ITCMD. Base de calculo. Valor Do patrimônio da pessoa jurídica. Valor Da quota ou ação. Preferência do valor De venal de mercado através de Balancete de verificação. Na sua Impossibilidade. Aplica-se o valor do Patrimônio líquido. Se presentes livros e Demonstrativos contábeis. Desde que Presentes os requisitos intrínsecos e Extrínsecos. Residualmente. Caso não Detenha demonstrativos contábeis ou o Patrimônio líquida seja negativo. Aplica-se o valor do capital social da Pessoa jurídica.
Trata-se da consulta interna formulada pelo setor de ITCMD, onde apresenta os seguintes questionamentos:
1) Qual o valor a ser atribuído a quota societária, quando a mesma, na data da ocorrência do fato gerador (morte) encontra-se menor que o valor da quota integralizada no contrato social?
2) E quando o patrimônio líquido dá negativo? Qual a ser considerado da quota societária?
Narra ainda que:
“No caso concreto a empresa foi constituída com um capital social de R$ 160.000,00 com as quotas sociais no valor de R$1,00.
Sendo 50% das quotas do marido e 50% das quotas da esposa. A esposa faleceu e o contribuinte apresentou Balanco Patrimonial onde o Patrimônio Líquido é de R$ 7.396,56, na data da morte.
Nosso questionamento se dá devido a alguns fiscais não utilizarem o valor do Patrimônio Líquido, quando o valor da quota dá menor que o valor dela em sua constituição (R$1,00).
Exemplo: No caso concreto apresentado o valor da quota societária é R$ 0,046, pelo PL na data da morte. Devemos usar R$ 1,00 ou R$ 0,046?”
Em resumo, é o relatório.
FUNDAMENTO JURÍDICO
Como visto no relatório o questionamento centra-se em definir qual a base de cálculo na transmissão de quotas ou ações de pessoa jurídica em decorrência da causa mortis.
No momento da morte, a propriedade da quota passa imediatamente para os herdeiros pelo efeito legal previsto no art. 1784 do CC[1], sendo essa transmissão o fato gerador do ITCMD, nos termos do art. 162 da Lei Estadual nº 5077/89.
Art. 162 - O imposto sobre transmissão "causa mortis" e doação de quaisquer bens ou direitos (ITCD), incide sobre as aquisições desses bens ou direitos por títulos de sucessão legitima ou testamentária ou por doação.
Para a quantificação do imposto devido deve primar pela correta identificação do valor real do bem transmitido, no caso concreto, as quotas da sociedade.
Inicialmente, tem que se ter em mente que há duas modalidades de valor patrimonial: o contábil e o real.
Sobre o assunto o professor Fábio Ulhoa Coelho ensina que:
“Podem-se considerar duas modalidades de valor patrimonial: o contábil e o real. Nas duas, o divisor é o número de ações emitidas pela companhia, variando o dividendo. O valor patrimonial contábil tem por dividendo o patrimônio líquido constantes das demonstrações financeiras ordinárias da sociedade anônima, quer dizer, aquelas que ela está obrigada a levantar ao término do exercício. O instrumento que, especificamente, contém a informação é o balanço. A medida do patrimônio líquido ostentada pelo balanço ordinário, contudo, não raras vezes, encontra-se defasada. O valor em reais atribuído a cada bem ou direito do ativo, bem assim a exata e atualizada mensuração do passivo podem não retratar, de forma adequada, a situação real do patrimônio da sociedade, ou seja, pode ser que, no mercado, os bens do patrimônio social, se fossem postos à venda, alcançassem preços diferentes, menores ou maiores, dos valores referidos na demonstração contábil. Dois são, basicamente, os motivos da defasagem: em primeiro lugar, com o passar do tempo, tende a oscilar o valor dos bens da sociedade, e nem sempre a oscilação é devidamente reavaliada e apropriada; em segundo, os critérios para classificar ou quantificar determinado fato contábil são, em parte, discutíveis. (Curso de direito comercial, v. 2 – São Paulo: Saraiva, 1999, p. 85).
