Parecer Normativo Nº 467 DE 28/06/2024


 Publicado no DOE - ES em 28 jun 2024


ICMS – diferimento – operações internas de mercadorias des-critas no item 37 do anexo III – impossibilidade de análise abstrata 1. Diferimento é uma técnica de arrecadação tributária, sendo entendido como uma previsão de postergação para o pagamento do tributo, tendo como pressuposto a observância das exigências e requisitos previstos na legislação de regência do imposto. Caso não sejam observadas as exigências e requisitos há o afastamento do diferimento, com a cobrança normal do tributo, não havendo que se falar em não- incidência do imposto 2. Não há um critério abstrato absoluto a respeito do diferimento de vendas internas da hulha betuminosa, devendo ser analisado o caso concreto para se verificar o afastamento do diferimento com a consequente incidência do imposto. 3. O estabelecimento importador que não fizer o recolhimento do imposto nas saídas internas da hulha betuminosa quando não ocorrer posteriormente alguma das condições previstas nos incisos I e II do item 37 do anexo III do RICMS/ES pode vir a ser responsabilizado pelo recolhimento do imposto. Assim como é cabível o pedido de restituição do valor pago caso venha a recolher antecipadamente o imposto diferido e, após isso, demonstre a ocorrência de tais condições.


Impostos e Alíquotas

DIFERIMENTO NAS OPERAÇÕES INTERNAS DE MERCADORIAS DESCRITAS NO ITEM 37 DO ANEXO III DISPOSITIVOS INTERPRETADOS: 1. item 37 do Anexo III do RICMS-ES

1. RELATÓRIO

Trata-se de consulta de interpretação e aplicação da legislação de regência do Imposto sobre operações relativas a Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transportes Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS.

O assunto trata da possibilidade de aplicação do diferimento ou do lançamento e do pagamento do ICMS, previsto no item 37, do Anexo III do RICMS/ES, nas operações de revenda interna, considerando que a saída dar-se-á do estabelecimento da CONSULENTE para estabelecimento de outra pessoa jurídica localizada nesta Unidade da Federação.

Expõe a situação fática, afirmando que produz placas de aço e bobinas a quente, neste Estado, destinadas a venda no mercado doméstico e mercado externo.

Para tanto, utiliza o insumo hulha betuminosa (NCM 2701.12.00) importado do exterior com diferimento do ICMS para fabricação de tais produtos.

Ademais, o item 37, do Anexo III do RICMS/ES dispõe que o lançamento e o pagamento do ICMS incidente nas operações de importação, do exterior, de hulha betuminosa, realizadas por importador estabelecido neste Estado, fica diferido para o momento em que ocorrer: saída para outra Unidade da Federação; ou saída tributada interna ou interestadual do produto resultante de sua industrialização.

Ao trazer a aplicação do dispositivo acima para a realidade do seu negócio, a CONSULENTE entende que o diferimento do ICMS encerra quando a hulha betuminosa for remetida para outra Unidade da Federação, ou seja, em operação interestadual ou quando ocorrer a saída tributada interna ou interestadual de placas de aço ou de bobinas a quente.

A dúvida ensejadora desta consulta deriva do fato de a CONSULENTE estar sendo procurada por clientes, pessoas jurídicas, localizados no Estado do Espirito, para realizar a "venda de hulha betuminosa” importada anteriormente com o diferimento do ICMS.

Dessa forma, a CONSULENTE entende que, em conformidade com o item 37, do Anexo III do RICMS/ES, a saída interna de hulha betuminosa destinada a clientes localizados no Estado do Espirito Santo não é hipótese de encerramento do diferimento do ICMS, devendo a operação ser praticada sem o lançamento e pagamento do imposto.

Diante disso, elabora os seguintes questionamentos:

1) Está correto o entendimento da CONSULENTE de que o diferimento do ICMS incidente nas operações de importação, do exterior, de hulha mesmo em pó, mas não aglomeradas - NCM 2701.1, antracita – NCM 2701.11.00, hulha betuminosa - NCM 2701 . 12. 00, outras hulhas – NCM 2701.19.00, linhitas, mesmo em pó, mas não aglomeradas

– NCM 2702.10.00 e linhitas aglomeradas - NCM 2702.20.00 previsto no item 37, do Anexo III do RICMS/ES, fica mantido quando a CONSULENTE revender internamente tais mercadorias para clientes localizados no Estado do Espirito Santo?

