Lei Nº 2006 DE 02/07/2024


 Publicado no DOE - RR em 2 jul 2024


Institui a Política Estadual de Agroecologia e Produção Orgânica do Estado de Roraima (PEAPO) e dá outras providências.


Sistemas e Simuladores Legisweb

O Governador do Estado de Roraima:

Faço saber que a Assembleia Legislativa aprovou e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º Fica instituída a Política Estadual de Agroecologia e Produção Orgânica do Estado de Roraima (PEAPO), com o objetivo de promover a Agroecologia e a Produção Orgânica, como forma de fortalecer a produção soberana, em quantidade, qualidade e diversidade de alimentos e demais produtos da sociobiodiversidade; conservar o patrimônio cultural e natural; dinamizar as redes locais de economia solidária; construir relações sociais justas entre homens e mulheres e entre gerações; e reconhecer a diversidade étnica, contribuindo para a construção de uma sociedade sustentável, igualitária e democrática.

Parágrafo único. A PEAPO será implementada pelo Estado de Roraima em regime de cooperação com os demais entes da federação e organizações da sociedade civil, visando integrar, articular e adequar políticas, programas e ações indutoras de agroecologia e produção orgânica, considerando o Decreto Federal nº 7.794, de 20 de agosto de 2012, que instituiu a Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica.

Art. 2º Para fins desta Lei, entende-se por:

I - agroecologia: ciência ou campo do conhecimento transdisciplinar que estuda os agroecossistemas, fundamentada em conceitos, princípios e metodologias, visando o desenvolvimento das relações entre capacidade produtiva, equilíbrio ecológico, equidade social, respeitando os modos de vida, uso e conservação da biodiversidade e dos demais bens naturais por meio da articulação entre conhecimento técnico-científico, saberes e fazeres ancestrais e culturas populares e tradicionais, com foco na sustentabilidade;

II - produção de base agroecológica: aquela que busca otimizar a integração entre capacidade produtiva, uso e conservação da biodiversidade e dos demais recursos naturais, equilíbrio ecológico, eficiência econômica, justiça e igualdade social, abrangida ou não pelos mecanismos de controle de que trata a Lei Federal nº 10.831 , de 23 de dezembro de 2003, e sua regulamentação;

III - transição agroecológica: processo gradual de mudança de práticas e de manejo de agroecossistemas tradicionais ou convencionais, por meio da transformação das bases produtivas e sociais do uso da terra e dos recursos naturais, que levem a sistemas de agricultura que incorporem princípios e tecnologias de agroecologia e produção orgânica, conforme Decreto Federal nº 7.794, de 20 de agosto de 2012;

IV - sociobiodiversidade: resulta da inter-relação entre a biodiversidade e a diversidade sociocultural da agricultura familiar, povos e comunidades tradicionais, que se expressa por meio de sistemas agrícolas e extrativistas tradicionais, da agrobiodiversidade, dos conhecimentos, das culturas e no manejo dos recursos naturais;

V - produtos da sociobiodiversidade: bens e serviços gerados a partir de recursos da biodiversidade, destinados à formação de cadeias produtivas de interesse dos beneficiários da Lei Federal nº 11.326 , de 24 de julho de 2006, que promovam a manutenção e valorização de suas práticas e saberes, e assegurem os direitos decorrentes, para gerar renda e melhorar sua qualidade de vida e de seu ambiente;

VI - produção orgânica: aquela oriunda de sistema orgânico de produção, respaldada por um sistema de avaliação da conformidade orgânica reconhecido oficialmente, segundo critérios estabelecidos em regulamento específico, para fins de comercialização;

VII - sistema orgânico de produção: aquele estabelecido no art. 1º da Lei Federal nº 10.831 , de 23 de dezembro de 2003, e outros que atendam aos princípios nela estabelecidos;

VIII - agricultora ou agricultor familiar: é quem pratica a agricultura, extrativismo, pecuária, silvicultura, pesca, aquicultura e outras atividades rurais em consonância com os requisitos da Lei Federal nº 11.326, de 24 de julho de 2006;

IX - agricultor urbano: aquele que pratica atividade agrícola no meio periurbano e intraurbano;

X - povos e comunidades tradicionais: grupos culturalmente diferenciados que se reconhecem como tais, definidos nos termos do inciso I do art. 3º do Decreto Federal nº 6.040, de 07 de fevereiro de 2007;

