SÚMULA: ICMS. Empresa de construção civil. Incorporação imobiliária direta. Difal.
CONSULENTE: ALEA S.A. INSCRIÇÃO: CAD/ICMS 91007868-23
RELATORA: Maristela Deggerone
A consulente, cadastrada na atividade principal de construção de edifícios (CNAE 4120-4/00), informa que faz parte de grupo empresarial que tem sua atividade dedicada à construção de unidades residenciais populares de que trata o Programa Casa Verde e Amarela (PVCA), realizando, por conta própria, todas as etapas necessárias ao desenvolvimento dos empreendimentos imobiliários (aquisição de terreno, elaboração do projeto, realização da obra, incorporação e registro das unidades imobiliárias e posterior venda) e que, para consecução de sua atividade, utiliza novo padrão construtivo por ela desenvolvido, denominado de construção offsite, que se caracteriza pela construção de casas preparadas fora do local da obra, mediante a utilização da tecnologia denominada de woodframe.
Explica que a construção com a referida tecnologia se inicia em estabelecimento da empresa, com a elaboração de painéis de woodframe, constituídos basicamente com madeira de pinus oriundos de reflorestamento, e a montagem da casa é concluída com a colocação desses painéis sobre o suporte de concreto preparado em cada imóvel.
Aduz que, na chamada construção offsite, há maior facilidade de implementar os conceitos de engenharia de produção no âmbito da engenharia civil, em que as casas são preparadas em um ambiente controlado, livre de intempéries 133 climáticas, permitindo ganhos de produtividade com a realização do trabalho em até três turnos, o que não ocorre com a construção de casas no local da obra, com a utilização de concreto ou alvenaria estrutural, dado que as estruturas de woodframe, empregadas na montagem das casas, são preparadas em processo que utiliza maquinário de alta tecnologia, o que lhe permite construir 10.000 casas ao ano.
Esclarece que inaugurou na cidade de Jaguariúna, São Paulo, um centro de construção offsite, como ponto inicial desse moderno e inovador modelo de construção, muito utilizado na Europa, nos Estados Unidos e no Japão, e que as estruturas de woodframe, produzidas no referido centro de construção,serão movimentadas fisicamente para os locais de suas obras próprias localizadas noParaná e em outras unidades federadas, onde serão empregadas na construção de unidades imobiliárias autônomas de sua propriedade, para posterior revenda.
Frisa que esse modelo de construção parte do conceito de verticalização, em que a empresa internaliza toda a cadeia de valor da atividade imobiliária.
Assevera que, pelo fato de a legislação nacional e a paranaense não ter acompanhado a evolução tecnológica, não há previsão contemplando os novos modelos de construção e desenvolvimento no mercado de construção civil e incorporação imobiliária, obrigando as empresas desse segmento consultar os Fiscos acerca da aplicação da norma vigente à situação retratada.
Reporta-se ao art. 392 do Regulamento do ICMS, que prevê a obrigatoriedade de empresa de construção civil manter inscrição estadual relativamente a cada estabelecimento, para fins de cumprimento das obrigações previstas na norma regulamentar, bem como define o que se considera empresa de construção civil, e ao art. 394, que prevê a incidência do ICMS na hipótese, dentre outras, de fornecimento de mercadorias produzidas pelo próprio prestador fora do local da prestação dos serviços, sem fazer qualquer referência às situações em que os materiais são destinados a obras próprias, fora do contexto de prestação de serviços, para sustentar que não há previsão na norma dispondo acerca de hipóteses de não incidência do ICMS em operações realizadas por empresas de construção civil.
Defende que a movimentação de materiais, assim como de bens produzidos fora do local da obra, realizada entre seus estabelecimentos não configura circulação de mercadorias, o que afastaria a incidência do ICMS. Desse modo, entende, com fundamento no art. 19 e no inciso I do art. 2° do Regulamento do ICMS, que não é contribuinte do tributo estadual e que sua atividade não se sujeita à incidência do ICMS, pois não promove a circulação econômica e jurídica de bens.
Afirma, ainda, que, embora o § 2° do art. 395 do RICMS disponha sobre a emissão de notas fiscais 395, nele consta expressamente que a movimentação de bens móveis entre os estabelecimentos do mesmo titular, entre estes e a obra ou de uma para outra não estão sujeitos à incidência do ICMS, o que o leva a conclusão de que o legislador afastou da incidência do tributo a mera movimentação de materiais. Nesse contexto, em que a movimentação de materiais enseja a emissão de notas fiscais, conclui que deve se inscrever no cadastro estadual.
