Consulta Fiscal. ICMS. Crédito presumido. Art. 21 do Decreto nº 38.394/2000. Empresa incentivada pelo PRODESIN, Lei nº 5.671/95. Esclarecimentos acerca da apuração, transferência e escrituração dos créditos. Observância do art. 81 do Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto nº 35.245/1991. Os créditos relativos às entradas de mercadorias e serviços devem ser utilizados prioritariamente em relação ao crédito presumido.
RELATÓRIO
A empresa Consulente, acima qualificada, esclarece que: i) não se encontra sob procedimento fiscal iniciado ou instaurado pela fiscalização da Secretaria de Estado da Fazenda de Alagoas, voltada a apuração dos fatos que se relacionam com a matéria objeto desta consulta; ii) não foi intimada a cumprir obrigação relativa aos fatos objeto desta consulta; e iii) os fatos expostos nesta consulta não foram objeto de decisão anterior.
Expõe que é empresa instalada no Estado de Alagoas e exerce as suas atividades no polo industrial de Marechal Deodoro, realizando as atividades de fabricação de esmaltes, pigmento e aditivos cerâmicos, sendo constituída como sociedade empresarial limitada. Informa que aderiu ao Programa de Desenvolvimento Integrado do Estado de Alagoas – PRODESIN, e tem o direito de usufruir do incentivo fiscal de concessão de créditos presumidos de 50% (cinquenta por cento) sobre o valor do ICMS debitado em cada período de apuração.
Ressalta que por estar enquadrada na sistemática anterior (direito a usufruir crédito presumido de 50% (cinquenta por cento) sobre o valor do ICMS debitado), surgem dúvidas quanto à interpretação da legislação tributária, em face da ausência de dispositivos específicos que tratem da escrituração dos créditos e apuração do tributo a ser pago.
Assim expondo, Consulta:
1. Quando da realização da apuração do ICMS, na coexistência de créditos presumidos e créditos destacados em operações da aquisição de mercadorias, quais créditos devem ser utilizados em primeira ordem na hipótese dos créditos superarem o débito?
2. Havendo o transporte de crédito acumulados para os períodos subsequentes, quais créditos devem ser utilizados em primeira ordem?
3. Deve haver a escrituração em separado dos créditos de acordo com a natureza de crédito presumido ou crédito destacado em operação de aquisição de mercadoria?
É o relatório.
FUNDAMENTAÇÃO
Inicialmente, cumpre informar que a legislação tributária estadual (arts. 56 a 61 da Lei nº 6.771/06 e arts. 199 a 213 do Decreto nº 25/370/13, que regulamenta o processo administrativo tributário – RPAT) aplicada à Consulta Fiscal foi observada pela consulente.
Conforme se depreende da inicial, a questão ensejadora da presente consulta está relacionada a forma de utilização dos créditos de ICMS relacionados a aquisição de mercadorias e serviços, em face da existência de créditos presumidos.
Visando melhor vislumbre dessa questão discorreremos, inicialmente, acerca do princípio da não cumulatividade.
O ICMS é um tributo que onera, dentre outros fatos jurídico tributários, a circulação de mercadorias. Tendo em vista que o ciclo mercantil das mercadorias em geral envolve diversas etapas e que o ICMS incide em todas essas fases do ciclo mercantil, tem-se que este é um tributo plurifásico.
Com o fito de implementar mecanismo para impedir a sobreposição das fases de tributação do ICMS, também chamada de tributação em cascata, o Poder Constituinte inseriu na Constituição Federal de 1988 a não cumulatividade como sistemática norteadora da tributação pelo ICMS.
A não cumulatividade do ICMS consiste na compensação do que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou Distrito Federal.
A regra da não-cumulatividade está prevista na Constituição da República Federativa do Brasil, em seu artigo 155, § 2º, inciso I, determinando que o ICMS:
“será não cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal.”
A despeito da disciplina Constitucional transcrita acima ser suficiente para a aplicabilidade da não cumulatividade do ICMS, o próprio Texto Magno atribui à Lei Complementar a função de “disciplinar o regime de compensação do Imposto” (art. 155, §2°, XII, “c”, da CF), função esta que foi cumprida pela Lei Complementar n° 87/1996 nos seguintes termos:
“Lei Complementar n° 87/96
Art. 19. O imposto é não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou por outro Estado.
Art. 20. Para a compensação a que se refere o artigo anterior, é assegurado ao sujeito passivo o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria, real ou simbólica, no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente, ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação. ”
O fato da Lei Complementar n° 87/96 ter repetido as disposições da Constituição relativas à não cumulatividade do ICMS decorre primeiramente da inafastável e inquestionável superioridade do Texto Constitucional, bem como do fato de que além de impor a observância da não cumulatividade como norteadora da incidência do ICMS, a Constituição Federal teve o cuidado de estabelecer exaustivamente as hipóteses nas quais essa sistemática não será aplicável.
