Publicado no DOE - CE em 1 nov 2023
ICMS. Consulta. Obrigação acessória. Venda à ordem. Nota técnica 2018.005. Pedido de dispensa da nota fiscal pelo industrializador. Impossibilidade. Interpretação literal para dispensa do cumprimento de obrigações acessórias. Observância da legislação tributária para emissão das notas fiscais pelo adquirente originário e pelo industrializador. Art. 111, inciso III do Código Tributário Nacional c/c art. 705, § 5.º, do Decreto n.º 24.569/1997.
ICMS. Consulta. Obrigação acessória. Venda à ordem. Nota técnica 2018.005. Pedido de dispensa da nota fiscal pelo industrializador. Impossibilidade. Interpretação literal para dispensa do cumprimento de obrigações acessórias. Observância da legislação tributária para emissão das notas fiscais pelo adquirente originário e pelo industrializador. Art. 111, inciso III do Código Tributário Nacional c/c art. 705, § 5.º, do Decreto n.º 24.569/1997.
O contribuinte acima identificado, inscrito no Cadastro Geral da Fazenda sob o Regime de Recolhimento Normal, CNAE Fiscal n.º 1531901 (Fabricação de calçados de couro), realiza consulta fiscal relativa aos fatos descritos a seguir.
Afirma a interessada que realiza operações de remessa para industrialização dentro do Estado do Ceará, segundo o rito previsto nos arts. 687 a 697 do Decreto n.º 24.569, de 31 de julho de 1997.
Informa ainda que até o momento da finalização do produto no estabelecimento do industrializador, a consulente já realizou a venda da mercadoria, ocorrendo em seguida uma venda à ordem, com a emissão de duas notas fiscais:
1. nota fiscal emitida pela encomendante, tendo como destinatário o comprador, com CFOP 6.118 – Venda de produção do estabelecimento entregue ao destinatário por conta e ordem do adquirente originário, em venda à ordem;
2. nota fiscal emitida pelo industrializador, tendo como destinatário o comprador. com CFOP 6.923 - Remessa de mercadoria por conta e ordem de terceiros, em venda à ordem ou em operações com armazém geral ou depósito fechado
Aduz que, com a publicação da Nota Técnica 2018.005, previu-se no layout das notas fiscais NF-e e NFC-e um campo para informações do “local de retirada”, com a possibilidade de adicionar novos quadros no DANFE relacionados ao expedidor e ao recebedor.
Sustenta a interessada que a alteração supramencionada torna desnecessária a emissão da nota fiscal com CFOP 6.923 pelo industrializador, passando-se a adotar o seguinte procedimento na venda à ordem:
1º) Emissão de NF-e pelo industrializador com CFOP 6.118, narrando nos campos Local de
Retirada de que a mercadoria está nas dependências do industrializador;
2º) Emissão dos documentos fiscais relativos ao frete, fazendo menção a essa NF-e;
3º) Transportador coleta a mercadoria nas dependências do industrializador, e faz a entrega no endereço do comprador.
Face às premissas supracitadas, vem a consulente requerer posicionamento do Fisco Estadual quanto aos seguintes questionamentos:
a) A consulente pode proceder com a operação de venda diretamente ao comprador destinatário, utilizando-se unicamente da Nota Fiscal com CFOP 6.118, constando a informação sobre “Local da retirada”?
b) Essa nota fiscal preenchida nos termos da questão “a”, é suficiente para acobertar o transporte até o comprador, sendo dispensável a emissão da nota fiscal CFOP 6.923?
Informa a consulente que não se encontra sob ação fiscal com relação à matéria objeto da consulta, que não está intimada a cumprir obrigação relativa ao objeto da consulta e que o fato exposto na consulta não foi objeto de decisão anterior.
É o relato.
A formalização de consulta à legislação tributária visa conferir segurança jurídica ao contribuinte acerca da adequada aplicação normativa a um fato determinado. Sendo assim, a análise versada pressupõe correspondência entre a narrativa exposta e a realidade, não se prestando a consulta tributária a aferir a factibilidade das operações descritas pela consulente.
O objeto da consulta corresponde às obrigações acessórias determinadas pela legislação tributária para acobertar operações de venda à ordem, após a remessa dos produtos para industrialização.
Preliminarmente, o conceito de obrigação acessória deriva da legislação tributária, cujo conteúdo consiste em prestações de fazer ou não fazer com vistas a atender os interesses da arrecadação ou da fiscalização e para operacionalizar as operações praticadas pelo contribuinte.
