º do art. 155 da Constituição da República, aplicados sobre o valor atribuído à transferência realizada, observado o disposto na Seção VI do Capítulo IV desta Lei; ou

II – que promova remessa de mercadorias para outra unidade do mesmo titular, localizada em outra unidade da Federação, em caso de diferença positiva entre os créditos pertinentes às operações e prestações anteriores e o crédito transferido na forma da Seção VI do Capítulo IV desta Lei.

§ 6º Alternativamente ao disposto no § 5º deste artigo, por opção do contribuinte, a transferência de mercadoria para estabelecimento pertencente ao mesmo titular poderá ser equiparada a operação sujeita à ocorrência do fato gerador do imposto, hipótese em que serão observadas:

I – nas operações internas, as alíquotas estabelecidas nesta Lei; e

II – nas operações interestaduais, as alíquotas fixadas nos termos do inciso

IV do § 2º do art. 155 da Constituição da República.”

O art. 31-A, da Lei nº 10.296/1997, por sua vez, prevê:

“Art. 31-A. Na remessa interestadual de mercadorias entre estabelecimentos de mesma titularidade, fica assegurado o direito à transferência de crédito do imposto a que se refere o inciso I do § 5º do art. 4º desta Lei para o estabelecimento de destino relativo às operações e prestações anteriores, observado o disposto nesta Seção e na regulamentação desta Lei.

Parágrafo único. Nos termos do inciso II do § 5º do art. 4º desta Lei, fica assegurado ao estabelecimento remetente o direito à manutenção do crédito do imposto correspondente apenas à diferença positiva entre os créditos pertinentes às operações e prestações anteriores e o resultado da aplicação dos percentuais estabelecidos no art. 20 desta Lei, aplicados sobre o valor atribuído à operação de transferência realizada”.

O art. 12, §4º, II, da Lei Complementar nº 87/1996 estabelece que nas hipóteses de transferências interestaduais em que os créditos serão assegurados:

(a) pela unidade federada de destino, por meio de transferência de crédito, limitados aos percentuais estabelecidos nos termos do inciso IV do § 2º do art. 155 da Constituição Federal, aplicados sobre o valor atribuído à operação de transferência realizada;

(b) pela unidade federada de origem, em caso de diferença positiva entre os créditos pertinentes às operações e prestações anteriores e o transferido na forma do inciso I deste parágrafo.

Portanto, com relação às operações interestaduais de transferência, os créditos relativos às operações e prestações anteriores também ficam mantidos, e serão suportados:

(a) pela unidade federada de destino, por meio de transferência de crédito, limitado à alíquota interestadual; e

(b) pela unidade federada de origem, quanto ao valor que exceder aquele correspondente à alíquota interestadual, no caso de saldo positivo.

A previsão do referido Convênio ICMS está exatamente em consonância com o previsto no §4º, inciso II, do art. 12, da Lei Kandir - a despeito de não repetir o texto legal ipsis litteris -, de acordo com o qual a unidade federada de origem, obviamente, só deverá garantir a diferença positiva entre os créditos pertinentes às operações e prestações anteriores e o resultado da aplicação dos percentuais estabelecidos no inciso IV do § 2º do art. 155 da Constituição Federal aplicados sobre o valor atribuído à operação de transferência realizada.

Embora a transferência de mercadoria entre estabelecimentos de mesmo titular não configure fato gerador do ICMS, o princípio da autonomia dos estabelecimentos permanece hígido para os demais fins, tratando-se, portanto, de um fato jurídico apto a produzir outros efeitos tributários que não sejam o surgimento da obrigação tributária principal que seria devida em decorrência de eventual saída destinada a outros contribuintes. É o caso, por exemplo, da própria transferência do crédito do imposto prevista na Lei Complementar 204/2023.

Daí o motivo pelo qual a Lei Complementar 204/2023, que incluiu o § 4º ao artigo 12 da Lei Complementar 87/1996, garantiu a manutenção do crédito do ICMS relativo às operações e prestações anteriores em favor do contribuinte, o que se aplica inclusive nas hipóteses de transferências interestaduais, nas quais os créditos serão assegurados pelas Unidades Federadas (UF) de destino e origem.

A sistemática trazida pelo § 4º do artigo 12 da Lei Complementar 87/1996 garante a manutenção da totalidade do crédito, sendo parte dele devido em face da UF de origem e parte em face da UF de destino. Cada uma dessas UFs deve suportar exatamente o montante de crédito estipulado pela Lei Complementar; nem mais, nem menos.

Obviamente que, no regramento constante do § 4º da Lei Complementar, não havendo crédito do imposto (por exemplo, no caso de aquisições isentas do ICMS), não há o que se falar em transferência de crédito. A expressão “limitados aos percentuais”, trazida no inciso I do § 4º, indica precisamente que caso o montante de crédito relativo às operações anteriores seja inferior ao valor resultante da aplicação do percentual correspondente à alíquota interestadual, apenas o crédito existente será transferido.

