Consulta Nº 76 DE 16/11/2020


 


Inutilização ou Perda de Mercadoria. Covid–19. Manutenção dos Créditos do ICMS de Forma Temporária: Inadmissibilidade. Ausência de Amparo Legal.


Monitor de Publicações

RELATÓRIO.

A empresa, estabelecimento não inscrito no Cadastro de Contribuinte do ICMS (CAD-ICMS) do Estado do Rio de Janeiro, inicialmente, através do documento “Petição (4288970)”, considerando os prejuízos que o grupo empresarial estima suportar em face do perecimento de produtos, requer que seja autorizada - de forma temporária, em face de situação excepcional de desastre natural em que se encontra o país, decorrente da pandemia internacional ocasionada pela infecção pelo coronavírus (Covid-19) -, a manter os créditos do ICMS apurados e escriturados, relativos aos produtos acabados que pereceram ou que vierem a perecer em razão da integral ou parcial suspensão das atividades dos estabelecimentos que, por esse motivo, estão sendo descartados pela empresa.

Atendendo à nossa solicitação no “Parecer 100 (5909460)”, através do documento “Petição Manifestação Créditos Insumos (10728297)”, ratificou seu requerimento, indicando estabelecimento localizado no Estado do Rio de Janeiro, bem como efetuou o pagamento da Taxa de Serviços Estaduais.

Relata a requerente que suas operações vêm sofrendo um grande revés, em razão da significativa redução no escoamento dos seus produtos, apesar da também significativa redução da sua produção, na medida em que aqueles já produzidos e postos à venda estão perecendo e, portanto, se tornando impróprios para o consumo, impossibilitando, consequentemente, a sua comercialização.

Os produtos que se tornam impróprios para consumo em razão do perecimento ou qualquer outro motivo, diante da necessidade de descarte em conformidades da legislação aplicável, retornam às suas fábricas, que possuem estações de tratamento para este fim.

A consulente está ciente que, pela regra geral contida no inciso IV do artigo 21 da citada Lei Complementar n.º 87/9, no caso de retorno dos produtos às fábricas e sendo descartados em razão de perecimento, deveria estornar os créditos do ICMS apurados e escriturados, relativos aos produtos acabados.

Entretanto, pondera que o perecimento dos produtos está ocorrendo por motivos alheios a sua vontade, pois a redução do escoamento, que implica no seu perecimento, se dá única e exclusivamente em razão da pandemia do Covid -19 e a consequente determinação de distanciamento social, que atingiu diretamente as atividades de seus principais clientes.

Destaca que alguns Estados preveem na legislação a manutenção desses créditos em situação específicas, especialmente naquelas decorrentes de desastres naturais, assim como é a própria pandemia, condicionando à decretação de calamidade pública ou situação de emergência, o que foi feito pelo Estado por meio do Decreto n.º 46.984/20.

Considerando que o país está em situação nunca antes vista e/ou imaginada e/ou esperada pelo legislador, sendo improvável previsão específica sobre a ocorrência de pandemias, assim como as suas consequências nas atividades comerciais e nas obrigações tributárias;

Considerando os prejuízos que a requerente terá que suportar em face do perecimento dos produtos;

Requer:

Ser autorizada, de forma temporária, com fundamento na situação excepcional de desastre natural em que se encontra o país, decorrente da pandemia internacional ocasionada pela infecção humana pelo Covid-19, a manter os créditos do ICMS apurados e escriturados, relativos aos produtos acabados que pereceram ou que vierem a perecer em razão da integral ou parcial suspensão das atividades dos estabelecimentos e que, por esse motivo, estão sendo descartados pela requerente.

O processo encontra-se instruído com cópias digitalizadas do “Documento Procuração (4288972)”, e do comprovante do pagamento da TSE, que está no arquivo Anexo “Doc. 01- Comprovante de Recolhimento (10728300)”.

ANÁLISE E FUNDAMENTAÇÃO.

Através do presente processo, a empresa requer autorização para manutenção de créditos do ICMS, de forma temporária, em razão de uma situação especialíssima. Face o “Relatório de Fiscalização SEFAZ/AFE 07 10752562”, cumpre-se esclarecer que a matéria objeto do presente processo demanda a identificação na legislação da existência de previsão que dê amparo à decisão, razão pela qual o requerimento autonomamente se converte, revestindo -se em consulta jurídico-tributária a ser analisada por esta Coordenadoria, conforme competência atribuída pelo artigo 36 do Anexo IV da Resolução SEFAZ n.º 48/19, o que motivou o Despacho de Encaminhamento de Processo SEFAZ/AFE 11 4318753 e Despacho de Encaminhamento de Processo SEFAZ/SSER 5762147, e determinação para a observância das normas da Resolução SEF n.º 109/76. Isto posto, passamos ao exame do mérito.