Seguindo esse entendimento, defende ser inaplicável também o recolhimento de ICMS a título de diferencial de alíquotas de que trata o inciso VII do art. 2° da norma regulamentar, pois se trata de movimentação física de bens entre o estabelecimento paulista e suas obras próprias, localizadas em outras unidades federadas. Ademais, informa que sequer a consulente é contribuinte no Estado de São Paulo, conforme manifestou o Fisco da referida unidade federada, e que adquire os materiais empregados na produção das estruturas de woodframe na condição de consumidor final.
Argumenta, por fim, ser inaplicável à sua atividadea ressalva constante na parte final do item 7.02 da Lista de serviços anexa à Lei Complementar n° 116/2003, que prevê a incidência do ICMS sobre o fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador de serviços fora do local da obra, pois pretende desenvolver empreendimentos imobiliários, mediante a execução de obras próprias, em terrenos de sua propriedade, não tendo essa atividade qualquer relação com as prestações de serviços relacionados à construção de obras.
Por fim, alega que a construção civil, na incorporação imobiliária, nada mais é que uma atividade-meio. Nesse sentido, destaca, posicionou-se o STJ - Superior Tribunal de Justiça, nos Embargos de Divergência em Recurso Especial n° 884.778/MT, decidindo que na construção realizada por incorporador imobiliário não há prestação de serviço e, consequentemente, não há incidência do ISS. Portanto, aduz que, muito menos, haveria ICMS sobre a circulação de materiais empregados na construção de obra própria, nem sobre os materiais produzidos pela consulente em outros locais e destinados às suas obras, em terrenos de sua titularidade.
Após a exposição dos fatos, questiona se está correta a interpretação de que:
(i) não seria contribuinte do ICMS, na forma prevista no art. 19 do Regulamento do ICMS, por não praticar circulação de mercadorias nas movimentações físicas das estruturas de woodframe do centro de construção offsite, localizado em São Paulo, para os locais de suas obras próprias, em terrenos de sua propriedade, no Paraná, conforme entendimento manifestado na Consulta n° 78, de 30 de novembro de 2021; (ii) as movimentações físicas de materiais entre o centro de construção offsite, que produz as estruturas de woodframe, e seus terrenos no Paraná, onde serão construídas as unidades imobiliárias autônomas próprias, não são hipóteses de incidência do ICMS, inclusive em relação aos diferenciais de alíquotas de que tratam os incisos VI e VII do artigo 1° doRICMS;
(iii) em função das movimentações físicas de materiais entre o centro de construção, localizado em São Paulo, e seus terrenos no Paraná, deve ter inscrição estadual no Estado do Paraná e deve emitir notas fiscais para acompanhar o trânsito desses materiais, com as indicações dos locais de procedência e destino, na forma do artigo 395, § 2°, do RICMS.
Indaga, ainda, na hipótese de as respostas aos questionamentos anteriores serem positivas, se deve emitir notas fiscais e escriturá-las nos respectivos livros fiscais, por ocasião da remessa do material de São Paulo para o Paraná ou na movimentação dentro do território paranaense, consignando os CFOP 6.959 ou 5.949 (Outra saída de mercadoria ou prestação de serviço não especificado)
RESPOSTA
Inicialmente, registre-se que compete a este Setor esclarecer dúvidas relativamente a operações promovidas por contribuintes paranaenses, não lhe cabendo avaliar a incidência ou não de imposto nas hipóteses em que seja sujeito ativo do imposto outra unidade federada.
Conforme reiteradamente tem manifestado este Setor Consultivo, a empresa de construção civil é contribuinte do ICMS no caso de comercializar mercadorias, prestar serviços de transporte, ou praticar as atividades previstas no artigo 394 do Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto n° 7.871, de 29 de setembro de 2017.
Ainda, são contribuintes do ICMS os prestadores de serviços de construção civil, por administração, empreitada ou subempreitada, relativamente aos materiais que produzirem fora do local da obra, nos termos do item 7.02 da Lista de Serviços de que trata a Lei Complementar n° 116/2003, conjugado com o disposto no inciso V do art. 2° do Regulamento do ICMS.
