Consulta Nº 108 DE 25/06/2015


 


Consulta. Lei n° 6.078 de 2011. Decreto n° 43.603 de 2012. Interpreta-se literalmente legislação tributária que disponha sobre benefício fiscal. Artigo 111 da Lei 5.172 de 1966.


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I - RELATÓRIO

Trata a presente consulta de indagação formulada pela interessada acerca da interpretação a ser utilizada no caso benefícios fiscais concedidos em atos normativos diferentes, quais sejam: a Lei n° 6.078 de 2011, que concede Tratamento Tributário Especial para a implantação e operação da Nissan do Brasil Automóveis Ltda e demais Sociedades Integrantes do complexo industrial a ser localizado no Estado do Rio de Janeiro; e o Decreto 43.603 de 2012, que concede tratamento tributário especial para o complexo composto de uma planta industrial e de um centro de distribuição implantado pela Hyundai Heavy Industries Brasil - indústria e comércio de equipamentos de construção Ltda e pela BMC Hyundai S/A para produção e comercialização de máquinas pesadas e suas peças de reposição e dá outras providências.

Informa a consulente que a alínea “b” do inciso II do artigo 1° da Lei n° 6.078/11 concede diferimento nas aquisições internas de matéria-prima, produtos intermediários, produtos secundários, componentes, partes, peças, embalagens, subconjuntos, produtos acabados e semiacabados, inclusive pneus e acessórios e qualquer tipo de insumo utilizado para fabricação/montagem de veículos acabados, inclusive gás natural, com exceção de energia elétrica, bem assim peças e acessórios destinados ao mercado de reposição.

Posteriormente, compara o dispositivo legal supracitado com a alínea “b” do inciso II do artigo 1° do Decreto 43.603/12. Infere que benefício concedido através da Lei n° 6.078/11 é mais amplo, podendo incluir lubrificantes, qualquer que seja sua função, uma vez que o texto legal, além de arrolar praticamente todo o tipo de material e mercadoria que podem compor um produto, menciona expressamente o trecho “qualquer tipo de insumo utilizado para fabricação/montagem de veículos acabados”. Compreendendo, portanto, segundo a consulente, não apenas aqueles que serão integrados ao produto final, mas também aqueles que serão meramente consumidos no processo fabril.

Isto posto consulta: “Sendo assim, pode-se indagar, com base nos princípios gerais do Direito Tributário, como o da isonomia - segundo o qual não pode a lei tributária instituir tratamento desigual a contribuintes que se encontrem em situação equivalente -, que a intenção do legislador tenha sido a mesma ao editar as duas normas, e que, portanto, os benefícios concedidos às duas montadoras devam ser interpretados como tendo o mesmo alcance e extensão, podendo assim se falar em enquadramento de lubrificantes como insumo em ambos os casos?”.

No final de sua petição, informa a interessada que:

a) “Não se encontra sob procedimento fiscal iniciado, ou já instaurado, para apurar fatos que se relacionem à matéria da presente Consulta Formal”;

b) “Não foi notificado a cumprir obrigação relativa ao fato objeto do presente pedido”;

c) “Os fatos expostos na presente consulta não foram objetos de decisão anterior negativa, proferida em requerimento, consulta ou ofício em que foi parte”;

d) “A requerente declara a inexistência de débitos pendentes de estabelecimento”.

II - ANÁLISE E FUNDAMENTAÇÃO

Preliminarmente, cumpre ressaltar que, conforme disposto na Resolução SEFAZ 45/07, a competência da Superintendência de Tributação, bem como da Coordenação de Consultas Jurídico-Tributárias abrange a interpretação de legislação em tese, cabendo à verificação da adequação da norma ao caso concreto exclusivamente à autoridade fiscalizadora ou julgadora.

O processo encontra-se instruído com a inicial (fls. 03/04), com o comprovante de transação bancária, DARJ referente à Taxa de Serviços Estaduais e respectivo demonstrativo de item de pagamento - DIP (fls. 05/07). A consulente juntou cópia da procuração com documento de identificação (fls. 13/14).

Consta, ainda, declaração da IFE 04 - Petróleo e Combustível - informando que não existem ações fiscais iniciadas e ainda não concluídas nos estabelecimentos de Inscrição Estadual n° 81.293.279 e 80.202.067. Acrescenta, que, da mesma forma, não existe autuação pendente de decisão final, cujo fundamento esteja direta ou indiretamente relacionado às dúvidas suscitadas no presente processo para os estabelecimentos acima referenciados, conforme fl. 16 deste processo.

Desta forma, passamos a discorrer acerca do que foi requerido em fls. 03/04. A interpretação de uma regra jurídica pode se dar por diversos métodos, dentre os quais podem ser ressaltados o literal, o teleológico e o sistemático, não havendo hierarquia entre eles, como brilhantemente nos ensina Ricardo Lobo Torres.

“A interpretação do Direito Tributário se subordina ao pluralismo metodológico. Inexiste a prevalência de um único método. (…) O que se observa é a pluralidade e a equivalência, sendo os métodos aplicados de acordo com o caso e com os valores ínsitos na norma: ora se recorre ao método sistemático, ora ao teleológico, ora ao histórico, até porque não são contraditórios, mas se complementam e intercomunicam”.

A interpretação literal encontra-se presente em alguns momentos no Código Tributário Nacional (CTN). O código submeteu determinados institutos tributários, por se referirem a situações que configuram exceções às regras jurídicas, a uma interpretação necessariamente literal, como é o caso do art. 111. Paralelamente, a interpretação da norma deve ser realizada, considerando-a como parte de um sistema na qual está inserida, buscando harmonia e unicidade entre elas.