Nesse sentido, o Código Tributário Nacional (CTN) dispõe que:
Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória.
(...)
§ 2º A obrigação acessória decorre da legislação tributária e tem por objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos.
Noutro giro, o CTN também determina que a dispensa do cumprimento de obrigações tributárias acessórias deve ser interpretada literalmente, conforme art. 111, inciso III, abaixo:
Art. 111. Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre:
(...)
III - dispensa do cumprimento de obrigações tributárias acessórias.
A interpretação literal, no entanto, não obsta o uso dos métodos interpretativos jurídicos cabíveis ao caso concreto. A interpretação literal, na realidade, informa que a norma jurídica não se submete à interpretação extensiva ou ampliativa, sendo vedado chegar a resultados não compatíveis com os sentidos veiculados no texto normativo.
Portanto, firma-se a premissa de que a dispensa da emissão de documento fiscal deve decorrer de disposição normativa prevista em lei, decreto ou norma complementar. Ausente a dispensa prevista em ato normativo, prevalecem as disposições gerais quanto às obrigações acessórias aplicáveis às operações praticadas.
No caso em comento, trata-se de operação triangular, na qual as mercadorias são vendidas pelo estabelecimento, quando os produtos encontram-se ainda no estabelecimento do fornecedor, para remessa direta ao destinatário final sem que as mercadorias transitem pelo contribuinte vendedor.
A legislação tributária determina a obrigatoriedade de emissão de três notas fiscais para operações de venda à ordem, com fulcro no art. 705, § 5.º, do Decreto n.º 24.569/1997, in verbis:
Art. 705. Nas vendas à ordem ou para entrega futura, poderá ser emitida nota fiscal, para simples faturamento, vedado o destaque do ICMS.
(...)
§ 5º No caso de venda à ordem, por ocasião da entrega global ou parcial da mercadoria a terceiros, deverá ser emitida nota fiscal:
I - pelo adquirente originário: com destaque do imposto, quando devido, em nome do destinatário da mercadoria, consignando-se, além dos requisitos exigidos, nome do titular, endereço e números de inscrição estadual e no CGC, do estabelecimento que irá promover a remessa da mercadoria;
a) em nome do destinatário, para acompanhar o transporte da mercadoria, sem destaque do ICMS, na qual, além dos requisitos exigidos, constarão como natureza da operação, "Remessa por Conta e Ordem de Terceiros", número, série e data da nota fiscal de que trata o item anterior, bem como o nome, endereço e números de inscrição estadual e no CGC, do seu emitente;
b) em nome do adquirente originário, com destaque do ICMS, quando devido, na qual, além dos requisitos exigidos, constarão, como natureza da operação "Remessa Simbólica - Venda à Ordem", número e série da nota fiscal prevista na alínea anterior.
Pode-se extrair da norma supra que a emissão de documentos fiscais nas operações de venda à ordem segue a seguinte ordem:
● 1.ª: Nota do contribuinte revendedor (adquirente originário), para o destinatário final da mercadoria, com destaque do imposto, com CFOP 5120 ou 6120 (Venda de mercadoria adquirida ou recebida de terceiros entregue ao destinatário pelo vendedor remetente, em venda à ordem);
● 2.ª: Nota do vendedor remetente (estabelecimento industrial) para o destinatário final da mercadoria, com CFOP 5923 ou 6923 (Remessa de mercadoria por conta e ordem de terceiros, em venda à ordem), para acompanhar a entrega dos produtos;
● 3.ª: Nota do vendedor remetente (estabelecimento industrial) para o contribuinte revendedor (adquirente originário), com destaque do imposto, com CFOP 5118/6118 (Venda de produção do estabelecimento entregue ao destinatário por conta e ordem do adquirente originário, em venda à ordem).
Segundo a consulente, as mercadorias a serem comercializadas para o destinatário final foram anteriormente remetidas para o estabelecimento industrial em operação interna de remessa para industrialização, segundo o procedimento dos arts. 687 a 697 do Decreto n.º 24.569/1997.
Importa frisar que o art. 687 prevê hipótese de diferimento do imposto devido na remessa para industrialização para o momento da saída dos produtos do estabelecimento encomendante, desde que ocorra o retorno das mercadorias para o estabelecimento remetente no prazo de 90 (noventa) dias.
Contudo, como a operação de venda à ordem sucede a remessa para industrialização, as normas específicas da venda à ordem prevalecem no que for contrário às disposições do retorno do produto da industrialização para o estabelecimento encomendante.