2) Na hipótese das mercadorias mencionadas no quesito anterior, importadas do exterior peia CONSULENTE, serem revendidas a clientes industriais detentores de Termos de Acordo INVEST/ES, os quais também preveem o diferimento do ICMS nas aquisições internas de matérias primas e insumos para o momento em que ocorrer a saída dos produtos resultantes de sua industrialização, o diferimento do imposto pode ser mantido pela CONSULENTE?

2. APRECIAÇÃO

1. A questão principal da Consulta versa sobre a incidência do imposto nas operações internas de hulha betuminosa, considerando a previsão de diferimento no Anexo III do RICMS/ES para essa mercadoria. Sobre o assunto, vale esclarecer, inicialmente, que o diferimento é uma técnica de arrecadação tributária, sendo entendido como uma previsão de postergação para o pagamento do tributo, tendo como pressuposto a observância das exigências e requisitos previstos na legislação de regência do imposto.

2. Na doutrina, Celso de Barros afirma que “o diferimento é o não recolhimento do ICMS em determinada operação ficando adiado para etapa posterior.

Por esta técnica, o pagamento do imposto incidente sobre a saída de determinada mercadoria (no caso do ICMS) é transferido para as etapas posteriores de sua circulação1”.

3. Dessa forma, trata-se de instituto inconfundível com a isenção, que exonera o contribuinte do recolhimento do imposto em decorrência da ocorrência do fato gerador da obrigação tributária. Tanto é assim, que para o Estado conceder a isenção de uma mercadoria é preciso que haja a previsão em lei específica do ente federativo e a deliberação dos Estados e Distrito Federal, conforme exige o artigo 150, §6º c/c 155, §2º, XII, g, da Constituição Federal, enquanto que para fixar um diferimento, basta um ato do Poder Executivo.

4. Nesse sentido, é pacífica a jurisprudência dos Tribunais Superiores, havendo diversos julgados do Supremo Tribunal Federal (ADI 2056/MS, STF, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe 17/08/2007) e do Superior Tribunal de Justiça (EREsp 1119205 / MG, STJ, S1 - Primeira Seção, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe 08/11/2010) aderindo a esse posicionamento.

5. Portanto, por não se tratar de benefício fiscal, só existe diferimento quando ocorrer alguma das condições previstas na legislação, caso contrário, há responsabilidade de recolhimento do imposto. Assim, por exemplo, quando a legislação fixa que uma determinada mercadoria possui diferimento até a sua industrialização, deve-se entender que só existirá diferimento no caso de efetivamente ocorrer a industrialização. Se porventura tal situação não aconteça por algum motivo (mercadoria seja consumida pelo estabelecimento), então, o tributo deve ser cobrado normalmente, podendo ser responsabilizados tanto o remetente quanto o destinatário da mercadoria.

6. Gleisson Fernando Oliveira Ribeiro é didático na sua explicação sobre o assunto:

Sendo a responsabilidade pelo recolhimento do imposto transferida para operação subseqüente, esta será do adquirente ou destinatário da mercadoria. Assim, o alienante ou remetente, fica por hora, "livre" do tributo.

Entretanto, em algumas situações, a aplicação do diferimento é, por força da própria legislação ou de regime especial, condicionada a evento futuro.

Assim, caso não se concretize a situação em que há previsão de aplicação do diferimento, tanto o adquirente ou destinatário quanto o alienante ou remetente ficarão vinculados ao fato gerador e conseqüentemente ao recolhimento do tributo. Cito novamente o ramo de fertilizantes: o já citado Anexo II do Regulamento do ICMS, em seu item 25 traz o seguinte:

ANEXO II

PARTE 1 - DO DIFERIMENTO

(a que se refere o artigo 8º deste Regulamento)

(...)