Logo, quanto ao primeiro questionamento do consulente, como regra geral, os créditos serão suportados pela unidade federada de destino, por meio de transferência de crédito, limitado à alíquota interestadual e pela unidade federada de origem, quanto ao valor que exceder aquele correspondente à alíquota interestadual, no caso de saldo positivo.

Por outro lado, no que se refere ao segundo questionamento, nas operações de transferência de mercadorias entre estabelecimentos de mesma titularidade é facultada a opção por equiparar a transferência a uma operação sujeita à ocorrência do fato gerador do imposto (art. 4º, §6º, Lei nº 10.297/1996), a fim de fruir eventuais benefícios fiscais previstos na legislação.

Nessa hipótese, o débito do imposto na UF de origem e o crédito na UF de destino ocorrerão exatamente como ocorreriam em uma operação com a mesma mercadoria realizada entre estabelecimentos de titulares distintos.

É por essa razão que se torna necessária a previsão contida no §1º, da Cláusula Sexta, do Convênio ICMS nº 109/2024 (que, a propósito, coincide com a previsão anterior do art. 12, §4º, da Lei Kandir, revogada pela Lei Complementar nº 204/2023):

“Cláusula sexta Alternativamente ao disposto nas cláusulas primeira à quarta, por opção do contribuinte, a transferência da mercadoria poderá ser equiparada a operação sujeita à ocorrência do fato gerador de imposto, para todos os fins.

§ 1º Na hipótese desta cláusula, considera-se valor da operação para determinação da base de cálculo do imposto:

I - o valor correspondente à entrada mais recente da mercadoria;

II - o custo da mercadoria produzida, assim entendida a soma do custo da matéria-prima, material secundário, mão-de-obra e acondicionamento;

III – tratando-se de mercadorias não industrializadas, a soma dos custos de sua produção, assim entendidos os gastos com insumos, mão-de-obra e acondicionamento”.

A previsão acima está contida no art. 31-E, da Lei nº 10.297/1996:

“Art. 31-E. Alternativamente ao disposto nos arts. 31-A, 31-B, 31-C e 31-D desta Lei, de acordo com o disposto no § 6º do art. 4º desta Lei, por opção do contribuinte, a transferência da mercadoria poderá ser equiparada a operação sujeita à ocorrência do fato gerador de imposto, para todos os fins.

§ 1º Na hipótese deste artigo, considera-se valor da operação para determinação da base de cálculo do imposto:

I – o valor correspondente à entrada mais recente da mercadoria;

II – o custo da mercadoria produzida, assim entendida a soma do custo da matéria-prima, dos materiais secundários e de acondicionamento e da mão de obra; ou

III – tratando-se de mercadorias não industrializadas, a soma dos custos de sua produção, assim entendidos os gastos com insumos, mão de obra e acondicionamento”.

Destaca-se que o Convênio não está definindo a base de cálculo ou o fato gerador do imposto, mas estabelecendo critérios para fixação do valor para uma operação que originariamente não seria considerada tributada, mas, por opção do contribuinte, deve ser tratada como tal.

Sendo assim, na transferência de mercadorias, o contribuinte poderá optar por realizar a transferência do crédito da forma prevista nas cláusulas primeira à quarta do Convênio ICMS 109/2024 (artigo 12, § 4º, da Lei Complementar 87/1996) ou por meio da equiparação da transferência de mercadorias a uma operação sujeita à ocorrência do fato gerador do imposto, para todos os fins (cláusula sexta do Convênio – artigo 12, § 5º, da LC 87/1996).

RESPOSTA

Diante do exposto, responda-se à consulente que, nas operações de transferência interestadual de mercadorias entre estabelecimentos de mesma titularidade:

(a) como regra geral, os créditos serão suportados pela unidade federada de destino, por meio de transferência de crédito, limitado à alíquota interestadual e pela unidade federada de origem, quanto ao valor que exceder aquele correspondente à alíquota interestadual, no caso de saldo positivo.

(b) é facultada a opção por equiparar a transferência a uma operação sujeita à ocorrência do fato gerador do imposto.

À consideração da Comissão.

DANIEL BASTOS GASPAROTTO

AUDITOR FISCAL DA RECEITA ESTADUAL - Matrícula: 9507256

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na Sessão do dia 18/09/2025.

A resposta à presente consulta poderá, nos termos do § 4º do art. 152-E do Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário (RNGDT), aprovado pelo Decreto 22.586, de 27 de julho de 1984, ser modificada a qualquer tempo, por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente, em decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de Resolução Normativa que adote diverso entendimento.

Responsáveis

DILSON JIROO TAKEYAMA

Presidente COPAT

FABIANO BRITO QUEIROZ DE OLIVEIRA

Gerente de Tributação

NEWTON GONÇALVES DE SOUZA

Presidente do TAT

CAROLINA VIEITAS KRAJNC ALVES

Secretário(a) Executivo(a)