Consulta Nº 90 DE 21/11/2024


 


ICMS. Importação. Diferimento parcial. Operação posterior. Decreto nº 46.781/2019


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RELATÓRIO

Trata-se de consulta formulada por contribuinte fluminense. A petição inicial (doc. 80665804) está acompanhada do comprovante de pagamento da taxa de serviços estaduais (doc. 80665812) e demais documentos relativos ao contribuinte (docs. 80665807, 80665810, 80665813 e 80665814). 

A consulente apresenta dúvidas relacionadas ao diferimento parcial previsto no decreto nº 46.781/2019, em especial sobre o cálculo e recolhimento do imposto no momento do desembaraço aduaneiro e nas posteriores saídas, interna ou interestadual, conforme o caso. 

A AFE 05 informou que “não há qualquer RAF em aberto m face do Contribuinte. Informo ainda, que se encontra na situação Habilitado Regular, Regime Normal de Apuração, sem qualquer Auto de Infração vencido ou Parcelamento em Aberto.”, vide docs. 84032600 e 80721705. 

Preliminarmente, registre-se que compete a esta Coordenadoria de Consultas Jurídico-Tributárias (CCJT) a interpretação da legislação tributária fluminense em tese, cabendo a verificação da adequação da norma ao caso concreto exclusivamente à autoridade fiscalizadora ou julgadora. Assim, a análise e verificação dos produtos, operações e informações indicados na petição inicial, inclusive no que tange ao eventual enquadramento em tratamento tributário diferenciado e cumprimento de regras e requisitos existentes, por exigirem “atividades de fiscalização especificas”, competem à respectiva Auditoria Fiscal, conforme o caso[1]

Registre-se ainda que a legislação que rege o procedimento de consulta estabelece que os questionamentos devem ser apresentados com clareza e precisão, bem como devem conter a respectiva interpretação da consulente. Ademais, supõe-se que a consulente faça jus ao tratamento tributário previsto no Decreto nº 46.781/19 e Resolução nº 112/20.

Em relação ao diferimento parcial previsto no decreto nº 46.781/19, esta Coordenadoria, por meio da resposta de consulta nº 068/24, esclareceu como deve ser efetuado o cálculo do imposto, em observância ao previsto na legislação fluminense. A seguir é reproduzido trecho que elucida como a consulente deve calcular:

O Decreto nº 46.781/19, portanto, não estabelece base de cálculo ou alíquota, bem como não altera o fato gerador, apenas define como o valor do imposto calculado será recolhido, parte no desembaraço aduaneiro e outra parte na posterior operação de saída interna ou interestadual, conforme o caso, observado o art. 3º do referido decreto.

Assim, consideradas as disposições contidas no Anexo XVIII da Parte II da Resolução nº 720/14, .em especial art. 2º e §§ 1º e 2º do art. 5º [2], para o cálculo do diferimento parcial previsto no Decreto nº 46.781/19, com base, hipoteticamente, no ‘preço na nota fiscal’ de 100, adotam-se as seguintes fórmulas:

Valor do ICMS diferido = {[(100 / (1 – 0,18)) * 0,18] * 0,7778 [3]} 

Valor do ICMS no desembaraço aduaneiro = {[(100 / (1 – 0,18)) * 0,18] * 0,2222 [4]} 

Diante do exposto, entendemos que deve ser utilizada a alíquota aplicável às importações (18%), obtida a partir do inciso IV do art. 14 da Lei nº 2.657/96 e Lei Complementar nº 210/23, para a formação da base de cálculo, a fim de respeitar (i) o contido na alínea "i" do inciso XII do § 2º do artigo 155 da Constituição Federal; no inciso I do § 1º do artigo 13 da Lei Complementar nº 87/96 e no inciso I do caput do artigo 5º da Lei nº 2.657/96; (ii) a reserva legal correspondente aos referidos elementos do imposto; (iii) aquilo que se entende por diferimento e (iv) o § 2º do art. 5º do Anexo XVIII da Parte II da Resolução nº 720/14.

Conforme extraído da parte preliminar do decreto nº 46.781/19, estes são alguns dos objetivos que motivaram a edição do referido ato:

CONSIDERANDO:

- a competência atribuída pelo § 6º do artigo 17 da Lei nº 2657/96, de 26 de dezembro de 1996;

- que a referida disciplina é tratada atualmente pela Resolução SEFAZ nº 726/14, de 19 de fevereiro de 2014; (grifo nosso) 

- que existe um plano estratégico de governo que visa fomentar as atividades de comércio exterior no território fluminense; 

- que a existência de um programa de estimulo a importações tem potencial para incrementar as atividades portuárias e aeroportuárias; e 

- o que consta no Processo nº E-04/058/38/19, DECRETA:

A expressamente citada Resolução SEFAZ nº 726/14, por sua vez, tinha, entre seus objetivos, “inibir o acúmulo de saldos credores em montantes elevados e continuados, em razão da aplicação da alíquota de 4% (quatro por cento)” prevista na Resolução do Senado Federal nº 13/12[5], ato este que possivelmente afetou a competitividade de algumas empresas, a depender de seu plano ou modelo de negócio e rede de clientes. 

