Publicado no DOE - PA em 25 nov 2021
A ausência de fato concreto sobre a matéria consultada promove a ineficácia da consulta
DA CONSULTA
A consulente é indústria moageira de trigo e na fabricação de derivados com estabelecimento neste Estado e informa que importa do exterior grãos de trigo, que são a matéria-prima principal na produção de farinha de trigo, de mistura pré-preparada para panificação e de outros produtos.
Esclarece a consulente que, na tributação do imposto nas operações com o trigo e derivados, observa o
que predizem os arts. 117 a 123-C do Anexo I do RICMS-PA.
De fato, a consulente afirma que, além de pagar o ICMS-Importação, também é responsável pelo valor do imposto devido sobre as operações posteriores à venda de sua produção, cuja base de cálculo considera as parcelas descritas no art. 23 do RICMS à MVA de 120% (cento e vinte por cento), tendo, ao final, redução desta mesma base de cálculo, de modo a ter-se carga tributária de 7% (sete por cento), tudo conforme arts. 118 e 119 do Anexo I do Regulamento.
À guisa de exemplo, a consulente apresentou memória de cálculo com os seguintes números:
Valor da Operação | 1.000 |
17% por dentro | 1.204,82 |
BC Reduzida 41,1765% | 496,10 |
ICMS Importação 17% | 84,34 |
MVA 120% | 2.650,60 |
REDUÇÃO 41,1765% | 1.091,43 |
ICMS ST | 101,20 |
ICMS ST + IMP | 185,54 |
Contudo, a consulente diz ter tomado notícia de que o STF declarou inconstitucionais os incisos I e II do art. 118, o art. 119, o caput e os §§ 1º e 2º do art. 119-A, os artigos 119-C e 119 D, o caput, os incisos I, II e III do § 1º, os incisos I e II do § 2º e o § 3º do art. 120 e os artigos 122-A e 123-A, todos do Anexo I do RICMS- PA.
Porém, argumenta a consulente que a mencionada decisão do STF não alcançou os artigos 117 e 117-A do Anexo I do RICMS-PA, e estes estabelecem o regime de substituição tributária progressiva em face dos estabelecimentos industriais que adquirem trigo em grãos do Exterior.
Há mais: a consulente aduz que a decisão do Tribunal Excelso ainda não transitou em julgado pela
interposição de embargos de declaração, no qual se solicitou a modulação dos efeitos do acórdão.
Diante disso, a consulente compreende que deverá cumprir suas obrigações fiscais nas operações com o trigo na forma dos art. 117 a 123-C do RICMS-PA, seja por que:
1) a seu ver as regras do Capítulo XI do Anexo I do RICMS-PA ainda estão vigentes;2) a decisão do STF não atacou os artigos 117, 117-A e 120 do Anexo I do RICMS-PA;
3) o Estado do Pará terá que adequar sua legislação a nova realidade advinda com a declaração de
inconstitucionalidade; e
4) haverá necessidade de tempo para que contribuintes e Estado se adéqüem à outra sistemática de
tributação.
Por isso, a consulente sublinha que continuará a recolher, na qualidade de substituto tributário, o ICMS
devido na importação do Exterior do trigo em grãos, aos moldes do art. 117 e ss. do RICMS-PA, enquanto o Estado não editar outras normas para regular a questão.
Ao cabo a consulente solicita solução de consulta conforme transcrição abaixo:
Em resumo, requer a solução da presente consulta para espancar a dúvida da consulente acerca dos
procedimentos a serem seguidos para apuração e recolhimento do ICMS nas operações aqui referidas,
não sem antes emprestar-lhe os efeitos previstos pelo art. 57 da Lei n. 6.182, de 1998.
DA LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
Lei nº 6.182, de 30 de dezembro de 1998, que dispõe sobre os PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVO-TRIBUTÁRIOS do Estado do Pará e dá outras providências.
Regulamento do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS, denominado RICMS/PA, aprovado pelo Decreto n.º 4.676, 18 de junho de 2001.
Decreto nº 428, de 04 de dezembro de 2019, que dispõe sobre os procedimentos administrativos
relativos à Consulta Tributária.
DA MANIFESTAÇÃO
A Lei n.º 6.182/98, que regula os procedimentos administrativo-tributários no Estado do Pará, assegura ao sujeito passivo a formulação de consulta sobre a aplicação da legislação tributária, em relação a fato
concreto de seu interesse.
A mesma lei impõe ao consulente o atendimento dos requisitos do expediente previstos nos artigos 54 e 55 da referida lei de regência, no intuito de garantir o atendimento do pleito na forma de solução às questões provocadas.
Para melhor esclarecimento, trazemos à colação os preceptivos:
Art. 54. É assegurado ao sujeito passivo que tiver legítimo interesse o direito de formular consulta sobre
dispositivos da legislação tributária aplicados a fato concreto de seu interesse.
Parágrafo único.
Os órgãos da administração pública e as entidades representativas de categorias econômicas ou profissionais também poderão formular consulta.
Art. 55. A consulta será apresentada por escrito, na repartição fazendária que jurisdiciona o domicílio
tributário do sujeito passivo, e conterá:
I - a qualificação do consulente;
II - a matéria de fato e de direito objeto de dúvida, na seguinte forma:
a) exposição completa e exata da hipótese consultada, com a citação dos correspondentes dispositivos da legislação e a indicação da data do fato gerador da obrigação principal ou acessória, se já ocorrido;
b) informação sobre a certeza ou possibilidade de ocorrência de novos fatos geradores idênticos;
c) indicação, de modo sucinto e claro, da dúvida a ser dirimida.
