ICMS. ISENÇÃO. CONVÊNIO ICMS N. 65/88. ALCs. Convênio ICMS n. 52/92. Aplicação da norma de tratamento nacional prevista na cláusula terceira do GATT.
DA CONSULTA
A Consulente acima qualificada dirige consulta protocolada sob o número 7265, de 01 de maio de 2017 a esta Administração Tributária.
A Consulente informa que tem como atividade principal o Comércio Atacadista de inúmeras mercadorias, notadamente as de gênero alimentício e de produtos de higiene, limpeza e conservação domiciliar, sob regime normal de recolhimento do ICMS, com fulcro nos Artigos 132 e seguintes do Decreto 856-E-CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO FISCAL, encaminha as seguintes questões:
1) ESTÁ CORRETA A INTERPRETAÇÃO DA CONSULENTE DE QUE A ISENÇÃO PREVISTA PELA CLÁUSULA PRIMEIRA DO CONVÊNIO ICMS N. 65/88 (ESTENDIDA ÀS ÁREAS DE LIVRE COMÉRCIO – ALCs PELO CONVÊNIO ICMS N. 52/92) APLICA-SE ÀS MERCADORIAS NACIONALIZADAS ADQUIRIDAS PELA CONSULENTE DE FORNECEDORES LOCALIZADOS NO BRASIL, DESDE QUE TAIS MERCADORIAS SEJAM PROVENIENTES DE PAÍSES SIGNATÁRIOS DO GATT, BEM COMO SEJAM SIMILARES A MERCADORIAS NACIONAIS, GARANTINDO-SE QUE NÃO HAJA DISCIMINAÇÀO ENTRE O TRATAMENTO DO PRODUTO NACIONAL E DO PRODUTO ESTRANGEIRO?
2) EM CASO NEGATIVO, QUAL SERIA O ENTENDIMENTO DESTE ÓRGÃO FAZENDÁRIO SOBRE OS REQUISITOS PARA QUE SE APLIQUE O PRINCÍPIO DO TRATAMENTO NACIONAL (ART. III, CLÁUSULA 3.2 DO GATT?) NAS ISENÇÕES CONCEDIDAS POR ESTA SECRETARIA?
FUNDAMENTAÇÃO
Preliminarmente, importa observar que o instituto da consulta guarda obediência às disposições previstas na Lei Complementar 72/94, bem como, às normas contidas no Regulamento do Contencioso Administrativo Tributário, aprovado pelo Decreto nº 856/94.
Inicialmente devemos observar o que reza o Convênio ICMS 65/88:
Cláusula primeira Ficam isentas do imposto às saídas de produtos industrializados de origem nacional para comercialização ou industrialização na Zona Franca de Manaus, desde que o estabelecimento destinatário tenha domicílio no Município de Manaus. (grifo nosso)
§ 1º Excluem-se do disposto nesta cláusula os seguintes produtos: armas e munições, perfumes, fumo, bebidas alcoólicas e automóveis de passageiros.
§ 2º Para efeito de fruição do benefício previsto nesta cláusula, o estabelecimento remetente deverá abater do preço da mercadoria o valor equivalente ao imposto que seria devido se não houvesse a isenção indicado expressamente na nota fiscal.
Cláusula segunda A isenção de que trata a cláusula anterior fica condicionada à comprovação da entrada efetiva dos produtos no estabelecimento destinatário.
...
Cláusula quinta As mercadorias beneficiadas pela isenção prevista neste Convênio, quando saírem do município de Manaus e de outros em relação aos quais seja estendido o benefício, perderão o direito àquela isenção, hipótese em que o imposto devido será cobrado, com os acréscimos legais cabíveis, pelo Estado de origem, salvo se o produto tiver sido objeto de industrialização naquela zona.
Segue, após o Convênio ICMS 52/92 que trata dos benefícios fiscais atribuídos as Áreas de Livre Comércio (ALCs), e estende às Áreas de Livre Comércio dos Estados do Amapá, Roraima e Rondônia os benefícios do Convênio ICM 65/88, de 06.12.88.
Cláusula primeira Ficam estendidos às Áreas de Livre Comércio de Macapá e Santana, no Estado do Amapá, Bonfim e Boa Vista, no Estado de Roraima, Guajaramirim, no Estado de Rondônia, Tabatinga, no Estado do Amazonas, e Cruzeiro do Sul e Brasiléia, com extensão para o Município de Epitaciolância, no Estado do Acre, os benefícios e as condições contidas no Convênio ICM 65/88, de 6 de dezembro de 1988.
