Possibilidade de crédito de valor do ICMS normal objeto de auto de infração por uso indevido na compensação do ICMS-ST.
A consulente, sediada no município do Rio de Janeiro, acima identificada, vem solicitar esclarecimentos desta Superintendência acerca da possibilidade de crédito de ICMS relativo a valores que foram utilizados em apurações de períodos anteriores, porém glosados, através de auto de infração, já com decisão administrativa irrecorrível. Trata-se do uso indevido de crédito acumulado do imposto normal para compensação do ICMS-ST, objeto de autuação, e já com decisão administrativa final. Uma vez que parte do seu crédito acumulado de ICMS normal não foi de fato utilizado, por ter sido glosado, questiona se pode se creditar desse valor.
O processo encontra-se instruído com cópias reprográficas que comprovam a habilitação do signatário da inicial para peticionar em nome da empresa (fls. 07 a 13). Constam, às fls. 41 a 43, cópias de documentos que comprovam o pagamento da TSE - Taxa de Serviços Estaduais. O processo foi formalizado no GAC, e encaminhado à AFE 04 - Petróleo e Combustíveis, de jurisdição da consulente, que informou, às fls. 45, que a empresa encontrava-se sob ação fiscal, à época do protocolo do presente administrativo, mas, entretanto, a fiscalização não versa sobre o objeto da consulta tributária, assim como inexistem autos de infração relacionados a este.
A empresa inicia sua explanação informando que exerce a atividade de refino de petróleo e venda de derivados, adquirindo insumos tributados, sendo a maior parte importados, destinados à fabricação de gasolina A, que por sua vez, é comercializada, majoritariamente, para distribuidoras de outras UF. Dessa forma, acumula créditos junto ao estado do Rio de Janeiro, ao se creditar do ICMS da importação e deixar de se debitar do imposto nas saídas interestaduais, devido à imunidade tributária. Informa também que é a responsável pelo pagamento do ICMS-ST, referente ao imposto da cadeia da gasolina, e que na apuração desse imposto, utilizou parte do seu crédito acumulado (do ICMS normal), na compensação do valor devido como ICMS-ST, em alguns períodos de 2011 e 2012. Prossegue afirmando que foi autuada pelo uso, sem autorização do fisco, de crédito de ICMS normal na compensação de ICMS-ST, tendo sido exigidos o ICMS-ST indevidamente compensado com créditos de imposto próprio, e que, apesar de sua defesa, as instâncias administrativas de julgamento decidiram pela procedência do auto de infração. Por fim, questiona sobre a possibilidade dos créditos utilizados, mas glosados, serem revertidos e reintegrados ao seu saldo credor.
Isto posto, consulta, às fls. 05 e 06 (sic):
“16. Diante de tudo quanto exposto, questiona a Consulente se está correto o seu entendimento de que, ante a decisão transitada em julgando no auto de infração nº 03.371982-4, que considerou indevida a transferência do crédito lançado em GIA-ICMS - Substituição Tributária, tem a consulente a possibilidade de reverter os lançamentos efetuados a fim de “retornar” o crédito em sua GIA-ICMS - operações próprias.
17. Estando correto o entendimento da Consulente, e sendo positiva a resposta, questiona ainda qual o procedimento a ser adotado para a recomposição dos créditos próprios.”
Preliminarmente, cumpre ressaltar que a competência da Superintendência de Tributação, bem como da Coordenadoria de Consultas Jurídico Tributárias abrange a interpretação da legislação tributária fluminense em tese, cabendo à verificação da adequação da norma ao caso concreto exclusivamente à autoridade fiscalizadora ou julgadora. Assim como, não cabe à CCJT a verificação da veracidade dos fatos narrados, presumindo-se corretas as informações e documentos apresentados pela consulente.
Reproduzimos abaixo dispositivos relevantes da Lei n.º 2.657/1996, referentes à compensação e apuração do imposto devido:
Art. 32 - O imposto é não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação com o montante cobrado nas anteriores por esta ou por outra unidade da Federação, nos termos e condições estabelecidos neste capítulo.
