Publicado no DOE - RO em 23 dez 2014
Consulta. Crédito fiscal de explosivo e óleo diesel na extração de pedra para britagem – A extração não é fase de industrialização.
1. RELATÓRIO
A empresa acima identificada atuando em “Serviços Especializados para Construção não especificados, sob o CNAE 4399.199” (fl. 24), efetua consulta sob o seguinte teor, que transcrevemos literalmente:
“A consulta tem como fundamento a interpretação e correta utilização do credito relacionado aquisição de combustível direto de posto de gasolina para abastecimento de seus equipamentos, relatório anexo, relacionados com a produção de concreto e brita bem como o credito de ICMS na aquisição de explosivo destinado a produção de rochas para britagem. Todos utilizados no processo industrial.
Sendo assim indagamos as seguintes questões:
01 – Qual o procedimento e calculo para efetuar o credito do ICMS na aquisição de combustível direto de posto de gasolina? Fundamente.
02 – Quais os critérios utilizados pelo fisco para atribuição do credito para combustível no processo industrial na atividade de exploração de brita e produção de concreto voltados a construção civil? E qual o prazo para liberação deste crédito? Fundamente.
03 – Qual interpretação do fisco de não poder utilizar-se do credito na aquisição de explosivo para produção de rocha para britagem? Sendo um produto correlacionado diretamente ao processo produtivo onde esta sendo negado pelo estado o direito ao credito e atribuído diferencial de alíquota. Fundamente.
04 – Orientação correta no aproveitamento dos créditos acima citados onde permita a empresa utiliza-se de forma adequada seus lançamentos tributários”.
A representação foi realizada pelo sócio administrador xxxxxxxxxxxxx (fls. 04, 20, 21 e 26).
É o necessário relatório.
2. DA ANÁLISE E DA LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
A empresa em epígrafe, qualificada nos autos deste processo, dentre outras atividades, realiza a exploração de brita e produção de concreto.
A requerente apresenta planilha onde relaciona diversos equipamentos e suas respectivas médias de consumo de óleo diesel e energia elétrica.
Nessa lista constam os seguintes equipamentos que utilizam óleo diesel: Escavadeira, Pá Carregadeira, Compressor de Perfuração, Caminhão Basculante e vários caminhões Fora de Estrada para transporte de rocha.
Outros equipamentos são listados como utilizadores de Energia Elétrica para seu funcionamento: Britadores (Primário, HP-300, Cone Vibratório) e Usina de Asfalto.
Consulta sobre o seu direito à utilização de créditos fiscais decorrentes de suas entradas, que seriam, à sua crítica, passíveis de apropriação tanto pelo óleo diesel consumido em suas atividades quanto ao uso dos explosivos.
Iniciaremos a análise pelo texto da Constituição Federal que prevê que o ICMS será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo Estado ou pelo Distrito Federal (art. 155, § 2º, inciso I).
O crédito fiscal é o chamado crédito físico, que é aquele em que só o imposto relativo à entrada de mercadorias - que são vendidas pelo estabelecimento, ou que integrem fisicamente o produto industrializado a ser vendido - resultará em crédito a ser compensado com o imposto devido na saída desses bens (CF/88, art. 155, § 2º, I, com texto oriundo da Emenda Constitucional nº 3/93).
Porém, todas as mercadorias e bens que são adquiridos por um estabelecimento, em última análise, prestam-se ao cumprimento de seu objeto social, independentemente de serem, ou não, consumidos no processo industrial. Ciente disso, o legislador complementar inseriu no ordenamento jurídico brasileiro, por intermédio da LC 87/96, o regime de créditos financeiros, em substituição ao de créditos físicos.
Transcrevemos a lição de Hugo de Brito Machado (Aspectos Fundamentais do ICMS.
São Paulo: Dialética, 1997, p. 143), quanto ao novo regime introduzido pela lei complementar:
Pelo regime de crédito financeiro é assegurado o crédito do imposto pago em todas as operações de circulação de bens, e em todas as prestações de serviços, que constituam custo do estabelecimento. Não importa se o bem, ou serviço, compõe o bem a ser vendido.
Importa, é que o bem vendido teve como custo aquele bem, ou aquele serviço, já tributado anteriormente.
É um regime de não-cumulatividade absoluta. Não-cumulatividade que leva em conta o elemento financeiro, por isso mesmo regime denominado de crédito financeiro.
