Publicado no DOE - GO em 21 mar 2025
ICMS. Transferência interestadual para estabelecimento do mesmo titular. Bem do ativo imobilizado. Art. 13, § 3º do CTE-GO; LC nº 204/2023; ADC 49.
(...), com atividade principal “4929-9/01 Transporte rodoviário coletivo de passageiros, sob regime de fretamento, municipal” e secundária, dentre outras, “4930-2/02 Transporte rodoviário de carga, exceto produtos perigosos e mudanças, intermunicipal, interestadual e internacional”, estabelecida na (...) solicita esclarecimentos acerca da transferência interestadual de bem do ativo imobilizado para estabelecimento do mesmo titular.
Aduz que de acordo com o art. 12, § 4º da Lei Complementar nº 87/1996, alterado pela Lei Complementar nº 204/2023, “Não se considera ocorrido o fato gerador do imposto na saída de mercadoria de estabelecimento para outro de mesma titularidade”.
Informa que precisa emitir uma nota fiscal de transferência de um veículo de seu ativo imobilizado para a matriz de São José do Rio Preto-SP. O bem foi transferido originalmente da referida matriz para sua filial de Mineiros-GO. A nota fiscal de transferência foi emitida sem destaque de ICMS pois o bem não possuía créditos a serem apropriados por se tratar de um veículo ano 2019 e os créditos que seriam passíveis de aproveitamento foram utilizados anteriormente.
Faz os seguintes questionamentos:
a) - Qual CST deve utilizar na emissão da nota fiscal de transferência para não informar ICMS a transferir, pois o bem não teve créditos de ICMS transferidos para o Estado de Goiás?
b) - Qual base legal deve informar nas informações complementares da nota fiscal a ser emitida para justificar a não incidência de ICMS?
A Lei Complementar nº 204, de 28 de dezembro de 2023, pacificou a celeuma atinente às transferências de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo contribuinte. Seguindo o entendimento manifestado pelo Supremo Tribunal Federal, a circulação de mercadorias juridicamente relevante para efeito de incidência do ICMS é apenas a circulação jurídica, isto é, a que envolve a mudança de titularidade das mercadorias ou bens.
No julgamento, em 14/08/2020, do Recurso Extraordinário com Agravo 1.255.885/MS (Tema 1099), o Supremo Tribunal Federal, reafirmando a jurisprudência da Corte sobre a matéria, firmou a seguinte tese de repercussão geral: “Não incide ICMS no deslocamento de bens de um estabelecimento para outro do mesmo contribuinte localizados em estados distintos, visto não haver a transferência da titularidade ou a realização de ato de mercancia.”
Em 19/04/2021, julgando a Ação Declaratória de Constitucionalidade 49/RN – ADC 49, decidiu o STF que “o deslocamento de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular não configura fato gerador da incidência de ICMS, ainda que se trate de circulação interestadual” e declarou a inconstitucionalidade dos artigos 11, §3º, II; 12, I, no trecho “ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular”, e 13, §4º, da Lei Complementar Federal n. 87, de 13 de setembro de 1996.
Em 19/04/2023, nos Embargos de Declaração na ADC 49 a Suprema Corte modulou os efeitos temporais da decisão a fim de que tenha eficácia pró-futuro a partir do exercício financeiro de 2024, ressalvados os processos administrativos e judiciais pendentes de conclusão até a data de publicação da ata de julgamento da decisão de mérito, assim como reconheceu a inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, do art. 11, § 3º, II, da Lei Complementar nº 87/1996, excluindo do seu âmbito de incidência apenas a hipótese de cobrança do ICMS sobre as transferências de mercadorias entre estabelecimentos de mesmo titular.
Em observância ao entendimento firmado pelo STF foi sancionada a Lei Complementar nº 204/2023, citada, que promoveu alterações na Lei Complementar nº 87/1996, estabelecendo que não há incidência do ICMS na saída de mercadoria para outro estabelecimento do mesmo titular e que o crédito relativo às operações e prestações anteriores fica mantido em favor do contribuinte, inclusive nas hipóteses de transferências interestaduais em que parte do crédito deverá ser transferido para a unidade federada de destino e a diferença positiva será assegurada pela unidade federada de origem.
As novas disposições foram incorporadas à Lei nº 11.651, de 26 de dezembro de 1991, que instituiu o Código Tributário do Estado de Goiás – CTE-GO, pelas Leis nºs. 22.575, de 22 de março de 2024 e 23.174, de 26 de dezembro de 2024, importando destacar o acréscimo do § 3º ao art. 13 do referido Código:
“Art. 13. Ocorre o fato gerador do imposto, no momento:
(…)
§ 3º Não se considera ocorrido o fato gerador do imposto na saída da mercadoria do estabelecimento do contribuinte para outro estabelecimento do mesmo contribuinte, observado o disposto no art. 58-A.”
No caso de bens do ativo imobilizado, embora não se trate de mercadoria stricto sensu, a jurisprudência da Suprema Corte é firmada no sentido de que o ICMS não incide sobre a transferência de mercadorias e ativo fixo entre estabelecimentos de um mesmo contribuinte, ainda que localizados em estados distintos.
