Resposta à Consulta Nº 827 DE 27/01/2009


 


ICMS – Na importação por conta e ordem de terceiro o sujeito ativo da operação é o Estado da Federação no qual se situa o estabelecimento onde ocorre a entrada física da mercadoria e o sujeito passivo é esse estabelecimento.


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1. A Consulente, fabricante de produtos de origem vegetal, expõe que:

1.1. contratou uma empresa importadora e exportadora, localizada em Itajaí/SC, para efetuar uma operação de importação de uma máquina selecionadora de grãos, classificada no código 8437.10.00 da NBM/SH, nos termos do que dispõe a IN/SRF n° 225/2002 – Importação por Conta e Ordem de Terceiros;

1.2. figura como adquirente, sendo a importadora a empresa contratada;

1.3. o comprovante de importação foi emitido em 02/09/2008, pela Secretaria da Receita Federal do Brasil – Coordenação-Geral do Sistema Aduaneiro – Itajaí/SC;

1.4. após o desembaraço aduaneiro, ocorrido no Estado de Santa Catarina, e a liberação da mercadoria, a empresa importadora emitiu Nota Fiscal sob CFOP 6.949, no valor de R$ 325.645,31, com ICMS destacado em 12%, ou seja, R$ 39.077,44;

1.5. o bem importado foi-lhe enviado com conhecimento de transporte rodoviário emitido em 02/09/2008.

2. Esclarece que questionou os procedimentos da importadora, em especial quanto ao ICMS, obtendo as seguintes respostas:

a) com relação ao recolhimento do ICMS, que o documento de crédito do ICMS é a nota fiscal acima mencionada;

b) "que, a partir de 05/09/2006, a decisão da Primeira Turma do STF declara que o ICMS é recolhido pelo Estado que desembaraça o bem importado, referendando a Ação Cautelar (AC) 1292, ajuizada pela empresa (...), contra decisão do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, em que o Ministro Relator da ação considerou correta a tese da empresa de que o imposto deve ser recolhido pelo Estado onde se efetivou o respectivo desembaraço aduaneiro".

3. Diante de todo o exposto, questiona a Consulente:

3.1. qual é o posicionamento e a orientação desta Secretaria de Estado diante da decisão do STF, ocorrida em 06/09/2006 (Ação Cautelar 1292)?;

3.2. deve se creditar do ICMS destacado na referida Nota Fiscal (no valor de R$ 39.077,44)?;

3.3. caso positivo, no valor integral de uma só vez, nos termos do disposto no § 8° do artigo 61 do RICMS/00 ou proporcionalmente 1/48 avos por mês, nos termos do que dispõe o artigo 61, §10, do RICMS/00?

3.4. caso negativo, qual é o procedimento quanto ao ICMS destacado na referida nota fiscal, considerando o princípio constitucional da não-cumulatividade e o disposto no artigo 59 do RICMS/00?

3.5. está correto o valor destacado na referida nota fiscal correspondente a alíquota de 12% sobre o valor total da importação (R$ 217.846,54, constante do comprovante de importação, acrescido dos valores de Imposto de Importação, PIS, COFINS, Taxa Siscomex, despesas aduaneiras, descrito no corpo da mencionada Nota Fiscal)?

3.6. caso negativo, deve recolher o diferencial de alíquota de 12% para 18%, considerando o que dispõe o artigo 117 do RICMS/00?

3.7. caso seja devido o recolhimento do diferencial, qual o valor a ser utilizado para a base de cálculo desse diferencial, e, ainda, qual o procedimento para o creditamento desse valor?

3.8 "qual o procedimento no que tange às obrigações acessórias, ou seja, emissão de nota fiscal de entrada, saída, valores, creditamento, além da contabilização, considerando que o valor desembolsado pela empresa difere do valor constante da nota fiscal emitida pela (importadora)?".

4. Preliminarmente, registramos que a ação cautelar mencionada pela Consulente foi interposta contra outro Estado por outro contribuinte, para que fosse atribuído efeito suspensivo a recurso extraordinário (n° 555654), ainda não julgado.

