Parecer Técnico Nº 8 DE 22/04/2022


 Publicado no DOE - PA em 22 abr 2022


Consulta tributária. ICMS. Prestação de serviço de transporte. Transporte de carga própria. Arrendamento. Matéria expressamente disposta na legislação. Descaracterização como processo de consulta.


Impostos e Alíquotas

ASSUNTO: Consulta tributária. ICMS. Prestação de serviço de transporte. Transporte de carga própria. Arrendamento. Matéria expressamente disposta na legislação. Descaracterização como processo de consulta.

PEDIDO

O consulente, acima identificado, pessoa jurídica de direito privado, por meio do seu representante legal que subscreve, pleiteia a solução em forma de consulta quanto a interpretação correta da legislação tributária, no tocante ao transporte de carga própria por meio de arrendamento, pelos fatos e fundamentos a seguir indicados:

1- A Consulente comumente utiliza sua frota própria para realizar a coleta de suas aquisições de matéria prima (couro em estado verde), na rota entre os municípios de Castanhal e Xinguara, ambos no Estado.

2- Relata que no dia 06/12/21 ao passar pelo posto de fiscalização local apresentou contrato de arrendamento e nota fiscal do produto transportado para fins de comprovação do transporte de carga própria. Ocorre, que ainda assim, a autoridade fiscal plantonista descaracterizou o veículo como próprio pelo fato do documento está em nome da matriz da empresa estabelecida no Paraná, gerando um CT-e avulso, bem como o débito do ICMS para a operação de transporte de carga contra o proprietário do documento do veículo (Durlicouros Paraná).

3- Em sua petição, a Consulente entende que:

a) De acordo com a ANTT (Agência Nacional de Transporte Terrestre), a operação apresentada corresponde a um transporte de carga própria conforme Resolução ANTT nº 4799/2015 que no seu Capítulo I parágrafo XVII:

XVII - transporte de carga própria: transporte não remunerado, realizado por pessoa física ou jurídica, efetuado com veículos de sua propriedade ou na sua posse, e que se aplique exclusivamente a cargas para consumo próprio ou distribuição dos produtos por ela produzidos ou comercializados;

b) De acordo com o RICMS/PA a operação é caracterizada por carga própria conforme art. 576 § 2º:

§ 2º Entende-se por transporte de carga própria, aquele realizado por uma das pessoas envolvidas na operação mercantil, podendo haver cobrança ou não do frete no caso de transporte realizado pelo remetente.

c) Por se tratar de carga própria, acompanhada de nota fiscal correspondente, não há incidência de imposto sobre essa operação conforme o que dita o capítulo III (da não incidência) no artigo 5º do RICMS:

Art. 5º O imposto não incide sobre:

XI - o transporte de carga própria, desde que acompanhada de Nota Fiscal correspondente e que se comprove tratar-se de veículo próprio ou locado, observado o disposto no § 3º do art. 576;

d) A mesma possui um contrato de arrendamento do veículo entre sua matriz e filial, o qual foi apresentado ao Ilustríssimo fiscal no posto da 2ª região, conforme rege o artigo 576, dispensando a emissão de CTE (conhecimento de transporte eletrônico) e consequentemente a arrecadação do ICMS.

Art. 576. A Nota Fiscal que acobertar a circulação da mercadoria, na hipótese de carga própria, servirá também para documentar o transporte de mercadoria:

I - efetuado pelo remetente ou adquirente, em veículo próprio, locado ou arrendado;

e) A ANTT veda a cobrança de frete ou qualquer valor remunerado que caracterize remuneração pelo transporte, reforçando o entendimento de nossa operação (art. 5º da resolução ANTT nº 4799/2015.

Art. 5º O transportador que detenha propriedade ou posse de veículo automotor de carga registrado no órgão de trânsito na categoria "particular" será considerado como Transportador de
Carga Própria - TCP.

§ 1º É vedada ao TCP a cobrança de frete ou de qualquer valor discriminado que caracterize a remuneração pelo transporte.

f) Afirma que não houve cobrança de frete nem pelo remetente nem pelo destinatário, alcançando uma vez mais a não incidência conforme previsto no § 3º do art. 576:

§ 3º Não incide o ICMS no caso de transporte de carga própria, exceto se houver cobrança, pelo remetente, de frete ou qualquer despesa acessória do adquirente da mercadoria, hipótese em que o valor cobrado integrará a base de cálculo da operação.

Sendo assim, com base nas evidências apresentadas, a empresa Durlicouros entende estar de acordo com a legislação vigente, tanto no âmbito regulatório (ANTT), quanto no âmbito legal perante o estado do Pará (RICMS/PA).

Dessa forma, o consulente através da presente consulta questiona:

De acordo com nosso entendimento a cobrança supracitada, embora recolhida é indevida, portanto, solicitamos um esclarecimento sobre o aceite do contrato de arrendamento celebrado entre a matriz e filial que justifica e embasa a não incidência do ICMS nesta operação de transporte de carga própria.

LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

- Lei n.º 6.182, de 30 de dezembro de 1998, que dispõe sobre os PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVO-TRIBUTÁRIOS do Estado do Pará e dá

- outras providências.

- Decreto nº 428, de 04 de dezembro de 2019, que dispõe sobre os procedimentos administrativos relativos à Consulta Tributária.

- Regulamento do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS, denominado RICMS/PA, aprovado pelo Decreto n.º 4.676, 18 de junho de 2001.

MANIFESTAÇÃO

A Lei n.º 6.182/98, que regula os procedimentos administrativo-tributários no Estado do Pará, assegura ao sujeito passivo a formulação de consulta sobre a aplicação da legislação tributária, em relação a fato concreto de seu interesse.

A mesma lei impõe ao consulente o atendimento dos requisitos do expediente previstos nos artigos 54 e 55 da referida lei de regência, no intuito de garantir o atendimento do pleito na forma de solução às questões provocadas.

Para melhor esclarecimento, trazemos à colação os preceptivos:

Art. 54. É assegurado ao sujeito passivo que tiver legítimo interesse o direito de formular consulta sobre dispositivos da legislação tributária aplicados a fato concreto de seu interesse.

Parágrafo único. Os órgãos da administração pública e as entidades representativas de categorias econômicas ou profissionais também poderão formular consulta.

Art. 55. A consulta será apresentada por escrito, na repartição fazendária que jurisdiciona o domicílio tributário do sujeito passivo, e conterá:

I - a qualificação do consulente;

II - a matéria de fato e de direito objeto de dúvida, na seguinte forma:

a) exposição completa e exata da hipótese consultada, com a citação dos correspondentes dispositivos da legislação e a indicação da data do fato gerador da obrigação principal ou acessória, se já ocorrido;

b) informação sobre a certeza ou possibilidade de ocorrência de novos fatos geradores idênticos;

c) indicação, de modo sucinto e claro, da dúvida a ser dirimida.

III - a declaração de existência ou não de início de procedimento fiscal contra o consulente;

IV - o comprovante de recolhimento da taxa. (negritamos)

Nesse sentido, cumpre esclarecer que a consulta tributária não se confunde com um mero pedido de orientação. Pois senão vejamos:

O pedido de orientação é formulado junto à Administração Tributária e visa a um esclarecimento no tocante a qualquer assunto que esteja gerando dúvida, podendo ser, ou não, dúvida na interpretação de dispositivo na legislação tributária.

Consiste de fato a orientação em dirimir dúvidas de caráter genérico ou concernentes a procedimentos diversos e é prestada nos plantões fiscais e nos canais de atendimento ao contribuinte, de forma verbal inclusive, sem seguir qualquer formalidade.

A consulta tributária, por seu turno, é feita sempre de forma solene e seu objeto é obrigatoriamente uma dúvida na interpretação de dispositivo da legislação tributária, aplicado a situação concreta enfrentada pelo interessado, este último, o que a lei prevê.

Nesse sentido, prevê o § 1º do art. 1º do Dec. 428/19:

§ 1º Entende-se por fato concreto o evento ocorrido, a operação ou a prestação já iniciados, ainda que não concluídos, realizados pelo sujeito passivo, observadas as disposições específicas de cada tributo.

No caso sob análise, a consulente traz a exame circunstância já vivenciada por ela, devidamente comprovada por meio dos documentos anexados aos autos, contudo, o assunto trazido no expediente está expressamente disposto na legislação tributária deste Estado, o que, por si só, obriga este setor consultivo a sugerir a declaração de ineficácia da consulta, com base no inc. III do art. 58 da L. 6.182/98:

Art. 58. A consulta será declarada ineficaz e arquivada de plano quando:

I - formulada em desacordo com o previsto nos arts. 54 e 55;

I I- contiver dados inexatos ou inverídicos ou, ainda, quando o fato for definido como crime ou contravenção penal;

III - que seja meramente protelatória, assim entendida a que verse sobre disposições claramente expressas na legislação tributária ou sobre questão de direito já resolvida por decisão administrativa definitiva, publicada antes da apresentação da consulta;

IV - formulada após o início de procedimento fiscal.

V - o fato houver sido objeto de solução anterior proferida em consulta em que tenha sido parte o consulente, e cujo entendimento por parte da administração não tenha sido alterado por ato superveniente;

VI - a matéria tiver sido objeto de decisão proferida em processo administrativo já findo, de interesse do consulente;

VII - não descrever, completa e exatamente, a hipótese a que se referir ou não contiver os elementos necessários à sua solução, salvo se a inexatidão ou omissão for escusável, a critério da autoridade consultada;

VIII- o sujeito passivo tiver sido comunicado a observar obrigação relativa a fato objeto da consulta. (destacamos)

Contudo, em razão do que prediz o § 2º do art. 12 do Dec. 428/19, esta CCOT tem a informar que a matéria em questão está expressamente prevista nos art. 5º inc. XI, e nos arts. 575 e 576, todos do RICMS, sendo que, inclusive, a própria Consulente transcreveu dois desses dispositivos em sua petição:

Art. 5º O imposto não incide sobre:

...................................................