O regime de créditos financeiros introduzido pela LC 87/96, entretanto, não entrou plenamente em vigor. No caso dos bens de uso e consumo, terá de ser observado o disposto em seu art. 33, I, que é taxativo: tais créditos, só a partir de janeiro de 2020 (LC 87/96, art. 33, I, com redação dada pela LC 138/10).
Quanto aos produtos intermediários de necessária aplicação nas diversas etapas do processo produtivo que, apesar de não se incorporarem ao produto final, são imprescindíveis à atividade industrial da empresa, os Tribunais vêm decidindo que o crédito só será possível em relação aos materiais que se integrarem fisicamente ao produto, ou que venham a ser integralmente consumidos no processo produtivo.
Se o direito ao crédito em análise diz respeito a produtos intermediários que se integram fisicamente a um produto ou que sejam totalmente consumidos em um processo fabril, então só poderemos admiti-lo nos limites de uma atividade econômica específica: a industrial.
Por outro lado, as atividades ligadas aos demais setores da economia – primário: agricultura, pecuária e extrativismo; terciário: comércio e prestação de serviços e quaternário: informação e comunicação - não podem ser confundidas com as atividades industriais, que integram o chamado setor secundário.
Consoante o Regulamento do IPI – RIPI, tem-se que:
Decreto nº 7.212, de 15 de junho de 2010. (Regulamento do IPI)
Seção I - Da Disposição Preliminar
Art. 3º Produto industrializado é o resultante de qualquer operação definida neste Regulamento como industrialização, mesmo incompleta, parcial ou intermediária (Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966, art. 46, parágrafo único, e Lei nº 4.502, de 1964, art. 3º).
Seção II - Da Industrialização - Características e Modalidades
Art.4º Caracteriza industrialização qualquer operação que modifique a natureza, o funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a finalidade do produto, ou o aperfeiçoe para consumo, tal como (Lei nº 5.172, de 1966, art. 46, parágrafo único, e Lei nº 4.502, de 1964, art. 3º, parágrafo único):
I - a que, exercida sobre matérias-primas ou produtos intermediários, importe na obtenção de espécie nova (transformação);
II - a que importe em modificar, aperfeiçoar ou, de qualquer forma, alterar o funcionamento, a utilização, o acabamento ou a aparência do produto (beneficiamento);
III - a que consista na reunião de produtos, peças ou partes e de que resulte um novo produto ou unidade autônoma, ainda que sob a mesma classificação fiscal (montagem);
IV - a que importe em alterar a apresentação do produto, pela colocação da embalagem, ainda que em substituição da original, salvo quando a embalagem colocada se destine apenas ao transporte da mercadoria (acondicionamento ou reacondicionamento); ou
V - a que, exercida sobre produto usado ou parte remanescente de produto deteriorado ou inutilizado, renove ou restaure o produto para utilização (renovação ou recondicionamento).
Parágrafo único. São irrelevantes, para caracterizar a operação como industrialização, o processo utilizado para obtenção do produto e a localização e condições das instalações ou equipamentos empregados.
O Regulamento do ICMS do Estado de Rondônia, aprovado pelo Decreto nº 8.321/98, caminha no mesmo sentido:
Art. 4º Para efeito de aplicação da legislação do imposto, considera-se:
(...)
II – industrialização qualquer operação que modifique a natureza, o funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a finalidade do produto ou o aperfeiçoe para consumo, tal como:
a) a que, executada sobre matéria-prima ou produto intermediário, resulte na obtenção de espécie nova;
b) a que importe modificação, aperfeiçoamento ou, de qualquer forma, alteração do funcionamento, da utilização, do acabamento ou da aparência do produto;
c) a que consista na reunião de produtos, peças ou partes e de que resulte um novo produto ou unidade autônoma;
d) a que importe em alteração da apresentação do produto pela colocação de embalagem, ainda que em substituição à original, salvo quando a embalagem aplicada destinar-se apenas ao transporte da mercadoria;
e) a que, executada sobre o produto usado ou partes remanescentes de produto deteriorado ou inutilizado, o renove ou restaure para utilização.
Observa-se que, nos termos postos na legislação, inexiste qualquer possibilidade de considerarmos uma atividade, como por exemplo, o extrativismo (setor primário), como pertencente ao setor secundário da economia, ou seja, como uma atividade industrial. Ou seja, extrativismo não é industrialização.