Esta Coordenadoria já se manifestou no sentido que o diferimento previsto na referida resolução “não causa a redução ou eliminação do ônus do imposto, pois, face ao princípio da não-cumulatividade, o importador tem direito ao crédito do ICMS pago na importação”. Assim, “o diferimento do ICMS incidente na importação da mercadoria tão somente evita o acúmulo de saldo credor do imposto”. 

Além disso, em geral, como observado em diversas consultas respondidas por este órgão, a exemplo das consultas nº 013/23 e 062/23, “o diferimento do ICMS consiste na postergação do recolhimento do tributo. 

Ou seja, quando o lançamento e o pagamento do imposto são transferidos para etapa posterior à ocorrência do fato gerador, desonerando do imposto as etapas antecedentes, o que o insere no contexto da exclusão e, em alguns casos, de uma espécie de isenção (na hipótese em que é pago englobadamente com as saídas dos produtos, não se aplicando o disposto no artigo 39 do Livro I do RICMS/00)”. 

No caso analisado nos presentes autos, conforme artigo 3º do decreto nº 46.781/19, “o ICMS diferido será recolhido englobadamente com o ICMS próprio incidente na operação de saída interna ou interestadual, observado o disposto no § 3º do artigo 1º”. 

Parece-nos, portanto, que o decreto nº 46.781/19 também busca inibir o acúmulo de saldos credores em montantes elevados e continuados, em razão da alíquota de 4% (quatro por cento) prevista na Resolução do Senado Federal nº 13/12, não apenas em virtude da indicação expressa da Resolução SEFAZ nº 726/14, mas também da adoção de técnica tributária de diferimento com pagamento do imposto diferido englobadamente com as saídas dos produtos. 

Consideradas as hipóteses trazidas na petição inicial, quando da operação de saída interna ou interestadual posterior à importação, a consulente aplicará a alíquota respectiva (22% ou 4%, conforme o caso) à base de cálculo da referida operação a fim de obter o imposto devido. 

Exemplifica-se a seguir o cálculo[6]

(1) Importação

(1.1) Valor do ICMS diferido = {[(1000 / (1 – 0,18)) * 0,18] * 0,7778} = 170,73

(1.2) Valor do ICMS recolhido no desembaraço aduaneiro = {[(1000 / (1 – 0,18)) * 0,18] * 0,2222} = 48,78

(1.3) Valor total do imposto calculado na respectiva importação: 219,51 ( [(1000 / (1 – 0,18)) * 0,18] ).

(2) Saída interna ou interestadual da mercadoria importada:

(2.1) Saída interna Imposto exigível: [(2000 / (1 – 0,22[7]

(2.1.1) Parcela do imposto exigível relativa ao ICMS diferido = 170,73

(2.1.2) Parcela do imposto exigível relativa ao ICMS da operação própria da saída interna = 290,81 (461,54 – 170,73)

(2.2) Saída interestadual

Imposto exigível: [(2000 / (1 – 0,04)) * 0,04] = 83,33 

Parcela do imposto exigível relativa ao ICMS diferido = 83,33 

Em geral, existirá parcela do imposto exigível relativa ao ICMS da operação própria da saída se o imposto exigível for superior ao ICMS diferido.

Importante destacar as disposições contidas no § 7º do art. 1º do decreto nº 46.781/19:

§ 7º - Fica vedada a compensação do ICMS diferido, nos termos previstos neste Decreto, com saldo credor acumulado de ICMS registrado na escrita fiscal.

Observe-se ainda que, em regra, “nas hipóteses em que a legislação determina que o imposto diferido seja pago englobadamente com o devido pela saída, não há crédito a ser apropriado” (consulta nº 16/23). 

Entretanto, no caso do diferimento parcial em exame, a fim de observar a não-cumulatividade, e diante da ausência de vedação ao respectivo crédito, a parcela do imposto recolhida no desembaraço aduaneiro é passível de aproveitamento na forma de crédito, observadas, no que couber, as disposições e restrições normativas fluminenses, em especial aquelas contidas nos Livros I, VI e XI do RICMS/00. 

[1] Nos termos contidos no Anexo da Resolução SEFAZ nº 414/2022. 