XI - o transporte de carga própria, desde que acompanhada de Nota Fiscal correspondente e que se comprove tratar-se de veículo próprio ou locado, observado o disposto no § 3º do art. 576;

...................................................

Art. 575. Considera-se, para efeito deste Regulamento, veículo próprio aquele em que o possuidor detenha a propriedade plena do veículo, comprovada esta mediante a apresentação do Certificado de Registro e Licenciamento de Veículo,ou equivalente, bem como o veículo locado ou arrendado em que o locatário tenha a posse contínua do veículo e possa utilizá-lo, como próprio, durante a vigência do contrato.

Parágrafo único. Para os efeitos do caput, além das exigências nele previstas, será observado que:

I - o veículo seja explorado, exclusivamente, pelo contratante;

II - toda e quaisquer despesas, obrigações e encargos referentes aos bens transportados, bem como a manutenção, revisão, combustível dos veículos afretados, direitos trabalhistas dos empregados envolvidos no transporte sejam de exclusiva responsabilidade do locatário ou arrendatário.

...................................................

Art. 576. A Nota Fiscal que acobertar a circulação da mercadoria, na hipótese de carga própria, servirá também para documentar o transporte de mercadoria:

I - efetuado pelo remetente ou adquirente, em veículo próprio, locado ou arrendado;

II - para vendas fora do estabelecimento em veículo do próprio remetente.

§ 1º Nas hipóteses deste artigo, na Nota Fiscal relativa à circulação das mercadorias ou bens, além das demais exigências regulamentares, devem constar:

I - os dados do veículo transportador;

II - a expressão: “Transporte de carga própria”.

§ 2º Entende-se por transporte de carga própria, aquele realizado por uma das pessoas envolvidas na operação mercantil, podendo haver cobrança ou não do frete no caso de transporte realizado pelo remetente.

§ 3º Não incide o ICMS no caso de transporte de carga própria, exceto se houver cobrança, pelo remetente, de frete ou qualquer despesa acessória do adquirente da mercadoria, hipótese em que o valor cobrado integrará a base de cálculo da operação.

Deveras, fica claramente demonstrado, pela legislação ao norte mencionada, que considera-se transporte de carga própria a prestação de serviço de transporte realizada
por meio de veículo arrendando por transportador, observado os requisitos regulamentares.

Por fim, cumpre destacar, que não cabe ao órgão de tributação desta Secretaria de Estado da Fazenda o aceite de contrato de arrendamento celebrado pela Consulente ou qualquer contribuinte, devendo a mesma comprovar tal situação no caso concreto no exercício de suas atividades. Sendo que, caso entenda que no exercício de suas atividades esteja sofrendo cobrança indevida do ICMS, esclarecemos que a legislação tributária estadual possui instrumentos que garantem o contraditório e ampla defesa ao contribuinte dos tributos estaduais, entre eles, o da impugnação, prevista na própria Lei 6.182/98.

Dessa forma, pelas razões de fato e de direito expostas acima, o expediente não apresenta elementos suficientes e bastantes, aptos a impor o dever de emissão de parecer para fins de solução de consulta tributária, de modo que não cabe outra opinião a não ser a de sugerir que o feito seja declarado ineficaz, por força do art. 58, III, da Lei 6.182/98, sem prejuízo de formulação de novo processo sobre o mesmo assunto, desde que sanados os vícios que lhe deram causa, observados os demais requisitos legais (Dec. 428/19, art. 12, § 3º).

Assim, explanada a compreensão da CCOT sobre o assunto trazido a exame, deve ser observado o procedimento previsto no art. 13 do Dec. 428/19, que assim reza:

"descaracterizada a petição, com despacho denegatório de sua admissibilidade, como expediente de consulta, o interessado será notificado e o processo arquivado".

É o parecer técnico redigido na forma do art. 8º do Dec. 428/19, o qual submetemos para apreciação superior. S.M.J.

Belém (PA), 09 de fevereiro de 2022.

ANTONIO MANOEL DE SOUZA JUNIOR,AFRE

DESPACHO DENEGATÓRIO

Com base no parecer técnico da CCOT, fica descaraterizada a petição da interessada e denegada a admissibilidade dela como consulta tributária, extando assim ineficaz, forte no inc. III do art. 58 da L.

6.182/98. Notifique-se a interessada. Após, encaminhe-se o feito à CERAT/CEEAT para arquivamento.

ANDRÉ CARVALHO SILVA, Diretor de Tributação, em exercício