Resolução de Consulta COPAT Nº 45 DE 22/05/2025


 Publicado no DOE - SC em 26 mai 2025


ICMS. Apropriação de créditos do imposto na prestação de serviço de transporte internacional. Impossibilidade. Hipótese que não se encontra sujeita à competência tributária dos estados.


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DA CONSULTA

Trata-se de consulta na qual a Consulente, cuja atividade principal é o “transporte rodoviário de carga, declara que presta serviços de transporte destinados ao exterior. Além disso, informa que presta serviços de transporte internos, sendo detentora do Tratamento Tributário Diferenciado (TTD) 1030, que confere aos prestadores de serviços de transporte o direito de se creditar do imposto incidente sobre a entrada de combustíveis, lubrificantes, aditivos, fluídos, pneus, câmaras de ar e peças de reposição, efetivamente utilizados na prestação de serviço de transporte em que o estado de Santa Catarina seja o sujeito ativo.

Diante dos fatos narrados, direciona a esta Comissão os seguintes questionamentos:

“a) poderá se creditar dos insumos utilizados na prestação de fretes internacionais, conforme previsto no § 8º do art. 29 do RICMS/SC-01?

b) no que se refere ao estorno do crédito de que trata o inciso XIII do art. 5º do Anexo 2 do RICMS/C-01, seriam os fretes internacionais considerados como serviços tributados?”

É o Relatório. Passo à análise.

LEGISLAÇÃO

RICMS/SC, art. 1º, II; art. 6º,

RICMS/SC, art. 6º, II c/c §§ 1º e 2º;

RICMS/SC, art. 29, § 8º;

RICMS/SC, art. 36, I;

RICMS/SC, Anexo 2, art. 5º, XIII.

FUNDAMENTAÇÃO

Primordialmente, cabe destacar que a Constituição da República, ao dispor sobre o Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS), estabelece sua não incidência sobre operações com mercadorias ou prestação de serviços destinados ao exterior.

Vejamos:

“Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:

(...)

II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;

(...)

§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:

(...)

X - não incidirá:

(...)

a) sobre operações que destinem mercadorias para o exterior, nem sobre serviços prestados a destinatários no exterior, assegurada a manutenção e o aproveitamento do montante do imposto cobrado nas operações e prestações anteriores;

(...)” (grifo nosso)

Em análise dos dispositivos acima, verifica-se que o legislador constitucional buscou não apenas (i) excluir a incidência do imposto nas operações com mercadorias e nas prestações de serviços com destino ao exterior, desonerando as exportações brasileiras (regra reproduzida no art. 6º do Regulamento do ICMS – RICMS/
SC-01), como, igualmente, (ii) possibilitar a manutenção, em tais casos, dos créditos do imposto referentes às etapas anteriores da cadeia produtiva (regra reproduzida no parágrafo único do art. 35 do RICMS/SC-01).

Nesse contexto, registra-se que a não incidência tributária acima descrita caracteriza hipótese de imunidade, instituto jurídico-tributário amplamente discutido na doutrina constitucional, podendo ser conceituado nos seguintes termos:

“é o obstáculo decorrente de regra da Constituição à incidência de regra jurídica de tributação. O que é imune não pode ser tributado. A imunidade impede que a lei defina como hipótese de incidência tributária aquilo que é imune. É limitação de competência” ( MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. São Paulo: Malheiros, 1995. p. 190.) (grifo nosso)

“são as vedações absolutas ao poder de tributar certas pessoas (subjetivas) ou certos bens (objetivas) e, às vezes, uns e outras. Imunidades tornam inconstitucionais as leis ordinárias que as desafiam” (BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1996. p. 82.)

“é o impedimento constitucional absoluto à incidência da norma tributária, pois restringe as dimensões do campo tributário da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. (...) Além disso, as imunidades tributárias não se confundem com a possibilidade de os entes federativos concederem isenções, que correspondem à dispensa de pagamento do tributo por expressa disposição legal e não constitucional. (...) Observe-se, porém, que há pontos em comum entre imunidades tributárias e isenções, pois, conforme ensina Regina Helena Costa, 1) ambas são regras de estrutura, que estabelecem a incompetência para tributar; 2) são, em consequência, regras parciais, de exceção, que só fazem sentido em combinação com a norma atributiva de competência tributária – no caso de imunidade – e da hipótese de incidência tributária – no caso de isenção; 3) podem ter por objeto quaisquer espécies tributárias; 4) são justificadas pela perseguição de fins constitucionais”.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. Barueri: Atlas, 2024. p. 977 e ss.) (grifo nosso)

Em colação dos ensinamentos destacados acima, é possível concluir que a imunidade tributária, enquanto instituto jurídico que exclui, constitucionalmente, a competência de ente federativo para instituir e cobrar o tributo, pressupõe a existência de tal competência para sua aplicação. Dito de outra forma, não se revela passível de exclusão aquilo que não existe. Por conseguinte, entende-se que não há aplicação de imunidade se o ente federativo sequer possui competência para tributar a hipótese protegida pelo instituto.

