Decreto Nº 10025 DE 10/04/2025


 Publicado no DOM - Salvador em 11 abr 2025


Regulamenta a Lei Nº 8553/2014, que dispõe sobre a arrecadação e a encampação de imóveis urbanos abandonados no Município de Salvador.


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O Prefeito do Município do Salvador, Capital do Estado da Bahia, no uso de suas atribuições, devidamente autorizado pelo inciso V do art. 52 da Lei Orgânica do Município,

Considerando a grande quantidade de imóveis abandonados e subutilizados em áreas dotadas de infraestrutura urbana, sobretudo no Centro Histórico da cidade e seus arredores;

Considerando a riqueza do conjunto arquitetônico, paisagístico e urbanístico existente na Cidade Baixa e no Centro Histórico de Salvador, que possui inestimável valor cultural, tendo sido tombado como patrimônio nacional junto ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e, para tanto, inscrito no Livro de Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico;

Considerando que muitos desses imóveis se encontram em péssimo estado de conservação e apresentam risco de desabamento, oferecendo perigo aos pedestres e a todos que transitam no entorno diariamente, conforme ocorrências que têm sido verificadas recentemente;

Considerando que a situação de abandono de imóveis tem efeitos negativos no ambiente urbano, facilitando a prática de crimes e o esconderijo de delinquentes, inclusive para a comercialização de substâncias entorpecentes;

Considerando a falta de manutenção e limpeza desses imóveis abandonados favorece o abrigo de animais peçonhentos e de acúmulo de lixo e entulhos que ensejam riscos de contaminação de doenças e a proliferação de vetores de enfermidades;

Considerando o princípio constitucional da função social da propriedade, prevista como direito fundamental no art. 5º, inc. XXIII, da CF/1988;

Considerando que o art. 182, § 2º, da Carta Magna de 1988, ao tratar da política de desenvolvimento urbano, estabelece que a propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor;

Considerando que é responsabilidade atribuída aos proprietários de imóveis a preservação e a conservação de bens tombados, nos termos do art. 16 da Lei Municipal nº 8.550/2014;

Considerando que, segundo o Código de Polícia Administrativa do Município de Salvador (Lei nº 5.503/1999), "os proprietários ou moradores de imóveis edificados, bem como de terrenos, são responsáveis pela conservação, limpeza e confinamento das instalações, de acordo com as condições estabelecidas no Regulamento de Limpeza Urbana";

Considerando a obrigatoriedade da manutenção periódica e preventiva das edificações por seus proprietários determinada pela da Lei nº 5.907/2001;

Considerando que, a teor do art. 1.276 do Código Civil Brasileiro (Lei Federal nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002), o imóvel urbano que o proprietário abandonar, com a intenção de não mais o conservar em seu patrimônio, poderá ser arrecadado, como bem vago, e passar, três anos depois, à propriedade do Município;

Considerando o disposto sobre a Arrecadação de Imóveis Abandonados a partir das inovações advindas da Lei Federal nº 13.465 , de 11 de julho de 2017, arts. 64 e 65 , Capítulo IX,

Decreta:

CAPÍTULO I - DAS DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 1º O Município de Salvador poderá promover a arrecadação e encampação dos imóveis abandonados situados no seu território, como bem vago, em conformidade com as disposições da Leis Federais nº 10.406/2002 e nº 13.465/2017, e da Lei Municipal nº 8.553/2014 .

§ 1º Serão considerados abandonados os imóveis urbanos privados que apresentarem evidentes sinais de desuso, sobre os quais o proprietário tenha cessado os atos de posse e não manifeste a intenção de conservá-los.

§ 2º A intenção referida no § 1º deste artigo deve ser demonstrada por meio de elementos caracterizadores do abandono colhidos na instrução do processo administrativo e estará presumida de modo absoluto quando o proprietário, cessados os atos de posse sobre o imóvel, não adimplir os ônus fiscais instituídos sobre a propriedade predial e territorial urbana por 05 (cinco) anos, consecutivos ou não.

§ 3º Configura a cessação dos atos de posse:

I - a perda, pelo proprietário, de qualquer dos poderes inerentes à propriedade, decorrente:

a) do não uso deliberado desses poderes;

b) da ausência de percepção dos frutos ou rendimentos do bem;

c) da omissão na realização de obras de conservação necessárias;

d) da destinação do imóvel em desacordo com sua função econômica e social.