Para a devida mensuração do patrimônio real da pessoa jurídica há o instrumento denominado de “balanço de determinação”, que diferencia do balanço patrimonial, conforme ressalta o ilustre professor:
Desse modo, os dados constantes das demonstrações financeiras podem acabar tornando-se infiéis à realidade da companhia. O instrumento contábil perde, como se costuma dizer, a sua consistência, justificando-se a reavaliação dos ativos e a conferência dos lançamentos, com vistas à elaboração de novo balanço patrimonial. Trata-se de balanço de ‘determinação’, cujo objetivo é possibilitar o cálculo do valor patrimonial ‘real’ da ação” (Curso de direito comercial, v. 2 – São Paulo: Saraiva, 1999, p. 85-86).
Esse “balanço de determinação” é previsto especialmente para a saída do sócio do quadro societário por motivo do seu falecimento, no intuito de se apurar o valor patrimonial da sua quota ou ação nesse momento específico, conforme prevêem os arts. 1.028 e 1.031 do CC.
Art. 1.028. No caso de morte de sócio, liquidar-se-á sua quota, salvo:
I - se o contrato dispuser diferentemente;
II - se os sócios remanescentes optarem pela dissolução da sociedade;
III - se, por acordo com os herdeiros, regular-se a substituição do sócio falecido.
Art. 1.031. Nos casos em que a sociedade se resolver em relação a um sócio, o valor da sua quota, considerada pelo montante efetivamente realizado, liquidar-se-á, salvo disposição contratual em contrário, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado.
Nesse norte, o „balanço de determinação‟ deve ser utilizado, primordialmente, no intuito de se verificar o real valor – de mercado - do bem adquirido pelos herdeiros. Essa conclusão se extrai da redação dada no art. 167 da Lei nº 5077/89, onde determina que a base de cálculo deve ser o valor venal do bem ou direitos.
Art. 167 - A base de cálculo do imposto é o valor venal ou comercial dos bens ou direitos transmitidos ou doados Sobre o valor venal como elemento quantitativo, o professor Kiyoshi Harada apresenta a seguinte passagem:
Como se sabe, o elemento quantitativo do fato gerador compõe-se de base de cálculo, que é uma ordem de grandeza sobre a qual incide a alíquota.
Logo, não basta dizer que a base de cálculo é o valor venal do imóvel, ou dos bens ou direitos transmitidos para aplicar na operação de lançamento o conceito doutrinário.
Conceituamos o valor venal como sendo aquele preço que seria alcançado em uma operação de compra e venda à vista, em condições normais do mercado imobiliário, admitindo-se a diferença de até 10% para mais ou para menos (Cf. nosso Direito financeiro-tributário, 17ª edição, Atlas, 2008, p. 423).[2] Afinal, o que pretendeu o legislador foi aproximar o máximo possível a base de cálculo do valor de mercado do bem ou direito transmitido, apenas admitindo outros critérios na dificuldade de se encontrar tal valor.
Tanto é assim que o § 1º do art. 167 da Lei Estadual nº 5077/89 determinar que o Fisco deverá realizar a avaliação administrativa, independente dos valores atribuídos pelo inventariante, prevalecendo o valor venal (mercado) do bem ou direito, conforme o caput do art. 167.
Art. 167 - A base de cálculo do imposto é o valor venal ou comercial dos bens ou direitos transmitidos ou doados.
§1º - Nas transmissões "causa mortis", o imposto será calculado sobre o valor atribuído pelo inventariante e, após a avaliação administrativa, sobre a parcela que resultar a maior.
Ocorre que o valor patrimonial real (mercado), muitas vezes, detém variáveis incontroláveis que tornam a mensuração faticamente impraticável.
