Consulta Nº 20 DE 21/03/2019


 


Devolução De Mercadoria Sujeita Ao Regime De Substituição Tributária. Ausência De Destaque No Documento Emitido Por Contribuinte Substituído Paranaense Que Realiza A Devolução Tendo Em Vista O Disposto Na Legislação Tributária Do Paraná. Remetente Fluminense Substituto Tem Direito Ao Crédito Do ICMS Relativo À Operação Própria Se Cumpridos Os Requisitos Formais De Escrituração Sob Condição Resolutória, Tendo Em Vista Tratar-Se De Tributo Não-Cumulativo Lançado Por Homologação.


Banco de Dados Legisweb

Trata-se de consulta formulada por empresa “do ramo da fabricação de bebidas alcoólicas”, que fornece “mercadorias sujeitas ao regime de substituição tributária a adquirentes localizadas em outras unidades federadas” (fl. 03).

Em resposta à indagação formulada por esta Coordenação (fls. 38/39), a AFE 11 retifica a informação anterior, no sentido de que estaria prejudicada a consulta (fl. 35), e “ressalta a diferença das operações, uma vez que consulta abrange operações submetidas ao regime de substituição tributária, diferentemente do ocorrido na planilha anexa ao Ofício 26/2018”. Assim, parece-me superada a preliminar suscitada de forma genérica à fl 35.   

O consulente salienta que seu cliente contribuinte localizado no Estado do Paraná, por força do disposto no art. 9º do Anexo X do RICMS PR (Decreto nº 6.080, de 28/09/2012), ao realizar devolução de mercadoria, que fora anteriormente submetida ao regime de substituição tributária, emite “documento fiscal na forma regulamentar, sem destaque do imposto, indicando o número e a data da nota fiscal emitida quando da remessa originária, assim como os motivos da devolução” (grifo inexistente no original). Em síntese, “o contribuinte paranaense que promove a devolução, apenas indica no campo próprio o número da nota fiscal correspondente à aquisição e no campo ‘Informações Complementares’ o motivo da devolução e os valores da base de cálculo, sem destaque do ICMS” (fl.4).

Após considerações gerais sobre o tema, questiona (fl. 8/9):

1. “Nas devoluções de mercadorias sujeitas à Substituição Tributária, o contribuinte substituto com sede no Estado do Rio de Janeiro poderá se apropriar do crédito de ICMS relativo à devolução de mercadoria por pessoa jurídica que, em razão do disposto na legislação estadual de sua unidade federada, não emite Nota Fiscal com destaque do imposto?

2. Entendendo-se pela impossibilidade de creditamento, tal entendimento não acarretaria a violação à não-cumulatividade?

3. Do contrário, entendendo-se pela possibilidade de creditamento, como deverá ser registrado o crédito na escrita fiscal?”

Importante ressaltar que, estranhamente, a nota fiscal incluída para exemplificar a operação (fl. 5), não é documento fiscal que tenha como destinatário o consulente, além de ser relativa transação com pneu, e não “do ramo da fabricação de bebidas alcoólicas”.

Sugiro que a (ir)relevância desse fato seja examinado pela AFE 11 –Bebidas.  

Por fim, saliente-se que a petição inicial (fls. 03 a 09) está devidamente assinada e acompanhada pelo comprovante do pagamento da taxa de serviços estaduais (fls. 10 a 12).

É o relatório.

Resposta:

Esta consulta não produzirá os efeitos que lhe são próprios caso seja editada norma superveniente que disponha de forma contrária à resposta dada no presente processo.

Preliminarmente, importante salientar que a esta Coordenadoria de Consultas Jurídico-Tributárias compete tão somente interpretar a legislação tributária já editada, assumindo como verdadeiros os fatos descritos pelo contribuinte, não sendo atribuição deste órgão avaliar a constitucionalidade, legalidade, adequação ou pertinência de norma vigente, tampouco realizar procedimentos fiscais visando conferir a exatidão das alegações apresentadas.  

Isto posto, saliente-se que a legislação tributária do Estado do Rio de Janeiro não disciplina de forma expressa os procedimentos a serem adotados por contribuinte fluminense na hipótese descrita na inicial, isto é, em situação na qual o estado de localização do remetente da mercadoria devolvida determina a emissão de documento fiscal sem destaque do imposto, indicando, no entanto, o número e a data da nota fiscal emitida, quando da remessa originária, e “o motivo da devolução” (fl. 4).