Conforme citado na petição, o Decreto n.º 46.984/20 decretou Estado de Calamidade Pública no Estado do Rio de Janeiro em decorrência do novo coronavírus (Covid-19), porém, sem abordar questões tributárias.

O Decreto n.º 46.973/20 que, primeiramente, reconheceu a situação de emergência na saúde pública no Estado do Rio de Janeiro em razão do contágio e adotou medidas para o enfrentamento da propagação decorrente do Covid -19, também não abordou questões tributárias, com normas que se permitissem alguma compensação relacionada ao ICMS em face da retração da atividade econômica, com todas as suas consequências.

Substituindo o citado Decreto n.º 46.973/20, também dispondo sobre as medidas de enfrentamento da propagação decorrente do Covid -19, foram editados os Decretos n.ºs 47.006/20, 47.027/20, 47.052/20, 47.068/20, 47.102/20, 47.112/20, 47.129/20, 47.152/20, 47.176/20, 47.199/20, 47.219/20, 47.250/20, 47.287/20, 47.287/20, 47.306/20, e, finalmente, Decreto n.º 47.345/20, alterado pelo Decreto n.º 47.369/20, que igualmente não trataram de matéria tributária que dê embasamento ao acolhimento do pedido.

Um pouco mais próximo de assuntos tributários, o Decreto n.º 46.980/20, entre outras medidas, determinou a suspensão do curso do prazo processual nos processos administrativos perante a Administração Pública do Estado do Rio de Janeiro, bem como, o acesso aos autos dos processos físicos, sem, contudo, adotar outras medidas mais permissivas no âmbito das obrigações tributárias.

Ainda mais diretamente voltado à questão tributária, o Decreto n.º 46.982/20 prorrogou o prazo de vencimento previsto no artigo 5º, caput, do Decreto n.º 42.049/09, para o pagamento de parcelas vencidas a partir de 20 de março de 2020, decorrentes de parcelamentos de créditos tributários e não tributários, inscritos em dívida ativa.

Lembramos que o Estado do Rio de Janeiro ainda se encontra em Estado de Calamidade Financeira no âmbito da Administração Financeira, desde 2016, e, por conta disso, em processo de Recuperação Fiscal mediante acordos com a União, conforme Lei n.º 7.483/16 e Decreto n.º 45.692/16.

Atualmente, consoante os dispositivos da Lei Complementar Federal n.º 160/17 e Convênio ICMS 190/17, os Estados e o DF só podem renunciar de suas receitas tributárias nos estritos termos e amplitude de convênios editados no âmbito do CONFAZ, em consonância com a Lei Complementar federal n.º 24/75, bem como os requisitos e condições estabelecidos no artigo 14 da Lei Complementar n.º 101/00.

A permissão para a manutenção dos créditos do ICMS sem que ocorra a subsequente saída tributada da mercadoria, em grande escala, pode acarretar significativos impactos negativos na arrecadação estadual, que também se depara com as consequências da redução das atividades econômicas, sem esquecer novos custos que se impuseram aos entes federados.

Em suma, diante da pandemia, o Poder Executivo editou diversos atos, porém, não incluiu renúncia da receita tributária, consequência de permissão para manutenção de créditos do ICMS de forma excepcional, fato que demanda a análise de fatores, tais como a conveniência e oportunidade por parte dos seus gestores, para se fazer concessões, sobretudo, considerando o estado de emergência financeira existente desde 2016, ainda em vigor.

RESPOSTA.

Considerando a inexistência de ato próprio do Poder Executivo do Estado do Rio de Janeiro, inserindo na legislação tributária fluminense expressa autorização para a manutenção dos créditos do ICMS na hipótese de inutilização ou perda de mercadoria, em razão da pandemia, concluímos que não há amparo legal para a autorização do pedido, devendo a empresa proceder de acordo com as normas do Capítulo XXIII do Anexo XIII, Parte II, da Resolução SEFAZ n.º 720/14, que determina o estorno do crédito, com base no inciso IV do artigo 37 da Lei n.º 2.657/96.

Alertamos à AFE - 11 que essa resposta não produzirá os efeitos próprios da consulta, previstos nos artigos 162 e 163 do Regulamento do Processo Administrativo-Tributário, aprovado pelo Decreto n.º 2.473/79, caso, em data anterior à formalização do processo, o estabelecimento consulente estivesse sob ação fiscal, ou haja auto de infração, pendente de decisão, cujos fundamentos estejam direta ou indiretamente relacionados às dúvidas suscitadas.

Fique a consulente ciente de que esta consulta perderá automaticamente a sua eficácia normativa em caso de mudança de entendimento por parte da Administração Tributária ou seja editada norma superveniente dispondo de forma contrária.