Publicado no DOE - ES em 30 set 2024
ICMS – incidência – saídas para estaleiro – embarcação registrada no reb – lei federal – isenção heterônoma – impossibilidade 1. A legislação tributária estadual não equipara a venda de peças e equipamentos destinados a estaleiro responsável pela construção ou reparo de embarcação inscrita no reb a uma operação destinada à exportação. 2. Afastar a incidência do ICMS com fundamento no § 9º do artigo 11 da lei nº 9.432/97 configuraria uma isenção heterônoma, vedada pelo artigo 151, III, da constituição federal.
Incidência do ICMS nas operações destinadas a estaleiro responsável por construção ou reparação de embarcação registrada no REB DISPOSITIVOS INTERPRETADOS:
1. artigo 4º, II, § 1º, da Lei nº 7.000/01
2. artigo 11, § 9º da Lei 9.432/97
1. RELATÓRIO
Versam os autos sobre solicitação de consulta acerca da interpretação e aplicação da legislação de regência do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – RICMS.
O consulente informa que tem como uma de suas atividades principais a fabricação de máquinas e peças de metal para uso industrial.
Expõe que foi contratado por estaleiro localizado em Pernambuco para o fornecimento de diversas peças a serem destinadas à construção de embarcações.
Esclarece que as saídas de peças são destinadas à construção de embarcações registradas no REB (Registro Especial Brasileiro – instituído pela Lei nº 9.432/97) e consubstanciam operações em que o destinatário é o próprio estaleiro responsável pela construção ou reparação da embarcação.
Em razão do disposto no § 9º do artigo 11 da Lei nº 9.432/97, que equipara as saídas de mercadorias destinadas a embarcações registradas no REB às operações de exportação, descreve a existência de dúvida quanto à possibilidade da não incidência do ICMS, nos termos do artigo 4º, II, do RICMS- ES.
Declara que não se encontra sob procedimento fiscal, iniciado ou já instaurado, para apurar fatos que se relacionem com a matéria objeto da consulta.
Apresenta o seguinte questionamento:
1 - A venda de peças e equipamentos destinados a “estaleiro, responsável pela construção/reparo da embarcação”, sendo as embarcações destinatárias dos produtos inscritas no REB – Registro Especial Brasileiro, enquadra-se na hipótese de não-incidência do ICMS, prevista no art. 4º, inciso II do RICMS/ES?
É o relatório.
2. PRELIMINAR
Preliminarmente, constata-se que o consulente não observou o disposto no art. 8441 do Decreto nº 1.090-R/02. Isto posto, em obediência ao artigo 854, VII2, do RICMS-ES, este parecer deve ser emitido em caráter informativo, não produzindo os efeitos do art. 848.
3. APRECIAÇÃO
A consulta formulada requer o entendimento desta Gerência Tributária sobre a incidência de ICMS nas saídas interestaduais de mercadorias destinadas a estaleiro responsável por construção ou reparo de embarcações registradas no REB.
A Constituição Federal estabelece uma imunidade ao ICMS, afastando a incidência desse imposto nas operações que destinem mercadorias ao exterior, bem como nos serviços prestados a destinatários localizados no exterior:
Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:
(...)
II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;
(...)
§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:
(...)
a) sobre operações que destinem mercadorias para o exterior, nem sobre serviços prestados a destinatários no exterior, assegurada a manutenção e o aproveitamento do montante do imposto cobrado nas operações e prestações anteriores;
O texto constitucional determina a competência concorrente da União, Estados e Distrito Federal para legislar sobre direito tributário, sendo que a competência da União será limitada a estabelecer normas gerais:
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
I - direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico;
(...)
§ 1º No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais.
Desse modo, compete à lei complementar instituir normas gerais acerca do fato gerador do ICMS:
Art. 146. Cabe à lei complementar:
(...)
III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:
a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes;
A Lei Complementar nº 87/96, ao estabelecer normas gerais para o ICMS, determina que o imposto não incide sobre operações e prestações que destinem mercadorias e serviços ao exterior, equiparando a essas operações a saída de mercadoria com o fim específico de exportação quando destinada a empresa comercial exportadora, armazém alfandegado ou entreposto aduaneiro:
Art. 3º O imposto não incide sobre:
(...)
II - operações e prestações que destinem ao exterior mercadorias, inclusive produtos primários e produtos industrializados semi- elaborados, ou serviços;
(...)