5. Convém esclarecer alguns aspectos da incidência do ICMS na importação, para então verificarmos como a legislação pertinente se aplica à chamada "importação por conta e ordem de terceiros". Utilizaremos, quando necessário, a terminologia consagrada por diversos tributaristas, que analisam o fato gerador segundo critérios (ou aspectos): material, pessoal (sujeito ativo e sujeito passivo), temporal, espacial, e quantitativo (base de cálculo e alíquota).

6. A Constituição Federal de 1988 traçou as principais linhas do ICMS, especialmente seu critério material e o princípio da não-cumulatividade, deixando para lei complementar outros aspectos, tais como a definição dos contribuintes, a disciplina do regime de compensação e a determinação do local do fato gerador.

7. No que diz respeito ao princípio da não-cumulatividade, o inciso I do § 2º do artigo 155 da Constituição Federal estabelece que o imposto "será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias .... com o montante cobrado nas anteriores, pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal".

8. Embora tivesse deixado a cargo de lei complementar a fixação do local da operação, o que define também o sujeito ativo da operação, a CF/88, no artigo 155, § 2°, IX, "a", adiantou-se dizendo que, na importação, cabe o imposto ao Estado "onde estiver situado o domicílio ou o estabelecimento do destinatário da mercadoria, bem ou serviço".

9. A Lei Complementar 87/96, por seu turno, estabelece, no parágrafo único do artigo 4º, que também é contribuinte "a pessoa física ou jurídica que, mesmo sem habitualidade ou intuito comercial, importe mercadorias ou bens do exterior, qualquer que seja a sua finalidade". Quanto ao local da operação, tratando-se de mercadoria ou bem importados do exterior, determina que este é o do estabelecimento onde ocorrer a entrada física (artigo 11, inciso I, alínea "d").

10. Voltando, agora, nossa atenção para a chamada "importação por conta e ordem de terceiros", asseveramos que ela deveria ter sido objeto de convênio, nos moldes do que dispõe a Lei Complementar 24/75, por envolver interesses não somente da União - no tocante ao PIS/PASEP e à COFINS – como também dos Estados da Federação. No entanto, o assunto foi normatizado unilateralmente pela Receita Federal por meio da Instrução Normativa SRF 247/2002 e suas alterações, bem como por atos hierarquicamente inferiores, normas essas que não obrigam a Fazenda do Estado.

11. De acordo com os incisos I e II do § 1º do artigo 12 da mencionada Instrução Normativa:

"I – entende-se por importador por conta e ordem de terceiros a pessoa jurídica que promover, em seu nome, o despacho aduaneiro de importação de mercadoria adquirida por outra, em razão de contrato previamente firmado, que poderá compreender, ainda, a prestação de outros serviços relacionados com a transação comercial, como a realização de cotação de preços e a intermediação comercial;

II – entende-se por adquirente a pessoa jurídica encomendante da mercadoria importada" (g.n.).

12. Por sua vez, o artigo 86 da citada Instrução Normativa estabelece que:

"Art. 86. O disposto no art. 12 aplica-se, exclusivamente, às operações de importação que atendam, cumulativamente, aos seguintes requisitos:

I – contrato prévio entre a pessoa jurídica importadora e o adquirente por encomenda, caracterizando a operação por conta e ordem de terceiros;

II – os registros fiscais e contábeis da pessoa jurídica importadora deverão evidenciar que se trata de mercadoria de propriedade de terceiros; e

III – a nota fiscal de saída da mercadoria do estabelecimento importador deverá ser emitida pelo mesmo valor constante da nota fiscal de entrada, acrescido dos tributos incidentes na importação.

§ 1º Para efeito do disposto neste artigo, o documento referido no inciso III do caput não caracteriza operação de compra e venda (G.N.).

(...)"

13. Assim, existe uma só "operação relativa à circulação de mercadorias", que é a de importação, embora dois sejam os seus agentes: um, que empresta o seu nome ao despacho aduaneiro e outro, que realmente tem interesse no negócio jurídico que dará origem à "entrada de mercadoria importada do exterior", fato gerador do ICMS. Ademais, este segundo agente, por conta e risco de quem é promovida a importação, é aquele que a CF/88 e a LC 87/96 quiseram tributar, por sua capacidade contributiva. De fato, ele arca, também, com os tributos incidentes na importação, ainda que sejam pagos em nome de outra pessoa jurídica, esta mera facilitadora da operação.