Dessa forma, na venda à ordem, não ocorre o retorno das mercadorias para o estabelecimento encomendante, devendo-se observar a ordem de emissão de documentos fiscais prevista no § 5.º, art. 705, do Decreto n.º 24.569/1997, com o devido destaque do imposto na forma disciplinada previamente.
A Nota Técnica 2018.005, por sua vez, dispõe acerca de alterações para NF-e e NFC-e, dentre elas a inclusão de mais informações no Grupo F – Identificação do Local de Retirada e Grupo G – Identificação do Local de Entrega, com acréscimos no DANFE dos campos conforme alterações, por exemplo, campo para informar telefone, e-mail e inscrição estadual do expedidor/recebedor. Segue texto transcrito da Nota Técnica 2018.005 para delimitação do seu conteúdo e efeitos:
NOTA TÉCNICA 2018.005
1.RESUMO
Esta Nota Técnica divulga as alterações de leiaute da NF-e e da NFC-e, as respectivas regras de validação dos campos criados ou alterados e as alterações no leiaute do DANFE.
(...)
3 ALTERAÇÕES DE LEIAUTE DA NOTA FISCAL ELETRÔNICA
3.1 GRUPO F. IDENTIFICAÇÃO DO LOCAL DE RETIRADA
Criados novos campos para complementação das informações de identificação do estabelecimento e do endereço do local de retirada:
(...)
3.2 GRUPO G. IDENTIFICAÇÃO DO LOCAL DE ENTREGA
Criados novos campos para complementação das informações de identificação do estabelecimento e do endereço do local de entrega:
(...)
Como se pode observar, a Nota Técnica 2018.005 inovou apenas quanto ao detalhamento das informações do local de retirada e de entrega que devem constar no documento fiscal e no respectivo documento auxiliar, não fazendo qualquer menção à dispensa da emissão de nota fiscal.
Ressalte-se que a dispensa do cumprimento de obrigação acessória deve ocorrer pela legislação tributária do Estado em que se sucedem as operações mercantis praticadas, limitando-se a nota técnica a exprimir entendimento ou dar transparência para alterações promovidas pelo Fisco, quanto ao cumprimento de obrigações tributárias principais ou acessórias. Portanto, permanece vigente a determinação do art. 705, § 5.º, do Decreto n.º 24.569/1997.
Ex positis, procede-se à resposta das perguntas formuladas pela consulente:
a) A consulente pode proceder com a operação de venda diretamente ao comprador destinatário, utilizando-se unicamente da Nota Fiscal com CFOP 6.118, constando a informação sobre “Local da retirada”?
R: Não. Deve-se observar a legislação de regência da matéria, que estabelece como obrigação acessória para vendas à ordem a necessidade de emitir três notas fiscais, com fulcro no art. 705, § 5.º, do Decreto n.º 24.569/1997, quais sejam:
● 1.ª: Nota do contribuinte revendedor (adquirente originário), com CFOP 5120 ou 6120 (Venda de mercadoria adquirida ou recebida de terceiros entregue ao destinatário pelo vendedor remetente, em venda à ordem), para o destinatário final da mercadoria, com destaque do imposto;
● 2.ª: Nota do vendedor remetente (estabelecimento industrial) para o destinatário final da mercadoria, com CFOP 5923 ou 6923 (Remessa de mercadoria por conta e ordem de terceiros, em venda à ordem), para acompanhar a entrega dos produtos;
● 3.ª: Nota do vendedor remetente (estabelecimento industrial) para o contribuinte revendedor (adquirente originário), com CFOP 5118/6118 (Venda de produção do estabelecimento entregue ao destinatário por conta e ordem do adquirente originário, em venda à ordem).
b) Essa nota fiscal preenchida nos termos da questão “a”, é suficiente para acobertar o transporte até o comprador, sendo dispensável a emissão da nota fiscal CFOP 6.923?
R: Não. Conforme resposta ao item “a”, deve-se emitir três notas fiscais para acobertar vendas à ordem, conforme disposto no art. 705, § 5.º, do Decreto n.º 24.569/1997.
Com esses esclarecimentos, consideram-se dirimidas as dúvidas pertinentes à consulta.
A resposta à Consulta Tributária aproveita à consulente nos termos da legislação vigente.
Deve-se atentar para eventuais alterações posteriores da legislação tributária.
É o Parecer.