Diante da aludida omissão e da consulta formulada, entendo ser necessário disciplinar duas situações distintas. A primeira relativamente às notas fiscais já recebidas pelo consulente até o momento e cujo crédito não foi apropriado. A segunda no que alude às notas fiscais relativas às operações que ainda ocorrerão.

No que se refere às notas fiscais de entrada já recebidas, entendo aplicável o disposto nos §§ 4º e 5º do art. 30 do Livro I do RICMS/00, os quais estabelecem:

Art. 30. (...)

(...)

§ 4.º Quando o documento fiscal deixar de ser escriturado no prazo previsto na legislação, o contribuinte deverá, para aproveitamento do crédito extemporâneo, adotar os procedimentos previstos em ato do Secretário de Estado de Fazenda.

§ 5.º O procedimento previsto no § 4.º aplica-se, ainda, à hipótese em que o documento fiscal tiver sido escriturado sem crédito do ICMS e este for cabível.”

Nesses termos, considerando que o RICMS prevê que o “procedimento previsto no § 4.º” também é aplicável “à hipótese em que o documento fiscal tiver sido escriturado sem crédito do ICMS e este for cabível”, entendo que na hipótese das notas fiscais de entrada já recebidas deve ser adotada a disciplina prevista na Resolução SEFAZ nº 202/2018.

Por outro lado, no que alude às notas fiscais relativas às operações que ainda ocorrerão, entendo que, diante da inexistência de legislação expressa, aplica-se o disposto no art. 108 do Código Tributário Nacional, o qual dispõe:

Art. 108. Na ausência de disposição expressa, a autoridade competente para aplicar a legislação tributária utilizará sucessivamente, na ordem indicada:

I - a analogia;

II - os princípios gerais de direito tributário;

III - os princípios gerais de direito público;

IV - a eqüidade.

§ 1º O emprego da analogia não poderá resultar na exigência de tributo não previsto em lei.

§ 2º O emprego da eqüidade não poderá resultar na dispensa do pagamento de tributo devido.

Acerca da analogia ensina Miguel Reale1:

O processo analógico é no fundo um raciocínio baseado em razões relevantes de similitude. Quando encontramos uma forma de conduta não disciplinada especificamente por normas ou regras que lhe sejam próprias, consideramos razoável subordiná-la aos preceitos que regem relações semelhantes, mas cuja similitude coincida em pontos essenciais.

No Estado do Rio de Janeiro, a nota fiscal de devolução deve ser emitida com a mesma base de cálculo e a mesma alíquota constante do documento fiscal que acobertou a remessa da mercadoria, em relação ao imposto próprio, de acordo com o artigo 35 do Anexo XIII da Parte II da Resolução SEFAZ nº 720/14. A base de cálculo de retenção e o imposto retido também devem ser informados nos campos próprios da NF-e, nos termos do § 4º do artigo 35 acima citado.

Na hipótese de erro no destaque do imposto, devem ser observados os artigos 32 e 33 do Livro I do RICMS-RJ/00. O mencionado artigo 32 do Livro I do RICMS/00 estabelece:

Art. 32. O valor do imposto destacado no documento fiscal, relativo à operação de que decorrer a entrada da mercadoria, é meramente informativo, cumprindo ao contribuinte conferir sua exatidão.

§ 1.º Se o destaque se apresentar em valor inferior ao correto, o contribuinte creditar-se-á, inicialmente, pelo valor destacado, exigindo do remetente documento fiscal relativo à diferença havida, para creditar-se do valor restante.

§ 2.º Na ausência de destaque, o contribuinte exigirá do remetente documento fiscal suplementar.

Considerando que em operação interestadual o remetente se subordina ao disposto na legislação do Estado de origem da remessa, não é possível aplicar o transcrito § 2.º do art. 32 do Livro I do RICMS/00, haja vista a autonomia do Estado do Paraná para disciplinar a matéria em seu território, onde se localiza o remetente que realiza a devolução. Inaplicável, portanto, a analogia à hipótese, deve-se recorrer aos os princípios gerais de direito tributário.  

