Publicado no DOE - CE em 30 jan 2024
ICMS. Consulta tributária. Produtos farmacêuticos. Substituição tributária “Canal Farma”. Regime especial de tributação. Momento do fato gerador. Cobrança do tributo na entrada do estado. Interpretação integrativa. Lei n.º 14.237/2008. Decreto n.º 24.569/1997. Decreto n.º 33.237/2019.
ICMS. Consulta tributária. Produtos farmacêuticos. Substituição tributária “Canal Farma”. Regime especial de tributação. Momento do fato gerador. Cobrança do tributo na entrada do estado. Interpretação integrativa. Lei n.º 14.237/2008. Decreto n.º 24.569/1997. Decreto n.º 33.237/2019.
A consulente acima qualificada, estabelecida no Estado do Ceará, com CNAE principal de comércio atacadista de medicamentos e drogas de uso humano e enquadrada no Regime Normal de Recolhimento, vem perante esta Secretaria realizar consulta fiscal a fim de esclarecer em que momento ocorre o fato gerador das quais é substituta tributária pelo Regime Especial de Tributação (RET) nº 01033/2020.
Aduz que não está sujeita à sistemática de antecipação do ICMS, posto que o RET firmado entre a empresa e esta Secretaria a submete à substituição tributária do ICMS Canal Farma (prevista na Lei nº 14.237/2008 e regulamentada pelos artigos 546 a 548-J do Decreto n.º 24.569/1997), razão pela qual defende que o ICMS não deve ser cobrado na entrada do Estado do Ceará, e sim no momento da entrada em seu estabelecimento.
Para tanto, apresenta a legislação correlata, mais precisamente o art. 3.º da Lei n.º 12.670/1996, bem como o art. 3.º do Decreto n.º 33.327/2019. Este prevê:
Art. 3.º - Ocorre o fato gerador do ICMS no momento:
(...)
IX - da entrada, neste Estado, de mercadoria sujeita ao regime de pagamento antecipado do ICMS. (grifos nossos)
Considerando que a empresa é detentora do RET n.º 01033/2020, com fundamento na Lei n.º 14.237/2008 c/c artigos 546 a 548-J do Decreto n.º 24.569/1997, entende a consulente que não está sujeita à antecipação tributária, posto que dispõe o parágrafo único do art. 452 do Regulamento do ICMS:
Art. 452 - Quando o regime de substituição tributária aplicar-se ao produto, este prevalecerá sobre qualquer outra sistemática de tributação a que esteja sujeita o destinatário.
Parágrafo único. Não será exigido o pagamento antecipado do ICMS a que se refere o artigo 767 sobre as entradas de mercadorias tributadas na forma deste Capítulo. (grifos nossos)
Por sua vez, apresenta ainda o art. 767:
Art. 767. As mercadorias procedentes de outra unidade federada ficam sujeitas ao pagamento antecipado do ICMS sobre a saída subsequente.
§ 1° O disposto nesta Seção não se aplica à operação com mercadoria:
(...)
II - sujeita ao regime da substituição tributária; (grifos nossos)
(...)
Assim, conclui que, como o art. 1.º da Lei n.º 14.237/2008 estabelece que a consulente é responsável, na condição de substituto tributário pela retenção e recolhimento do ICMS devido nas operações seguintes até o consumidor final, não estaria sujeita à antecipação tributária, o que teria como consequência lógica que o momento do fato gerador efetivar-se-ia na entrada do estabelecimento, e não na entrada do Estado, como cobrado pela SEFAZ/CE.
Em suma, questiona:
1. Está correto o entendimento da consulente de que o fato gerador do ICMS/ST apurado e recolhido pela empresa na forma especial prevista nos artigos 546 a 548-J do Decreto 24.569 de 31 de julho de 1997 (RICMS/CE) ocorre no momento da entrada da mercadoria no estabelecimento, haja vista a previsão do § único do artigo 452 e pela inaplicabilidade do instituto do regime da antecipação prevista no inciso IX do artigo 3º c/c artigo 767 do RICMS/CE?