II - a ausência de exercício, pelo proprietário, do efetivo poder de fato sobre o imóvel.

Art. 2º O imóvel urbano que o proprietário abandonar será arrecadado como bem vago e, após 3 (três) anos da publicação do Decreto de Arrecadação, passará à propriedade do Município do Salvador, respeitado o contraditório e a ampla defesa do proprietário em regular procedimento.

CAPÍTULO II - DAS COMPETÊNCIAS DOS ÓRGÃOS MUNICIPAIS E DO PROCEDIMENTO

Seção I - Das Competências dos Órgãos Municipais

Art. 3º A Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano - SEDUR, com o apoio dos demais órgãos da Administração Pública, será responsável pelas ações de vistoria e fiscalização dos imóveis de que trata este Decreto, podendo editar atos complementares necessários a sua execução.

Art. 4º A Secretaria Municipal da Fazenda - SEFAZ fica autorizada a fornecer à SEDUR os dados referentes aos proprietários e contribuintes dos imóveis abandonados para os fins do disposto neste Decreto.

Seção II - Do Procedimento para a Arrecadação dos Imóveis

Art. 5º As providências para a realização da arrecadação e encampação de imóveis abandonados serão promovidas pela Secretaria Municipal da Fazenda (SEFAZ), nas seguintes hipóteses:

I - de ofício ou por provocação órgãos da administração pública municipal (mediante Termo de Início da Ação Arrecadatória;

II - por denúncia escrita de terceiros.

Art. 6º O processo administrativo de arrecadação e encampação conterá em sua instrução, além da documentação de que trata o art. 2º da Lei nº 8.553/2014 , relatório técnico circunstanciado elaborado pela SEDUR, com a descrição das condições do imóvel e da situação de abandono e, quando necessário, com laudo da Defesa Civil de Salvador (CODESAL).

§ 1º A eventual impossibilidade de instrução processual com algum dos documentos poderá ser justificada no processo de modo fundamentado.

§ 2º O termo declaratório dos ocupantes de imóveis contíguos poderá ser substituído por declaração de servidor público que realize a vistoria no imóvel.

Art. 7º Confirmada a situação de abandono, será lavrado ato administrativo (auto de infração caracterizador do abandono), pela Secretaria Municipal da Fazenda (SEFAZ).

§ 1º Após a lavratura do auto de infração, o processo administrativo será encaminhado ao Chefe do Poder Executivo municipal para edição do decreto de arrecadação.

§ 2º O Decreto de Arrecadação expedido pelo Prefeito conterá as disposições sobre os trâmites e será publicado no Diário Oficial do Município.

Art. 8º Após a edição do Decreto de Arrecadação, a SEFAZ adotará as seguintes providências:

I - afixar edital no imóvel arrecadado, em posição visível ao público e no prazo de 05 dias;

II - providenciar a notificação do proprietário do imóvel, se localizado, pessoalmente ou pela via postal com aviso de recebimento.

§ 1º O prazo para apresentação de impugnação pelo proprietário é de 30 (trinta) dias, a contar da notificação.

§ 2º Caso o proprietário esteja em local incerto ou inacessível, a notificação será realizada por meio de edital, publicado no Diário Oficial e afixado no imóvel.

§ 3º Na impugnação, o proprietário poderá contestar os elementos da notificação e apresentar provas contrárias à caracterização do abandono do imóvel.

§ 4º No mesmo prazo da impugnação, o proprietário poderá demonstrar a intenção de manter o gozo dos direitos inerentes à propriedade, mediante assinatura de Termo de Compromisso e adoção das providências para realizar obras de conservação do bem, de acordo com o fim econômico e social para o qual é constitucionalmente protegido.

§ 5º No caso de ser rejeitada a impugnação ou esgotado o prazo sem a manifestação do proprietário, fica permitida a imediata imissão na posse do imóvel e a possibilidade de realização, diretamente ou por meio de terceiros, de investimentos necessários para que se atinja prontamente o objetivo social a que se destina.

§ 6º A SEFAZ editará Termo de Posse para formalizar o início da posse provisória do Município, nas hipóteses mencionados no § 5º deste artigo.

