Parecer Nº 219 DE 09/06/2009


 Publicado no DOE - RO em 9 jun 2009


Consulta – Administração e gestão de empresas através de procurações – Atuação junto ao fisco estadual – Análise.


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1. RELATÓRIO:

A Agência de Rendas de Buritis, RO, diante de dúvidas suscitadas acerca da emissão de procurações, inclusive no âmbito cartorário, solicita parecer sobre o assunto, conforme as seguintes indagações:

1. Para representar plenamente a sociedade perante à SEFIN, pode-se aceitar a procuração particular com suas assinaturas reconhecidas em cartório ou somente a procuração pública emitida diretamente no cartório?

2. Há necessidade de estipulação de prazo de validade das procurações?

3. A procuração pode ser outorgada por qualquer um dos sócios quotistas ou apenas pelo sócio administrador definido no contrato social e informado no CAD/ICMS/RO? Ou por ambos? E quando todos os sócios foram informados como sócios administradores?

4. Quando se pretende abrir uma nova empresa, ambos os sócios devem antes passar na consulta prévia, o que atesta que os mesmos não possuem pendências junto à sefin para obter a sua inscrição estadual. Os administradores não integrantes do quadro societário quando nomeados por procuração não devem comprovar a sua inadimplência junto ao Estado?

5. Existe diferença no tratamento a ser dado quanto às procurações, com relação aos diferentes serviços realizados nas Agências de Rendas?

6. No caso de procurações em que o tabelião vinculou sua validade à averbação na JUCER, podemos aceita-la sem a averbação, ou não?

7. Nos procedimentos realizados no SITAFE, como liberações de AIDF ou autenticação de livros fiscais, devemos informar os dados do solicitante. Quando este serviço foi solicitado por procurador, quem devemos informar no SITAFE, o procurador ou o outorgante que nomeou? (O SITEFE só aceita a informação do integrante do quadro societário que consta do cadastro).

8. O contador pode representar a empresa na solicitação de serviços como solicitação de AIDF, autenticação dos livros fiscais, requerimentos de extratos de lançamento de ICMS antecipado, substituição tributária ou diferencial de alíquotas?

9. Quais os procedimentos e conferências os servidores das Agências de Rendas devem realizar ao efetuar atendimentos a representantes ou administradores de empresas nomeados por procuração?

10. Que medidas práticas, respaldadas pela legislação, podem ser utilizadas nas Agências de Rendas para se evitar que o artifício da representação por procuração seja utilizado com o intuito de lesar o fisco em sua arrecadação de tributos ou mesmo para se evitar que pessoas impedidas perante a legislação de exercer atividades comerciais após cometerem atos lesivos ao fisco, a exerçam em nome de terceiros?

2. ANÁLISE:

2.1 – Disposições preliminares

Preliminarmente, cabe informar que as indagações do consulente no que diz respeito ao instrumento de “procuração” se insere sobremaneira no contexto do direito civil, mais especificamente no art. 653 e seguintes do Código Civil, que estabelece as obrigações do mandante, do mandatário, etc..

Art. 653. Opera-se o mandato quando alguém recebe de outrem poderes para, em seu nome, praticar atos ou administrar interesses. A procuração é o instrumento do mandato.

Art. 654. Todas as pessoas capazes são aptas para dar procuração mediante instrumento particular, que valerá desde que tenha a assinatura do outorgante.

§ 1º O instrumento particular deve conter a indicação do lugar onde foi passado, a qualificação do outorgante e do outorgado, a data e o objetivo da outorga com a designação e a extensão dos poderes conferidos.

§ 2º O terceiro com quem o mandatário tratar poderá exigir que a procuração traga a firma reconhecida.

Art. 655. Ainda quando se outorgue mandato por instrumento público, pode substabelecer-se mediante instrumento particular.

(...)

A respeito do assunto, é interessante o artigo de José Fernando dos Santos Campos, tabelião notarial e bacharel em direito, transcrito do sítio eletrônico jus navigandi:1

“Código Civil de 2002 trouxe algumas ressalvas relativas ao tema da administração societária e da delegação administrativa, ou constituição de prepostos por intermédio de procuração (arts. 1010 a 1021, CC). Vedou-se aos administradores fazerem-se substituir ou serem substituídos no exercício de suas funções sem o consentimento expresso dos demais sócios (art. 1018 e 1002).

(...)

