Resolução de Consulta DLO Nº 69 DE 23/11/2023


 Publicado no DOE - PE em 23 nov 2023


ICMS. Energia elétrica. Ambiente de contratação livre por consumidor. Liquidação financeira no âmbito da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica - CCEE. Incidência do imposto.


Fale Conosco

RESOLUÇÃO DE CONSULTA N° 69/2023. PROCESSO N° 2022.000005685362-91. CONSULENTE: CONDOMINIO DO SHOPPING CENTER RECIFE, CNPJ: 08.961.229/0001-02. ADV: ALEXANDRE DE ARAÚJO ALBUQUERQUE. OAB/PE No 25.108. 

EMENTA: ICMS. Energia elétrica. Ambiente de contratação livre por consumidor. Liquidação financeira no âmbito da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica - CCEE. Incidência do imposto.

A Diretoria de Legislação e Orientação Tributárias - DLO, no exame do processo acima identificado, responde à consulta nos seguintes termos: 

1. A posição devedora no Mercado de Curto Prazo-MCP de energia elétrica ocorre quando do efetivo consumo da energia no estabelecimento ou domicílio do consumidor, após o registro dos contratos de compra e venda de energia pela CCEE e liquidação no MCP, calculada a posição devedora com a confrontação da medição da energia consumida com a energia contratada, ocorrendo a incidência do ICMS sobre o resultado desta operação. 

2. A revogação dos art. 406 a 412 do Decreto no 44.650, de 2017, se refere à denúncia de Pernambuco ao Convênio ICMS 77/2011 e a adesão aos Convênios ICMS 83/2000, 117/2004 e 15/2007, que trazem em seu bojo as obrigações acessórias do destinatário da energia elétrica. Por sua vez, caso o agente consumidor não tenha inscrição no Cacepe, este deve solicitar a emissão de nota fiscal avulsa em relação à posição devedora no MCP.

RELATÓRIO

1. A Consulente é condomínio edilício que adquire energia elétrica no mercado livre, firmando contratos bilaterais diretamente com os comercializadores ou geradores, com condições livremente negociadas, como preço, volume, prazo e forma de pagamento.

2. Informa que "os contratos são geralmente de longo prazo, é comum não existir exata correspondência entre o montante contratado e o consumido. Então, existirão “Sobras e Déficits” que deverão ser negociadas, total ou parcialmente, com outros consumidores, os quais irão substituir o Consulente, respeitadas as condições pactuadas naquele CONTRATO, e feitas as compensações devidas ao CESSIONÁRIO/CONSULENTE na exata proporção do impacto da alteração, tudo isto sob a chancela da ANEEL e consoante legislação aplicável".

3. Afirma que “o fato gerador do ICMS só ocorre na entrada no Estado de energia elétrica"; "o ICMS devido nas aquisições interestaduais de energia elétrica é recolhido pelo gerador ou distribuidor, nos termos do art. 405 e seguintes do RICMS (Decreto no 44.650/17), estando o consumidor livre desobrigado do pagamento do ICMS"; e "a revogação, pelo Decreto no 46.644/2018, dos artigos 410, 411 e 412 do RICMS, que fixava obrigações acessórias a serem observadas pelo consumidor livre (destinatário da energia)".

4. Expressa seu entendimento de que “na condição de consumidor final, dispensado de inscrição no Cadastro Estadual (CACEPE), a emissão de notas fiscais e a realização de contracorrente (sic) do ICMS (apuração de débitos e créditos), próprios, pelo consumidor livre/Consulente, não são possíveis, o que afasta qualquer tentativa de imposição das obrigações próprias de contribuintes."

5. Apresenta jurisprudências do STJ que firmam entendimento que os consumidores ao operarem no Mercado de Curto Prazo não os transformam em agentes do setor elétrico mesmo quando possam ser credores ou devedores junto ao CEE, afastando a configuração do fato gerador do ICMS (Resp n. 1.615.790/MG) e que "o ICMS não é imposto incidente sobre tráfico jurídico, não sendo cobrado, por não haver incidência, pelo fato de celebração de contratos" (REsp 960476 / SC).

6. Por fim pergunta se estão corretas suas interpretações nos seguintes termos:

6.1. "Não há incidência do ICMS sobre as operações financeiras realizadas no Mercado de Curto Prazo da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (cessões de direitos entre consumidores), em especial porque o fato gerador do ICMS só ocorre na entrada, no território deste Estado, de energia elétrica (ex vi Lei no 15.730/16, art. 2o, XIII), sendo a cessão anterior à referida entrada";

6.2. "Com a revogação dos artigos 410, 411 e 412 do RICMS (Decreto no 44.650/18) (sic) pelo Decreto no 46.644/2018, e em razão da impossibilidade de a Consulente, na condição de consumidor final não inscrito no Cacepe, realizar apuração do ICMS e emitir de notas fiscais próprias, as operações financeiras supracitadas não estão submetidas a obrigações tributárias acessórias específicas".

7. A Consulta foi acolhida pela DLO, conforme publicação no Diário Oficial do Estado – DOE de 2 de setembro de 2023.

É o relatório.

MÉRITO

7. A consulta diz respeito à cobrança do ICMS nas operações com energia elétrica adquirida em ambiente de contratação livre, através do Mercado de Curto Prazo - MCP, assim como, as obrigações geradas em tais operações, previsto no Capítulo III do Título XIII, do Decreto no 44.650, de 30 de junho de 2017, Regulamento do ICMS do Estado de Pernambuco - RICMS/PE.

8. O cerne da presente consulta está centrado na ocorrência de divergência entre os valores de energia elétrica contratados e os efetivamente consumidos. Ao contratar energia elétrica no mercado livre o consumidor pode ficar em uma posição credora, quando contrata mais energia do que a energia efetivamente consumida, ou em uma posição devedora, quando contrata menos energia do que a energia efetivamente consumida.

