Publicado no DOE - PA em 3 dez 2020
O estabelecimento industrial que recebe resíduos resultantes do abate do gado não poderá aplicar a regra do art. 29 do Anexo I do RICMS-PA aos produtos resultantes de seu processo de industrialização, ainda que tenham como destino outra indústria.
EMENTA: O estabelecimento industrial que recebe resíduos resultantes do abate do gado não poderá aplicar a regra do art. 29 do Anexo I do RICMS-PA aos produtos resultantes de seu processo de industrialização, ainda que tenham como destino outra indústria.
DA CONSULTA
A consulente acima identificada é estabelecimento localizado neste Estado, que atua na preparação de subprodutos do abate do gado bovino (CNAE 10.13-9-02) e relata que coleta de matadouros ossos e resíduos e produz, a partir desses materiais, sebo bovino e osso autoclavado.
Esclarece a consulente que, a seu ver, não realiza atividade industrial no presente caso, tendo em vista que os produtos resultantes de sua atividade continuam como matéria-prima, não como produtos acabados, e terão como destino outro estabelecimento industrial, conforme DANFE de NF-e juntadas por ela aos autos.
Nesse sentido, a consulente lembra que o caput do art. 29 do Anexo I do RICMS-PA diz que o pagamento do ICMS incidente nas operações internas com couro e pele em estado fresco, salmourado ou salgado, sebo, osso, chifre e casco, com destino a estabelecimento industrial, fica diferido para a subsequente saída do produto acabado resultante da industrialização final.
Em efeito, a consulente pretende saber se a operação por pratica está sujeita a regra de diferimento descrita no parágrafo acima, motivo por que perguntou o seguinte:
A empresa tem direito ao diferimento do art. 29 do Anexo I do Regulamento do ICMS quando a mesma comercializar dentro do Estado o sebo bovino e o osso autoclavado para establecimento industrial com CNAE da seção C, divisão 10 a 33 da TIPI (que são as indústrias de transformação. CNAE que transforma matéria-prima em produto acabado)?
(grifamos)
DA LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
- Lei nº 6.182, de 30 de dezembro de 1998, que dispõe sobre os PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVO-TRIBUTÁRIOS do Estado do Pará e dá outras providências.
- Regulamento do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS,
denominado RICMS/PA, aprovado pelo Decreto n.º 4.676, 18 de junho de 2001.
- Decreto nº 1.565, de 26 de março de 2009, que regulamenta a Lei nº 5.674, de 21 de outubro de 1991, que dispõe sobre o Fundo de Desenvolvimento Econômico do Estado do Pará - FDE.
DA MANIFESTAÇÃO
A Lei n.º 6.182/98, que regula os procedimentos administrativo-tributários no Estado do Pará, assegura ao sujeito passivo a formulação de consulta sobre a aplicação da legislação tributária, em relação a fato concreto de seu interesse.
A mesma lei impõe ao consulente o atendimento dos requisitos do expediente previstos nos artigos 54 e 55 da referida lei de regência, no intuito de garantir o atendimento do pleito na forma de solução às questões provocadas.
Para melhor esclarecimento, trazemos à colação os preceptivos:
Art. 54. É assegurado ao sujeito passivo que tiver legítimo interesse o direito de formular consulta sobre dispositivos da legislação tributária aplicados a fato concreto de seu interesse.
Parágrafo único. Os órgãos da administração pública e as entidades representativas de categorias econômicas ou profissionais também poderão formular consulta.
Art. 55. A consulta será apresentada por escrito, na repartição fazendária que jurisdiciona o domicílio tributário do sujeito passivo, e conterá:
I - a qualificação do consulente;
II - a matéria de fato e de direito objeto de dúvida, na seguinte forma:
a) exposição completa e exata da hipótese consultada, com a citação dos correspondentes dispositivos da legislação e a indicação da data do fato gerador da obrigação principal ou acessória, se já ocorrido;
b) informação sobre a certeza ou possibilidade de ocorrência de novos fatos geradores idênticos;
c) indicação, de modo sucinto e claro, da dúvida a ser dirimida.
III - a declaração de existência ou não de início de procedimento fiscal contra o consulente;
IV - o comprovante de recolhimento da taxa. (negritamos)
Quando atendidos os quesitos descritos no preceptivo em destaque, o expediente está apto a obter solução de consulta com os efeitos que dela irradiam do art. 57 da indigatada lei de procedimentos:
Art. 57. A consulta produz os seguintes efeitos, exclusivamente em relação à matéria consultada:
I - suspende o curso do prazo de recolhimento dos tributos não-vencidos à data em que for formulada;
II - adquire o caráter de denúncia espontânea em relação a débito vencido até a data da ciência de sua solução pelo sujeito passivo, desde que, no prazo de trinta dias da data da intimação da solução, o sujeito passivo adote as demais providências previstas no art. 7º;
III - exclui a punibilidade do consulente, no que se refere a infrações meramente formais;
IV - impede ação fiscal a partir da apresentação da consulta até trinta dias da data da ciência.
§ 1º A suspensão do prazo prevista no inciso I não se aplica ao recolhimento de tributo cobrado por substituição tributária ou declarado pelo sujeito passivo.
§ 2º O impedimento de ação fiscal referido no inciso IV não alcança o lançamento de crédito tributário indispensável para prevenir os efeitos da decadência, hipótese em que, no auto de infração, deverá conter a condição de suspensão da exigibilidade até a solução da consulta.
§ 3º Na hipótese do parágrafo anterior, se da solução da consulta resultar tributo a ser pago, o pagamento deste, e dos acréscimos decorrentes da mora, se devidos, desde que efetuado no prazo referido no inciso II, determinará o automático cancelamento da multa lançada por infração material ou formal.