Assim, o termo “saída de mercadoria” constante do § 3º do art. 13 do CTE-GO deve ser tomado como “saída de bens e mercadorias”, de forma que estejam contemplados pela não incidência do ICMS também os bens do ativo imobilizado, em harmonia com as decisões do STF.
Corrobora tal entendimento a revogação, implementada pela Lei nº 22.575/2024, do art. 17 da Lei nº 11.651/1991 – CTE-GO, tendo em vista que o dispositivo se tornou incompatível com a Lei Complementar nº 204/2023, conforme justifica a Exposição de Motivos nº 10/24-GSE.
O dispositivo revogado estabelecia a base de cálculo do ICMS na saída de mercadoria para estabelecimento localizado neste ou em outro Estado, pertencente à mesma pessoa natural ou jurídica, inclusive nas transferências internas de bem do ativo imobilizado antes de decorrido o período de quatro anos. Infere-se, portanto, que se não há base de cálculo tributária na transferência de bem do ativo imobilizado não há incidência do imposto.
Desse modo, no caso da Consulente, a base legal para a transferência interestadual de bem do ativo imobilizado para outro estabelecimento de mesma titularidade sob o amparo da não incidência é o art. 13, § 3º do CTE-GO (LC nº 204/2023 – ADC 49).
Quanto aos créditos referentes às operações e prestações anteriores, o Conselho Nacional de Política Fazendária – CONFAZ disciplinou a sua transferência na remessa interestadual de mercadorias por meio do Convênio ICMS nº 178/2023, revogado pelo Convênio ICMS nº 109/2024, atualmente em vigor. Tais prescrições estão gravadas no art. 58-A do CTE-GO.
Todavia, não foi, ainda, regulamentada pelo CONFAZ e por esta Secretaria a transferência de créditos relativos à transferência de bens do ativo imobilizado, os quais se submetem a regras específicas.
Considerando, entretanto, que, segundo o relato da Consulente, a nota fiscal de transferência do veículo da matriz de São José do Rio Preto-SP para seu estabelecimento foi emitida sem destaque de ICMS, vez que o bem não possuía créditos a serem apropriados por se tratar de um veículo ano 2019 e os créditos que seriam passíveis de aproveitamento foram utilizados anteriormente, não há falar em transferência de créditos na nova operação de transferência da filial de Mineiros-GO para a referida matriz.
A propósito, o Ajuste SINIEF nº 33/2024 disciplinou o procedimento de emissão da Nota Fiscal Eletrônica - NF-e na transferência de créditos da remessa interestadual de mercadorias entre estabelecimentos de mesma titularidade, nos termos das cláusulas primeira a quarta do Convênio ICMS nº 109/2024. Segundo o normativo, o documento fiscal emitido para acobertar a operação deve conter as seguintes informações:
1) Natureza da Operação, o texto "Transferência de Mercadoria - Estabelecimentos mesmo titular";
2) Informações Adicionais de Interesse do Fisco - infAdFisco, o texto "Procedimento autorizado conforme Convênio ICMS nº 109/24";
3) Código Fiscal de Operações e de Prestações - CFOP, um dos códigos do grupo "6.150 - Transferências de produção própria ou de terceiros", conforme o caso, sendo:
3.1) CFOP 6.151 (quando for transferência de produção próprio do contribuinte);
3.2) CFOP 6.152 (quando for mercadoria adquirida de terceiros ou decorrente de importação);
4) Código de Situação Tributária - CST, o código 90;
5) Valor Base de Cálculo do ICMS - vBC , "valor zerado";
6) Alíquota do imposto - pICMS, "valor zerado";
7) Valor do ICMS - vICMS, o valor do crédito a ser transferido, caso exista.
Dessa forma, ainda que não tenha sido regulamentada a transferência de créditos relativa a bens do ativo imobilizado, a Nota Fiscal Eletrônica – NF-e pode ser emitida normalmente para acobertar a saída em transferência do bem, com o Código de Situação Tributária - CST 90, em conformidade com o Ajuste SINIEF nº 33/2024, visto que não há créditos passíveis de apropriação relativos ao veículo.
Com base no exposto, pode-se concluir:
a) - Na Nota Fiscal Eletrônica – NF-e que acobertar a transferência do veículo ano 2019, integrado ao ativo imobilizado da Empresa, do estabelecimento da Consulente para a matriz de São José do Rio Preto-SP, deve ser utilizado o Código de Situação Tributária - CST 90, em conformidade com o Ajuste SINIEF nº 33/2024 e não haverá créditos do ICMS a transferir, pois que decorridos 48 meses da entrada original do bem no estabelecimento.
b) – A base legal a ser consignada no campo “Informações Complementares” da nota fiscal a ser emitida, para justificar a não incidência do ICMS, será o art. 13, § 3º do CTE-GO (LC nº 204/2023 – ADC 49).
É o parecer.
GOIANIA, 21 de março de 2025.
OLGA MACHADO REZENDE
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