A necessidade de perfuração, utilização de explosivos, detonadores etc., é mera questão de logística1 que não descaracteriza a atividade de extração. As pedras precisam ser “partidas” em pedaços menores, passíveis de serem transportadas. O que se obtém após tais explosões continua sendo pedra bruta, significando necessariamente que não houve qualquer processo de industrialização.
Da mesma forma, debulhado para viabilizar sua colheita e transporte, o milho a granel não deixa ser um produto primário (estado natural), justamente por não ter sido submetido a qualquer processo que possa caracterizar industrialização. Assim como existe a necessidade de plataformas bilionárias e de vanguarda tecnológica que não faz com que o petróleo bruto extraído das profundezas seja considerado produto industrializado; continua sendo óleo bruto, em estado natural, podendo, posteriormente, ser utilizado na atividade industrial.
O que importa assentar aqui, é que na atividade primária chamada extrativismo, não há qualquer transformação, beneficiamento, montagem, acondicionamento etc., nos termos definidos pelos dispositivos acima transcritos do RIPI, o que indica a presença de duas atividades distintas, no processo realizado pela consulente. Uma de extração (atividade primária), que se consubstancia nos procedimentos de que se vale para obtenção da pedra em estado bruto (não beneficiada, não transformada, etc.); e outra, de industrialização (atividade secundária), caracterizada por modificar a natureza, o acabamento, a apresentação etc., da pedra obtida na atividade de extração.
Já que os procedimentos necessários à obtenção da pedra em estado bruto não podem ser considerados, nos termos legais, como fase ou etapa integrante do processo de industrialização da brita, as aquisições que lhes são inerentes, via de conseqüência, não poderão gerar crédito algum.
A etapa em que são iniciados os procedimentos que modificam a natureza, o acabamento, a apresentação ou finalidade do produto, a teor do disposto no caput do art. 4º do Decreto 7.212 - Regulamento do IPI - é a de britagem (denominação utilizada pela própria interessada). Nessa fase, a pedra bruta é descarregada no britador para a obtenção de seus produtos finais, quais sejam: a pedra britada em vários tamanhos e classificações, conforme as necessidades comerciais.
Assim, todas as operações praticadas pela consulente, anteriores ao processo de britagem (incluídas, aqui, a carga e o transporte das pedras até os britadores), dizem respeito a atividades alheias ao processo produtivo, impossibilitando qualquer especulação acerca de materiais intermediários e, consequentemente, do crédito deles decorrente.
Dessa forma, a consulente não pode se apropriar do crédito do ICMS referente ao óleo diesel consumido ou utilizado por suas máquinas e equipamentos, eis que não é insumo (matéria-prima, ou produto intermediário, ou material de embalagem), ou seja, não é bem ou mercadoria que integrará o produto final a ser comercializado. A mesma conclusão se aplica aos explosivos utilizados na fase de extração (atividade primária) anterior à fase de industrialização.
Este tema já foi amplamente debatido e esclarecido no âmbito da Receita Federal do Brasil, órgão público da União gestor do IPI (CF/88, art. 153, IV), que por reiteradas vezes vem decidindo no mesmo sentido:
ASSUNTO: Imposto sobre Produtos Industrializados
EMENTA: INDUSTRIALIZAÇÃO. PRODUTO INDUSTRIALIZADO. CARACTERIZAÇÃO.
Produto industrializado é o resultante de qualquer operação definida no RIPI como de industrialização, mesmo incompleta, parcial ou intermediária. Assim sendo, quando o estabelecimento opera a modificação da natureza, da apresentação, da finalidade de determinado produto ou o aperfeiçoe para consumo, exerce operação de industrialização, independentemente do processo utilizado para a obtenção do produto novo ou renovado, da localização e das condições das instalações ou equipamentos empregados, bastando que deste processo resulte produto tributado, ainda que de alíquota zero ou isento. A utilização indevida de créditos de IPI implica a respectiva glosa, com o refazimento da escrita fiscal, e o lançamento dos créditos tributários apurados no procedimento de fiscalização (Lei nº 4.502, de 1964, art. 3º; CTN, art. 142, parágrafo único). DIREITO AO CRÉDITO DE IPI - PARECER NORMATIVO CST Nº 65, DE 1979. Somente podem ser considerados como matéria-prima ou produto intermediário, além daqueles que se integram ao produto novo, os bens que sofrem desgaste ou perda de propriedade, em função de ação diretamente exercida sobre o produto em fabricação, ou proveniente de ação exercida diretamente pelo bem em industrialização e desde que não correspondam a bens do ativo permanente. Dessa maneira, a energia elétrica, os combustíveis, bens integrantes do ativo permanente, produtos de limpeza, etc, elementos que não atuam diretamente sobre o produto, não se enquadram nos conceitos de matéria-prima ou produto intermediário (PN CST, nº 65, de 1979). (grifo nosso). Acórdão nº. 09-22644 de 19 de fevereiro de 2009.3ª Turma da Delegacia da Receita Federal de Julgamento em Juiz de Fora – Secretaria da Receita Federal – Ministério da Fazenda.