Segundo relatado pela consulente, exerce a função de incorporadora direta, construindo por conta própria, em terrenos de sua propriedade, unidades imobiliárias autônomas para posterior revenda. Ainda, nos locais das obras em território paranaense, receberá em transferência estruturas de woodframe, produzidas pelo centro de construção offsite localizado em São Paulo.
Essa atividade, segundo jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça (STJ), não se constitui em prestação de serviço, não estando submetida às disposições do referido item 7.02 da Lista de Serviço anexa à Lei Complementar n° 116/2003.
Nesse sentido, transcreve-se excertos de ementas de julgamentos proferidos pelo Superior Tribunal de Justiça:
"REsp 1166039 / RN
RECURSO ESPECIAL
2009/0222579-7
RELATOR
Ministro CASTRO MEIRA (1125)
ÓRGÃO JULGADOR
T2 - SEGUNDA TURMA
DATA DO JULGAMENTO
01/06/2010
DATA DA PUBLICAÇÃO/FONTE
DJe 11/06/2010
EMENTA
TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE SERVIÇO. INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA DIRETA. CONSTRUÇÃO FEITA PELO INCORPORADOR EM TERRENO PRÓPRIO, POR SUA CONTA E RISCO. NÃO INCIDÊNCIA. AUSÊNCIA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO A TERCEIRO.
1. A incorporação imobiliária é um negócio jurídico que, nos termos previstos no parágrafo único do art. 28 da Lei 4.591/64, tem por finalidade promover e realizar a construção, para alienação total ou parcial, de edificações compostas deunidades autônomas.
2. Consoante disciplina o art. 48 da Lei 4.591/64, a incorporação poderá adotar um dos seguintes regimes de construção:
(a) por empreitada, a preço fixo, ou reajustável por índices previamente determinados (Lei 4.591/64, art. 55);
(b) por administração ou "a preço de custo" (Lei 4.591/64, art.58); ou
(c) diretamente, por contratação direta entre os adquirentes e o construtor (Lei 4.591/64, art. 41).
3. Nos dois primeiros regimes, a construção é contratada pelo incorporador ou pelo condomínio de adquirentes, mediante a celebração de um contrato de prestação de serviços, em que aqueles figuram como tomadores,sendo o construtor um típico prestador de serviços. Nessas hipóteses, em razão de o serviço prestado estar perfeitamente caracterizado no contrato, o exercício da atividade enquadra-se no item 32 da Lista de Serviços, configurando situação passível de incidência do ISSQN.
4. Na incorporação direta, por sua vez, o incorporador constrói em terreno próprio, por sua conta e risco, realizando a venda das unidades autônomas por "preço global", compreensivo da cota de terreno e construção. Ele assume o risco da construção, obrigando-se a entregá-la pronta e averbada no Registro de Imóveis. Já o adquirente tem em vista a aquisição da propriedade de unidade imobiliária, devidamente individualizada, e, para isso, paga o preço acordado em parcelas.
5. Como a sua finalidade é a venda de unidades imobiliárias futuras, concluídas, conforme previamente acertado no contrato de promessa de compra e venda, a construção é simples meio para atingir-se o objetivo final da incorporação direta; o incorporador não presta serviço de "construção civil" ao adquirente, mas para si próprio.
6. Logo, não cabe a incidência de ISSQN na incorporação direta, já que o alvo desse imposto é atividade humana prestada em favor de terceiros como fim ou objeto; tributa-se o serviço-fim, nunca o serviço-meio, realizado para alcançar determinada finalidade. As etapas intermediárias são realizadas em benefício do próprio prestador, para que atinja o objetivo final, não podendo, assim, serem tidas como fatos geradores da exação.
7. Recurso especial não provido.
AgInt no AgInt no TP 946 / RN
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO INTERNO NO PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA2017/0244794-9
RELATOR
Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO (1133)
ÓRGÃO JULGADOR
T1 - PRIMEIRA TURMA
DATA DO JULGAMENTO
15/09/2020
DATA DA PUBLICAÇÃO/FONTE
DJe 21/09/2020
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO NA TUTELA PROVISÓRIA OBJETIVANDO CONFERIR EFEITO SUSPENSIVO ATIVO A RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO CONTRA ACÓRDÃO QUE JULGOU IMPROCEDENTE PEDIDO RESCISÓRIO.