Ciente dessa impossibilidade, a legislação permitiu que o Fisco, de forma residual, adote o patrimônio líquido da pessoa jurídica como base de cálculo do ITCMD, nos termos do §§ 1º e 2º do art. 9 do Decreto nº 10306/2011:
DECRETO Nº 10306 DE 24 DE FEVEREIRO DE 2011
Art. 9º Tratando-se de ações representativas do capital de sociedade, a base de cálculo é determinada por sua cotação média na Bolsa de Valores na data da transmissão, ou na imediatamente anterior quando não houver pregão ou quando essas não tiverem sido negociadas naquele dia, regredindo-se, se for o caso, até o máximo de 180 (cento e oitenta) dias.
§ 1º No caso em que a ação, quota, participação ou qualquer título representativo do capital de sociedade não seja objeto de negociação ou não tiver sido negociado nos últimos 180 (cento e oitenta) dias, a base de cálculo será o seu valor patrimonial na data da transmissão, observado o disposto nos §§ 2º a 4º.
§ 2º O valor patrimonial da ação, quota, participação ou qualquer título representativo do capital de sociedade será obtido do balanço patrimonial e da respectiva declaração do imposto de renda da pessoa jurídica entregue à Secretaria da Receita Federal, relativos ao período de apuração mais próximo da data de transmissão, observado o disposto no § 4º, facultado ao Fisco efetuar o levantamento de bens, direitos e obrigações.
§ 3º O valor patrimonial apurado na forma do § 2º será atualizado segundo a variação da UPFAL, da data do balanço patrimonial até a data prevista na legislação tributária para o recolhimento do imposto.
A definição do patrimônio líquido é previsto no item 9 da Resolução nº 689/1990 do Conselho Federal de Contabilidade da seguinte forma:
“Patrimônio Líquido é o valor residual dos ativos da entidade depois de deduzidos todos os seus passivos”
Para a comprovação do patrimônio líquido a legislação determina que o interessado deve apresentar, nos termos da alínea “a” do Item 11.2.2 do Anexo X da Instrução Normativa SEF nº 18/2013 e do § 2º do art. 9 do Decreto nº 10306/2011 ,os seguintes demonstrativos contábeis:
a) atos constitutivos da entidade atualizados até a data da abertura da sucessão;
b) Balanço Patrimonial da entidade relativo ao exercício anterior à data da abertura da sucessão;
c) Demonstrativo do Valor Contábil das Cotas; d) Balanço Patrimonial até o momento do fato gerador e e) a Declaração do Imposto de Renda entregue à Receita Federal.
INSTRUÇÃO NORMATIVA SEF Nº 18/2013
11.2. Ações, cotas, participações ou quaisquer títulos representativos de capital social:
11.2.1 - relativamente a ações negociadas em Bolsas de Valores, cotações de jornais ou documentos emitidos pela Bolsa de Valores em que figure a cotação média alcançada na data do óbito, ou na imediatamente anterior, quando não houver pregão ou quando a mesma não tiver sido negociada naquele dia, regredindo-se, se for o caso, até o máximo de 180 (cento e oitenta) dias;
11.2.2 - relativamente a ações, cotas, participações ou quaisquer títulos representativos do capital social não enquadrados no item 11.2.1:
a) atos constitutivos da entidade atualizados até a data da abertura da sucessão; Balanço Patrimonial da entidade relativo ao exercício anterior à data da abertura da sucessão; e Demonstrativo do Valor Contábil das Cotas, Participação, Ações ou Títulos, atualizado, segundo a variação da Unidade Padrão Fiscal do Estado de Alagoas - UPFAL, da data do Balanço Patrimonial até o momento do fato gerador, podendo tal demonstrativo ser elaborado mediante a divisão do valor do patrimônio líquido pelo número de cotas, ações ou títulos, ou pela multiplicação do valor do patrimônio líquido pela fração da participação (Decreto nº 10.306/11, art. 9º);
Cabe observar que as demonstrações contábeis supracitadas para terem validade probatória devem atender aos requisitos intrínsecos e extrínsecos, conforme prevê o art. 226 do Código Civil.