Tal entendimento encontra-se pacificado na doutrina e jurisprudência pátrias, conforme verifica-se nos acórdãos abaixo colacionados, proferidos pelo Superior Tribunal de Justiça.

TRIBUTÁRIO - PROCESSO CIVIL - PIS - COFINS - INCIDÊNCIA MONOFÁSICA - CREDITAMENTO - IMPOSSIBILIDADE - LEGALIDADE - INTERPRETAÇÃO LITERAL - ISONOMIA - PRESTAÇÃO JURISDICIONAL SUFICIENTE - NULIDADE - INEXISTÊNCIA.

(...)

4. Para a criação e extensão de benefício fiscal o sistema normativo exige lei específica (cf. art. 150, § 6° da CF/88) e veda interpretação extensiva (cf. art. 111 do CTN), de modo que benefício concedido aos contribuintes integrantes de regime especial de tributação (REPORTO) não se estende aos demais contribuintes do PIS e da COFINS sem lei que autorize.

REsp 1140723/RS, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 02/09/2010, DJe 22/09/2010. Grifos Nossos.

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. PIS E COFINS. CREDITAMENTO. LEIS N° 10.637/2002 E 10.833/2003. NÃO-CUMULATIVIDADE. ART. 195, § 12, DA CF. MATÉRIA EMINENTEMENTE CONSTITUCIONAL. INSTRUÇÕES NORMATIVAS SRF 247/02 e SRF 404/04. EXPLICITAÇÃO DO CONCEITO DE INSUMO. BENS E SERVIÇOS EMPREGADOS OU UTILIZADOS DIRETAMENTE NO PROCESSO PRODUTIVO. BENEFÍCIO FISCAL. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA. IMPOSSIBILIDADE. ART. 111 CTN.

(…)

Interpretação extensiva que não se admite nos casos de concessão de benefício fiscal (art. 111 do CTN). Precedentes: AgRg no REsp 1.335.014/CE, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJe 8/2/13, e REsp 1.140.723/RS, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 22/9/10. 5. Recurso especial a que se nega provimento.

STJ - REsp: 1020991 RS 2008/0000796-8, Relator: Ministro SÉRGIO KUKINA, Data de Julgamento: 09/04/2013, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 14/05/2013.

Note-se que no caso em questão, ressaltamos que tanto a Lei n° 6.078/11 quanto o Decreto 43.603/12, por concederem benefícios fiscais, devem ser interpretados literalmente e restritivamente, visto tratarem de norma excepcional, que afasta a aplicação das regras gerais de pagamento de tributo, conforme o art. 111 do CTN.

Assim, no que concerne à aplicação do Decreto 43.603/12, sua redação deve ser respeitada na integralidade e literalidade. Adicionalmente, no caso específico da determinação disposta na alínea “b” do inciso II do art. 1°, destacada pela própria requerente na inicial, ressalta-se que deve ser observada nos seus termos. Ou seja, fica concedido à planta industrial da Hyundai Heavy Industries Brasil - Indústria e Comércio de Equipamentos de Construção Ltda e ao centro de distribuição da BMC Hyundai S/A, em suas fases de implantação, pré-operação, operação e expansões, o diferimento do ICMS incidente nas aquisições internas de insumos, exceto energia elétrica, água e gás, destinados ao processo produtivo da planta industrial. Logo, conclui-se que, neste caso em epígrafe, o diferimento do ICMS ocorrerá na operação prevista na alínea “b” (aquisições internas de insumos) destinada ao processo da planta industrial, respeitando as exceções nela determinada.

Desta forma, por se tratarem de normativos que concedem benefícios fiscais, não cabe estender a interpretação de cada ato, baseado no Princípio da Isonomia. Deve-se aplicar o que dispõe o texto de cada um dos normativos, observando os demais atos que compõe o sistema normativo.

Ademais, em que pese a consulente não ter destacado esta questão, é imprescindível observar o conceito de insumo dentro da sistemática de apuração do ICMS, que deve ser percebido como matéria-prima utilizada diretamente na fabricação do produto. Assim, o lubrificante, não incluído neste conceito, não pode ser considerado como insumo, pois sua utilização não ocorre diretamente na fabricação da mercadoria, devendo ser observada, portanto, a regra geral disposta no Título VIII (da operação interna com óleo lubrificante) do Livro IV do Decreto 27.427/2000.

III - RESPOSTA

Destarte, considerando que o Decreto 43.603/2012 concede tratamento tributário especial, e que o inciso II do seu art. 1° concede o benefício fiscal de diferimento do imposto nos casos que especifica, deve-se interpretar literalmente e restritivamente sua redação, não cabendo, portanto, a extensão, por analogia, de seus efeitos.

Além disso, é entendimento desta Superintendência de Tributação que insumo, para fins de cumprimento das obrigações disposta na legislação do ICMS do Rio de Janeiro, deve ser entendido como a matéria-prima aplicada diretamente na fabricação do produto, razão pela qual o diferimento constante na alínea “b” do inciso II do art. 1° do Decreto 43.603/12, assim como o da alínea “b” do inciso II do art. 1° da Lei 6.078/11, não se aplica ao lubrificante.

Fique a consulente ciente de que esta consulta perderá automaticamente a sua eficácia normativa em caso de mudança de entendimento por parte da Administração Tributária, ou seja, editada norma superveniente dispondo de forma contrária.

Pelo o exposto, opino pelo retorno dos presentes autos com vistas à IFE 04 - PETRÓLEO E COMBUSTÍVEL, com posteriormente envio à DIVISÃO DE ATENDIMENTO AO CONTRIBUINTE - DAC - para cientificar o interessado.

S.M.J., este é o parecer.

C.C.J.T., em 25 de junho de 2015.