Solução de Consulta SRE Nº 122 DE 09/04/2019


 


CONSULTA. GT ITCD. Incidência do ITCD sobre bem imóvel doado e cláusula de reversão, prevista no art. 547 do Código Civil


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ANÁLISE E FUNDAMENTAÇÃO

Trata-se de consulta fiscal, formulada pelo Grupo de Trabalho ITCD, por meio do Despacho nº 26/2019 (fls. 2 a 4), questionando sobre a aplicação da legislação tributária estadual referente ao ITDC incidente sobre doação e o possível reflexo da cláusula de reversão, prevista no art. 547 do Código Civil.

Conforme se depreende dos fatos narrados e dos documentos acostados aos autos, podemos expor, didaticamente, a situação a ser analisada em três momentos distintos:

Fato 1

A XXXXXXXXXXXXXXXXXX, proprietária de bem imóvel identificado à folha 8 dos autos, fez a doação deste bem à Sra. XXXXXXXXXXXXXXX, em 17/06/1985.

Esta doação ficou condicionada a uma cláusula de reversão (fl. 8), onde ficou estabelecido que “(…) caso a donatária venha a falecer antes dela doadora o bem ora doado reverterá ao seu patrimônio.”

Tal cláusula de reversão é expressamente prevista no art. 547 do Código Civil, Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002.

Art. 547. O doador pode estipular que os bens doados voltem ao seu patrimônio, se sobreviver ao donatário.

Parágrafo único. Não prevalece cláusula de reversão em favor de terceiro.

Conclui-se, portanto, que a doação efetuada pela Sra. XXXXXXXXXXXX tem natureza de negócio jurídico bilateral sob condição resolutiva.

Fato 2

A Sra. XXXXXXXXXXXXX, donatária do bem, veio a falecer em 14/03/2015, conforme certidão de óbito em anexo (fl. 9).

Tendo havido, supõe-se, a reversão do bem ao patrimônio da doadora, Sra. XXXXXXXXXXXX, conforme cláusula prevista no ato de doação.

Fato 3

Voltando a ser proprietária do bem, a Sra. XXXXXXXXXXX realizou nova doação do mesmo bem, em agosto de 2018, tendo sido beneficiários desta o Sr. XXXXXXXXXX e a Sra. XXXXXXXXXXXXXX, conforme documentos acostados aos autos (fls. 5 a 7 e 10). Em virtude desta nova doação foi recolhido o ITCD, conforme documento acostado aos autos (fl. 11).

Sendo estes os fatos apontados nos autos, o GT ITCD apresenta seu questionamento sobre a natureza jurídica da cláusula de reversão e seu efeito sobre o ITCD, formulando, por fim, a seguinte questão:

“Diante do exposto venho a esta Gerência solicitar seu posicionamento quanto a incidência ou não do ITCD sobre a cláusula de reversão.”

Inicialmente, importa observar o que dispõe a legislação do ITCD sobre o fato gerador deste tributo, conforme prescrito no Decreto nº 10.306, de 24 de fevereiro de 2011.

Art. 1º O ITCD incide sobre:

I – transmissão, de quaisquer bens ou direitos, havidos por sucessão legítima ou testamentária, inclusive por sucessão decorrente de morte presumida e por sucessão provisória; e (grifamos)

II – doação de quaisquer bens ou direitos. (grifamos)

(…)

§ 2º Entende-se por doação o ato ou fato em que o doador, por liberalidade, transmitir bem, vantagem ou direito de seu patrimônio ao donatário, que o aceitará expressa, tácita ou presumidamente, incluindo a doação efetuada com encargo ou ônus e o adiantamento da legítima.

(grifamos)

Portanto, o ITCD incide, apenas e somente, sobre dois fatos jurídicos específicos: a sucessão e a doação, sendo a sucessão um fato jurídico simples e a doação um negócio jurídico que depende, naturalmente, da vontade das partes. No caso em tela, cabe-nos analisar apenas o negócio jurídico doação. Para efeitos da legislação tributária do ITCD, a doação é definida no § 2º do art. 1º acima transcrito, nesta definição há previsão expressa do ato de liberalidade da parte, ou seja, a parte deve expressar a vontade de realizar a doação, de outra forma, não há doação.

Desse modo, conclui-se que o eventual retorno do bem ao doador, após a morte do donatário, em virtude da cláusula de reversão, não pode ser considerado uma forma de doação, pois, entre outras questões, não há liberalidade neste ato.

Após o falecimento do donatário, o doador torna-se novamente proprietário do bem, porém isso não se dá por ato de doação, pois não há liberalidade, o fato se dá por força de cláusula resolutiva firmada em negócio jurídico.

Em sendo assim, se não há doação não se pode considerar a eventual incidência do ITCD.

Por fim, pelo princípio da legalidade, ressaltamos que de nenhum modo se pode utilizar analogia para se estender a incidência da norma tributária sobre fato jurídico não previsto em lei, conforme previsto no Código Tributário Nacional, Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966.

Art. 108. Na ausência de disposição expressa, a autoridade competente para aplicar a legislação tributária utilizará sucessivamente, na ordem indicada:

I - a analogia;

II - os princípios gerais de direito tributário;

III - os princípios gerais de direito público;

IV - a eqüidade.

§ 1º O emprego da analogia não poderá resultar na exigência de tributo não previsto em lei.

(…)

Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias.

CONCLUSÃO

Ante o exposto, conclui-se que o ITCD não incide sobre cláusula de reversão, prevista no art. 547 do Código Civil, Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002.

Gerência de Tributação, em Maceió, 09 de abril de 2019.

Bruno Medeiros Chaves – AFRE

Em assessoramento

De acordo. Encaminho à apreciação do Sr. Superintendente de Tributação.

Gerência de Tributação, em Maceió, de de 2019.

Jacque Damasceno Pereira Júnior

Gerente de Tributação