Art. 33 - O imposto devido resulta da diferença a maior entre os débitos e os créditos escriturais referentes ao período de apuração fixado pelo Poder Executivo.
§ 1º - Os débitos são constituídos pelos valores resultantes da aplicação das alíquotas cabíveis sobre as bases de cálculo das operações ou prestações tributadas.
§ 2º - Os créditos do período são constituídos pelos valores do imposto relativo a operações ou prestações de que decorrerem as entradas de mercadorias no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente, ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação, observadas as restrições previstas na legislação.
§ 4º - Do valor do imposto devido, apurado na forma do caput, são dedutíveis os recolhimentos antecipados e outros valores expressamente previstos na legislação tributária, transferindo-se para o período subsequente o eventual saldo credor.
§ 10 - O contribuinte que desenvolver atividade de revenda de combustíveis e outros derivados de petróleo, conforme definidos em legislação federal, e não sendo esta atividade a preponderante de seu estabelecimento, não poderá creditar-se ao imposto relativo à entrada de mercadorias ou de serviços relacionados a esta atividade.
Art. 34 - O direito ao crédito é condicionado à idoneidade da documentação e à sua regular escrituração, nos prazos e condições estabelecidos na legislação.
Parágrafo único - O direito de utilizar o crédito extingue-se depois de decorridos cinco anos contados da data de emissão do documento.
Art. 35 - Não dão direito a crédito as entradas de mercadorias ou utilização de serviços resultantes de operações isentas ou não-tributadas, ou que se refiram a mercadorias ou serviços alheios à atividade do estabelecimento.
Art. 36 - É vedado o crédito relativo a mercadoria entrada no estabelecimento ou a prestação de serviços a ele feita:
I - para integração ou consumo em processo de industrialização ou produção rural, quando a saída resultante não for tributada ou estiver isenta do imposto, exceto quando se tratar de saída para o exterior;
Art. 37 - O contribuinte efetuará o estorno do imposto creditado sempre que o serviço tomado ou a mercadoria entrada no estabelecimento:
II - for integrada ou consumida em processo de industrialização, quando a saída do produto resultante não for tributada ou estiver isenta do imposto;
Analisando os dispositivos acima reproduzimos podemos concluir que o direito ao crédito se extingue 5 (cinco) anos após a emissão do documento (que lhe deu origem) e é condicionado a sua idoneidade e sua regular escrituração, nos prazos e condições da legislação.
A utilização de saldos credores acumulados está regulamentada no Livro III do RICMS/RJ.
Iniciamos pela provável ilegitimidade do crédito acumulado da consulente. Pelo relatado, a empresa acumula créditos oriundos da entrada de insumos importados aliados a saídas interestaduais não tributadas do produto fabricado. De acordo com o disposto no inciso I do artigo 36 da Lei 2.657/1996, acima reproduzido, é vedado o crédito na entrada de mercadoria para consumo em processo de industrialização quando a saída resultante não for tributada.
Em princípio, a pretensão da consulente seria legítima, já que o direito ao crédito, caso oriundo de documentos idôneos e regularmente escriturados é inequívoco. Entretanto, a consulente DIMINUIU o valor do ICMS-ST que era devido ao estado do Rio de Janeiro, usando parte do seu saldo credor de ICMS normal. Como tal abatimento não é permitido pela legislação estadual, sem a devida autorização prévia do fisco, a empresa foi autuada, e o respectivo auto de infração foi mantido pelas instâncias julgadoras administrativas. Então, para que seja possível, em tese, a autorização para que a consulente “retorne” para seu saldo credor o valor do ICMS glosado no auto de infração, a empresa tem que comprovar o pagamento desse auto de infração. Caso contrário o estado do Rio de Janeiro seria lesado, ao permitir um crédito com valores utilizados, indevidamente, para abater imposto devido. Com o pagamento do auto de infração, entendemos que a consulente passaria, sob certas condições, a fazer jus ao direito de “reaproveitar” como crédito, o valor do ICMS exigido no auto de infração.
