Consulta Nº 46 DE 25/06/2020


 


Lei n.º 6.979/2015; aço beneficiado; destaque de 12%


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RELATÓRIO

A empresa, sediada no município de Três Rios, inscrição estadual 78.333.235, CNPJ 22.719.686/0001-08, vem solicitar esclarecimentos desta Superintendência acerca da possibilidade de aplicar a alíquota de ICMS de 20% nos documentos fiscais emitidos para a saída de seus produtos siderúrgicos sob a égide dos benefícios dados pela Lei n.º 6.979/2015.

A consulente anexou um único documento 3749807, que inclui, além de sua petição (pg. 1 a 7), a comprovação do pagamento da TSE (pg. 8 a 10), a 22ª alteração do contrato social (pg. 19 a 23), o documento de identidade do signatário (pg. 12) - um dos sócios administradores da empresa, não havendo, portanto, a necessidade de procuração. Dessa forma, o presente encontra-se instruído com documentação que comprova a habilitação do signatário de peticionar pela empresa.

A repartição de jurisdição AFE 05 – Siderurgia, Metalurgia e Material de Construção em Geral, em sua manifestação, documentos AFRE05.24 5254751, informa a inexistência de ação fiscal e autos de infração relacionados ao objeto da consulta tributária.

A consulente inicia afirmando que tem como atividade a fabricação de outros produtos de metal não especificados anteriormente, CNAE 25.99.3.99, e que no seu exercício, adquire bobinas de aço com o benefício da isenção de ICMS, de acordo com o artigo 4º da Lei n.º 6.979/2015, que são utilizadas como insumo no seu processo industrial.

Declara que as bobinas de aço adquiridas são transformando-as em chapas, telhas, calhas, tubos e perfis, mercadorias sujeitas à alíquota de 20% no Rio de Janeiro.

Prossegue, afirmando que também usufrui do tratamento tributário especial, previsto no artigo 5º da Lei n.º 6.979/2015, com a substituição do regime de apuração normal do imposto pelo recolhimento de 2% sobre o valor das operações de saídas internas e interestaduais, por transferência e por venda, deduzidas as devoluções e sem aproveitamento de qualquer crédito. Destaca a previsão do parágrafo 2º desse mesmo artigo 5º, de que o ICMS próprio destacado nas notas fiscais das saídas internas de aço beneficiado deve ser calculado pela aplicação da alíquota de 12%.

Continua, alegando que, em 2016, apresentou consulta tributária onde questionou se poderia utilizar a alíquota de 20% nas saídas internas de seus produtos de aço, pois os mesmos não sofreriam alteração química, sendo apenas objeto de transformação. A resposta (Consulta n.º 124/2016) foi negativa, justificada pela disposição expressa do parágrafo 2º do artigo 5º da Lei n.º 6.979/2015.

Segue, afirmando que pretende abordar na presente consulta questão diversa, notadamente quanto a diferenciação entre industrialização por beneficiamento e industrialização por transformação, para concluir que os produtos objeto de transformação poderiam ter saída com alíquota de 20%.

Para embasar seus argumentos cita e reproduz o artigo 4º do Regulamento do IPI, Decreto n.º 7.212/2010, que prevê e define 5 modalidades de industrialização, entre as quais transformação e beneficiamento. Cita e reproduz parcialmente, também, o Parecer Normativo CST n.º 398/1971, que, na situação ali descrita, conclui que industrialização por transformação importa na obtenção de produto novo, com classificação fiscal diferente da matéria prima utilizada na industrialização.

Arrola as mercadorias e NCM das bobinas que adquire como matéria prima e dos produtos que fabrica, concluindo que parte das que fabrica constituem novas mercadorias com características distintas das do insumo, inclusive a classificação fiscal. Anexa uma série de cópias de notas fiscais de aquisição das bobinas e de saídas das mercadorias produzidas como exemplos (pg. 38 a 80) para comprovar que as NCM são distintas.