Antes de tudo, é preciso distinguir o administrador nomeado no contrato ou em ato separado, do administrador delegatário (gerente), constituído por procuração. O primeiro recebe outorga ampla e originária de poderes (contrato ou ato em separado) para realizar os fins da empresa, por força dos artigos 1010 a 1021 do Código Civil. Já o segundo recebe uma delegação secundária (mandato) do administrador da sociedade para em sentido estrito promover a administração societária ou para certos e determinados atos negociais.

(...)

De modo a viabilizar a necessária publicidade dos atos das empresas e à importância que adquirem, nesse contexto sua representação, entendemos que esse ato deve ser averbado na Junta Comercial ou no Registro Civil das Pessoas Jurídicas, conforme o caso (art.1012 e 1.174, CC), para oposição contra terceiros.

A constituição de procuradores para gerir e administrar sociedade simples, limitada, anônima, de forma ampla ou restrita, sem autorização dos demais sócios, implica em desrespeito à deliberação societária contratual ou por meio de ato em separado, que à sua revelia institui uma nova administração (art. 1.063 e §§, CC)”.

2.2. Resposta às indagações do consulente

1. Para representar plenamente a sociedade perante a SEFIN, pode-se aceitar a procuração particular com suas assinaturas reconhecidas em cartório ou somente a procuração pública emitida diretamente no cartório?

A obrigação de registrar os documentos da empresa no contexto empresarial, decorre de previsão do Código Civil e do Decreto nº 1800/96:

Código Civil:

Art. 1.012. O administrador, nomeado por instrumento em separado, deve averbá-lo à margem da inscrição da sociedade, e, pelos atos que praticar, antes de requerer a averbação, responde pessoal e solidariamente com a sociedade.

(...)

Art. 1.174. As limitações contidas na outorga de poderes, para serem opostas a terceiros, dependem do arquivamento e averbação do instrumento no Registro Público de Empresas Mercantis, salvo se provado serem conhecidas da pessoa que tratou com o gerente.

Decreto nº 1800/96, que regulamentou as disposições da Lei nº 8.934/94:

Art. 7º Compete às Juntas Comerciais:

I - executar os serviços de registro de empresas mercantis, neles compreendidos:

a) o arquivamento dos atos relativos à constituição, alteração, dissolução e extinção de empresas mercantis, de cooperativas, das declarações de microempresas e empresas de pequeno porte, bem como dos atos relativos a consórcios e grupo de sociedades de que trata a lei de sociedade por ações;

(...)

c) o arquivamento de atos ou documentos que, por determinação legal, seja atribuído ao Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins e daqueles que possam interessar ao empresário ou às empresas mercantis;

A indagação do consulente diz respeito ao administrador delegatário, constituído através de procuração.

Pelas disposições constantes do art. 1.012 e 1.174 do Código Civil e art. 7º, I,”a” e “c” do Decreto nº 1.800/96, expostos nas transcrições acima e em homenagem ao princípio da publicidade, a procuração deve ser feita por escritura pública averbada na junta comercial (no caso de sociedades empresariais e cooperativas) ou no Cartório de Registro Civil das Pessoas Jurídicas (demais sociedades simples).

2. Há necessidade de estipulação de prazo de validade para as procurações?

À exceção das empresas Sociedades Anônimas (S/A) que possuem prazo determinado na legislação específica para a representação do acionista, as outras modalidades de empresa não dispõem de legislação que imponha fixação de prazo determinado no instrumento do mandato, cabendo à sociedade estabelecer livremente prazo determinado ou não. Entretanto, a melhor doutrina recomenda a fixação no mandato de prazo de validade, tratando-se de nomeação de gerente delegatário não sócio da empresa (que é o caso da indagação), de modo a evitar transtornos à sociedade empresarial”.

Ressalte-se que o art. 682 do Código Civil estabelece as situações de perda do mandato, aplicáveis às pessoas jurídicas, no que couber.

3. A procuração pode ser outorgada por qualquer um dos sócios quotistas ou apenas pelo sócio administrador definido no contrato social e informado no CAD/ICMS/RO? Ou por ambos? E quando todos os sócios foram informados como sócios administradores?

A delegação de poderes de gestão é feita pelo próprio administrador titular ao administrador não sócio delegatário, entretanto, mesmo nesses casos, à luz da legislação, é necessário a autorização dos outros sócios, nas seguintes proporções:

a) nas sociedades simples, a outorga deve ser precedida de autorização feita por todos os sócios ou de percentual específico deles conforme estiver disposto no contrato (arts. 997, 1061 e 1057, CC), dado seu intuitu personae.

b) se sociedades limitadas, se o contrato social permitir, a outorga deve ser feita após aprovação da unanimidade dos sócios se o capital não estiver integralizado ou de 2/3, no mínimo, após a integralização (art. 1.061, CC).