Por oportuno, vejamos o dispositivo Constitucional limitador da aplicabilidade da não cumulatividade do ICMS:
“Constituição Federal
§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:
II - a isenção ou não-incidência, salvo determinação em contrário da legislação:
a) não implicará crédito para compensação com o montante devido nas operações ou prestações seguintes;
b) acarretará a anulação do crédito relativo às operações anteriores”;
Dessa forma, a liberdade do legislador complementar de regular o regime de compensação do ICMS se restringe a disciplinar a operacionalidade desta sistemática, visto que as hipóteses limitadoras da não cumulatividade estão taxativamente estabelecidas pelo Texto Constitucional.
Expostos os contornos da não cumulatividade, cabe examinar a natureza jurídica dos créditos fiscais presumidos.
Os créditos fiscais presumidos são benefícios fiscais outorgados pela legislação tributária ao contribuinte, consistem em uma técnica de tributação que visa a alcançar uma determinada finalidade, como estimular a circulação de mercadorias, reduzindo a oneração de determinados setores da atividade econômica. Trata-se, pois, de um tipo específico de exoneração tributária, que acarreta redução no valor do imposto a ser pago.
Vale dizer, trata-se de dispensa de pagamento do imposto estadual nas saídas tributadas, estímulo de ordem financeira com vistas à recuperação de custos na forma de incentivo fiscal. Não se trata, portanto, de crédito gerado pela sistemática não-cumulativa do imposto, em face de determinada etapa da circulação econômica do bem, ao revés, o crédito fiscal presumido constitui-se em subvenção de custeio, instituída pelo legislador estadual.
Nesta ordem de idéias, cabe ressaltar que o sistema de crédito ou de não cumulatividade do ICMS permite que haja compensação do imposto, isto é, garante ao sujeito passivo ou àquele que recebe as mercadorias ou produtos o direito de se creditar do imposto que foi anteriormente cobrado em operações envolvendo a entrada de mercadorias. Dentro da contabilidade, este sistema funciona pelo raciocínio de débito e crédito e permite que seja feita a compensação do imposto.
O imposto é apurado pelo confronto entre aquele creditado na entrada de mercadoria ou prestação de serviço e aquele devido pela saída de mercadorias ou prestação de serviços dentro de determinado período. A diferença a maior representa o imposto a ser pago nesse período e a diferença a menor constitui crédito a ser transferido para o período seguinte.
Assim, na apuração do imposto deve-se utilizar em primeira ordem os créditos destacados em operações da aquisição de mercadorias ou serviços.
No que tange aos procedimentos a serem observados quando da escrituração dos créditos, faz-se necessário a reprodução do art. 81 do Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto nº 35.245/91:
Art. 81. Os estabelecimentos enquadrados no regime periódico de apuração, em relação as operações ou prestações efetuadas no período, apurarão:
(…)
III - no livro Registro de Apuração do ICMS, após os lançamentos de que tratam os incisos I e II:
a) o valor do débito do imposto, relativamente as operações de saída ou as prestações de serviço;
b) o valor de outros débitos;
c) o valor dos estornos de créditos;
d) o valor total do débito do imposto;
e) o valor do crédito do imposto, relativamente as entradas de mercadoria ou aos serviços tomados;
f) o valor de outros créditos;
g) o valor dos estornos de débitos;
h) o valor total do crédito do imposto;
i) o valor do saldo devedor, que corresponderá a diferença entre as valores mencionadas nas alíneas “d” e “h”;
j) o valor das deduções previstas pela legislação;
1) o valor do imposto a recolher ou o valor do saldo credor a transportar para o período seguinte, que corresponderá a diferença entre os valores mencionados nas alíneas “h”e “d”. . (grifo nosso)
Da leitura do enunciado transcrito, em especial dos dispositivos grifados, é possível concluir que a escrituração do crédito deverá ser realizada no livro Registro de Apuração do ICMS, de acordo com a sua natureza.
CONCLUSÃO
Com fundamento nos argumentos apresentados, bem como na legislação apontada, apresenta-se para as questões suscitadas o seguinte entendimento:
1. Quando da realização da apuração do ICMS, na coexistência de créditos presumidos e créditos destacados em operações da aquisição de mercadorias, quais créditos devem ser utilizados em primeira ordem na hipótese dos créditos superarem o débito?
Resposta: a partir das considerações aqui apresentadas, em vista da soberania da constituição, em especial do princípio da não cumulatividade, na apuração do imposto deve-se utilizar em primeira ordem os créditos destacados em operações da aquisição de mercadorias ou serviços.
2. Havendo o transporte de créditos acumulados para os períodos subsequentes, quais créditos devem ser utilizados em primeira ordem?
Resposta: o crédito relativo às entradas de mercadoria ou serviços tomados.
3. Deve haver a escrituração em separado dos créditos de acordo com a natureza de crédito presumido ou crédito destacado em operação de aquisição de mercadoria? Resposta: sim, a escrituração do crédito deverá ser realizada no livro Registro de Apuração do ICMS, de acordo com a sua natureza, na forma prevista no art. 81 do RICMS.
É o parecer. Sigam os autos à Superintendência de Tributação.
Gerência de Tributação, Maceió/AL, 09 de abril de 2019.
Jacque Damasceno Pereira Júnior
Gerente de Tributação