ICMS – OBRIGAÇÃO PRINCIPAL – PRODEIC – CRÉDITO OUTORGADO – EXPORTAÇÃO – CRÉDITO – APROVEITAMENTO. Os créditos relacionados com operações de saídas destinadas à exportação podem ser mantidos e, portanto, após a apuração do crédito outorgado concedido no âmbito do PRODEIC, eles podem ser aproveitados para a apuração do total do ICMS a ser recolhido no período.
Texto
..., pessoa jurídica de direito privado, estabelecida na Rodovia ..., zona rural de ..., inscrita no CNPJ sob o n° ... e no Cadastro de Contribuintes do ICMS deste Estado sob o n° ..., formula consulta sobre o aproveitamento de créditos de ICMS decorrentes do direito à manutenção destes pela realização de operações de exportação.
Para tanto, informa que é estabelecimento industrial cujo objeto social se consubstancia nas seguintes atividades: a) preparação e fiação de fibras de algodão; b) comércio atacadista de fios e fibras beneficiadas; c) transporte rodoviário de carga, exceto produtos perigosos e mudanças intermunicipal, interestadual e internacional; d) fabricação de tecidos de malha; e) comércio atacadista de tecidos de malha para confecção; e f) tecelagem de fios de algodão.
Expõe que requereu, e teve deferido, o benefício fiscal no âmbito do Programa de Desenvolvimento Industrial e Comercial – PRODEIC, em conformidade com a Lei n° 7.958/03 e o Decreto n° 1.432/03, que lhe concede crédito presumido de 80% (oitenta por cento) do valor do ICMS incidente nas operações próprias de comercialização interestadual do produto “fibrilha de algodão” efetivamente produzidos em seu empreendimento industrial.
Prossegue aduzindo que, além das vendas realizadas para outras unidades da federação, a consulente também realiza operações de exportação de produtos, cujos respectivos créditos, apesar da não incidência, podem ser mantidos, conforme artigo 155, § 2°, inciso X, da CF/88.
Alega que compulsando a legislação atinente ao ICMS defrontou-se com uma insegurança acerca da aplicação da legislação tributária e, assim, após longa argumentação, questiona:
No entendimento do Estado do Mato Grosso, a consulente pode utilizar a totalidade de créditos de ICMS decorrentes do não estorno dos créditos nas operações de exportação, como permitido pela norma Constitucional (art. 155, § 2°, inciso X, a, da CF/88) para a liquidação dos saldos credores de ICMS do período, apurados nos termos do Programa de Desenvolvimento Industrial e Comercial – PRODEIC, em conformidade com a Lei n° 7.958/03 e regulamentado pelo Decreto n° 1.432/03?
É a consulta.
Preliminarmente, após consulta ao Sistema de Gerenciamento do Cadastro de Contribuintes do ICMS desta SEFAZ, observa-se que a consulente declara exercer a atividade principal de preparação e fiação de fibras de algodão (CNAE 1311-1/00), bem como que apura o ICMS pelo regime normal previsto no artigo 131 do RICMS.
Ademais, do Sistema de Registro e Controle da Renúncia Fiscal – RCR, instituído pela Portaria n° 200/2019-SEFAZ, extrai-se que a consulente fez opção, entre outros, pelos benefícios fiscais concedidos no âmbito do PRODEIC Investe Fabricação de Produtos Têxtil.
Ainda em preliminar, se faz necessário esclarecer que, em face do advento da Lei Complementar n° 631/2019, foi editado o Decreto n° 288, de 5 de novembro de 2019, regulamentando a Lei n° 7.958/2003 e revogando o Decreto n° 1.432/2003.
Assim, os benefícios fiscais concedidos no âmbito do PRODEIC, após a edição da Lei Complementar n° 631/2019, passaram a ser regulamentados pelo Decreto n° 288/2019, que estabelece, tanto às operações de saídas internas quanto às operações de saídas interestaduais, o benefício fiscal de crédito outorgado. Veja-se:
Art. 13 Para o cálculo e fruição dos benefícios fiscais decorrentes de cada Programa, atendido o disposto em resolução editada nos termos do artigo 6°, deverão, ainda, ser observadas as seguintes condições:
(....)
II - em relação às demais operações de saídas internas, bem como em relação às operações de saídas interestaduais, o benefício fiscal consistirá em crédito outorgado, relativo ao ICMS, hipótese em que o respectivo valor será obtido mediante a observância do disposto nos §§ 1° a 3° do artigo 14 deste decreto;
(....)
Ademais, os percentuais aplicáveis aos produtos do submódulo “PRODEIC Investe Fabricação de Produtos Têxtil”, estão definidos na Resolução CONDEPRODEMAT n° 30/2019.