Por óbvio, caso não se trate da outorga de poderes de gestão, mas sim, de simples procuração do administrador titular conferindo poderes específicos e esporádicos restritos à representação junto a determinado órgão ou entidade (procuração particular), não é necessária a deliberação acima explicitada.

4. Quando se pretende abrir uma nova empresa, ambos os sócios devem antes passar na consulta prévia, o que atesta que os mesmos não possuem pendências junto à SEFIN para obter sua inscrição estadual. Os administradores não integrantes do quadro societário quando nomeados por procuração não devem comprovar sua adimplência junto ao Estado?

As restrições dos administradores, aí incluídos os sócios e não sócios delegatários, estão arroladas no art. 1.011 do Código Civil:

Art. 1.011. O administrador da sociedade deverá ter, no exercício de suas funções, o cuidado e a diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração de seus próprios negócios.

§ 1º Não podem ser administradores, além das pessoas impedidas por lei especial, os condenados a pena que vede, ainda que temporariamente, o acesso a cargos públicos; ou por crime falimentar, de prevaricação, peita ou suborno, concussão, peculato; ou contra a economia popular, contra o sistema financeiro nacional, contra as normas de defesa da concorrência, contra as relações de consumo, a fé pública ou a propriedade, enquanto perdurarem os efeitos da condenação.

§ 2º Aplicam-se à atividade dos administradores, no que couber, as disposições concernentes ao mandato.

Além disso, conforme art. 163 da lei nº 688/96:

Art. 163. A Certidão Negativa será exigida nos seguintes casos:

(...)

VII - inscrição inicial, transferência de firma individual, alteração de sócios ou diretores, no Cadastro de Contribuintes do imposto; (NR Lei nº 869, de 23/12/99 - efeitos a partir de 24/12/99)

Considerado o teor literal do Inciso VII do art. 163 da lei nº 688/96, acima transcrito, a exigência da Certidão Negativa gera a seguinte dúvida: a certidão é exigida da empresa ou dos sócios/ diretores?

De qualquer maneira, considerando que o conceito de administrador é diferente de diretor, é de concluir que essa exigência não alcança a constituição do administrador, notadamente o delegatário com poderes de gestão.

5. Existe diferença no tratamento a ser dado quanto às procurações com relação aos diferentes serviços realizados nas agências?

Tem bastante relevância qualquer ato realizado em nome das empresas no âmbito do fisco estadual, notadamente nas Agências de Rendas, ante ao sigilo fiscal.

Portanto, entendo que a prática de qualquer ato de representação no âmbito da Secretaria da Fazenda de Rondônia exige a identificação do administrador titular (nomeado no contrato social e registrado no SITAFE) ou a regular procuração do administrador delegatário. A diferença reside apenas na modalidade de outorga de poderes dessas procurações – poderes de gestão ou poderes específicos restritos à determinados atos.

Isto posto, Agências de Rendas deverão, para garantir o acesso a informações e práticas desses atos, exigir a identificação do administrador titular (nomeado no contrato social ou em apartado) ou a regular procuração, com delegação de poderes de gestão ou com poderes específicos para determinados atos.

6. No caso de procurações em que o tabelião vinculou sua validade à averbação na JUCER, podemos aceita-la sem a averbação ou não?

Como já foi exposto, o ato de nomeação em apartado ao contrato social ou a procuração constituindo o administrador delegatário com poderes de gestão devem ser feitas por escritura pública e averbada na junta comercial (no caso de sociedades empresariais e cooperativas) ou no Cartório de Registro Civil das Pessoas Jurídicas (demais sociedades simples).

7. Nos procedimentos realizados no SITAFE, como liberações de AIDF ou autenticação de livros fiscais, devemos informar os dados do solicitante. Quando este serviço foi solicitado por procurador, quem devemos informar no SITAFE, o procurador ou o outorgante que o nomeou? (O SITAFE só aceita a informação de integrante do quadro societário que consta do cadastro).

O administrador nomeado no contrato social ou nomeado em apartado (administrador titular), mesmo não sócio, são os titulares da gestão, portanto o sistema SITAFE deve se adequar para que sejam aceitos no banco de dados.