ISSQN. INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA. MATÉRIA JÁ PACIFICADA À ÉPOCA EM QUE PROFERIDO O ACÓRDÃO QUE SE POSTULA RESCINDIR. INAPLICABILIDADE DO ÓBICE DA SÚMULA 343/STF. INAPLICABILIDADE DA RESTRIÇÃO DA SÚMULA 7/STJ. CABIMENTO DE AÇÃO RESCISÓRIA. EXCEPCIONALIDADE DEMONSTRADA. CONSTATAÇÃO DOS REQUISITOS AUTORIZADORES DO DEFERIMENTO DO EFEITO SUSPENSIVO POSTULADO. MANUTENÇÃO DA TUTELA PROVISÓRIA CONCEDIDA, A FIM DE SUSPENDER A EXIGIBILIDADE DOS CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS REFERENTES AOS AUTOS DE INFRAÇÃO 505067072, 505068079 E 505069075, BEM COMO GARANTIR O DIREITO DA SOCIEDADE EMPRESARIAL, ORA AGRAVADA, À EXPEDIÇÃO DE CERTIDÃO POSITIVA COM EFEITOS DE NEGATIVA, CASO INEXISTA QUALQUER OUTRO DÉBITO FISCAL EXIGÍVEL A OBSTAR SUA EXPEDIÇÃO, PARA VIGORAR ATÉ O JULGAMENTO DO RECURSO ESPECIAL POR ESTA CORTE, OU EVENTUAL ALTERAÇÃO DESTA DECISÃO. AGRAVO INTERNO DO MUNICÍPIO DE NATAL/RN A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
[...]
7. Diante disso, verifica-se que, analisando os fatos apresentados pelo Tribunal de origem, a pretensão recursal encontra apoio na jurisprudência consolidada desta Corte Superior, segundo a qual a incorporadora não assume a condição de contribuinte do ISS quando a construção do imóvel é feita pelo incorporador em terreno próprio, por sua conta e risco, hipótese na qual atua como construtor, ainda que durante o período de edificação tenha realizado a venda de unidades autônomas para entrega futura por preço global (cota de terreno e construção).
8. Não se configura, portanto, a prestação de serviços de construção civil do construtor ao adquirente, mas sim para si próprio, objetivando atingir o objetivo final da incorporação direta". is produzidos fora do local da obra, conclui-que a consulente não se caracteriza como contribuinte do ICMS, relativamente à atividade relatada na inicial. Quanto ao diferencial de alíquotas (DIFAL) de que trata o inciso VII do art. 2° do Regulamento do ICMS, não é devido seu recolhimento, tendo em vista que a remessa de material promovida pelo estabelecimento paulista se encontra fora do campo de incidência do ICMS. Ademais, segundo inciso XVI do art. 12 da Lei Complementar n° 87/1996, o fato gerador ocorre na saída de bem ou mercadoria promovida por estabelecimento de contribuinte, condição não preenchida pelo estabelecimento da consulente domiciliado em São Paulo, conforme manifestado pelo Fisco local. Partindo dessa premissa, caso a consulente não realizar movimentação de materiais entre as suas obras localizadas em território paranaense, não será necessário manter inscrição no cadastro estadual. Caso contrário, ou seja, se realizar movimentação de materiais entre suas obras localizadas no Paraná, deverá ser detentora de inscrição estadual neste Estado para cumprimento das obrigações acessórias dispostas nos artigos 392 a 396 do RICMS.
Logo, ainda que utilize em suas construções materiais produzidos fora do local da obra, conclui-se que a consulente não se caracteriza como contribuinte do ICMS, relativamente à atividade relatada na inicial.
Quanto ao diferencial de alíquotas (DIFAL) de que trata o inciso VII do art. 2° do Regulamento do ICMS, não é devido seu recolhimento, tendo em vista que a remessa de material promovida pelo estabelecimento paulista se encontra fora do campo de incidência do ICMS. Ademais, segundo inciso XVI do art. 12 da Lei Complementar n° 87/1996, o fato gerador ocorre na saída de bem ou mercadoria promovida por estabelecimento de contribuinte, condição não preenchida pelo estabelecimento da consulente domiciliado em São Paulo, conforme manifestado pelo Fisco local.
Partindo dessa premissa, caso a consulente não realizar movimentação de materiais entre as suas obras localizadas em território paranaense, não será necessário manter inscrição no cadastro estadual.
Caso contrário, ou seja, se realizar movimentação de materiais entre suas obras localizadas no Paraná, deverá ser detentora de inscrição estadual neste Estado para cumprimento das obrigações acessórias dispostas nos artigos 392 a 396 do RICMS.