Pois bem, em síntese a dúvida da consulente consiste na possibilidade de aproveitamento dos créditos mantidos, nos termos da CF/88, referentes às operações de exportação.
Sem maiores delongas, veja-se o que estabelece o § 2° do artigo 26 da Lei n° 7.098/1998, que consolida as normas referentes ao ICMS no Estado:
(...)
§ 2° Não se estornam créditos referentes a operações e prestações relacionadas com mercadorias e serviços destinados ao exterior.
Na mesma vertente, o artigo 124 do Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto n° 2.212/2014, prevê:
Art. 124 Não se exigirá o estorno do crédito do ICMS relativo à utilização de serviços ou à entrada de:
I – mercadorias para utilização como matéria-prima ou material intermediário ou secundário na fabricação e embalagem de produtos industrializados destinados:
a) ao exterior; (cf. § 2° do art. 26 da Lei n° 7.098/98)
(...)
Na esfera da legislação do PRODEIC, o artigo 14 do Decreto n° 288/2019, estabelece:
Art. 14 O crédito outorgado e a redução de base de cálculo, previstos nos termos dos incisos do caput do artigo 13, bem como no seu § 1°, aplicam-se, exclusivamente, em relação às operações próprias com os produtos resultantes do processo industrial do estabelecimento beneficiário, não alcançando:
I - o imposto devido pelas operações com mercadorias adquiridas para revenda;
II - o imposto devido a título de diferencial de alíquotas, incidente nas aquisições interestaduais de bens destinados ao ativo imobilizado ou de materiais de uso ou consumo do estabelecimento;
III - o imposto devido pelo estabelecimento a título de substituição tributária pelas operações subsequentes que vierem a ocorrer no território mato-grossense.
§ 1° Para a utilização de crédito outorgado de que trata este decreto, o beneficiário deverá observar o que segue:
I - no cálculo do crédito outorgado deverão ser considerados, exclusivamente, os valores que o contribuinte efetivamente receber pelas operações ou prestações próprias que realizar;
II - fica vedada a utilização como crédito outorgado de valor apurado:
a) a partir de imposto cuja base de cálculo contenha, em sua composição, qualquer liberalidade ofertada a seus clientes;
b) com base em parcela integrante do valor da operação ou prestação própria, independentemente do respectivo título, não onerosa ao destinatário ou tomador do serviço;
III - o valor correspondente à liberalidade concedida aos clientes e/ou à parcela não onerosa ao destinatário ou prestador de serviço serão deduzidos do valor do produto efetivamente recebido, para efeitos da definição da base de cálculo do ICMS beneficiado com crédito outorgado.
§ 2° Sem prejuízo do disposto no § 5° deste artigo, para fins de apuração do valor de crédito outorgado, previsto neste decreto, o contribuinte deverá, ainda, observar o que segue:
I - somar todos os créditos fiscais relativos às entradas efetivadas no mês, acrescendo eventuais excessos de créditos transferidos do mês imediatamente anterior;
II - calcular o ICMS incidente sobre suas operações próprias de saídas de mercadorias tributadas no mês, passíveis de aplicação do benefício fiscal;
III - aplicar o percentual fixado pelo CONDEPRODEMAT para utilização como crédito outorgado sobre o valor apurado, de acordo com o disposto no inciso II deste artigo;
IV - o crédito outorgado do mês corresponderá, alternativamente:
a) ao valor da diferença positiva entre o montante apurado na forma do inciso III e a soma encontrada de acordo com o disposto no inciso I, ambos deste parágrafo;
b) a zero, quando a diferença entre o valor apurado na forma do inciso III e a soma encontrada de acordo com o disposto no inciso I, ambos deste parágrafo, for igual ou menor que zero.
§ 3° Quando a soma encontrada de acordo com o disposto no inciso I for maior que o valor apurado na forma do inciso III, ambos do § 2° deste artigo, a diferença deve ser transferida para utilização no mês seguinte.
§ 4° Sem prejuízo do disposto no § 5° deste artigo, para fins de aplicação de redução de base de cálculo na forma deste decreto, o beneficiário deverá observar a regra de estorno proporcional de crédito fiscal, conforme determinado na legislação que rege o ICMS.