8.1. Todos os contratos de compra e venda de energia elétrica são registrados pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica - CCEE, que faz a liquidação no MCP, onde os valores contratados são confrontados com a medição da energia gerada e consumida.

8.2. O valor da energia liquidada no MCP é obtido através do Preço de Liquidação das Diferenças - PLD, que é calculado pela CCEE diariamente, considerando a aplicação dos limites máximos (horário e estrutural) e mínimo vigentes para cada período de apuração e para cada submercado.

9. O entendimento apresentado pela consulente de que "o ICMS não é imposto incidente sobre tráfico jurídico, não sendo cobrado, por não haver incidência, pelo fato de celebração de contratos" não se coaduna com a situação fática, vez que, a jurisprudência com repercussão geral do Supremo Tribunal Federal-STF, através do Tema 176 consagra que não há tributação sobre contrato de energia elétrica, mas sim sobre as operações onde há o efetivo consumo.

Tema 176-STF:

"A demanda de potência elétrica não é passível, por si só, de tributação via ICMS, porquanto somente integram a base de cálculo desse imposto os valores referentes àquelas operações em que haja efetivo consumo de energia elétrica pelo consumidor."

(grifos nossos)

10. Inicialmente é importante destacar que a lei considera energia elétrica como mercadoria. Assim como, para os efeitos da cobrança do imposto e definição do estabelecimento responsável considera como local da operação o do estabelecimento ou domicílio do adquirente, inclusive consumidor final, nas aquisições em outra Unidade da Federação - UF de energia elétrica, quando não destinadas à industrialização ou à comercialização (alínea "f" do art. 3o da Lei no 15.730, de 17 de março de 2016).

11. A situação apresentada pela consulente vai de encontro a sua própria tese, onde o contrato firmado apresenta-se apenas como cessão de direitos e não da aquisição de mercadoria. Ora, em sua justificativa para o não recolhimento das diferenças não previstas no contrato, esquece que em sua própria argumentação o fato gerador é a entrada efetiva da mercadoria. Sendo assim, de forma contraditória, considera que neste momento não houve o "fato gerador" do imposto e o que prevalece é a energia contratada, não a utilização efetiva da energia elétrica pelo consumidor. Logicamente, cabe razão tão somente em relação à entrada interestadual da energia, cujo fato gerador ocorre no momento da entrada em Pernambuco (inciso XII do art. 2o da Lei no 15.730, de 2016). Porém, é importante afirmar que também ocorre quando do efetivo consumo, nas situações em que se encontre em uma posição devedora, quando contrata menos energia do que a efetivamente consumida.

12. Toda a sistemática de tributação do imposto relativo às operações com energia elétrica para o consumo de destinatário que a tenha adquirido em ambiente de contratação livre é regulada pelo art. 405 do RICMS/PE, que por sua vez determina que sejam observadas as regras contidas nos Convênios ICMS 83/2000, 117/2004 e 15/2007, assim como, nas normas gerais de tributação do ICMS, relativamente à operação interna, não cabendo razão a afirmação da consulente de que está "o consumidor livre desobrigado do pagamento do ICMS."

13. A revogação dos arts. 406 a 412 do RICMS/PE se deu em função da saída de Pernambuco do Convênio ICMS 77/2011, através do Convênio ICMS 71/2018, retornando assim a regular a referida sistemática pelo disposto no Convênio ICMS 15/2007, não obstante os regramentos contidos RICMS/PE, notadamente nas regras gerais da substituição tributária previstas no seu Anexo 37.

13.1. Igualmente, a revogação dos arts. 410 a 412, da seção IV do RICMS/PE, que trata das obrigações acessórias do destinatário da energia elétrica, não teve o condão de acabar com estas obrigações, vez que, as mesmas são determinadas na cláusula terceira do Convênio 15/07, e no RICMS/PE.

13.2. Quanto a emissão de Nota Fiscal na condição de consumidor final não inscrito Cadastro de Contribuintes de Pernambuco - Cacepe, a sua obrigação está prevista no inciso II da cláusula primeira do Convênio ICMS 15/2007, onde determina que, caso o agente consumidor não tenha inscrição no Cacepe, este deve solicitar a emissão de nota fiscal avulsa em relação as diferenças apuradas.

RESPOSTA

14. Que se responda à Consulente, nos termos abaixo:

14.1. A posição devedora no MCP de energia elétrica ocorre quando do efetivo consumo da energia no estabelecimento ou domicílio do consumidor, após o registro dos contratos de compra e venda de energia pela CCEE e liquidação no MCP, calculada a posição devedora com a confrontação da medição da energia consumida com a energia contratada. Logo, ocorre a incidência do imposto sobre o resultado desta operação; isto posto, não há de se falar que a incidência se dá sobre a cessão anterior à entrada efetiva da mercadoria.

14.2. A revogação dos art. 406 a 412 do RICMS, refere-se à denúncia de Pernambuco ao Convênio ICMS 77/2011 e a adesão aos Convênios ICMS 83/2000, 117/2004 e 15/2007, que trazem em seu bojo as obrigações acessórias do destinatário da energia elétrica. Por sua vez, caso o agente consumidor não tenha inscrição no Cacepe, este deve solicitar a emissão de nota fiscal avulsa em relação às diferenças apuradas.

LAERCIO VALADÃO PERDIGÃO

Auditor Fiscal do Tesouro Estadual

De acordo,

MARCOS AUTO FAEISRTEIN

Gerente de Orientação

De acordo,

GLENILTON BONIFÁCIO DOS SANTOS SILVA

Diretor da DLO