Realizados tais esclarecimentos iniciais, cabe destacar que o art. 1º do Regulamento do ICMS (RICMS/SC-01), em reprodução de dispositivos da Lei nº 10.297, de 26 de dezembro de 1996, e da Constituição da República, estabelece as hipóteses de incidência do imposto nos seguintes termos:

“Art. 1º O imposto tem como fato gerador:

(...)

II - prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal, por qualquer via, de pessoas, bens, mercadorias ou valores;

(...)” (grifo nosso)

Em análise do dispositivo acima, constata-se, de plano, que constitui hipótese de incidência do ICMS a prestação de serviços de transporte intermunicipal e interestadual. Por consequência, a prestação de serviços de transporte destinados ao exterior encontrar-se-ia, em razão do silêncio constitucional, à margem da competência tributária das Unidades da Federação, não se submetendo à tributação pelo referido imposto.

Considerando que a prestação de serviços não tributados não confere, a priori, direito à apropriação de créditos de ICMS, não há que se falar em tal apropriação na hipótese de insumos utilizados em fretes internacionais, de forma que os créditos eventualmente apropriados deverão ser estornados, conforme mandamento previsto no inciso I do caput do art. 36 do RICMS/SC-01.

Além disso, considerando que tal prestação encontra-se, ab initio, fora da esfera de competência tributária dos Estados e do Distrito Federal, conclui-se, conforme entendimento já exposto neste parecer, ser impossível a exclusão de sua tributação pela via da imunidade, de forma que resta inaplicável a permissão de manutenção de créditos prevista no parágrafo único do art. 35 do RICMS/SC-01.

Nesse sentido, posicionamento destacado pelo ex-Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Sydney Sanches, em voto proferido no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 1.600-8: 

“O serviço de transporte internacional, por qualquer meio (incluído o aeroviário), seja de mercadorias, seja passageiros, tem sido considerado pela generalidade dos Estados como espécie não tributada porque localizada fora do campo da competência tributária estadual. Esta circunstância se evidencia desde logo pela própria expressão constitucional, ‘transporte interestadual e intermunicipal ’, à qual se tem dado o sentido de transporte iniciado (ponto de partida) no território de um Estado ou Município e terminado (ponto de destino ou de chegada) no de outro.

Não basta, pois, para ser entendido como interestadual ou intermunicipal apenas que o transporte comece num Estado ou Município e ultrapasse seus lindes; é igualmente necessário que termine no território de um outro Estado ou Município e, portanto, em território nacional. Se tal não ocorre, se o transporte tem início no território de um Estado (ou Município) e termina fora do território nacional, ainda que atravessando outros Estados (ou Municípios), se ultrapassa a fronteira nacional é transporte internacional, gênero terceiro e distinto dos outros dois que constituem, só eles, fato gerador do ICMS (transporte intermunicipal e interestadual).

Por ser a competência tributária estadual, em matéria de transporte, assim definida constitucionalmente, é que não cabe dispositivo de imunidade para sua modalidade internacional; está já fora do campo de incidência, por definição. (...) No caso do transporte, o internacional não está incluído na previsão constitucional, não se podendo falar, portanto, em excluí-lo por via da imunidade. Assim sendo, o transporte internacional, nos termos do exposto, não é passível de tributação pelo ICMS, (...)" (STF - ADI: 1600, Relator.:

SYDNEY SANCHES, Data de Julgamento: 26/11/2001, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 20/06/2003, pág. 48)

Ademais, informa-se que as conclusões acima não se aplicam ao inciso XIII do caput do art. 5º do Anexo 2 do RICMS/SC-01, considerando que o citado dispositivo não guarda relação com o caso retratado em petição de consulta. Em verdade, trata-se de uma hipótese de isenção de ICMS na prestação de serviço de transporte de mercadorias destinadas à exportação. 