A Lei Estadual nº 688/96 – que instituiu a cobrança do ICMS neste Estado – assim define:
Art. 2º-A Para efeito de aplicação da legislação do imposto, somente são considerados (AC pela Lei 2331, de 16.07.10 – efeitos a partir de 16.07.10)
I - produtos industrializados, aqueles submetidos à incidência do Imposto Sobre Produtos Industrializados – IPI, conforme legislação pertinente;
II - estabelecimentos industriais, aqueles cujos produtos estejam submetidos à incidência do Imposto Sobre Produtos Industrializados – IPI, conforme legislação pertinente.
Quanto à energia elétrica, a LC 87/96 autoriza o crédito relativo à sua entrada, quando consumida no processo de industrialização (art. 33, I, “b”). Como a atividade fabril da consulente resume-se à etapa de britagem, terá direito a crédito da aquisição de energia consumida pelos maquinários nessa fase (britadores, por exemplo), na forma admitida pela legislação.
Por tudo que foi exposto, há subsídios suficientes para que se responda à consulente que, das apropriações de crédito pretendidas, fará jus às provenientes das aquisições de energia elétrica apenas, utilizada no processo produtivo e/ou do óleo diesel utilizado para geração de energia elétrica a ser, também, utilizada no processo produtivo, repita-se: tudo na forma admitida na legislação. E ainda deve ser excluído o consumo da energia elétrica utilizada fora das atividades industriais, como na área administrativa e afins.
As demais aquisições não darão direito a crédito enquanto não entrar plenamente em vigor o regime de créditos financeiros introduzidos pela Lei Complementar nº 87/96.
Quanto à utilização de crédito fiscal para o fornecimento de concreto aplicam-se as mesmas regras já anteriormente analisadas. Ou seja, tudo que integre fisicamente o produto industrializado a ser vendido, resultará em crédito a ser compensado com o imposto devido na saída desses bens (CF/88, art. 155, § 2º, I, com texto oriundo da Emenda Constitucional nº 3/93).
3. DA CONCLUSÃO
A consulente, cadastrada como empresa prestadora de serviços, formulando consulta sobre apropriação de crédito fiscal em atividade extrativista e de industrialização, não pode se apropriar do crédito do ICMS referente ao óleo diesel consumido em equipamentos utilizados na extração e transporte de pedra (rocha) em estado bruto (escavadeiras, pás carregadeiras e caminhões) até os britadores de sua indústria, eis que não são insumos (matéria-prima, ou produto intermediário, ou material de embalagem), ou seja, não são bens ou mercadorias que integrarão o produto final a ser comercializado.
Da mesma forma não é possível o aproveitamento de crédito fiscal decorrente da aquisição de explosivos utilizados na extração da pedra bruta (rocha) - atividade primária - fase anterior à industrialização - atividade secundária.
O crédito fiscal relativo à entrada de energia elétrica é autorizado pela LC nº 87/96 (art. 33, I, “b”), quanto à parcela consumida no processo de industrialização (britagem), assim como, quanto ao óleo diesel utilizado para geração de energia elétrica a ser utilizada no processo produtivo, devendo ser excluído o consumo de energia elétrica fora das atividades industriais como na área administrativa e afins.
Quanto à utilização de crédito fiscal para o fornecimento de concreto aplicam-se as mesmas regras já anteriormente analisadas, ou seja: tudo que integrar fisicamente o produto industrializado a ser vendido resultará em crédito a ser compensado com o imposto devido na saída desses bens (CF/88, art. 155, § 2º, I, com texto oriundo da Emenda Constitucional nº 3/93).
O questionamento formulado no item 04 da consulta tributária, acima transcrito, resta prejudicado diante das razões acima expostas, porque contrário ao pretenso direito da consulente.
É o parecer.
À consideração superior.
Porto Velho, 23 de dezembro de 2014.
DANIEL ANTÔNIO DE CASTRO
Gerente de Tributação