Adicionalmente, temos o fator da prescrição do direito de crédito, determinado pelo parágrafo único do artigo 34 da Lei n.º 2.657/1996. O dispositivo fala em cinco anos contados da emissão do documento (que lhe deu origem). Partindo da premissa que a consulente escriturou corretamente seus documentos de entrada, assim como se apropriou corretamente dos créditos ali consignados, e assim como promoveu corretamente os estornos de créditos porventura necessários, teríamos que estes créditos poderiam ser relativos a documentos emitidos até, no máximo, em abril de 2012, pois foram (indevidamente) utilizados até este período de apuração do ICMS-ST, de acordo com o relatado pela consulente. Ou seja, se considerarmos a data de emissão dos documentos fiscais de origem dos créditos, estes já estariam prescritos.
Entretanto, para a situação relatada, consideramos que a data de início da contagem da prescrição do direito ao crédito seria a data de lavratura do auto de infração, sendo este o evento “que teria originado o direito de “reintegração” do crédito”. Como a consulente apresentou impugnação, suspendendo a cobrança do auto, nas duas instâncias administrativas, entendemos que a data de início passaria para a data da ciência do julgamento de 2ª instância. Todavia, como a condição primordial para a reintegração do crédito seria o pagamento do auto, e a decisão de 2ª instância, prevê um prazo de pagamento de 30 dias da sua ciência, concluímos que a data de início da contagem do prazo de verificação da prescrição do direito de crédito seria, no máximo, essa data. Em suma, a data de início da contagem da prescrição será a data do pagamento do auto, caso tenha ocorrido em até 30 dias da ciência da decisão de 2ª instância. Caso contrário será a data de 30 dias da ciência da decisão do Conselho de Contribuintes, ainda que o auto tenha sido pago posteriormente.
Tal postergação do início da contagem do prazo de prescrição não se encontra regulamentada na legislação. Consequentemente, entendemos que podemos decidir como acima desenvolvido.
Não constam do presente administrativo informações sobre as datas de lavratura do auto de infração e das ciências das decisões das instâncias julgadoras. Assim como, também não temos informações sobre o pagamento ou não do auto. Consequentemente, não temos como precisar se o direito ao crédito é real e não se encontra prescrito.
Em resumo, para que a empresa possa ser atendida, e ser permitido o “reaproveitamento” dos créditos, têm que ser cumpridos, cumulativamente, os seguintes requisitos e/ou condições:
1 - pagamento do auto de infração objeto da cobrança do ICMS-ST indevidamente diminuído. O crédito teria que ser limitado ao valor histórico do ICMS cobrado no auto de infração, sem nenhuma atualização e sem os acréscimos moratórios e penalidades ali consignados.
2 – verificação da legitimidade dos créditos originais, pela repartição fiscal. Ainda que já tenha decaído o direito do fisco de cobrar e lançar um eventual crédito indevido, pois estamos falando em créditos originais de 2011 e 2012 ou anteriores, para fins da permissão de crédito pretendida, a repartição deve atestar sua legitimidade. Deve ser verificada a idoneidade dos documentos originais, sua regular escrituração, e se foram efetuados os estornos de créditos eventualmente necessários, principalmente face ao disposto no artigo 36 da Lei n.º 2.657/1996.
3 – verificação da não prescrição do direito do reaproveitamento do crédito, considerando como data de inicio da contagem do prazo de cinco anos, 30 dias após a data da ciência da decisão do Conselho de Contribuintes pela procedência do auto de infração (ou a data do pagamento do auto, se ocorreu em até 30 dias da ciência da decisão de 2ª instância).
Quanto aos procedimentos que a consulente deve adotar no caso de cumprida a primeira condição acima (o pagamento do auto de infração), entendemos que deve formalizar administrativo, junto à sua repartição fiscal, pleiteando este crédito e informando, tanto a data do pagamento do auto de infração quanto a data da ciência da decisão do Conselho de Contribuintes, anexando toda a documentação comprobatória.