Parágrafo único. Equipara-se às operações de que trata o inciso II a saída de mercadoria realizada com o fim específico de exportação para o exterior, destinada a:
I - empresa comercial exportadora, inclusive tradings ou outro estabelecimento da mesma empresa;
II - armazém alfandegado ou entreposto aduaneiro.
A Lei nº 7.000/01, ao disciplinar o ICMS em âmbito estadual, replicou o teor das normas gerais apresentado pela Lei Kandir:
Art. 4.º O imposto não incide sobre:
(...)
II - operações que destinem mercadorias para o exterior, nem sobre serviços prestados a destinatários no exterior, assegurada a manutenção e o aproveitamento do montante do imposto cobrado nas operações e prestações anteriores;
(...)
§ 1º Equipara-se às operações de que trata o inciso II a saída de mercadoria realizada com o fim específico de exportação para o exterior, destinada a:
I - empresa comercial exportadora, inclusive trading ou outro estabelecimento da mesma empresa;
II - armazém alfandegado ou entreposto aduaneiro.
Considerando que o texto constitucional não determina a imunidade na operação de saída de mercadorias com a finalidade de uso em construção ou reforma de embarcações registradas no REB, bem como a lei complementar nacional não afastou a incidência do ICMS nessas operações, somente o ente competente para instituir o imposto teria a autoridade para determinar a isenção dessas operações.
Ademais, a concessão de isenção do ICMS pelo Estado do Espírito Santo deve ser autorizada mediante Convênio do CONFAZ, conforme preceito constitucional:
Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:
(...)
§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:
(...)
XII - cabe à lei complementar:
(...)
g) regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do
Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados.
A Lei nº 9.432/97 ao equiparar à operação de exportação, para fins fiscais, a construção, a conservação, a modernização e o reparo de embarcações pré- registradas ou registradas no REB, restringe-se à disciplina da matéria tributária em âmbito federal, afastando exclusivamente a cobrança de tributos de competência da União.
Interpretação divergente, no sentido de que uma lei ordinária federal pudesse afastar a cobrança de um imposto de competência estadual, resultaria em uma clara afronta ao mandamento constitucional de vedação à isenção heterônoma:
(...)
III - instituir isenções de tributos da competência dos Estados, do
Distrito Federal ou dos Municípios.
4. CONCLUSÃO
Ante o exposto, passo a responder o questionamento formulado:
1 - A venda de peças e equipamentos destinados a “estaleiro, responsável pela construção/reparo da embarcação”, sendo as embarcações destinatárias dos produtos inscritas no REB – Registro Especial Brasileiro, enquadra-se na hipótese de não-incidência do ICMS, prevista no art. 4º, inciso II do RICMS/ES?
Resposta: Não. Nos termos do artigo 4º, II, da Lei nº 7.000/01, o ICMS não incide sobre as operações que destinem mercadorias ao exterior; o § 1º do mesmo dispositivo equipara à operação de exportação a saída de mercadoria realizada com o fim específico de exportação quando destinada a empresa comercial exportadora, armazém alfandegado ou entreposto aduaneiro.
A legislação tributária estadual não equipara a venda de peças e equipamentos destinados a estaleiro responsável pela construção ou reparo de embarcação inscrita no REB a uma operação destinada à exportação.
Afastar a incidência do ICMS com fundamento no § 9º do artigo 11 da Lei nº 9.432/97 configuraria uma isenção heterônoma, vedada pelo artigo 151, III, da Constituição Federal.
É o parecer.
Vitória-ES, 30 de setembro de 2024.
(assinado digitalmente)
ALEXANDRE DE CASTRO PEREIRA
Auditor Fiscal da Receita Estadual
(assinado digitalmente)
FLÁVIO VIGANOR SILVA
Subgerente de Julgamento de Processos e Orientação Tributária
Aprovo o Parecer Consultivo nº 482/2024.
Se a consulente já vem adotando o entendimento constante no mencionado parecer, que o mantenha com o fito de evidenciar conformidade com as disposições da legislação aplicável. Caso contrário, que o adote, no prazo de dez dias, contado do seu recebimento, em atendimento ao disposto no art. 849 do RICMS/ES.
Comunique a consulente. Remeta uma cópia do referido parecer à
Gerência Fiscal, com fulcro no art. 857 do RICMS/ES.
(assinado digitalmente)
HUDSON DE SOUZA CARVALHO
Gerente Tributário