25 - Saída de adubo, simples ou composto, fertilizante, corretivo de solo e esterco animal, produzidos no Estado, para uso na agricultura bem como no melhoramento de pastagens.

(...)

Nesta hipótese, caso o fertilizante produzido e vendido pela indústria para determinada cooperativa tiver seu destino diferente que o uso na agricultura ou no melhoramento de pastagens, haverá incidência do ICMS e este poderá ser cobrado total ou parcialmente do alienante ou remetente, caso o adquirente ou destinatário não o faça.

Entendo que esta regra tem duas intenções: a primeira visa "forçar" àquele que tem sobre suas operações o diferimento a ficar atento às suas regras e condições do diferimento e "fiscalizar" o devido destino dado ao produto. A segunda visa a satisfação tributária da Fazenda Pública, caso a condição não se perfaça2. (grifo nosso)

7. Destarte, caso não ocorra a hipótese prevista, há o afastamento do diferimento, com a cobrança normal do tributo, não havendo que se falar em não- incidência do imposto, até porque isso acabaria gerando hipóteses de isenção e benefícios fiscais não condizentes com a Constituição.

8. Na legislação capixaba, a Lei 7.000/2001 remete a matéria ao Regulamento do Imposto, que, por sua vez, corroborando com a tese aqui defendida, é expresso quando afirma no artigo 10, §1º, que o diferimento fica condicionado à observância das exigências e requisitos previstos na legislação de regência do imposto, ou seja, não ocorrendo tais condições, afasta-se o diferimento.

9. No caso concreto da Consulta, é preciso observar o item 37 do Anexo III, do RICMS/ES, que possui a seguinte redação:

O lançamento e o pagamento do imposto incidente nas operações de importação, do exterior, de hulha mesmo em pó, mas não aglomeradas, NCM 2701.1, antracita, NCM 2701.11.00, hulha betuminosa, NCM 2701.12.00, outras hulhas, NCM 2701.19.00, linhitas, mesmo em pó, mas não aglomeradas NCM 2702.10.00 e linhitas aglomeradas NCM 2702.20.00, realizadas por importador estabelecido neste Estado, observado o disposto na nota n.º 8, fica diferido para o momento em que ocorrer:

I - a saída para outra unidade da Federação; ou

II - a saída tributada interna ou interestadual do produto resultante de sua industrialização.

NOTA 8

8. Para efeito do diferimento de que trata o item 37, não será exigido o valor do imposto referente à obrigação tributária diferida, em caso de exportação de produto resultante de sua industrialização, quando utilizado como insumo por estabelecimento industrial situado neste Estado.

10. Analisando o dispositivo acima, nota-se que o imposto fica diferido para o momento em que ocorrer a saída interestadual da mercadoria ou a saída interna do produto resultante de sua industrialização.

11. Nesse cenário, no caso das saídas internas é preciso analisar a finalidade da operação, já que, dependendo da destinação a ser dada à mercadoria, pode ser identificado um encerramento do diferimento. Assim, por exemplo, caso a mercadoria seja vendida para um consumidor final ou adquirida para compor o ativo imobilizado de algum estabelecimento, então, não haverá diferimento, devendo incidir o imposto, que poderá ser cobrado tanto do remetente quanto do destinatário.

12. Dessa forma, não há um critério abstrato absoluto a respeito do diferimento de vendas internas da hulha betuminosa, devendo ser analisado o caso concreto para se verificar o afastamento do diferimento com a consequente incidência do imposto.

13. Isso porque mesmo que se venda para um contribuinte com CNAE de industrialização nas suas atividades não há garantia de que tais mercadorias serão utilizadas em processo industrial (causa de diferimento) ou consumidas internamente para o funcionamento do próprio estabelecimento (causa de encerramento do diferimento, com cobrança normal do imposto e responsabilização do remetente e adquirente). O mesmo pode ser dito do cliente que compra para comercialização, que pode revender tal mercadoria a outro Estado (causa de diferimento), como pode vender para um consumidor final (causa de encerramento do diferimento, com cobrança normal do imposto).