Pos sua vez, o administrador delegatário, enquanto estiver nessa condição está investido de poderes de gestão que lhe foram outorgados, e age em nome da empresa para todos os efeitos.

Entretanto, via de regra, na administração delegatária não há necessidade do administrador titular ser destituído.

Portanto, nestes casos, nas liberações de AIDF, autenticação de livros fiscais, etc. deve ser registrado o nome do mandatário, observada a sua condição de delegatário. Nesse contexto, o sistema SITAFE deveria se adequar, criando um campo específico para inserção do “administrador delegatário”, sem excluir o “administrador titular”.

8. O contador pode representar a empresa na solicitação de serviços como solicitação de AIDF, autenticação de livros fiscais, requerimentos de extratos de lançamento de ICMS antecipado, substituição tributária ou diferencial de alíquotas?

À luz do art. 1.177 e seguintes do Código Civil e legislação que regulamenta a profissão do contador (Dec. Lei 9295/46 e Resolução CFC 560/83), depreende-se que as prerrogativas do contador dizem respeito à sua relação com a empresa, e, no âmbito da mesma, nas atividades inerentes à profissão.

Entretanto, no âmbito fiscal, para obter acesso a dados fiscais da empresa contratada e realizar atividades de representação da empresa junto ao fisco, uma vez que envolve sigilo fiscal e outras implicações, há necessidade de mandato, através de procuração específica particular, com firma reconhecida em cartório.

9. Quais os procedimentos e conferências os servidores das Agências de Rendas devem realizar ao efetuar atendimentos a representantes ou administradores de empresas nomeados por procuração?

São três situações distintas, conforme a modalidade do administrador.

a) Caso se trate de administrador (sócio ou não), designado no próprio contrato social, a autoridade fiscal da agência de rendas deverá exigir a cópia do contrato social averbado na junta comercial, ou, caso seu nome já esteja regularmente constando no SITAFE, exigir apenas a identificação.

b) Nos casos de administrador (sócio ou não) constituído em apartado, o fisco deverá exigir o instrumento de nomeação com registro público e averbado na Junta Comercial, ou, caso seu nome já esteja regularmente constando no SITAFE, exigir apenas a identificação.

c) Caso se trate de administrador delegatário ou gerente, com poderes de gestão, os servidores da agência de Rendas deverão verificar o teor da procuração e exigir que a mesma seja lavrada por instrumento público averbada na Junta Comercial Local (sociedades empresariais) ou junto ao Cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas (outras sociedades civis).

No caso de simples procurador sem poderes de gestão/administração ou contador com poderes específicos para atuar junto ao fisco, devem exigir a procuração particular, com firma reconhecida.

Alerte-se que, quando forem apresentados em forma de cópia reprográfica, esses documentos, para que lhes seja conferida fé pública, deverão ser autenticados em cartório.

Quando se tratar de documentos constituídos por atos de cartório (registro, reconhecimento de firma, autenticação, etc.) de outro município ou estado da federação, caso haja alguma dúvida acerca da sua autenticidade, a autoridade fiscal poderá exigir o reconhecimento do sinal público, através de cartório local.

10. Que medidas práticas, respaldadas pela legislação, podem ser utilizadas nas Agências de Rendas para se evitar que o artifício da representação por procuração seja utilizado com o intuito de lesar o fisco em sua arrecadação de tributos ou mesmo para se evitar que pessoas impedidas perante a legislação de exercer atividades comerciais após cometerem atos lesivos ao fisco, a exerçam em nome de terceiros.

Entendo que o art. 163, da Lei nº 688/96, já mencionado, que impõe no seu inciso VII a exigência da Certidão Negativa de Débitos Estaduais na “inscrição inicial, transferência de firma individual, alteração de sócios ou diretores, no Cadastro de Contribuintes”, cuja redação gera dúvidas quanto ao seu alcance, deveria ser alterado para a seguinte redação:

“VII - da empresa, dos sócios, diretores e administradores, na inscrição inicial, transferência de firma individual, alteração de sócios, diretores e administradores, inclusive os administradores delegatários constituídos através de procuração, no Cadastro de Contribuintes;”

É o parecer.

À consideração superior.

Porto Velho, 09 de junho de 2009.

Francisco das Chagas Barroso 

AFTE – Cad. 300024021

Mário Jorge de Almeida Rebelo

AFTE – Chefe da Consultoria Tributária

De acordo: 

Daniel Antonio de Castro 

Gerente de Tributação

Aprovo o Parecer acima:

Ciro Muneo Funada

Coordenador Geral da Receita Estadual