Apresenta parte de análise de uma situação diversa, supostamente da Receita Federal, que conclui que a industrialização por transformação seria configurada sempre que houvesse mudança de classificação fiscal do produto fabricado. Afirma que seu processo industrial não se limita a modificar, aperfeiçoar ou alterar o funcionamento, utilização, acabamento ou aparência das bobinas de aço.

Encerra alegando que tem utilizado a alíquota de 12% nas notas de saída, mas seus concorrentes também localizados no estado do Rio de Janeiro estão destacando o imposto pela alíquota de 20%, o que provocou queda nas suas vendas e prejuízos, pois os clientes optam pela possibilidade de crédito a 20%.

Por fim, consulta no item 20 de sua petição (sic):

“20. Frente ao exposto, a Consulente formula a seguinte consulta tributária:

1. Está correto o entendimento da Consulente de que os produtos por ela vendidos, que adotem classificação fiscal diferente daquela utilizada pela respectiva matéria prima, enquadram-se como uma operação de industrialização por transformação, e por isso estão sujeitos ao destaque de alíquota de ICMS previstas no RICMS/RJ para aquelas mercadorias?

II. Está correto o entendimento da Consulente de que os produtos por ela vendidos, que adotem a mesma classificação fiscal da respectiva matéria prima, enquadram-se como uma operação de industrialização por beneficiamento, e por isso estão sujeitos ao destaque de alíquota de 12% prevista no §2º do art. 5º da Lei 6.979/15?

III. Caso o entendimento da Consulente não esteja correto, como deverá proceder com o intuito de identificar as operações de transformação e beneficiamento, e com isso adotar a alíquota de ICMS correta quando da saída dos produtos? ”

ANÁLISE E FUNDAMENTAÇÃO

Preliminarmente, trazemos o disposto no artigo 111 do Código Tributário Nacional, abaixo reproduzido, que determina que a legislação tributária relativa a concessão de isenção deve ser interpretada de forma literal. É entendimento dessa Coordenadoria, estendendo o disposto no artigo 111, que a legislação de que trata de benefícios fiscais em geral deve ser interpretada de forma literal e restritiva.

Art. 111. Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre:

I - suspensão ou exclusão do crédito tributário;

II - outorga de isenção;

III - dispensa do cumprimento de obrigações tributárias acessórias.

O parágrafo 2º do artigo 5º da Lei n.º 6.979/2015 dispõe expressamente que deve ser aplicada a alíquota de 12% nas saídas de aço beneficiado. Resta-nos então a definir o que seria aço beneficiado para fins de aplicação deste dispositivo.

A primeira possibilidade seria de considerar que aço beneficiado seria todo e qualquer produto de aço obtido com a utilização de um dos benefícios fiscais consignados na Lei 6.979/2015. Nesta possibilidade, toda e qualquer mercadoria industrializada a partir de aço objeto de benefício fiscal da Lei deverá ser destacada a alíquota de 12%.

Outra possibilidade seria considerar que aço beneficiado seria apenas o produto aço que teria sido objeto de um beneficiamento. Não comportaria outros produtos produzidos com o aço. Em outras palavras, as mercadorias produzidas por industrialização por transformação não estariam sujeitas ao disposto no parágrafo 2º do artigo 5º, e poderiam ter suas saídas internas com destaque da alíquota normal do ICMS. Entretanto, essa possibilidade deve ser afastada, tendo em vista o disposto no artigo 4º da própria Lei n.º 6.979/2015, que concede isenção para as aquisições internas de aço e seus produtos destinados ao processo produtivo. Se o produto continuar a ser aço, ainda que “beneficiado”, suas saídas internas (destinadas à industrialização), necessariamente, significariam entradas (aquisições) internas de outros contribuintes, e, por força do artigo 4º, as respectivas notas fiscais seriam sem destaque de ICMS. Teríamos uma incoerência entre aplicar a isenção do artigo 4º ou alíquota de 12% do parágrafo 2º do artigo 5º. A intenção do legislador é clara no sentido de isentar as entradas internas de aço (e seus produtos), quando destinados à novo processo industrial, e, portanto, a isenção deve prevalecer contra a outra opção.