XI - sustentabilidade: desenvolvimento que satisfaz as necessidades de bem viver do presente, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades, e considera de maneira indissociável as dimensões econômicas, social, ambiental, cultural, política e ética;

XII - agrobiodiversidade: contempla a diversidade genética de espécies cultivadas ou manejadas, a riqueza dos processos funcionais dos agroecossistemas e as interações entre seus componentes, que refletem a interação entre agricultores e ecossistemas locais, que podem ao longo do tempo originar variedades, espécies ou paisagem, adaptadas às condições ecológicas locais;

XIII - certificação orgânica e/ou agroecológica: ato pelo qual um organismo de avaliação da conformidade credenciado, seja social, comunitário ou outros, dá garantia por escrito de que uma produção ou um processo claramente identificado foi metodicamente avaliado e está em conformidade com as normas de produção orgânicas vigentes e de base agroecológica;

XIV - segurança alimentar e nutricional: consiste na realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como bases práticas alimentares promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e ancestral e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis;

XV - economia solidária: forma de organizar a produção de bens e serviços, a distribuição, o consumo e o crédito que tenha por base os princípios da autogestão da cooperação e da solidariedade;

XVI - pagamentos ou incentivos condicionados: pagamentos ou incentivos de natureza monetária ou não monetária, decorrentes das atividades de manutenção, preservação, restauração, recuperação, uso sustentável ou melhoria dos ecossistemas, realizados pelos provedores os quais estão condicionados à verificação periódica por parte do pagador, para efeitos de constatar o fornecimento de serviços ecossistêmicos;

XVII - assistência técnica e extensão rural: serviço de educação não formal, de caráter continuado, no meio rural, que promove processos de gestão, produção, beneficiamento e comercialização de produtos e serviços agropecuários e não agropecuários, inclusive das atividades agroflorestais, agroextrativistas, florestais e artesanais;

XVIII - extrativismo sustentável: conjunto de práticas associadas ao manejo sustentado dos recursos naturais seja de origem animal, vegetal ou mineral, em ecossistemas nativos ou modificados, orientadas pelo uso do conhecimento e práticas tradicionais e ancestrais;

XIX - educação popular: concepção de educação e movimento que utilizam metodologias e práticas pedagógicas que respeitam as especificidades culturais, sociais (gênero, geração, raça/etnia), ambientais, políticas, econômicas e valoriza o protagonismo dos sujeitos nas lutas pela terra e vida com ênfase na agroecologia;

XX - bens naturais: elementos bióticos e abióticos da natureza, essenciais e vitais para o bom funcionamento do planeta como a atmosfera, as águas interiores, superficiais e subterrâneas, os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo e todos os seres vivos;

XXI - recursos naturais e ambientais: são os bens naturais utilizados de forma direta ou indireta para a sobrevivência, bem-estar e desenvolvimento dos seres humanos; e

XXII - serviços ambientais: ações realizadas intencionalmente, visando a preservação, a conservação e a restauração dos ecossistemas e dos bens naturais como água, solo, biodiversidade microbiana, faunística e florística que resultem na melhoria do meio ambiente, as quais podem ser apoiadas, estimuladas e/ou recompensadas por meios econômicos e não econômicos.

Art. 3º São diretrizes da PEAPO:

I - assegurar o direito humano à alimentação adequada, bem como a soberania e segurança alimentar e nutricional, considerando a sustentabilidade e a diversidade das culturas alimentares locais;

II - desenvolver e incentivar a estruturação de circuitos de produção, agregação de valor e consumo adaptados às necessidades da agricultura familiar camponesa e dos povos e comunidades tradicionais, nos campos, nas florestas e nas cidades, dando preferência aos mercados locais, regionais e institucionais, ampliando o acesso aos produtos orgânicos e de base agroecológica;

III - garantir a autonomia e gestão da agricultura familiar camponesa, urbana e periurbana e dos povos e comunidades tradicionais na conservação e no uso sustentável dos recursos naturais para a manutenção da agrobiodiversidade e da sociobiodiversidade;

IV - promoção de sistemas justos e sustentáveis de produção, distribuição e consumo de alimentos, que aperfeiçoem as funções econômica, social e ambiental da agricultura e do extrativismo, e priorize o apoio institucional aos beneficiários da Lei Federal nº 11.326 , de 24 de julho de 2006;

