Publicado no DOE - DF em 25 jun 2025
Peticionamento promovido por pessoa jurídica de direito privado. Esclarecimento fiscal sobre NCM e tributação. Indicação de dúvida, clara e objetiva, sobre a interpretação e aplicação da legislação tributária do Distrito Federal a determinada situação de fato. Ausência. Mera solicitação de confirmação de entendimento. Inadmissibilidade da Consulta.
Processo SEI nº: 04044-00016706/2025-86.
RELATÓRIO
1. Os Autos versam sobre peticionamento promovido por pessoa jurídica de direito privado, através do qual a Consulente, em curta exposição, requer "esclarecimento fiscal sobre NCM e tributação (ICMS, PIS e COFINS) aplicável à venda de fotografias impressas de autoridades religiosas e pôsteres/gravuras com temáticas religiosas, culturais e ambientais". Acrescenta que aplica o NCM 4901.99.00, tratando a referida venda como imune, com base no art. 150, VI, "d" da CF. Solicita, por fim, "confirmação oficial quanto à validade dessa classificação e da aplicação da imunidade no DF, bem como orientação sobre correta tributação, especialmente se houver outra NCM mais adequada".
2. Os Autos foram enviados à Coordenação de Atendimento ao Contribuinte (COATE), a fim de se promover o preparo/saneamento processual, com esteio nos arts. 74 e 75 do Decreto distrital nº 33.269/2011 (Documento SEI nº 168143994), e, em seguida, retornaram a essa Gerência, com o objetivo de análise da questão (Documento SEI nº 168559395).
ANÁLISE
3. Ab initio, registre-se o fato de a Autoridade Fiscal promover a análise da matéria consultada plenamente vinculada à legislação tributária.
4. A faculdade de se formular consulta é um direito subjetivo do sujeito passivo em caso de dúvida, clara e objetiva, sobre a interpretação e aplicação da legislação tributária do Distrito Federal a determinada situação de fato, relacionada a tributo do qual seja contribuinte inscrito no Cadastro Fiscal do Distrito Federal, ou pelo qual seja responsável.
5. Entenda-se Dúvida (substantivo feminino) a ausência de convicção diante de duas ou mais opiniões ou possibilidades. Ex.: tinha dúvida entre a aplicação da legislação A ou da legislação B a determinada situação de fato.
6. A Dúvida é concêntrica ao Não Saber, porém com este não se confunde, haja vista ser genérico a certo tema, ultrapassando a fronteira jurídica da ausência de convicção diante de duas ou mais opiniões ou possibilidades. A dúvida jurídica decorre de um conflito de entendimentos, e não da ignorância normativa.
7. O "não saber" caracteriza-se pela ausência total de conhecimento ou informação sobre determinado tema, não configurando conflito interpretativo. Trata-se de um questionamento meramente procedimental, voltado à obtenção de informações básicas, como, por exemplo, desconhecer qual norma disciplina certo regime tributário.
8. A dúvida jurídica, tal como exigida no âmbito da Consulta Tributária, pressupõe a existência de ao menos duas interpretações possíveis sobre a aplicação da legislação tributária a uma situação de fato concreta e claramente delimitada. Ou seja, decorre de um conflito de entendimentos, e não da ignorância normativa.
9. Por essa razão, a Consulta Tributária não se presta a convalidar teses, confirmar entendimentos já formados ou suprir lacunas de conhecimento genérico.
10. Na ausência de descrição clara e objetiva da dúvida, a Consulta será inadmissível quanto ao quesito em análise.
11. Noutra toada, se a situação apresentada já estiver regulamentada, definida ou declarada em disposição literal de legislação, bem como disciplinada em ato normativo, inclusive em Solução de Consulta, ou orientação publicados antes de sua apresentação, a Consulta será ineficaz.
12. A faculdade de formular Consulta se estende aos órgãos da Administração Pública e às entidades representativas das categorias econômicas ou profissionais, relativamente às atividades desenvolvidas por seus representados.
13. Uma vez exercida essa faculdade, o pronunciamento da Autoridade Fiscal poderá se operar em três sentidos, quais sejam: Inadmissibilidade da Consulta, Ineficácia de Consulta e Consulta Eficaz (arts. 76 a 80 do Decreto distrital nº 33.269/2011).