§ 5° Quando o estabelecimento, no mesmo período de referência, realizar operações de naturezas diversas, contempladas por mais de uma modalidade de benefício fiscal, além das demais disposições deste artigo, deverá apurar os benefícios separadamente, atendendo ao que segue:
I - aplicar a proporcionalidade entre as operações de saídas alcançadas por créditos outorgados decorrentes deste decreto, em relação à totalidade das operações de saídas promovidas pelo estabelecimento, para apuração do montante dos créditos pelas entradas a elas referentes a serem escriturados, bem como para o cômputo do valor do crédito outorgado a ser utilizado no mês;
II - aplicar a proporcionalidade entre as operações de saídas alcançadas por redução de base de cálculo, em decorrência deste decreto, em relação à totalidade das operações de saídas promovidas pelo estabelecimento, para apuração do montante dos créditos das entradas a elas referentes a serem escriturados, bem como para o cômputo do valor do estorno proporcional dos créditos a ser efetuado;
III - aplicar a proporcionalidade entre as operações de saídas não alcançadas pela tributação, em relação à totalidade das operações de saídas promovidas pelo estabelecimento, para apuração do montante dos créditos pelas entradas a elas referentes a ser estornado;
IV - aplicar a proporcionalidade entre as operações de saídas com destino à exportação, em relação à totalidade das operações de saídas promovidas pelo estabelecimento, segregando aquelas que seriam passíveis de benefícios fiscais na forma deste decreto das demais, para apuração do montante dos créditos das entradas que poderão ser mantidos;
V - aplicar a proporcionalidade entre as operações de saídas não alcançadas por benefício fiscal, em relação à totalidade das operações de saídas promovidas pelo estabelecimento, para apuração do montante dos créditos das entradas a elas referentes a serem escriturados, bem como para apurar o respectivo valor do ICMS.
§ 6° A apuração prevista no § 5° deste artigo será efetuada em apartado, devendo os resultados ser transcritos na EFD do respectivo período de apuração, para apuração do valor do ICMS a recolher.
(...)
Por conseguinte, na fruição do benefício de crédito outorgado, conforme disciplinado no artigo 14 reproduzido, o contribuinte deve observar o que segue:
- somar todos os créditos fiscais relativos às entradas efetivadas no mês, acrescendo eventuais excessos de créditos transferidos do mês imediatamente anterior;
- calcular o ICMS incidente sobre suas operações próprias de saídas de mercadorias tributadas no mês, passíveis de aplicação do benefício fiscal;
- aplicar o percentual fixado pelo CONDEPRODEMAT para utilização como crédito outorgado sobre o valor apurado (ou seja, sobre o valor de ICMS incidente nas operações próprias de saídas tributadas no mês e passíveis de aplicação do benefício fiscal em questão).
O mencionado § 2° dispôs ainda que o crédito outorgado do mês corresponderá, alternativamente, ao seguinte:
- ao valor da diferença positiva entre o valor apurado com a aplicação do percentual fixado pelo CONDEPRODEMAT (para utilização como crédito outorgado) sobre o valor de ICMS incidente nas operações próprias de saídas tributadas no mês e passíveis de aplicação do benefício fiscal e o montante relativo à soma todos os créditos fiscais relativos às entradas efetivadas no mês e eventuais excessos de créditos transferidos do mês imediatamente anterior; ou
- a zero, quando a diferença apurada, conforme descrito no item anterior, for igual ou menor que zero.
Ademais, caso a contribuinte, no mesmo período de referência, realizar operações de naturezas diversas, contempladas por mais de uma modalidade de benefício fiscal também deverá atender as disposições previstas no § 5°, que trata de procedimento para se encontrar o valor proporcional dos créditos escriturados que poderão ser aproveitados nas diversas operações de saídas efetivadas pelo estabelecimento, conforme a natureza e os benefícios fiscais aplicáveis a essas operações.
Portanto, na hipótese de operações de saídas destinadas à exportação, os créditos podem ser mantidos, ou seja, podem, após a apuração do crédito outorgado, serem aproveitados para a apuração do total do ICMS a ser recolhido no período, conforme artigo 124, inciso I, alínea a, do RICMS c/c § 6° do artigo 14 do Decreto n° 288/2019.