Vejamos:

“Art. 5° São isentas as prestações de serviço de transporte:

(...)

XIII – rodoviário de cargas, cujo tomador seja contribuinte inscrito no CCICMS neste Estado, exclusivamente nas remessas de mercadorias a porto situado neste ou em outro Estado, com a finalidade de ser exportada para o exterior do país, dispensado o estorno do crédito de que tratam os arts. 36, I e 38, III do Regulamento (Convênio ICMS 06/11);”

Cumpre esclarecer que a prestação de serviço de transporte prevista no dispositivo acima não se caracteriza como frete internacional, tendo em vista que pressupõe o encerramento do serviço prestado em porto localizado em território nacional. Por conseguinte, trata-se de serviço que, sujeito à competência tributária dos Estados e do Distrito Federal, não é tributado em razão da política de incentivos fiscais adotada pelo Estado catarinense, após autorização conferida pelo Convênio ICMS 06/11. Nesse sentido, as Respostas às Consultas nº 103/2011 e 150/2016:

“É o que sucede com a prestação de serviços de transporte: alguém (tomador do serviço) contrata o prestador do serviço para efetuar o transporte de algo de um ponto para outro do território nacional. O resultado ou o efeito do contrato de prestação de serviço produz-se no Brasil o que descaracteriza a exportação de serviço. Os deslocamentos de mercadorias entre o porto e a fábrica, o porto e o depósito de containers etc., ainda que contratados por residente ou domiciliado no exterior, não caracterizam exportação de serviço.

Para que a prestação de serviço se caracterize como exportação, deve satisfazer, cumulativamente, as seguintes condições: (i) o tomador do serviço deve ser residente ou domiciliado no exterior; e (ii) o resultado ou efeitos do serviço devem se produzir no exterior. Estando satisfeita apenas uma dessas condições (como no caso da consulta), não se trata de exportação de serviço. 

Apenas no tocante ao transporte de mercadorias até o porto por onde serão exportadas não incide o ICMS, mas por motivo diverso do invocado pela consulente: com efeito, o Decreto 231, de 13 de maio de 2011, introduziu a Alteração 2.769 ao Regulamento do ICMS-SC, que, com espeque no Convênio ICMS 6/2011, celebrado na forma da lei Complementar 24/1975, acrescentou o inciso XIII ao art. 5° do Anexo 2 o qual prevê isenção na prestação de transporte rodoviário de cargas, cujo tomador seja contribuinte inscrito no CCICMS neste Estado, exclusivamente nas remessas de mercadorias a porto situado neste ou em outro Estado, com a finalidade de ser exportada para o exterior do país, dispensado o estorno de crédito de que tratam os arts, 36, I, e 38, III, do Regulamento.”

Dessa forma, considerando a absoluta distinção entre as hipóteses descritas, a expressa autorização para manutenção de créditos de ICMS prevista no inciso XIII do art. 5º do Anexo 2 do RICMS/SC-01 não se aplica à prestação de serviço de transporte destinado ao exterior.

RESPOSTA

Diante do exposto, responda-se à Consulente que a prestação de serviço de transporte internacional não se sujeita à competência tributária dos Estados, de forma que resta impossível a apropriação de créditos do imposto incidente sobre os insumos utilizados na sua prestação.

É o parecer que submeto à apreciação desta Comissão Permanente de Assuntos Tributários.

ENIO QUEIROZ E SILVA LIMA

AUDITOR FISCAL DA RECEITA ESTADUAL - Matrícula: 6171940

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na Sessão do dia 15/05/2025.

A resposta à presente consulta poderá, nos termos do § 4º do art. 152-E do Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário (RNGDT), aprovado pelo Decreto 22.586, de 27 de julho de 1984, ser modificada a qualquer tempo, por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente, em decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de Resolução Normativa que adote diverso entendimento.

Nome Cargo
DILSON JIROO TAKEYAMA Presidente COPAT
FABIANO BRITO QUEIROZ DE OLIVEIRA Gerente de Tributação
NEWTON GONÇALVES DE SOUZA Presidente do TAT
CAROLINA VIEITAS KRAJNC ALVES Secretário(a) Executivo(a)

Data e Hora Emissão: 22/05/2025 14:53:16

ESTADO DE SANTA CATARINA

SECRETARIA DE ESTADO DA FAZENDA COMISSÃO PERMANENTE DE ASSUNTOS TRIBUTÁRIOS