§ 7º O Cartório de Registro de Imóveis será oficiado para averbar a posse provisória do Município na matrícula do imóvel.

Subseção I - Do Termo de Compromisso

Art. 9º Se o proprietário optar por manter o imóvel, deverá assinar o Termo de Compromisso de que trata o § 4º, do art. 6º, deste Decreto, assumindo as obrigações estabelecidas pela SEFAZ, especialmente:

I - a execução de obras de recuperação ou conservação do imóvel, nas seguintes condições e prazos:

a) 6 (seis) meses, a partir da assinatura do Termo de Compromisso, para protocolar requerimento de processo administrativo relativo às obras;

b) 12 (doze) meses para iniciar as obras, a partir da data de abertura do processo administrativo;

c) 24 (vinte e quatro) meses para concluir as obras, a partir da data de emissão da Licença de Obras;

d) 36 (trinta e seis) meses para finalização e aceitação das obras, a partir da data de abertura do processo administrativo relativo às obras.

II - o pagamento de débitos fiscais do imóvel, no prazo máximo de 24 (vinte e quatro) meses, mediante parcelamento, a critério da SEFAZ e observada vedação do art. 9º da Lei Municipal nº 8.553/2014 ;

III - o pagamento de multa, em caso de descumprimento do Termo de Compromisso, fixada entre R$ 10.000,00 (dez mil reais) a R$ 100.000,00 (cem mil reais), proporcional às características do imóvel.

§ 1º O não cumprimento das obrigações previstas neste artigo, salvo razão devidamente justificada ou não atribuída ao proprietário, autoriza a retomada do processo de arrecadação.

§ 2º A obrigação de realizar obras no imóvel poderá ser substituída pela opção do proprietário para que o bem integre Consórcio Imobiliário.

§ 3º A SEDUR priorizará a análise do licenciamento de obras em imóveis que sejam considerados abandonados.

Subseção II - Da Reivindicação pelo Proprietário antes da Encampação

Art. 10. Após 3 (três) anos da publicação do decreto de arrecadação, caso o imóvel permaneça sob a posse direta ou indireta do Município, será consolidada a propriedade em seu favor e formalizada a transferência definitiva do bem vago.

§ 1º Nos casos de prosseguimento do processo com base no § 5º do art. 6º deste Decreto, o proprietário ainda poderá, antes de transcorridos 3 (três) anos após a publicação do decreto de arrecadação, manifestar o interesse em reaver o imóvel, desde que:

I - Regularize a situação fiscal do imóvel, mediante:

a) o pagamento, no prazo de 90 (noventa) dias, de todos os tributos municipais incidentes sobre o imóvel, acrescidos de multa e juros de mora, observada a vedação do art. 9º da Lei nº 8.553/2014 ;

b) o pagamento, no prazo de 90 (noventa) dias, de honorários advocatícios à Procuradoria Municipal, caso o débito esteja inscrito em dívida ativa.

II - atualize os dados e informações cadastrais devidas do bem junto à SEFAZ.

§ 2º Para os fins do disposto no § 1º deste artigo, o proprietário deverá ressarcir previamente o Município pelas despesas incorridas em razão do exercício da posse provisória, relativas à guarda, conservação e investimentos no imóvel, acrescidas de juros e atualização monetária, nos seguintes termos:

I - a mensuração dos custos será realizada por meio de laudo técnico elaborado pela SEFAZ, com base nas informações das despesas também realizadas por outros órgãos da administração pública direta e indireta;

II - o ressarcimento deverá ser pago no prazo de até 180 (cento e oitenta dias), a partir da apresentação do laudo técnico, mediante emissão de guia específica.

§ 3º Para formalizar a reivindicação do imóvel, o proprietário deverá assinar, em 30 (trinta) dias de sua manifestação, o Termo de Compromisso nos moldes do art. 9º deste Decreto, observando-se as seguintes obrigações adicionais:

I - caso o Município esteja executando obras ou projetos básicos no imóvel, permitir a ocupação temporária da municipalidade até a conclusão das intervenções;

II - garantir a realização de obras de conservação e manutenção do imóvel em conformidade com a Lei nº 5.907/2001;

III - regularizar o imóvel junto ao Cartório de Registro de Imóveis.