2. Considerando que a Consulente é detentora do Regime Especial de Tributação nº 00783/2019, na forma da Lei 14.237 de 10 de novembro de 2008, regulamentada pelos artigos 546 a 548-J do Decreto 24569 de 31 de julho de 1997 (RICMS/CE), que dispõem sobre o Regime da Substituição Tributária nas operações com produtos farmacêuticos, está correto o entendimento da Consulente de que o fato gerador do ICMS/ST ocorre no momento da entrada da mercadoria no estabelecimento?
Preliminarmente, necessário se faz o esclarecimento acerca das diferenças entre os institutos da antecipação tributária e da substituição tributária, em alguns momentos confundidos pelos contribuintes.
Em aspectos gerais, a antecipação tributária se refere exclusivamente ao montante devido pelo próprio sujeito passivo, enquanto que a substituição tributária representa verdadeira transferência de responsabilidade, ao substituto, do recolhimento do tributo devido por toda a cadeia. Assim, na “substituição para frente”, o substituto antecipa o recolhimento de outrem, enquanto na antecipação procede ao recolhimento antecipado do que seria de sua própria titularidade.
Por conseguinte, não procede a conclusão do consulente de que, caso não seja aplicado o instituto da antecipação tributária, consequentemente estaria desvinculado do recolhimento do ICMS na entrada das mercadorias no Estado do Ceará. As premissas tomadas não levam necessariamente à conclusão, tendo em vista, primeiramente, que a antecipação representa fenômeno tributário inaplicável aos tributos de outrem, não interferindo na data de recolhimento do ICMS do restante da cadeia.
Assim, quando a legislação (em especial o previsto no parágrafo único do art. 452 c/c § 1°, II, do art. 767 do RICMS) estabelece que a antecipação não se aplica nos casos em que a substituição tributária seja a ordem, estar-se, em verdade, esclarecendo que o sujeito passivo não será obrigado a proceder antecipadamente com um recolhimento próprio que já será efetuado de qualquer forma em relação à toda a cadeia, evitando assim a duplicidade de pagamento.
Quanto ao questionamento n.º 1 da empresa consulente, tem-se que não há como se falar em fato gerador da substituição tributária, pois, mais uma vez esclarecendo o alcance desse instituto, o ICMS-ST se refere a fatos geradores futuros, gerando uma presunção de algo que ainda não ocorreu na realidade fática. Logo, na efetivação da cobrança da substituição tributária não há “momento do fato gerador”, e sim data de cobrança e recolhimento dos tributos devidos, os quais serão antecipações de fatos futuros presumidos. Portanto, acredita-se que o questionamento do requerente seja o de esclarecimento acerca do momento de fiscalização, cobrança e recolhimento do ICMS devido por toda a cadeia.
Nestes termos, tem-se o disposto na Lei n.º 14.237/2008:
Art. 1.º Os estabelecimentos enquadrados nas atividades econômicas indicadas nos anexos I e II desta Lei ficam responsáveis, na condição de substituto tributário, pela retenção e recolhimento do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS, devido nas operações ou nas prestações
subsequentes, até o consumidor final, quando da entrada ou da saída da mercadoria ou da prestação de serviço de transporte intermunicipal e de comunicação, conforme dispuser o regulamento. (grifos nossos)
(...)
Art. 2º O imposto a ser retido e recolhido na forma do art. 1º será o equivalente à carga líquida resultante da aplicação dos percentuais constantes do anexo III desta Lei, sobre o valor do documento fiscal acobertador das entradas das mercadorias, incluídos os valores do IPI, frete e carreto, seguro e outros encargos transferidos ao destinatário, ou da prestação de serviços.
Em que pese a legislação supracitada de regência da substituição tributária com carga líquida (aplicável à consulente) não especificar se a “entrada” a que se refere seria a “entrada no Estado do Ceará” ou a “entrada no estabelecimento”, percebe-se por interpretação teleológica (e integrativa de toda a legislação de regência do tema) que se trata da passagem pelo posto fiscal de fronteira.