Para melhor clareza, veja-se o seguinte exemplo com valores hipotéticos:
1 | TOTAL DAS COMPRAS | R$ 1.000.000,00 | Valor total das matérias primas adquiridas |
2 | TOTAL DO CRÉDITO ESCRITURADO | R$ 50.000,00 | Valor total do ICMS destacado nas NF de entrada |
3 | TOTAL DAS OPERAÇÕES DE SAÍDAS | R$ 2.000.000,00 | Valor total das vendas |
4 | Operações interestaduais | R$ 900.000,00 | equivalente a 90% das saídas (cf. art. 14, § 5°, I) |
5 | Operações de exportações | R$ 100.000,00 | equivalente a 10% das saídas (cf. art. 14, § 5°, IV) |
6 | APURAÇÃO DO DÉBITO DE ICMS | R$ 108.000,00 | Total do débito nas operações tributadas |
7 | Valor do ICMS nas operações interestaduais | R$ 108.000,00 | (= item 4 x 12%) (cf. art. 14, § 2°, II) |
8 | Valor do ICMS nas operações de exportação | R$ 0,00 | sem débito de ICMS |
9 | DISTRIBUIÇÃO PROPORCIONAL DOS CRÉDITOS ESCRITURADOS (§ 5° do artigo 14 do Dec. 288/19) | R$ 50.000,00 | Valor total dos créditos referentes às entradas (= item 2) |
10 | Operações interestaduais | R$ 45.000,00 | (= item 2 x 90%) (cf. art. 14, § 5°, I) |
11 | Operações de exportação | R$ 5.000,00 | (= item 2 x 10%) (crédito a ser mantido, cf. art. 14, § 5°, IV, do Dec. 288/19 c/c art. 124, I, a, do RICMS) |
12 | APURAÇÃO DO VALOR PELA APLICAÇÃO DO PERCENTUAL FIXADO PELO CONDEPRODEMAT (§ 2°, inciso III, do art. 14 do Dec. 288/19) | Operações beneficiadas com crédito outorgado | |
13 | Operações interestaduais | R$ 91.800,00 | percentual de 85% fixado pelo CONDEPRODEMAT (= item 7 x 85%) |
14 | APURAÇÃO DO VALOR DO CRÉDITO OUTORGADO (= AO VALOR DA RENÚNCIA FISCAL) (§ 2°, inciso IV, do art. 14 do Dec. 288/19) | Corresponde ao valor a ser utilizado para apuração das contribuições devidas aos FUNDOS, nos termos da Lei n° 7.958/2003 | |
15 | Operações interestaduais | R$ 46.800,00 | Diferença entre o valor apurado pela aplicação do percentual fixado pelo CONDEPRODEMAT e o crédito de ICMS proporcional escriturado (= item 13 - item 10) (cf. art. 14, § 2°, IV) |
16 | APURAÇÃO DO SALDO DEVEDOR DE ICMS (POR NATUREZA DA OPERAÇÃO) | Considerando o valor dos créditos proporcionais a cada tipo de operação | |
17 | Operações interestaduais | R$ 16.200,00 | Consiste na diferença entre o ICMS apurado e o valor total dos créditos (crédito outorgado + crédito escriturado) (= item 6 – (item 10 + item 15) |
18 | APURAÇÃO DO ICMS TOTAL PARA RECOLHIMENTO | Considerando a manutenção dos créditos relativos às operações de exportação | |
19 | TOTAL DE ICMS APURADO | R$ 16.200,00 |
![]() |
20 | Crédito de ICMS dos produtos exportados que pode ser mantido (art. 124, I, a, do RICMS) | -R$ 5.000,00 | (= item 11) |
21 | ICMS A RECOLHER NO PERÍODO | R$ 11.200,00 | (= item 19 - item 20) |
Considera-se sanada a dúvida da consulente.
Por fim, registra-se que não produzirá os efeitos legais previstos no artigo 1.002 e no parágrafo único do artigo 1.005 do RICMS a consulta respondida sobre matéria que esteja enquadrada em qualquer das situações previstas nos incisos do caput do artigo 1.008 do mesmo Regulamento.
Alerta-se que, em sendo o procedimento adotado pela consulente diverso do aqui indicado, respeitado o quinquênio decadencial, deverá, no prazo de 15 (quinze) dias úteis, contados da ciência da presente, regularizar suas operações, inclusive com recolhimento de eventuais diferenças de imposto, ainda sob os benefícios da espontaneidade, com acréscimo de correção monetária, juros e multa de mora, calculados desde o vencimento da obrigação até a data do efetivo pagamento.
Após o transcurso do prazo apontado, também respeitado o prazo decadencial, ficará o estabelecimento consulente sujeito ao lançamento de ofício, para exigência de eventuais diferenças, nos termos do artigo 1.004 do RICMS.
Assinala-se que esta resposta não se enquadra nas hipóteses das alíneas do inciso I do § 2° do artigo 995 do RICMS, conforme redação dada pelo Decreto n° 1.076, de 24 de agosto de 2021, logo, não se submete à análise da Câmara Técnica pertinente.
Coordenadoria de Divulgação e Consultoria de Normas da Receita Pública da Superintendência de Consultoria Tributária e Outras Receitas, em Cuiabá/MT, 25 de novembro de 2022.
Damara Braga Almeida dos Santos
FTE
DE ACORDO.
Elaine de Oliveira Fonseca
Coordenadora – CDCR/SUCOR
APROVADA.
Miguelângelo Luis Cancian
Superintendente de Consultoria Tributária e Outras Receitas
(em exercício)