V - internalizar a perspectiva agroecológica nas instituições de ensino, pesquisa e extensão, assegurando a participação protagonista de agricultura familiar camponesa, povos e comunidades tradicionais, nos campos, nas florestas e nas cidades nos processos de construção e socialização de conhecimentos;

VI - valorização da agrobiodiversidade e dos produtos da sociobiodiversidade e estímulo às experiências locais de uso e conservação dos recursos genéticos vegetais e animais, especialmente àquelas que envolvam o manejo de raças e variedades locais, tradicionais ou crioulas;

VII - reconhecer e valorizar o protagonismo da juventude do campo e da floresta nos espaços de gestão, organização social e atividades produtivas de base agroecológica;

VIII - financiar atividades econômicas que favoreçam a produção orgânica e em bases agroecológicas, assim como o acesso da população a estes produtos;

IX - reconhecer e valorizar o protagonismo das mulheres na produção de alimentos saudáveis e agroecológicos, fortalecendo sua autonomia econômica e política;

X - ampliar e assegurar o acesso, uso e controle da terra, território, água e biodiversidade, implementando a reforma agrária e garantindo os direitos territoriais, tanto em áreas rurais, como urbanas e periurbanas;

XI - promover o trabalho digno de homens e mulheres na agropecuária, no extrativismo e nas demais atividades relacionadas à produção, processamento e consumo, assegurando valorização econômica, segurança no trabalho, saúde e reconhecimento do trabalho produtivo e reprodutivo;

XII - fomentar a criação de territórios livres de transgênicos e agrotóxicos;

XIII - interação com as demais políticas e planos correlatos aos temas da agroecologia e agricultura orgânica;

XIV - estímulo ao consumo de alimentos agroecológicos e orgânicos, por intermédio da promoção, divulgação, visibilidade e educação.

Art. 4º Devem ser instrumentos da PEAPO, sem prejuízo de outros a serem constituídos:

I - o Plano Estadual de Agroecologia e Produção Orgânica de Roraima (PEAPO) e seus congêneres no âmbito nacional, estadual, municipal e territorial;

II - o ensino, pesquisa, extensão, inovação científica e tecnológica;

III - a educação do campo;

IV - a educação ambiental;

V - a assistência técnica e extensão rural;

VI - a pesquisa e a sistematização de conhecimentos populares e tradicionais, bem como sua divulgação para a sociedade;

VII - o abastecimento, a comercialização, agroindustrialização e o acesso aos mercados;

VIII - as compras governamentais;

IX - o Plano Safra da agricultura familiar;

X - as certificações socioparticipativas e os sistemas de garantias;

XI - o fundo estadual, as linhas de crédito e financiamento, subsídios e outras fontes;

XII - as medidas fiscais, tributárias, sanitárias e ambientais como mecanismos de simplificação para os beneficiários;

XIII - os preços agrícolas e extrativistas, incluídos mecanismos de regulação e compensação de preços nas aquisições ou subvenções;

XIV - o Plano Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional;

XV - o Plano Estadual de Economia Solidária;

XVI - os Planos Territoriais de Desenvolvimento Rural Sustentável;

XVII - a Política Estadual de Meio Ambiente;

XVIII - a Política Estadual de Recursos Hídricos;

XIX - a Política Estadual de Saúde;

XX - a Política Estadual de Sementes de Cultivares e Mudas Crioulas;

XXI - o Programa de Compras Governamentais da Agricultura Familiar e Economia Solidária - PECAFES;

XXII - o monitoramento de resíduos de agrotóxicos em água, humanos e demais compartimentos ambientais;

XXIII - as unidades de conservação, os projetos de assentamento rural, os territórios quilombolas e terras indígenas.

Art. 5º O PEAPO terá como conteúdo, no mínimo, os seguintes elementos:

I - diretrizes;

II - objetivo;

III - diagnóstico;

IV - estratégias;

V - programas, projetos, ações;

VI - indicadores, metas, orçamento, prazos e responsáveis; e

VII - modelo de gestão, monitoramento e avaliação.