14. O instituto da consulta administrativa tributária se materializa por meio de um procedimento tributário de caráter preventivo, envolvendo determinado fato de duvidoso enquadramento tributário, que possa gerar insegurança jurídica em relação à situação fática, com força vinculante para a Administração, acaso seja favorável ao contribuinte, guardando força normativa até que outro ato a modifique ou revogue. Todavia, não é vinculativa para o sujeito passivo, uma vez que este poderá provocar o Judiciário para se pronunciar, com espeque no inciso XXXV do art. 5º da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/1988).
15. Por outro lado, avulta importância registrar a Consulta não ser o instrumento adequado para se questionar o lançamento tributário, ou seu início por meio de uma ação fiscal, bem como inscrição de crédito tributário em dívida ativa, haja vista o instrumento adequado ser a Impugnação, a Revisão e/ou o Recurso.
16. O caso versado nos Autos enseja claramente uma Inadmissibilidade de Consulta. Isso porque a Consulente apontou um questionamento meramente procedimental desacompanhado de qualquer raciocínio que enseje dúvida objetiva envolvendo interpretação ou aplicação da legislação tributária do Distrito Federal a determinada situação de fato.
17. Ademais, a competência para definir a Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM) é da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (RFB), vinculada ao Ministério da Fazenda.
18. Dentre várias outras atribuições, a RFB é responsável por (i) estabelecer a classificação fiscal das mercadorias, (ii) publicar a Tabela de Incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados (TIPI) e (iii) orientar os contribuintes quanto à correta aplicação da NCM.
19. Nada obstante, a título de esclarecimento e cortesia, sem caráter vinculativo algum, deixando clara a autoridade da RFB de orientar os contribuintes quanto à correta aplicação da NCM, informamos a NCM ser baseada no Sistema Harmonizado de Designação e Codificação de Mercadorias (SH), elaborado pela Organização Mundial das Aduanas (OMA), e utilizada para identificar a natureza das mercadorias comercializadas no Brasil e nos países signatários do Mercosul.
20. A correta classificação fiscal é essencial para determinar a tributação aplicável e o cumprimento das obrigações acessórias. A responsabilidade pela indicação nos documentos fiscais da NCM de uma mercadoria é do contribuinte, que deve considerar as características físicas, composição, função e uso do produto, observada classificação já disposta pelo órgão competente.
21. No caso em análise, a Consulente informa comercializar “fotografias impressas de autoridades religiosas e pôsteres/gravuras com temáticas religiosas, culturais e ambientais”, utilizando a NCM 4901.99.00, que corresponde a "Outros livros, brochuras e impressos semelhantes, mesmo em folhas soltas".
22. No entanto, esta classificação é aplicável a publicações que contenham texto escrito, com finalidade informativa, educativa ou cultural, e que se enquadrem no conceito de livro.
23. Para que uma mercadoria seja classificada nesta posição, é necessário (i) conter predominantemente texto escrito, (ii) ter estrutura editorial (título, autor, editora etc.) e (iii) ser destinada à leitura sequencial.
24. Já a posição 4911 abrange "Outros impressos, incluindo as estampas, gravuras e fotografias". Especificamente, o código 4911.91.00 corresponde a "Estampas, gravuras e fotografias".
25. Esta classificação é apropriada para produtos que consistem em imagens impressas, sem texto predominante, tais como fotografias impressas, pôsteres decorativos e gravuras artísticas.
26. Assim, considerando que as mercadorias comercializadas pela Consulente são predominantemente imagens impressas, sem texto escrito que as caracterize como livros, a classificação mais adequada seria a NCM 4911.91.00.
27. No que se refere à imunidade tributária, a alínea "d" do inciso VI art. 150 da CRFB/1988 estabelece ser vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios instituir impostos sobre "livros, jornais, periódicos e o papel destinado à sua impressão". Trata-se de imunidade de ordem objetiva, que visa proteger a liberdade de expressão, o acesso à informação e o incentivo à cultura e à educação.
28. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) tem interpretado essa imunidade de forma a abranger livros, jornais e periódicos impressos, livros eletrônicos (e-books) e seus suportes exclusivamente utilizados para fixá-los, componentes eletrônicos destinados exclusivamente a integrar unidade didática com fascículos, álbuns de figurinhas e respectivos cromos adesivos e listas telefônicas.
29. Por outro lado, a referida imunidade não alcança impressos publicitários, fotografias e pôsteres decorativos, obras de arte e produtos que não veiculem informação ou ideia de qualquer espécie.
30. Pois bem, considerando que as mercadorias comercializadas pela Consulente são fotografias impressas de autoridades religiosas e pôsteres/gravuras com temáticas religiosas, culturais e ambientais, sem texto escrito predominante, e que não se enquadram no conceito de livro, jornal ou periódico, não há se falar no alcance da imunidade a que se refere a alínea "d" do inciso VI do art. 150 da CRFB/1988.
31. Destarte, tais produtos estão sujeitos à tributação ordinária sobre a circulação de mercadorias, tal como o ICMS.
32. A alíquota aplicável dependerá da classificação fiscal e da legislação vigente no momento da operação. Recomenda-se consultar a tabela de alíquotas do ICMS do Distrito Federal para verificar a alíquota específica para a NCM 4911.91.00.
33. Quanto às contribuições para o PIS e a COFINS, considerando serem enquadradas como tributos federais incidentes sobre a receita bruta das empresas, não teceremos comentários, haja vista a RFB ser o órgão competente para se manifestar.
34. Por fim, recomenda-se à Consulente revisar a classificação fiscal de suas mercadorias e adequar seus procedimentos fiscais conforme a legislação vigente.
35. Como opção, a Consulente poderá seguir as orientações procedimentais a serem fornecidas pela Secretaria de Estado de Economia do Distrito Federal, que podem ser obtidas através do Atendimento Virtual. Nesse sentido, recomenda-se à Consulente acessar a página eletrônica desta Subsecretaria de Receita (https://www.receita.fazenda.df.gov.br/), dirigindo-se, inicialmente, para a aba “Perguntas Frequentes”, onde poderá inteirar-se sobre o tópico de seu interesse. Não sendo suficientes as orientações lá disponibilizadas, a Consulente poderá acessar, no endereço acima especificado, a aba “Atendimento Virtual” (https://www2.agencianet.fazenda.df.gov.br/Atendimento/SAC#/Home) e seguir as orientações indicadas.
36. Note-se a Declaração de Inadmissibilidade de Consulta não comportar a interposição de recurso voluntário, conforme dicção do parágrafo único do art. 79 do Decreto distrital nº 33.269/2011.
CONCLUSÃO
37. Em razão de todo o exposto, com espeque no inciso I do art. 5º da Lei ordinária distrital nº 4.717/2011, sugiro a inadmissibilidade desta formulação de Consulta, por estar em dissonância com os termos do Decreto distrital nº 33.269/2011, não devendo ser aplicado o disposto no caput dos arts. 79, 80 e 82 do mesmo Diploma Normativo.
38. À consideração superior.
Brasília/DF, 22 de maio de 2025
ZENÓBIO FARIAS BRAGA SOBRINHO
Auditor-Fiscal da Receita do Distrito Federal
Matrícula 109.123-9
De acordo.
Encaminhamos à análise desta Coordenação o Parecer supra.
Brasília/DF, 09 de junho de 2025
LUÍSA MATTA MACHADO FERNANDES SOUZA
Gerência de Esclarecimento de Normas
Gerente
Aprovo o Parecer supra e assim decido, declarando a inadmissibilidade da presente Consulta, nos termos do que dispõe a alínea “a” do inciso VI do art. 1º da Ordem de Serviço SUREC nº 14, de 26 de fevereiro de 2025 (Diário Oficial do Distrito Federal nº 42, de 28 de fevereiro de 2025, págs. 3 e 4).
Encaminhe-se para publicação, nos termos do inciso III do art. 252 da Portaria nº 140, de 17 de maio de 2021, alterada pela Portaria nº 95, de 16 de março de 2022.
Brasília/DF, 13 de junho de 2025
MATEUS TORRES CAMPOS
Coordenação de Tributação
Coordenador Substituto