Cabe também observar que os produtos industrializados de origem nacional são os resultantes de qualquer operação definida no Regulamento do IPI como industrialização, mesmo incompleta, parcial ou intermediária. (RIPI/2010 – Decreto 7.212/2010 – Regulamenta a cobrança, fiscalização, arrecadação e administração do IPI)
Art. 3. Produto industrializado é o resultante de qualquer operação definida neste Regulamento como industrialização, mesmo incompleta, parcial ou intermediária (Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966, art. 46, parágrafo único, e Lei no 4.502, de 1964, art. 3º).
Art. 4º Caracteriza industrialização qualquer operação que modifique a natureza, o funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a finalidade do produto, ou o aperfeiçoe para consumo, tal como (Lei no 5.172, de 1966, art. 46, parágrafo único, e Lei no 4.502, de 1964, art. 3o, parágrafo único): (grifo nosso)
I - a que, exercida sobre matérias-primas ou produtos intermediários, importe na obtenção de espécie nova (transformação);
II - a que importe em modificar, aperfeiçoar ou, de qualquer forma, alterar o funcionamento, a utilização, o acabamento ou a aparência do produto (beneficiamento);
III - a que consista na reunião de produtos, peças ou partes e de que resulte um novo produto ou unidade autônoma, ainda que sob a mesma classificação fiscal (montagem);
IV - a que importe em alterar a apresentação do produto, pela colocação da embalagem, ainda que em substituição da original, salvo quando a embalagem colocada se destine apenas ao transporte da mercadoria (acondicionamento ou recondicionamento); ou
V - a que, exercida sobre produto usado ou parte remanescente de produto deteriorado ou inutilizado, renove ou restaure o produto para utilização (renovação ou recondicionamento).
Parágrafo único. São irrelevantes, para caracterizar a operação como industrialização, o processo utilizado para obtenção do produto e a localização e condições das instalações ou equipamentos empregados.
Consta, na legislação federal, segundo a Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966, que dispõe sobre o SISTEMA TRIBUTARIO NACIONAL e institui normas erais de direito tributário aplicáveis a União , Estados e Municípios, o seguinte:
Art. 98. Os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna, e serão observados pela que lhes sobrevenha. (grifo nosso)
E, nesse sentido, o Decreto no 1.355, de 30 de dezembro de 1994, que promulgou a Ata Final que Incorpora os Resultados da Rodada Uruguai de Negociações Comerciais Multilaterais do GATT, a cerca das operações de comércio internacional entre os países participes do Acordo, decreta:
Art. 1º A Ata Final que Incorpora os Resultados da Rodada Uruguai de Negociações Comerciais Multilaterais do GATT, apensa por cópia ao presente decreto, será executada e cumprida tão inteiramente como nele contém. (grifo nosso)
Quanto a legislação do Estado de Roraima, de acordo com o Regulamento do ICMS, instituído pelo Decreto nº 4.335-E, de 03 de agosto de 2001, consta:
...
Da Isenção
Art. 5º. As isenções ou quaisquer outros incentivos ou benefícios fiscais serão concedidos ou revogados nos termos fixados em convênios celebrados entre os Estados e o Distrito Federal.
§ 1º. Quando a isenção depender de requisito a ser preenchido e não sendo este cumprido, o imposto será considerado devido a partir do momento em que tenha ocorrido a operação ou prestação, e seu recolhimento far-se-á com multa e demais acréscimos legais, que serão devidos a partir do vencimento do prazo em que o imposto deveria ser recolhido, caso a operação ou prestação não fosse efetuada com o benefício fiscal.
§ 2º. A isenção, salvo determinação em contrário da legislação:
I – não implicará crédito para compensação com o montante devido nas operações e prestações seguintes;
II – acarretará a anulação do crédito relativo às operações e prestações anteriores;
III – não é extensiva às obrigações acessórias relacionadas com a obrigação principal alcançada pela exoneração fiscal.
§ 3º. Nos casos em que a isenção for concedida por despacho da autoridade fazendária, esta não gera direito adquirido, devendo a concessão ser revogada de ofício sempre que se apure que o beneficiário não satisfazia ou deixou de satisfazer as condições, ou não cumprira ou deixou de cumprir os requisitos para sua concessão, hipótese em que será cobrado o ICMS com os acréscimos legais:
I – com imposição da penalidade cabível, nos casos de dolo, fraude ou simulação do beneficiado, ou de terceiro em benefício daquele;
II – sem imposição de penalidades nos demais casos.
§ 4º. As isenções, incentivos e benefícios fiscais em vigor neste Estado são as constantes do Anexo I deste Regulamento.
Avançando na busca de outras referencias para o questionamento da Consulente, encontramos o artigo abaixo, que trata do mesmo questionamento:
Estados não concedem benefícios de ICMS a importados similares aos nacionais
GATT/OMC é um acordo geral sobre tarifas e comércio firmado entre diversos países integrantes da OMC, que trata do comércio de bens e tem por finalidade acabar com a discriminação, reduzir tarifas e outras barreiras ao comércio internacional de bens.