§ 4º O não cumprimento das condições estabelecidas neste artigo implicará a continuidade do processo de arrecadação e o imóvel será incorporado ao patrimônio do Município.

Art. 11. O imóvel, após a publicação do Decreto de Arrecadação pelo Município, não poderá ser incluído em programas de benefícios fiscais ou recuperação de crédito tributário que parcelem, dispensem ou reduzam as penalidades pecuniárias e atualizações monetárias.

Subseção III - Regularização Cartorial da Propriedade pelo Município

Art. 12. As providências necessárias para a regularização dos imóveis encampados na esfera cartorial são de competência da Secretaria Municipal da Fazenda (SEFAZ), com o assessoramento jurídico da Procuradoria-Geral do Município.

Parágrafo único. O Município adotará os procedimentos estabelecidos nesta Lei e, quando necessário, as medidas judiciais para consolidar a transferência do imóvel ao domínio público.

CAPÍTULO III - DESTINAÇÃO DOS IMÓVEIS ARRECADADOS

Art. 13. Após a consolidação da propriedade pelo Município, os imóveis arrecadados serão prioritariamente destinados para:

I - programas habitacionais;

II - prestação de serviços públicos;

III - fomento da Regularização Fundiária Urbana (Reurb-S);

IV - concessão de direito real de uso a entidades civis de comprovada finalidade filantrópica, assistencial, educativa, esportiva ou outras que tenham como princípio a autogestão, a solidariedade, o reconhecimento e valorização dos saberes tradicionais, sempre no interesse do Município;

V - fomento a equipamentos de Cultura e Turismo no município;

VI - permuta com imóveis, desde que haja compatibilidade de valores e demonstrado o interesse público;

VII - permissão de uso por terceiros, conforme a legislação municipal;

VIII - alienação do imóvel, com destinação dos recursos auferidos para investimentos de capital nas áreas de habitação, de interesse social e de conservação do patrimônio histórico e cultural.

§ 1º Para os fins do inciso IV do caput deste artigo, entende-se como saberes tradicionais aqueles pertencentes aos povos e comunidades tradicionais: grupos culturalmente diferenciados e que se reconheçam como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição, conforme definição da Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais.

§ 2º No período de 03 (três) anos, imediatamente seguintes à publicação do decreto de arrecadação e que antecedem à consolidação da propriedade pelo Município, o imóvel poderá ser utilizado:

I - para as hipóteses dos incisos II e VII do caput deste artigo; e

II - para a cessão onerosa por terceiros interessados na exploração, desde que realizem a conservação, restauração ou reconstrução total ou parcial do imóvel, por meio de chamamento público.

§ 3º O órgão solicitante da arrecadação, na hipótese de imissão provisória, deverá adotar as providências relativas à guarda e vigilância do imóvel, bem como ficará responsável pelo acompanhamento da manutenção e eventuais obras que sejam realizadas nesse período.

CAPÍTULO IV - DAS DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS

Art. 14. Fica revogado o Decreto nº 25.922 , de 30 de março de 2015.

Art. 15. Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação, produzindo efeitos retroativos sobre os imóveis urbanos que estiverem sob a guarda do Município de Salvador na data da publicação da Lei nº 8.553/2014 .

GABINETE DO PREFEITO DO MUNICÍPIO DO SALVADOR, em 10 de abril de 2025.

BRUNO SOARES REIS

Prefeito

CARLOS FELIPE VAZQUEZ DE SOUZA LEÃO

Secretário de Governo

ANA PAULA ANDRADE MATOS MOREIRA

Secretária Municipal de Cultura e Turismo em exercício

GIOVANNA GUIOTTI TESTA VICTER

Secretária Municipal da Fazenda

JOSÉ XAVIER NUNES FILHO

Secretário Municipal de Desenvolvimento Urbano

LUIZ CARLOS DE SOUZA

Secretário Municipal de Infraestrutura e Obras Públicas

IVAN EULER PEREIRA DA SILVA

Secretário Municipal de Sustentabilidade, Resiliência e Bem-Estar e Proteção Animal em exercício

EDUARDO DE CARVALHO PAZ PORTO

Procurador Geral do Município