§ 4º No caso de consulta formulada por entidade representativa de categoria econômica ou profissional, os efeitos previstos neste artigo só alcançarão seus associados ou filiados depois de cientificado o consulente da decisão.
Isto posto, permite-se primeiramente discordar da alegação da requerente, qual seja, de que não realiza, no caso aqui trazido a estudo, atividade fabril, uma vez que, consoante seu próprio relato, recebe de matadouros ossos e resíduos e, a partir deles, produz o sebo e o osso autoclavado, fato este que se amolda perfeitamente ao conceito de industrialização à luz do RICMS-PA,
in verbis:
Art. 2º Nas operações internas, interestaduais ou de importação, considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento:
[...]
§ 3º Para os efeitos deste Regulamento, considera-se industrialização qualquer operação que modifique a natureza, o funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a finalidade do produto ou o aperfeiçoe para o consumo, tais como:
I - transformação, assim entendida a que, executada sobre matéria-prima ou produto intermediário, resulte na obtenção de espécie nova;
II - beneficiamento, a que importe modificação, aperfeiçoamento ou, de qualquer forma, alteração do funcionamento, da utilização, do acabamento ou da aparência do produto;
III - montagem, a que consista na reunião de peças ou partes e de que resulte um novo produto ou unidade autônoma, ainda que soba mesma classificação fiscal;
IV - acondicionamento ou reacondicionamento, a que importe alteração da apresentação do produto pela colocação de embalagem, ainda que em substituição à originária, salvo quando a embalagem colocada se destine apenas ao transporte da mercadoria;
V - renovação ou recondicionamento, a que, executada sobre produto usado ou parte remanescente de produto deteriorado ou inutilizado, renove ou restaure o produto para utilização.
§ 4º São irrelevantes, para caracterizar a operação como industrialização, o processo utilizado para obtenção do produto, a localização e as condições das instalações ou equipamentos empregados. (grifo nosso)
Por seu turno, a regra do art. 29 do Anexo I do RICMS-PA, de fato, difere o pagamento do imposto na saída interna de sebo e ossos até estabelecimento industrial e deixa o recolhimento para a posterior saída promovida pela fábrica do seu produto acabado resultante da industrialização final. Para tanto, veja-se o preceptivo:
Art. 29. O pagamento do ICMS incidente nas operações internas com couro e pele em estado fresco, salmourado ou salgado, sebo, osso, chifre e casco, com destino a estabelecimento industrial, fica diferido para a subsequente saída do produto acabado resultante da industrialização final.
§ 1º As operações a que se refere o caput, sujeitas ao diferimento do pagamento do ICMS, serão tributadas, englobadamente, no valor das saídas.
§ 2º O imposto diferido será exigido do estabelecimento destinatário, ainda que não ocorra saída subsequente do produto ou, caso ocorra, esteja amparada por não-incidência ou isenção do imposto.
§ 3º Na hipótese do parágrafo anterior, a base de cálculo do imposto diferido será o valor de aquisição mais recente dos produtos mencionados no caput, não podendo ser inferior ao preço de mercado.
Em efeito, a entrada dos resíduos (sebo e ossos) saídos do matadouro até seu estabelecimento se amolda, a princípio, ao comando acima transcrito. Ou seja, o imposto devido nesta operação estaria diferido. Contudo, entende-se que a mesma regra não se aplica a posterior saída do produto fabricado pela consulente a partir deste materiais, ainda que com destino a outra indústria, haja vista que as mercadorias produzidas pela consulente, sebo industrial (conforme descrito nos DANFE juntados ao processo) e osso autoclavado, são o produto final do seu processo de fabricação.
Deveras, se o RICMS-PA quisesse normatizar o instituto do diferimento na presente situação de forma diversa, teria o diploma assim disposto expressamente que a postergação do pagamento do imposto para momento posterior se darias nas sucessivas saídas dos produtos descritos no indigitado art. 29 do Anexo I, o que não se encontra no situação em concreto, o que leva a este setor consultivo a entender pela inaplicabilidade do presente dispositivo ao caso da consulente.
É a manifestação.
DA SOLUÇÃO
Passados os esclarecimentos, respondem-se o quesito formulado pela consulente como segue:
A empresa tem direito ao diferimento do art. 29 do Anexo I do Regulamento do ICMS quando a mesma comercializar dentro do Estado o sebo bovino e o osso autoclavado para establecimento industrial com CNAE da seção C, divisão 10 a 33 da TIPI (que são as indústrias de transformação. CNAE que transforma matéria-prima em produto acabado)?
Resposta. Não. A entrada dos resíduos, desde que se enquadrem num dos produtos descritos no art. 29 do Anexo I do RICMS-PA, do matadouro até o estabelecimento da consulente será diferida por se categorizar como industrial, e às saídas dos produtos finais resultantes de seu processo fabril, sebo industrial e osso autoclavado, não se aplicará a mencionada regra ainda que tenham como destino outra indústria por falta de expressa previsão.
É o parecer que submetemos para apreciação superior. S.M.J.
Belém (PA), 10 de novembro de 2020.
ANDRÉ CARVALHO SILVA, Coordenador da CCOT;
De acordo com o parecer da CCOT. Notifique-se a consulente da solução. Após encaminhe-se o feito à coordenação fazendária de seu domicílio tributário para arquivamento do expediente, em
obediência ao art. 58, III, da L. 6.182/98 c/c art. 13 do Dec. 428/19.
SIMONE CRUZ NOBRE, Diretora de Tributação