Ocorre que a substituição tributária por atividades econômicas prevista na Lei n.º 14.237/2008 possui como base de cálculo do imposto, em termos gerais (sem adentrarmos nas especificidades), valores de entrada da mercadoria com a aplicação de uma margem de valor agregado. Logo, os valores a serem acrescidos da margem de valor agregado devem ser provados à Administração Tributária, o que se consubstancia por meio do documento fiscal (através do registro).
Se pensarmos de modo diverso, outro momento oportuno de se provar os fatos jurídicos passíveis de tributação seria no momento da emissão da Nota Fiscal, entretanto isto seria ainda mais desvantajoso ao contribuinte e também ao fisco na sua atividade de fiscalização.
Assim, o mesmo normativo (Lei n.º 14.237/2008, no § 2º do art. 2.º), corroborando o entendimento de que a “entrada” se refere à “entrada no Estado” e não no estabelecimento, cita dentre as referidas “entradas” a de mercadorias de estabelecimentos enquadrados no Simples Nacional, sequenciando explicitamente que o momento é o de ingresso no ente federativo. Observe-se:
§ 2º Nas entradas oriundas de estabelecimentos enquadrados no Simples Nacional, bem como nas entradas neste Estado de produtos de origem estrangeira procedentes de outras unidades da Federação, sujeitos à alíquota de 4% (quatro por cento) nos termos da Resolução nº 13, de 25 de abril de 2012, do Senado Federal, os percentuais constantes do anexo III serão adicionados do percentual
definido em regulamento. (grifos nossos)
Ademais, o Decreto n.º 24.569/1997 dispõe:
Art. 157. A aplicação do Selo de Trânsito será obrigatória para todas as atividades econômicas na comprovação de operações de entradas e saídas de mercadorias. (grifos nossos)
Logo, observa-se que novamente a legislação tributária se refere às “entradas” com significado de “entrada no Estado”, já que se sabe que a aplicação de Selo de Trânsito se efetua nos postos fiscais de fiscalização, na fronteira do Estado, como esclarece o § 1° do art. 158 do Decreto n.º 24.569/1997:
§ 1° Na entrada ou saída de mercadoria por local onde não exista posto fiscal de fronteira, o documento será selado no órgão da circunscrição fiscal do município limítrofe deste Estado, mediante apresentação da respectiva mercadoria. (grifos nossos)
Por fim, importante se faz salientar que, caso o objetivo do requerente quanto a esta consulta seja o de postergar a data de recolhimento, o Decreto n.º 33.327/2019 prevê:
Art. 88. O recolhimento do ICMS, ressalvados os prazos previstos na legislação específica alusiva ao imposto, deverá ser efetuado com a observância dos seguintes prazos:
(...)
II - até o 20º (vigésimo) dia do mês subsequente, para os contribuintes:
a) substitutos, atacadistas e varejistas, nos casos de ICMS Substituição Tributária devido por entradas, por saídas, o retido na fonte e o ICMS decorrentes das operações próprias;
b) credenciados a recolher o imposto em prazo excepcional, nos casos de ICMS Substituição Tributária por entrada interestadual, do ICMS Antecipado de que trata o art. 767 e do ICMS Diferencial de Alíquotas;
Por conseguinte, uma vez mais a interpretação das normas acerca do tema deve ser feita de forma integrativa, cotejando-se com todo o restante da legislação de regência, a qual deixa claro que se trata de “entrada no Estado”, e não de “entrada no estabelecimento”, consignando procedimento correto de cobrança do ICMS pela SEFAZ/CE. Portanto, a resposta ao questionamento da consulente no item 2. é negativa, no sentido de que sua interpretação está equivocada.
Dessa forma, conclui-se que a “entrada de mercadoria” a que se refere a legislação tributária de regência da substituição tributária para determinadas categorias econômicas (Lei n.º 14.237/2008 e Decreto n.º 24.569//1997) é a “entrada no território do Estado”, conforme já cobrado pela SEFAZ/CE.
É o Parecer. À consideração superior.
A data da publicação indicada refere-se à data em que a consulta foi incluída digitalmente no Portal da SEFAZ/CE.