Art. 226. Os livros e fichas dos empresários e sociedades provam contra as pessoas a que pertencem, e, em seu favor, quando, escriturados sem vício extrínseco ou intrínseco, forem confirmados por outros subsídios
Por isso, não basta apresentação de um relatório desprovido dos requisitos para a correta identificação do patrimônio líquido. Para esse fim, devem ser exibidos os relatórios contábeis, devidamento escriturados de acordo com as normas contábeis vigentes, nos termos do art. 1.179 do Código Civil.
Art. 1.179. O empresário e a sociedade empresária são obrigados a seguir um sistema de contabilidade, mecanizado ou não, com base na escrituração uniforme de seus livros, em correspondência com a documentação respectiva, e a levantar anualmente o balanço patrimonial e o de resultado econômico.
§2o É dispensado das exigências deste artigo o pequeno empresário a que se refere o art. 970.
Certo é que para os pequenos empresários, o § 2º do art. 1.179 do Código Civil prevê a dispensa de cumprimento do caput supracitado.
Para essa situação, a nossa legislação utilizou regra subsidiária na qual determina que, diante da ausência de demonstrativos contábeis válidos ou do patrimônio líquido negativo, o Fisco arbitrará como base de cálculo do ITCMD o valor nominal do capital social que pode ser extraído do contrato social, conforme a alínea “a” do Item 11.2.2 do Anexo X da Instrução Normativa SEF nº 18/2013.
11.2.2 - relativamente a ações, cotas, participações ou quaisquer títulos representativos do capital social não enquadrados no item 11.2.1:
(...)
b) na hipótese de entidades dispensadas da elaboração de Balanço Patrimonial, nos termos da legislação federal, ou quando o patrimônio líquido indicar valor negativo,será considerado, para fins de base de cálculo do imposto, o valor nominal das ações, cotas, participações ou quaisquer títulos representativos de capital social
Ressalta-se que o arbitramento tem respaldo no art. 148 do Código Tributário Nacional, desde que seja estabelecido o devido processo legal para que oportunize ao contribuinte o seu direito de demonstrar, com provas válidas, o real valor patrimônio do bem adquirido.
Art. 148. Quando o cálculo do tributo tenha por base, ou tome em consideração, o valor ou o preço de bens, direitos, serviços ou atos jurídicos, a autoridade lançadora, mediante processo regular, arbitrará aquele valor ou preço, sempre que sejam omissos ou não mereçam fé as declarações ou os esclarecimentos prestados, ou os documentos expedidos pelo sujeito passivo ou pelo terceiro legalmente obrigado, ressalvada, em caso de contestação, avaliação contraditória, administrativa ou judicial.
Conclusão:
Do exposto, entende-se que a base de cálculo do ITCMD para quotas ou ações, não negociadas na Bolsa de Valores, será:
a. preferencialmente, o valor de mercado, próximo a data do fato gerador, das quotas ou ações extraído do balanço de determinação;
b. em segundo momento, diante da inviabilidade do método anterior, o patrimônio líquido refletido nos relatórios contábeis vertidos dos requisitos intrínsecos e extrínsecos;
c. de forma residual, nos casos da não apresentação dos relatórios contábeis válidos ou do patrimônio liquido negativo, o valor nominal do capital social extraído do contrato social.
Ao Superintendente de Tributação para análise.
Gerência de Tributação, em Maceió/AL, 16 de novembro de 2021.
Jacque Damasceno Pereira Júnior
Gerente de Tributação
[1] Art. 1.784. Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários
[2] HARADA, Kiyoshi. Valor Venal. Prevalência do Conceito Legal. Portal Jurídico Investidura, Florianópolis/SC, 28 Jun. 2009. Disponível em: www.investidura.com.br/biblioteca-juridica/artigos/direito-civil/3757-valor-venal-prevalencia-do-conceito-legal.
Acesso em: 05 Nov. 2021