Publicado no DOE - PA em 14 ago 2024
O produtor rural que industrializa e comercializa produtos derivados com habitualidade ou volume que indique atividade empresarial, reunidos os seus elementos caracterizadores, é equiparado a pessoa jurídica contribuinte do ICMS e obrigado a se inscrever no cadastro estadual na condição normal e as respectivas obrigações tributárias, conforme art. 34 da Lei n.º 5.530/89 e arts. 540, inciso II, e 542, inciso I, do RICMS/PA.
ASSUNTO: O produtor rural que industrializa e comercializa produtos derivados com habitualidade ou volume que indique atividade empresarial, reunidos os seus elementos caracterizadores, é equiparado a pessoa jurídica contribuinte do ICMS e obrigado a se inscrever no cadastro estadual na condição normal e as respectivas obrigações tributárias, conforme art. 34 da Lei n.º 5.530/89 e arts. 540, inciso II, e 542, inciso I, do RICMS/PA.
DA CONSULTA
A consulente acima identificada é pessoa física situada em Castanhal/PA, que atua na produção rural de queijo (NCM 0406.10.90), manteiga (NCM 0405.10.00) e iogurte (NCM 0403.10.00) e na comercialização dessas mercadorias em operações internas e interestaduais com destino a contribuintes do ICMS.
Questiona, nesse contexto, qual a alíquota a ser aplicada e quais as obrigações acessórias a serem cumpridas com seus respectivos embasamentos legais. E, se ao industrializar tais produtos primários e comercializá-los, seria equiparado a contribuinte do ICMS.
LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
➢ Lei Complementar n.º 87, de 13 de setembro de 1996, que dispõe sobre o imposto dos Estados e do Distrito Federal sobre operações relativas à circulação de mercadorias e
sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, e dá outras providências. (LEI KANDIR)
➢ Lei n.º 5.530, de 13 de janeiro de 1989, que disciplina o ICMS, e dá outras providências;
➢ Lei n.º 6.182, de 30 de dezembro de 1998, que dispõe sobre os PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVO-TRIBUTÁRIOS do Estado do Pará e dá outras providências.
➢ Decreto nº 428, de 04 de dezembro de 2019, que dispõe sobre os procedimentos administrativos relativos à Consulta Tributária.
MANIFESTAÇÃO
A Lei nº 6.182/98, que regula os procedimentos administrativo-tributários no Estado do Pará, assegura ao sujeito passivo a formulação de consulta sobre a aplicação da legislação tributária, em relação a fato concreto de seu interesse.
A mesma lei impõe ao interessado obediência aos requisitos previstos nos artigos 54 e 55 da referida lei de regência, no intuito de garantir o atendimento do pleito na forma de solução às questões provocadas.
Inobstante o direito assegurado, tem-se que no presente caso a consulta sob exame não deve produzir os efeitos legais do art. 57 da mesma lei de procedimentos, pois não contém fato concreto, conforme determina o disposto no art. 58, inciso I, da referida Lei. Entende-se por fato concreto o evento ocorrido, a operação ou a prestação já iniciada, ainda que não concluídos, realizados pelo sujeito passivo, observadas as disposições específicas de cada tributo (art. 1º, § 1º, Decreto nº 428/19).
Para melhor esclarecimento, traz-se à baila os aludidos articulados:
Art. 54. É assegurado ao sujeito passivo que tiver legítimo interesse o direito de formular consulta sobre a aplicação da legislação tributária, em relação à fato concreto de seu interesse.
[...]
Art. 55. A consulta será apresentada por escrito, na repartição fazendária que jurisdiciona o domicílio tributário do sujeito passivo, e conterá:
I - a qualificação do consulente;
II - a matéria de fato e de direito objeto de dúvida;
III - a data do fato gerador da obrigação principal ou acessória, se já ocorrido;
IV - a declaração de existência ou não de início de procedimento fiscal contra o consulente.
[...]
Art. 57. A consulta produz os seguintes efeitos, exclusivamente em relação à matéria consultada:
I - suspende o curso do prazo de recolhimento dos tributos não-vencidos à data em que for formulada;
II - adquire o caráter de denúncia espontânea em relação a débito vencido até a data da ciência de sua solução pelo sujeito passivo, desde que, no prazo de trinta dias da data da intimação da solução, o sujeito passivo adote as demais providências previstas no art. 7º;
III - exclui a punibilidade do consulente, no que se refere a infrações meramente formais;
IV - impede ação fiscal a partir da apresentação da consulta até trinta dias da data da ciência.
[...]
Art. 58. Não produzirão os efeitos previstos no artigo anterior a consulta:
[...]