III - a declaração de existência ou não de início de procedimento fiscal contra o consulente;
IV - o comprovante de recolhimento da taxa. (negritamos)
Posto isto, calha explicar que a consulta tributária não se confunde com o mero pedido de orientação.
Explique-se:
O pedido de orientação é formulado junto à Administração Tributária e visa a um esclarecimento no tocante a qualquer assunto que esteja gerando dúvida, podendo ser, ou não, dúvida na interpretação de dispositivo na legislação tributária.
Consiste de fato a orientação em dirimir dúvidas de caráter genérico ou concernentes a procedimentos
diversos e é prestada nos plantões fiscais e nos canais de atendimento ao contribuinte, de forma verbal
inclusive, sem seguir qualquer formalidade.
A consulta tributária, por seu turno, é feita sempre de forma solene e seu objeto é obrigatoriamente uma
dúvida na interpretação de dispositivo da legislação tributária, aplicada à situação concreta enfrentada pelo interessado, este último, o que a lei prevê.
No caso sob análise, a consulente, muito embora mencione que pontos da legislação lhe tem trazido
incertezas, não trouxe a exame circunstância alguma por ela já vivenciada, seja na circulação de
mercadorias ou na prestação de serviços, tributáveis pelo ICMS; pelo contrário, tão somente pede,
genericamente, esclarecimentos acerca dos procedimentos a serem adotados para a tributação das
operações com trigo, não havendo, pois, fato concreto praticado pela contribuinte, merecedor de análise a luz do instituto da consulta tributária.
À guisa de reforço, veja-se o que prediz o § 1º do art. 1º do Dec. 428/19 com os devidos destaques:
Art. 1º A Consulta Tributária é modalidade de processo administrativo em que o sujeito passivo apresenta, à autoridade competente, dúvida sobre dispositivos da legislação tributária aplicados a fato concreto de seu interesse.
§ 1º Entende-se por fato concreto o evento ocorrido, a operação ou a prestação já iniciados, ainda
que não concluídos, realizados pelo sujeito passivo, observadas as disposições específicas de
cada tributo.
Ao cabo, outra não pode ser a sugestão a ser apontada neste parecer senão opinar que a consulta seja
declara ineficaz pela falta de fato concreto praticado pela consulente, o que demonstra desacordo com o art. 55 da L. 6.182/98. Para tanto, vejamos o que diz o art. 58 da citada lei:
Art. 58. A consulta será declarada ineficaz e arquivada de plano quando:
I - formulada em desacordo com o previsto nos arts. 54 e 55;
II - contiver dados inexatos ou inverídicos ou, ainda, quando o fato for definido como crime ou contravenção penal;
III - que seja meramente protelatória, assim entendida a que verse sobre disposições claramente
expressas na legislação tributária ou sobre questão de direito já resolvida por decisão administrativa
definitiva, publicada antes da apresentação da consulta
IV - formulada após o início de procedimento fiscal.
V - o fato houver sido objeto de solução anterior proferida em consulta em que tenha sido parte o
consulente, e cujo entendimento por parte da administração não tenha sido alterado por ato
superveniente;
VI - a matéria tiver sido objeto de decisão proferida em processo administrativo já findo, de interesse do
consulente;
VII - não descrever, completa e exatamente, a hipótese a que se referir ou não contiver os elementos
necessários à sua solução, salvo se a inexatidão ou omissão for escusável, a critério da autoridade
consultada;
VIII - o sujeito passivo tiver sido comunicado a observar obrigação relativa a fato objeto da consulta.
(destacamos)
Apenas, em se fugindo um pouco ao que de rotina desta CCOT em razão da gravidade que o assunto pede, se pedirá vênia para esclarecer os últimos andamentos da ADI 4679, na qual o STF declarou parcialmente inconstitucional o Capítulo XI do Anexo I do RICMS-PA, quais sejam:
1) O embargos de declaração já foram apreciados pela STF e decidiu-se que os efeitos da decisão serão ex nunc, ou seja, a partir de 21.06.2021; e
2) O acórdão transitou em julgado em 22.09.2021.
Para fins de comprovação, juntaram-se acórdão e certidão do sítio eletrônico do Supremo Tribunal Federal.
No mais, tem-se a dizer à consulente, sem afastar a necessária orientação junto ao setor fazendário de seu domicílio tributário, que:
1) não poderá tributar suas operações à luz dos dispositivos do Capítulo XI do Anexo I do RICMS-PA
declarados inconstitucionais, devendo observar para cada caso as regras gerais de substituição tributária e antecipação do imposto, assim como alíquotas, margem de valor agregado e tutti quanti presentes do
RICMS-PA;
2) Os dispositivos do Capítulo XI do Anexo I do RICMS-PA que não foram declarados inconstitucionais ainda se encontram vigentes e podem seu aplicados desde que não dependam de forma única e indissociável dos artigos cuja inconstitucionalidade foi declarada pelo STF;
3) O que foi acima orientado não tem efeitos de consulta por não haver caso concreto no expediente, apto a produzir solução de consulta.
É o parecer técnico produzido com base no art. 8º do Dec. 428/19.
Belém (PA), 24 de novembro 2021.
ANTÔNIO MANOEL DE SOUZA JÚNIOR, AFRE - Cédula de Consulta e Orientação Tributária DO DESPACHO DENEGATÓRIO
Por estar-se de acordo com o parecer da CCOT, declara-se por meio deste despacho a ineficácia da
consulta tributária, com base no art. 58, III, da L. 6.182/98. Notifique-se a consulente. Após, encaminhe-se o expediente à CEEAT de seu domicílio tributário para arquivamento do feito.
ANDRÉ CARVALHO SILVA, Diretor de Tributação, e.e.