No referido acordo ficou convencionado, que não pode haver diferença de tratamento tributário entre produtos nacionais e estrangeiros quando estes últimos forem originários de país signatário do GATT/OMC.
Com efeito, dispõe o GATT em seu artigo III, item 2 que “os produtos originários de qualquer parte contratante importados nos territórios de qualquer outra parte contratante gozarão de tratamento não menos favorável que o concedido a produtos similares de origem nacional no que concerne a todas as leis, regulamentos e exigências que afetem sua venda, colocação no mercado, compra, transporte, distribuição ou uso no mercado interno”.
As normas do Tratado Internacional referido são aplicáveis no País e prevalecem sobre a legislação tributária interna nos exatos termos dos artigos 5º, parágrafo 2º da Constituição Federal, 96 e 98 do Código Tributário Nacional.
Isto significa que os benefícios fiscais concedidos aos produtos nacionais devem ser estendidos aos similares importados. Por exemplo, se um produto goza de isenção no mercado nacional, um produto semelhante importado de um país também signatário do GATT gozará igualmente do benefício da isenção.
E não importa que o benefício seja concedido no âmbito federal ou estadual.
Já se discutiu muito no passado se o acordo em questão atingiria as isenções também no âmbito estadual (visto que o acordo é firmado pela União). Esta questão já foi pacificada pelo Supremo Tribunal Federal, que na Súmula 575 deixou claro que muito embora o ICMS seja tributo de competência estadual,a União pode, por tratado internacional, assegurar que o bem importado tenha tributação igual à do similar nacional. Eis o teor da Súmula 575 do STF:
“575. À mercadoria importada de país signatário do GATT ou membro da ALALC estende-se a isenção do imposto de circulação de mercadoria concedida a similar nacional.”
Posteriormente, o Superior Tribunal de Justiça ratificou o entendimento do E.
Supremo Tribunal Federal, editando a Súmula 20 do seguinte teor: “20. A mercadoria importada de país signatário do GATT é isenta do ICM, quando contemplado com esse favor o similar nacional”.
Fica evidente que é inaceitável discriminação e, portanto, é vedado se atribuir tratamento fiscal mais favorável ao similar nacional, do que ao produto importado de país signatário do GATT.
Não obstante isso, os fiscos estaduais insistem em não estender benefícios fiscais aos produtos importados de países signatários do GATT/OMC, sob o argumento de que a extensão ao produto importado de benefício concedido apenas por um Estado da Federação ao similar nacional só se justificaria, caso o mesmo tratamento fosse uniforme em todo o território nacional, ou seja, se todos os Estados também concedessem o mesmo benefício.
Contudo o Judiciário tem afastado a pretensão dos estados esclarecendo que o benefício estadual se estende ao produto importado desde que seja comercializado na unidade da federação que concede o benefício e/ou desde que a internalização da mercadoria ocorra na unidade federativa correspondente.
Nesse sentido o recente REsp 1.169.590/RS. Além disso, há ainda o REsp 480.563/RS; AgRg no Ag 543.968/RS, REsp 621.128/RS, dentre inúmeros outros.
FONTE: http://tributarionosbastidores.com.br/2012/02/gatt/ pesquisa em 28/09/2017.
RESPOSTA
Ante o exposto, responde-se à Consulente:
1. Está correta a interpretação da Consulente, tanto que as legislações citadas pela mesma, consta da justificativa acima. Entretanto, não foi regulamentada pelo Estado de Roraima a “desoneração do ICMS”, quando do ingresso de produtos importados de países participantes do Acordo do GATT, no qual os equipara aos “produtos industrializados de origem nacional”.
2. Por não constar no Regulamento do ICMS, não tem como atribuir o Principio do Tratamento Nacional sem a previsão legal. Desta forma sugerimos que o assunto seja levado para o CONFAZ (Conselho Fazendário) e desta forma obter respaldo para conceder ou não o direito aqui requerido.
Esta consulta perderá automaticamente a sua eficácia normativa em caso de mudança de entendimento por parte da Administração Tributária, ou seja, na edição de norma posterior dispondo de forma contrária.
Com essas considerações dou por respondida a consulta.
DESPACHO
Dê-se ciência ao interessado, entregando uma via desta, com contra recibo.
Forneça-se cópia ao Presidente do Contencioso Administrativo Fiscal.
Encaminhe-se à Diretoria do Departamento da Receita para conhecimento e demais providências necessárias.
Após, os autos da presente consulta deverão ser arquivados na repartição de origem, nos termos do artigo 80 e 81 da Lei 72 de 30 de junho de 1994.
Boa Vista – RR, 28 de setembro de 2017.
Palmira Leão de Souza
Julgador de Primeira Instância
Mat. 050001689
Geize de Lima Diógenes
Chefe da Divisão de Procedimentos Administrativos Fiscais.