Ao analisarmos os parágrafos 1º e 2º do artigo 5º, em conjunto, fica nítida, também, a intenção do legislador, em restringir o benefício dado a saída dos produtos ali listados.

Em pesquisa na Internet sobre o assunto, encontramos, dentre outras semelhantes, a seguinte definição para beneficiamento de aço:

Tratamento térmico composto de têmpera seguida de revenido, em temperatura adequada, destinado a obtenção de maior tenacidade combinada com certas propriedades de resistência. Utiliza-se para peças e ferramentas que necessitem de uma boa confirmação de rigidez e tenacidade.

Fica claro que esse beneficiamento de aço é um tratamento dado ao aço, para melhorar suas propriedades, mas sem mudar a natureza, ou seja, continua sendo aço, e caímos no caso da segunda possibilidade acima.

Temos ainda que a consulente cita, além do Regulamento do IPI, um parecer normativo de 1971. Entretanto, temos o Parecer Normativo COSIT n.º 19/2013, mais recente, sobre o conceito de industrialização por beneficiamento, abaixo parcialmente reproduzido, com marcação em negrito das partes mais relevantes.

Relatório

Cuida-se da atualização e consolidação do entendimento expresso em pareceres normativos sobre industrialização, na modalidade  beneficiamento. Serão atualizados e consolidados neste ato os seguintes Pareceres Normativos CST: nº 16, de 1970; nº 17, de 1970; nº 300, de 1970; nº 157, de 1971; nº 641, de 1971. Referidos Pareceres, embora tenham vigorado até a presente data, fazem referência a normas já revogadas.

Fundamentos

2. O beneficiamento é modalidade de industrialização prevista no inciso II do art. 4º do Decreto nº 7.212, de 15 de junho de 2010, atual Regulamento do Imposto sobre Produtos Industrializados (RIPI/2010):

Art. 4º Caracteriza industrialização qualquer operação que modifique a natureza, o funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a finalidade do produto, ou o aperfeiçoe para consumo, tal como (Lei nº 5.172, de 1966, art. 46, parágrafo único, e Lei nº 4.502, de 1964, art. 3º, parágrafo único):

............................................................................................

II - a que importe em modificar, aperfeiçoar ou, de qualquer forma, alterar o funcionamento, a utilização, o acabamento ou a aparência do produto (beneficiamento);

III - a que consista na reunião de produtos, peças ou partes e de que resulte um novo produto ou unidade autônoma, ainda que sob a mesma classificação fiscal (montagem);

IV - a que importe em alterar a apresentação do produto, pela colocação da embalagem, ainda que em substituição da original, salvo quando a embalagem colocada se destine apenas ao transporte da mercadoria (acondicionamento ou reacondicionamento); ou

V - a que, exercida sobre produto usado ou parte remanescente de produto deteriorado ou inutilizado, renove ou restaure o produto para utilização (renovação ou recondicionamento).

Parágrafo único. São irrelevantes, para caracterizar a operação como industrialização, o processo utilizado para obtenção do produto e a localização e condições das instalações ou equipamentos empregados.

3. Considera-se estabelecimento industrial e, portanto, sujeito a todas as normas relativas ao Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), o estabelecimento que execute operação de beneficiamento, ressalvadas as hipóteses de exclusão do conceito de industrialização previstas no art. 5º do RIPI/2010.

7. O Parecer Normativo CST nº 300, de 1970, definiu que constituem aperfeiçoamento ou alteração da utilização do produto em decorrência de processo industrial as operações executadas sobre chapa de ferro e aço e que a torne ondulada ou corrugada ou que lhe dê forma diferente da retangular e da quadrada, tais como discos, perfilados, flanges, cantoneiras. O mesmo entendimento se aplica à operação que lhe modifica a espessura, tal como desbaste ou laminação.

8. Todas as operações acima descritas são, portanto, operações de industrialização, que se enquadram na modalidade beneficiamento, descrita no inciso II do art. 4º do RIPI/2010.