I - formulada em desacordo com o previsto nos arts. 54 e 55; (grifo nosso)
Por outro lado, o Decreto nº 428/19 dispõe que a consulta declarada ineficaz não prejudica a informação dos dispositivos da legislação que disponham expressamente sobre o assunto consultado, a seguir:
Art. 12. A consulta será declarada ineficaz e arquivada de plano quando:
I - formulada em desacordo com o previsto neste Decreto;
III - seja meramente protelatória, assim entendida a que verse sobre disposições claramente expressas na legislação tributária ou sobre questão de direito já resolvida por decisão administrativa definitiva, publicada antes da apresentação da consulta;
[...]
§ 2º A declaração de ineficácia de que trata o inciso III do caput deste artigo não retira a obrigação de informar os dispositivos da legislação que disponham expressamente sobre o assunto consultado. (grifo nosso)
No mérito, a Lei Complementar nº 87/96 define como contribuinte do ICMS qualquer pessoa, física ou jurídica, que realize, com habitualidade ou em volume que caracterize intuito comercial, operações de circulação de mercadoria ou prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior (art. 4º).
Tal preceito foi devidamente reproduzido na legislação tributária do Estado do Pará, especificamente no art. 34 da Lei n.º 5.530/89, in verbis:
Art. 34. Contribuinte é qualquer pessoa, física ou jurídica, que realize, com habitualidade ou em volume que caracterize intuito comercial, operações de circulação de mercadoria ou prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior. (grifo nosso)
Nessa linha de pensamento, a categorização de pessoa natural ou jurídica como contribuinte do ICMS obedece a critério objetivo. Dito de outra maneira, necessário e suficiente é a ocorrência do fato imponível, apto a ensejar a exigência tributária desse imposto, seja pela circulação de mercadorias ou pela prestação de serviços de transporte interestadual ou intermunicipal ou de comunicação.
Portanto, o sujeito passivo direto do ICMS será aquele que, independentemente da condição pessoal do agente, pratique, com habitualidade e intuito comercial, qualquer uma das hipóteses de incidência previstas ex lege. Noutras palavras: contribuinte é aquele que pratica o fato gerador descrito na lei de regência.
Nesse diapasão, o RICMS-PA, editado com o desiderato de permitir a fiel execução da lei, resolveu detalhar o conceito de contribuinte do ICMS, contido em seu artigo 14, que nada mais faz do que reproduzir, in totum, o caput do art. 34 da Lei n.º 5.530/89.
Para tal pretensão, o Poder Regulamentar inclui, logo abaixo do indigitado art. 14 do RICMS-PA, o § 1º, que, de forma exemplificativa, em seus incisos I a XIV, elencou determinadas pessoas, naturais ou jurídica, que, em razão das atividades que realizam, estão na condição de potenciais contribuintes do ICMS, dentre as quais se inclui o produtor rural:
Art. 14. Contribuinte é qualquer pessoa, física ou jurídica, que realize, com habitualidade ou em volume que caracterize intuito comercial, operações de circulação de mercadoria ou prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior.
§ 1º São contribuintes do imposto:
I - o industrial e o comerciante de mercadoria, o produtor rural, o gerador de energia elétrica e o extrator de substâncias vegetais, animais ou minerais; (grifo nosso)
Logo, o produtor rural, na hipótese em que praticar, com habitualidade ou em volume que indique intuito comercial, operações de circulação de mercadorias, será enquadrado como contribuinte do ICMS, sujeito, assim, ao pagamento desse imposto e, quando a norma assim exigir, ao cumprimento das obrigações acessórias, previstas na legislação tributária.
Frise-se que a classificação do produtor rural como contribuinte do imposto não leva em consideração se o mesmo está inscrito, ou não, nos cadastros de contribuintes do ICMS do Estado do Pará, pois essa exigência é feita pela Fazenda Pública apenas para fins de controle e cumprimento de obrigações acessórias e se dá em face de alguns produtores rurais que se encontram em situações específicas, disciplinadas no RICMS-PA, vide arts. 540 e 542, litteris:
Art. 540. O produtor e o extrator vegetal e animal equiparam-se a comerciante ou a industrial, quando:
I - constituídos como pessoas jurídicas;
II - equiparados à pessoa jurídica;
III - promoverem saída interestadual de mercadoria com o fim específico de exportação.
[...]
Redação original, efeitos até 31.01.24
Art. 542. Os produtores rurais e os extratores, quando equiparados a comerciantes ou industriais:
I - devem inscrever-se no Cadastro de Contribuintes do ICMS, na condição de contribuinte normais;
II - estão sujeitos à emissão de documentos fiscais, de acordo com as operações que realizarem. (grifo nosso)
Com efeito, em se entendendo que a classificação ou não do produtor rural como contribuinte do imposto está sujeita à análise da operação por ele praticada.
Na toada do critério objetivo, é válido observar o que o direito comercial brasileiro qualifica a empresa por meio de elementos caracterizadores de organicidade, profissionalidade e economicidade, visando o lucro, no exercício de sua atividade.