Nesses termos, considerando o princípio da não cumulatividade que norteia o ICMS, a teor do disposto no inciso I do §2º do art. 155 da Constituição da República Federativa do Brasil, e tendo em vista que o ICMS é imposto lançado por homologação, consoante o disposto no art. 150 do Código Tributário Nacional, parece-me que a solução mais adequada ao caso é subordinar o crédito imediato do imposto pelo contribuinte fluminense a dois grupos de requisitos, cumulativamente. 

Isso porque, nos termos do art. 34 da Lei nº 2.657/96 “o direito ao crédito é condicionado à idoneidade da documentação e à sua regular escrituração, nos prazos e condições estabelecidos na legislação”.

O primeiro, no sentido de que a nota fiscal NF-e de devolução de mercadoria informe o documento relativo à remessa original, isto é, que haja referência expressa à NF-e inicialmente emitida pelo contribuinte fluminense, além de conter no campo Informações Adicionais do Produto (1) “o motivo da devolução”, (2) o “percentual da mercadoria devolvida” e (3) o montante do ICMS correspondente à mercadoria devolvida.  

Com efeito, o próprio Manual de Orientação do Contribuinte (MOC) indica como aplicação obrigatória a mensagem 321, de rejeição para NF-e de devolução de mercadoria que não possua o documento fiscal referenciado2. Na mesma linha, o MOC também estabelece a obrigatoriedade de o remetente informar o percentual de mercadoria devolvida3.

O segundo grupo de requisitos é lançar, mensalmente, na Escrituração Fiscal Digital (EFD), no “Registro C110” e “filhos”, os dados contidos no campo “Informações Complementares da Nota Fiscal” acima referidos (1, 2 e 3).

Atendidos esses requisitos, entendo que o contribuinte fluminense está apto a se creditar do ICMS indicado no campo “Informações Adicionais do Produto” da NFe de devolução.

Com efeito, o argumento corretamente utilizado pelo Fisco, como regra geral, no sentido de que o crédito subordina-se ao destaque do imposto na nota fiscal de aquisição (emitida pelo fornecedor) deve ser interpretado à luz do caso concreto e, diante das circunstâncias ora descritas, parece-me inaplicável a regra mencionada no § 2.º do art. 32 do Livro I do RICMS/00. Nessa linha, repise-se que, de acordo com o art. 34 da Lei nº 2.657/96 constatada a “idoneidade da documentação e à sua regular escrituração, nos prazos e condições estabelecidos na legislação” o contribuinte tem “direito ao crédito” do imposto que foi objeto de incidência e pagamento em etapa de circulação anterior, como é a hipótese de que trata a tese do presente administrativo.

Por todo o exposto, entendo que o contribuinte fluminense substituto tributário que recebe mercadoria em devolução de unidade federada que proíba o destaque do imposto na NFe tem direito ao crédito do ICMS relativo à operação própria, observados os requisitos acima indicados, sob condição resolutória, tendo em vista tratar-se de tributo não-cumulativo lançado por homologação.

Assim, respondendo objetivamente às perguntas formuladas na inicial:

1. “Nas devoluções de mercadorias sujeitas à Substituição Tributária, o contribuinte substituto com sede no Estado do Rio de Janeiro poderá se apropriar do crédito de ICMS relativo à devolução de mercadoria por pessoa jurídica que, em razão do disposto na legislação estadual de sua unidade federada, não emite Nota Fiscal com destaque do imposto?”

Sim, desde que:

a) a nota fiscal NF-e de devolução de mercadoria informe o documento relativo à remessa original, isto é, que haja referência expressa à NF-e inicialmente emitida pelo contribuinte fluminense, além de conter no campo Informações Adicionais do Produto (1) “o motivo da devolução”, (2) o “percentual da mercadoria devolvida” e (3) o montante do ICMS correspondente à mercadoria devolvida; e

b) o contribuinte lance, mensalmente, na Escrituração Fiscal Digital (EFD), no “Registro C110” e “filhos”, os dados contidos no campo “Informações Complementares da Nota Fiscal” acima referidos (1, 2 e 3).

2. Entendendo-se pela impossibilidade de creditamento, tal entendimento não acarretaria a violação à não-cumulatividade?

Prejudicada.

3. Do contrário, entendendo-se pela possibilidade de creditamento, como deverá ser registrado o crédito na escrita fiscal?”

Respondida no item “b” da resposta 1.

CCJT, em  de            de 2019.