[2] “Art. 2º - Para efeito das hipóteses previstas nos artigos 3º, 4º e 5º:

I - fica denominado como “Manual de Benefícios”, o Manual de Diferimento, Ampliação de Prazo de Recolhimento, Suspensão e de Incentivos e Benefícios de Natureza Tributária, aprovado pelo Decreto nº 27815/01; 

II - considera-se: (...) 

b) “Alíquota” aquela vigente para as operações/prestações realizadas pelo contribuinte, desconsiderada a incidência de benefício ou incentivo fiscal, incluído o adicional relativo ao Fundo de Combate à Pobreza e às Desigualdades Sociais - FECP;

(...)

Art. 5º Na hipótese de operações com modalidades de desoneração classificadas como "Diferimento" no Manual de Benefícios, será utilizado o código 51 relativo ao Código de Situação Tributária - CST. 

§ 1º Nos casos de diferimento total, o campo "Valor do ICMS diferido" deverá ser preenchido com o resultado da:

3. RESPOSTA

seguinte fórmula:

Valor do ICMS diferido = (Preço na Nota Fiscal / (1 - Alíquota)) * Alíquota )) * 0,22] = 461,54

 § 2º Nos casos de diferimento parcial, para o preenchimento do campo "Valor do ICMS diferido" o resultado da fórmula referida no § 1º deverá ser multiplicado pelo percentual de diferimento aplicável.”. 

[3] O percentual de diferimento aplicável está compreendido em intervalo até 100 (sendo este relativo ao diferimento total). Veja-se o ‘Manual de preenchimento de documentos fiscais e escrituração – Benefícios Fiscais’ , p.ex., pág. 27: 

“Percentual do diferimento, campo pDif: informar o percentual. No caso de diferimento total, informar o percentual de diferimento "100"”. O valor 0,7778 (77,78) corresponde a 14/18 e 0,2222 (22,22), a 4/18. 

[4] Observado ainda o § 5º do art. 1º do Decreto nº 46.781/19

[5] Estabelece alíquotas do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS), nas operações interestaduais com bens e  mercadorias importados do exterior.

[6] Adota-se também o preço de nota fiscal de 1000 na importação e 2000 nas saídas posteriores interna e interestadual. 

[7] Alíquota da operação interna de 22%, já considerados os 2% destinados ao FECP.

Diante do exposto, são respondidos objetivamente os questionamentos formulados pela consulente: 

a) “O benefício concedido pelo art. 1°, § 4°, do Decreto/RJ nº 46.781/2019 torna menor o desembolso de caixa da Consulente quando do desembaraço aduaneiro (4%)?”. 

Os contribuintes sujeitos à previsão contida no inciso I do art. 1º do decreto nº 46.781/19 devem recolher o percentual de 4% do imposto obtido no momento do desembaraço aduaneiro. S.m.j., este valor será inferior ao eventualmente recolhido a partir da adoção das regras regulares de tributação. O cálculo do imposto deve observar as regras normativas vigentes, em especial o § 2º do art. 5º do Anexo XVIII da Parte II da Resolução nº 720/14, como exposto na consulta nº 068/24 e reproduzido neste parecer. 

b) “Elimina a hipótese de saldo credor acumulado de ICMS em operações interestaduais?”. 

c) “Extingue o atual desequilíbrio econômico-fiscal enfrentado pela Consulente (resultado de o saldo credor acumulado de ICMS não poder ser aproveitado para compensação com o próprio tributo - ou com outros - acaba se transformando em custo da mercadoria revendida, tornando as operações da Consulente deficitárias)?”.

O decreto nº 46.781/19, na esteira do anteriormente previsto na Resolução SEFAZ nº 726/14, também buscou inibir o acúmulo de saldos credores em montantes elevados e continuados. 

Cumpridas as regras previstas no referido decreto, em especial no que se refere ao disposto no § 3º do art. 1º, s.m.j., reduz-se a hipótese de saldo credor acumulado de ICMS em operações interestaduais com mercadorias importadas.

d) “Final e especificamente no que se refere ao presente processo, regido pelo Decreto nº 2.473/79, a Consulente questiona:

(i) Se está correto seu entendimento no sentido de que, durante o curso da presente Consulta, qualquer incidência de mora (juros e multa) restará suspensa. 

(ii) Se está correto seu entendimento no sentido de que, o curso da mora somente recomeçará a partir do décimo quinto dia após a ciência da Consulente para, quando for o caso, adotar o entendimento da administração e compensar/recolher/liquidar o tributo porventura devido.”. 

Observem-se os artigos 176 do decreto-lei nº 05/75 (Código Tributário Estadual fluminense) e 162 do decreto nº 2.473/79 (PAT/RJ).

Esta consulta não produzirá os efeitos que lhe são próprios caso seja editada norma superveniente que disponha de forma contrária à presente resposta dada ou ocorra mudança de entendimento por parte da Administração Tributária.