“a terceira fase originando-se novos contornos do direito mercantil, também se percebe que nem todos podem ser denominados de comerciantes, já que para a caracterização dos atos de comércio, a identificação do sujeito das normas do direito comercial se dá em função das atividades por ele exercida
[...]
[...] o Direito Privado brasileiro situa-se numa fase de transição entre a teoria dos atos de comércio e a teoria jurídica de empresa, isto é, está sofrendo uma vasta reavaliação na atividade econômica, que determina um ordenamento próprio para a empresa, sob a representação do empresário, da atividade exercida – que para a qualificação dessa, é fundamental a inserção de elementos como a organicidade, a profissionalidade, e a economicidade – e do estabelecimento, tendo, por consequência, a excelência de atravessar para o plano jurídico o âmbito socioeconômico da empresa que se faz vigente no ordenamento. (SASSO, 2011)”
In casu, os produtos queijo (NCM 0406.10.90), manteiga (NCM 0405.10.00) e iogurte (NCM 0403.10.00) são industrializados bem como comercializados pela requerente a partir de insumos primários em escala comercial. Sua inscrição no cadastro de contribuintes do ICMS (IE 15.236.043-3) foi efetuada no ano de 2004, atualmente em situação ativa, caracterizando-se assim habitualidade.
Dessa forma, uma vez equiparada a contribuinte do ICMS, a requerente deve observância à legislação tributária correspondente ao regime normal.
É a manifestação.
DA SOLUÇÃO
Passados os esclarecimentos, responde-se em ordem didática os quesitos formulados pela requerente como segue:
“3) O produtor rural que realizar industrialização de produtos primários e o comércio desses produtos, equipara-se a contribuinte do ICMS, tornando-se assim obrigado a cumprir todas as obrigações tributárias e acessórias ao mesmo?”
Resposta: Sim, o produtor rural situado no Estado paraense que industrializa e comercializa queijo (NCM 0406.10.90), manteiga (NCM 0405.10.00) e iogurte (NCM 0403.10.00) com destino a contribuintes do ICMS, com habitualidade ou volume equipara-se a pessoa jurídica e a contribuinte do ICMS, conforme art. 34 da Lei n.º 5.530/89 e arts. 14, § 1º, inciso I, e 540 do RICMS/PA.
“2) as obrigações acessórias pertinentes a sua atividade a serem cumpridas pelo contribuinte e a base legal da operação tributária;”
Resposta: Os produtores rurais e os extratores, quando equiparados a comerciante ou industrial, devem se inscrever no Cadastro de Contribuintes do ICMS, na condição de contribuinte normais e estão sujeitos à emissão de documentos fiscais, de acordo com as operações que realizarem, internas ou interestaduais (art. 542, I e II, do RICMS/PA).
“1) Solicitamos a alíquota a ser empregada na tributação;”
Resposta: Alíquota de 19% nas suas vendas internas de queijo (NCM 0406.10.90), manteiga (NCM 0405.10.00) e iogurte (NCM 0403.10.00), nos moldes do art. 12, inciso VII, da Lei nº 5.530/89 e do art. 20, inciso VII, do Decreto nº 4.676/01, observado o seu Anexo XIII (ST interna), e de 12% nas suas vendas interestaduais, conforme art. 21, inciso I, “a”, do Decreto nº 4.676/01, e sem prejuízo das demais obrigações tributárias, sobretudo do diferimento do ICMS incidente sobre as aquisições de seus eventuais fornecedores, art. 714, § 1º, II, do RICMS/PA.
É a manifestação que submetemos para apreciação superior. S.M.J, a título de orientação, cujo conteúdo não produz os efeitos da consulta tributária previstos no art. 57 da Lei Estadual nº 6.182/98, forte no art. 54 da mesma lei e no art. 1º, § 1º, Decreto nº 428/19.
Belém (PA), 2 de abril de 2024.
EDUARDO TETSUO AMEKU AFRE – CCOT/DTR
De acordo com a manifestação do Ilmo. AFRE, que tem status de parecer técnico nos termos do art. 8º do Dec. 428/19.
À consideração da Titular da DTR.
ANDRÉ CARVALHO SILVA, Coordenador da CCOT;
Em juízo de Admissibilidade, motivado pelas razões de fato e de direito explanadas pela Célula de Consulta e Orientação Tributária, descaracteriza-se a petição como processo administrativo de consulta tributária, em razão de sua ineficácia, e recomenda-se, após a notificação do interessado, o encaminhamento do feito para a CERAT- Castanhal para arquivamento do expediente, em obediência ao art. 58, I, da Lei n.º 6.182/98 c/c art. 13 do Dec. 428/19.
SIMONE CRUZ NOBRE Diretora de Tributação