Art. 6º Para atingir a finalidade e as diretrizes desta Lei, o Estado poderá:

I - criar linhas de crédito especial, inclusive com subsídios, para a produção de base agroecológica e orgânica;

II - estabelecer convênios, contratos e termos de cooperação com entidades de extensão rural, instituições de pesquisa, centros de ensino, institutos e universidades, cooperativas, associações e organizações da sociedade civil;

III - conceder tratamento tributário, sanitário e ambiental diferenciado e favorecido para produtos, tecnologias e equipamentos apropriados para a produção de base agroecológica e orgânica;

IV - financiar, por meio de editais públicos, projetos de Agroecologia e de produção orgânica, de Organizações Não Governamentais, cooperativas, associações, e empreendimentos de economia solidária;

V - apoiar e articular estruturas e mecanismos que facilitem a oferta e consumo de produtos orgânicos e de base agroecológica;

VI - estabelecer para o produto de base agroecológica e orgânica, critérios de preferência e valoração nas compras governamentais;

VII - fomentar e apoiar processos educativos para construção e disseminação do conhecimento agroecológico e produção orgânica;

VIII - promover a construção do conhecimento em agroecologia e produção orgânica por meio das instituições de ensino superior e técnico;

IX - proporcionar as condições necessárias para o desenvolvimento da Agroecologia e da produção orgânica priorizando a juventude, mulheres, povos e comunidades tradicionais;

X - destinar recursos financeiros específicos para implementação das ações no PEAPO;

XI - uso e gestão de recursos hídricos e comitês de bacias hidrográficas.

Art. 7º O Estado poderá criar um sistema participativo de certificação de produtos orgânicos e de base agroecológica, cujo selo será destinado exclusivamente ao público da Lei Federal nº 11.326, de 24 de julho 2006, a partir de ato a ser regulamentado pelo Poder Executivo e em compatibilidade às normas e procedimentos adotados, no âmbito federal, pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro).

Art. 8º Poderão constituir fontes de financiamento da Política Estadual de Agroecologia e Produção Orgânica do Estado de Roraima (PEAPO):

I - recursos do Tesouro do Estado de Roraima;

II - recursos oriundos de convênios, contratos, cooperação de outros entes da Federação e cooperação internacional;

III - recursos oriundos de operações de crédito.

Art. 9º Poder Executivo regulamentará a presente lei no que couber para garantir a sua execução.(Artigo alterado devido a Derrubada de Veto publicada no DOE DE 25/10/2024). 

Art. 10. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Palácio Senador Hélio Campos/RR, 2 de julho de 2024.

(assinatura eletrônica)

ANTONIO DENARIUM

Governador do Estado de Roraima

MENSAGEM GOVERNAMENTAL Nº 45, DE 2 DE JULHO DE 2024.

EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE RORAIMA E EXCELENTÍSSIMOS SENHORES DEPUTADOS E SENHORAS DEPUTADAS ESTADUAIS,

Comunico a Vossas Excelências que, nos termos do art. 43, § 3º, da Constituição Estadual, VETO PARCIALMENTE o Projeto de Lei nº 115/2023, que institui a Política Estadual de Agroecologia e Produção Orgânica do Estado de Roraima (PEAPO) e dá outras providências, conforme o Parecer nº 135/2024 PGE/GAB/ASSEP, exarado pela Procuradoria-Geral do Estado de Roraima - PGE.

RAZÕES DO VETO

A matéria em análise, almeja instituir a Política Estadual de Agroecologia e Produção Orgânica do Estado de Roraima (PEAPO), no entanto, no momento em que impõe ao Poder Executivo Estadual a edição de regulamento, conforme leitura do artigo 9º, do respectivo Autógrafo de Projeto de Lei, acaba por padecer de inconstitucionalidade, visto que, trata-se de competência privativa do Chefe do Poder Executivo Estadual, conforme dispõe a leitura da ConstituiçãoFederal, art. 84, IV e Constituição Estadual, art. 62, III, não sendo permitido ao Legislador constranger seu exercício, sob pena de afronta ao princípio da separação dos poderes.

Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:

[.....]

IV - sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução;

[.....]

Logo, por simetria, a Constituição Estadual, estabelece do mesmo modo:

Art. 62. São atribuições privativas do Governador do Estado:

[.....]

III - sancionar, promulgar e fazer publicar as Leis, bem como expedir decretos e regulamentos para a sua fiel execução;

[.....]

Nesta senda, fundamentado nestes termos, faço recair VETO PARCIAL sob o artigo 9º, do Projeto de Lei nº 115/2023, que institui a Política Estadual de Agroecologia e Produção Orgânica do Estado de Roraima (PEAPO) e dá outras providências.

Palácio Senador Hélio Campos/RR, 2 de julho de 2024.

(assinatura eletrônica)

ANTONIO DENARIUM

Governador do Estado de Roraima