Posteriormente, o interessado deve relacionar, na forma determinada pela repartição fiscal, todos os documentos fiscais que originalmente geraram o saldo credor do ICMS próprio indevidamente utilizado para abater o ICMS-ST, assim como comprovar sua regular escrituração, para que seja possível a verificação da legitimidade do crédito original. A repartição, no caso de cumprimento das três condições acima, poderá, então, autorizar o contribuinte a se creditar. Para tal, efetuará um lançamento em Outros Créditos, na apuração do ICMS próprio, no período da ciência do deferimento do pedido do crédito, pelo valor histórico do ICMS exigido no auto de infração. Na EFD, o valor do crédito permitido deverá compor o campo 08 do registro E110 e obrigatoriamente, deverão ser informados os registros E111 e E112, sendo que:
- o campo 03 do Registro E111 deve ser preenchido com: “Reaproveitamento de crédito referente a pagamento, em yyyy, do auto de infração nº xxxx, relativo a uso indevido de crédito de ICMS próprio para abater ICMS-ST”;
- o campo 04 do Registro E111 deve ser preenchido com o valor autorizado para o reaproveitamento do crédito;
- o campo 02 do Registo E112 deve ser preenchido com as informações do DARJ do pagamento do auto de infração;
- o campo 03 do Registo E112 deve ser preenchido com o número do Processo Administrativo que autorizou o reaproveitamento do crédito;
- o campo 04 do Registo E112 deve ser preenchido com “0”, referente à SEFAZ;
- o campo 05 do Registo E112 deve ser preenchido com: “Deferimento do pedido de reaproveitamento de crédito referente a pagamento, em yyyy, do auto de infração nº xxxx, relativo a uso indevido de crédito de ICMS próprio para abater ICMS-ST”.
Quanto ao primeiro questionamento, respondemos que está EQUIVOCADO o entendimento da consulente. Não é o transito em julgado do auto de infração que permitiria o reaproveitamento do crédito. A consulente poderá “reaproveitar” o crédito “utilizado” e glosado no auto de infração, somente se cumpridas, cumulativamente, as seguintes condições:
1 - comprovação do pagamento do auto de infração;
2 - não ter ocorrido a prescrição do direito ao crédito, considerando como data de início da contagem do prazo, 30 dias após a ciência da decisão do Conselho de Contribuintes pela procedência do auto de infração (ou a data do seu pagamento, se esta foi em até 30 dias da ciência); e,
3 - a repartição de jurisdição atestar formalmente a legitimidade dos créditos originais, observando, especialmente, a necessidade de estorno de crédito em relação às saídas posteriores não tributadas, além de, expressamente, deferir o pleito no processo formalizado.
Quanto ao segundo questionamento, respondemos que a consulente deve adotar os seguintes procedimentos:
1 – formalizar, junto à repartição de jurisdição, pedido de reaproveitamento de crédito, onde deve informar e comprovar com documentação apropriada a data do pagamento do auto de infração e a data da ciência da decisão de 2ª instância.
2 – atender eventuais intimações da repartição, no sentido de apresentar, da forma por ela exigida, documentação para comprovação da legitimidade do crédito que acumulou.
3 – em caso de deferimento do pleito, a consulente deverá lançar o crédito em Outros Créditos, na sua apuração de ICMS próprio do período da sua ciência do deferimento. Na EFD, o valor do crédito permitido deverá compor o campo 08 do registro E110 e obrigatoriamente, deverão ser informados os registros E111 e E112, sendo que:
- o campo 03 do Registro E111 deve ser preenchido com: “Reaproveitamento de crédito referente a pagamento, em yyyy, do auto de infração nº xxxx, relativo a uso indevido de crédito de ICMS próprio para abater ICMS-ST”;
- o campo 04 do Registro E111 deve ser preenchido com o valor autorizado para o reaproveitamento do crédito;
- o campo 02 do Registo E112 deve ser preenchido com as informações do DARJ do pagamento do auto de infração;
- o campo 03 do Registo E112 deve ser preenchido com o número do Processo Administrativo que autorizou o reaproveitamento do crédito;
- o campo 04 do Registo E112 deve ser preenchido com “0”, referente à SEFAZ;
- o campo 05 do Registo E112 deve ser preenchido com: “Deferimento do pedido de reaproveitamento de crédito referente a pagamento, em yyyy, do auto de infração nº xxxx, relativo a uso indevido de crédito de ICMS próprio para abater ICMS-ST”.
CCJT, em de setembro de 2018.