14. Em face de todo do exposto, entendemos que, para fins do ICMS:

o agente por conta e ordem de quem se realiza a importação (no caso, a Consulente) é o verdadeiro contribuinte do imposto (artigo 121, I, do CTN), pois é ele quem promove a "entrada de mercadorias importadas do exterior", ainda que em nome de terceiro (importador); será ele, inclusive, que terá direito ao crédito do ICMS pago pela importação;

a "importadora por conta e ordem" é responsável solidária pelo pagamento do imposto na importação (artigo 124, I, do CTN );

a entrada física da mercadoria no estabelecimento do agente por conta e ordem de quem se realiza a importação (a Consulente) é o fato relevante para a determinação do local da operação de importação (artigo 11, I, "d", da Lei Complementar 87/96), sendo devido o imposto, pela Consulente, ao Estado de São Paulo.

15. Por oportuno, registramos que o referido entendimento foi consagrado no Recurso Extraordinário 286.586-1, em processo originado pela lavratura de AIIM contra o "adquirente", em importação realizada por sua conta e ordem, no qual assim se manifestou o Ministro Cezar Peluso do STF:

"4. A questão é constitucional e radica-se na interpretação da cláusula final do art. 155, § 2º, IX, "a", da Constituição da República, o qual estatui:

"... cabendo o imposto ao Estado onde estiver situado o domicílio ou o estabelecimento do destinatário da mercadoria, bem ou serviço;"

(...)

O termo destinatário, contido no trecho final do art.155, § 2º, IX, "a", da Constituição, deve ser lido e interpretado em consonância com o preceito que, nesse mesmo texto, combinado com o disposto no inc. II do caput do art. 155, outorga ao Estado competência para instituir ICMS na importação. Ou seja, destinatário da mercadoria é quem figura como contraente no negócio jurídico que dá origem à operação material de importação, seja esta realizada diretamente, seja por intermédio de terceiro, como, p. ex., de prestador de serviço, trading, etc.

(...)

O decisivo é saber a quem, segundo o teor do negócio jurídico subjacente ao ato material da importação, é destinada a mercadoria que o próprio adquirente ou, por ele, terceiro traz do exterior. Isto é, quem adquire a mercadoria à importação.

(...)

O destinatário é, pois, sem sombra de dúvidas, para efeitos de incidência do ICMS na importação, a ora recorrente. A emissão de notas fiscais de saída pela empresa importadora, ... e o errôneo recolhimento do imposto ao Estado do Espírito Santo não desnaturam o negócio jurídico realizado entre a recorrente e o exportador. A importadora foi só intermediária na aquisição, não destinatária da mercadoria.

(...)

6. O Estado de São Paulo, ora recorrido, tem, portanto, legitimidade constitucional para exigir o ICMS incidente na importação, razão por que nego provimento ao recurso".

16. Isso posto, concluímos que a Consulente (agente por conta e ordem de quem se realiza a importação) deveria ter emitido a Nota Fiscal relativa à entrada da mercadoria em seu estabelecimento, na previsão da alínea "f" do inciso I do artigo 136 do RICMS/2000, e ter recolhido o ICMS a este Estado, em conformidade com o inciso IV do artigo 37 do RICMS/2000, ou seja, sobre o valor constante do documento de importação, acrescido do valor dos Impostos de Importação, sobre Produtos Industrializados e sobre Operações de Câmbio, bem como de quaisquer outros impostos, taxas, contribuições e despesas aduaneiras, observado o disposto nos §§ 5º e 6º do referido artigo 37, e, como assim não procedeu, deverá dirigir-se ao Posto Fiscal a que se vincula seu estabelecimento, para promover as regularizações necessárias, podendo valer-se do instituto da denúncia espontânea (artigo 529 do mesmo Regulamento).

16.1. Sendo assim, restam prejudicadas as indagações formuladas pela Consulente, que partem do pressuposto de que o procedimento adotado pelo importador por ela contratado está correto.

A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.