9. Entretanto, excluem-se do conceito de industrialização as operações de desbobinamento e de corte das chapas, com a mera finalidade de reduzi-las a tamanho menor, sem modificação da espessura e mantida a forma original, retangular ou quadrada. Nesse mesmo sentido, o simples corte de vidro em chapas quadradas e retangulares, sem modificação da espessura, curvatura, nem de outro modo trabalhado (biselado, gravado, etc.), não é considerado beneficiamento.

11. Lembre-se, entretanto, que poderá haver exclusão do conceito de industrialização nas operações acima elencadas, desde que presentes as condições previstas no inciso V do art. 5º, e no inciso II do art. 7º do RIPI/2010.

Conclusão

14. Diante do exposto, conclui-se que:

14.1. são operações de industrialização, na modalidade beneficiamento:

a) filtragem de azeite;

b) gravação (em vidros, tecidos, etc.) pelo processo de serigrafia (silkscreen)

c) confecção de visores panorâmicos, com utilização de chapas de acrílico, as quais são cortadas e curvadas segundo determinados moldes;

d) operações executadas sobre chapas de ferro, aço, ou vidro, que lhes modifiquem a espessura ou a curvatura, que lhes deem formas diferentes da retangular ou quadrada, ou que as tornem onduladas, corrugadas, perfuradas, estriadas, laminadas, etc.

14.2. não são operações de industrialização:

a) corte de chapas de ferro, aço, ou vidro, para simples redução de tamanho em forma retangular ou quadrada, sem modificação da espessura;

15. Ficam revogados os Pareceres Normativos CST nº 16, de 1970, nº 17, de 1970, nº 300, de 1970; nº 157, de 1971; e nº 641, de 1971

Ressaltamos que as características e modalidades de industrialização objeto do artigo 4º do RIPI/2010 foram inteiramente incorporadas à legislação tributária do Estado do Rio de Janeiro, em seus estritos termos, atualmente presentes no inciso III do artigo 3º do Livro XVII do RICMS/00.

Podemos concluir, portanto, que dentre as mercadorias fabricadas pela consulente, as várias chapas e perfis listados se enquadram, perfeitamente, na industrialização por beneficiamento.

Não aceitamos o argumento de que se houver alteração de NCM a industrialização seria por transformação. Assim como, não aceitamos a tese de que ocorre de fato alteração de NCM, quando mantidos os mesmos capítulo e posição, sendo distintos apenas a subposição e dígitos complementares.

Em suma, entendemos que “aço beneficiado” citado expressamente no parágrafo 2º do artigo 5º da Lei n.º 6.979/2015 refere-se a produtos de aço, independentemente de serem obtidos pelas modalidades de industrialização por beneficiamento ou transformação, fabricados com a utilização dos benefícios da referida Lei.

RESPOSTA

Quanto ao questionamento I respondemos que NÃO está correto o entendimento da consulente. Independentemente do tipo de industrialização por beneficiamento ou por transformação, a alíquota a ser aplicada nas saídas internas de produtos de aço, por usufrutuários de benefícios da Lei n.º 6.979/2015, é de 12%.

Quanto ao questionamento II respondemos que NÃO está correto o entendimento da consulente. Independentemente do tipo de industrialização por beneficiamento ou por transformação, a alíquota a ser aplicada nas saídas internas de produtos de aço, por usufrutuários de benefícios da Lei n.º 6.979/2015, é de 12%.

Quanto ao questionamento III respondemos que independentemente do tipo de industrialização por beneficiamento ou por transformação, a alíquota a ser aplicada nas saídas internas de produtos de aço, por usufrutuários de benefícios da Lei n.º 6.979/2015, é de 12%.

Fique a consulente ciente de que esta consulta perderá automaticamente a sua eficácia normativa em caso de mudança de  entendimento por parte da Administração Tributária, ou seja, editada norma superveniente dispondo de forma contrária.

Rio de Janeiro, 25/06/20.