14. O estabelecimento importador que não fizer o recolhimento do imposto nas saídas internas deve estar ciente de que no caso de não ocorrer posteriormente alguma das condições previstas nos incisos I e II do item 37 do Anexo III do RICMS/ES pode vir a ser responsabilizado pelo recolhimento do imposto. Assim como, caso venha a recolher e, após isso, ocorrer tais condições, é cabível o pedido de restituição do valor pago. Enfim, a ocorrência ou não do diferimento depende da verificação concreta das condições previstas.

3. INTERPRETAÇÃO

Ante o exposto, as saídas internas das mercadorias elencadas no item 37 do Anexo III do RICMS não estão necessariamente sujeitas ao diferimento, sendo necessário analisar a ocorrência concreta de alguma das hipóteses previstas nos incisos I e II do item 37 do Anexo III do RICMS/ES (saída interestadual ou industrialização da mercadoria).

4. RESPOSTA

Passamos a responder o questionamento formulado:

1) Está correto o entendimento da CONSULENTE de que o diferimento do ICMS incidente nas operações de importação, do exterior, de hulha mesmo em pó, mas não aglomeradas - NCM 2701.1, antracita – NCM 2701.11.00, hulha betuminosa - NCM 2701 . 12. 00, outras hulhas – NCM 2701.19.00, linhitas, mesmo em pó, mas não aglomeradas – NCM 2702.10.00 e linhitas aglomeradas - NCM 2702.20.00 previsto no item 37, do Anexo III do RICMS/ES, fica mantido quando a CONSULENTE revender internamente tais mercadorias para clientes localizados no Estado do Espirito Santo?

RESPOSTA: O entendimento do contribuinte não está correto, já que é possível a manutenção diferimento no caso de operações internas, desde que ocorra posteriormente alguma das hipóteses previstas nos incisos I e II do item 37 do Anexo

III do RICMS/ES (saída interestadual ou industrialização da mercadoria). Assim, só ocorrerá diferimento nas operações internas de revenda de mercadorias a serem usadas num processo industrial como matérias-primas ou insumos, nos demais casos de revenda, não haverá diferimento.

2) Na hipótese das mercadorias mencionadas no quesito anterior, importadas do exterior pela CONSULENTE, serem revendidas a clientes industriais detentores de Termos de Acordo INVEST/ES, os quais também preveem o diferimento do ICMS nas aquisições internas de matérias primas e insumos para o momento em que ocorrer a saída dos produtos resultantes de sua industrialização, o diferimento do imposto pode ser mantido pela CONSULENTE?

RESPOSTA: Aqui valem os mesmos comentários da resposta anterior, a qualidade de industrial, por si só, não modifica as condições exigidas para a manutenção do diferimento. Assim, só ocorrerá diferimento nas operações internas de revenda de mercadorias a serem usadas num processo industrial como matérias-primas ou insumos, nos demais casos de revenda, não haverá diferimento.

É o parecer.

Encaminho ao Centro de Estudos Tributários – CET – para apreciação.

Vitória/ES, 28 de junho de 2024.

(assinado digitalmente)

ALLAN DIAS LACERDA

Auditor Fiscal da Receita Estadual

De acordo. Encaminhe-se à Gerência Tributária.

(assinado digitalmente)

FLÁVIO VIGANOR SILVA

Presidente do Centro de Estudos Tributários

(assinado digitalmente)

ALEXANDRE DE CASTRO PEREIRA

Secretário do Centro de Estudos Tributários

(assinado digitalmente)

ADAISO FERNANDES ALMEIDA

Membro do Centro de Estudos Tributários

(assinado digitalmente)

PRISCILLA CORREA GONÇALVES DE REZENDE

Membro do Centro de Estudos Tributários

Se a consulente já vem adotando o entendimento constante no mencionado parecer, que o mantenha com o fito de evidenciar conformidade com as disposições da legislação aplicável. Caso contrário, que o adote, no prazo de dez dias, contado do seu recebimento, em atendimento ao disposto no art. 849 do RICMS/ES.

Comunique a consulente. Remeta uma cópia do referido parecer à Gerência Fiscal, com fulcro no art. 857 do RICMS/ES.

(assinado digitalmente)

HUDSON DE SOUZA CARVALHO

Gerente Tributário