Consulta Nº 87 DE 06/10/2011


 


ICMS. VENDA DE EQUIPAMENTOS. MATERIAL PARA INSTALAÇÃO. LOCAÇÃO DE BENS MÓVEIS COM FORNECIMENTO DE MATERIAIS DE MANUTENÇÃO E DE CONSUMO. TRATAMENTO TRIBUTÁRIO.


Sistemas e Simuladores Legisweb

A consulente informa atuar no ramo de “indústria, comércio, importação, exportação e prestação de serviços de equipamentos de informática industrial voltados à área de sinalização de rodovias, bem como semáforos, registros de infrações (radares), sistema de tráfego rodoviário e urbano, controle de acesso, bilhetagem eletrônica e coleta de dados”, estando cadastrada na atividade econômica principal de “comércio varejista especializado de equipamentos e suprimentos de informática”. Expõe que seus principais clientes são órgãos públicos, como prefeituras e sociedades de economia mista. Nesses termos, formula as seguintes indagações em duas situações distintas:

1. na venda de equipamentos:

- esclarece que efetua venda de equipamentos e a sua instalação, sendo que precisa enviar acessórios, como cabos, fiações, canaletas etc, e também andaimes e outros bens de sua propriedade, ao local em que serão instalados. Informa que esses acessórios são cobrados por meio de nota fiscal de serviço emitida para documentar a instalação. Entendendo ser material de consumo, pergunta como deve proceder para enviar os acessórios aos clientes que, muitas vezes, não possuem inscrição estadual. E pergunta também como deve documentar a devolução das sobras de materiais.

Manifesta o entendimento de que essas operações ocorrem sem incidência de ICMS, já que não se utiliza de crédito do imposto dessas mercadorias, por ocasião das entradas.

2. na locação de máquinas e equipamentos:

- informa que cede bens de sua propriedade a terceiros, por meio de contrato de locação, com cláusula determinando ser de sua responsabilidade a manutenção dos bens. Questiona como deve remeter os materiais empregados para esse fim e qual a natureza dessa operação.

RESPOSTA

Verifica-se pelo informado que o estabelecimento comercializa materiais e equipamentos de informática, sendo de sua responsabilidade a instalação desses quando necessária, bem como atua na locação de tais equipamentos, sendo responsável pela sua manutenção. Desse modo, responde-se que:

1. na venda de equipamentos.

Especificamente, no que tange ao envio de acessórios, objeto de sua linha normal de comercialização, necessários à instalação de equipamentos, deve proceder conforme descrito na Consulta nº 110/2001, cujo entendimento se encontra no excerto a seguir transcrito, pois é predominante na operação descrita a venda de mercadoria (obrigação de dar) sobre a prestação de serviço (obrigação de fazer):

“De todo o arrazoado, depreende-se que no fornecimento de mercadorias da consultante, em que ela mesma efetua a instalação e montagem, haverá incidência do ICMS sobre o total da operação (mercadorias + instalação).”

Nota-se que incide ICMS sobre o total cobrado do adquirente pela venda do equipamento, dos materiais necessários à sua instalação e do custo dessa, seja ele contribuinte ou não desse imposto. Por conseguinte, se nas operações de saída de mercadorias há o débito do ICMS, as operações de entradas desses produtos são passíveis de creditamento, em razão da regra da não-cumulatividade.

No caso de retorno de acessórios que constituem sobras da instalação do equipamento vendido, quando se trata de cliente que é entidade pública e não emite notas fiscais, a consulente deve proceder de forma análoga ao disposto no art. 273 do Regulamento do ICMS (RICMS), aprovado pelo Decreto nº 1.980/2007, sendo importante constar na nota fiscal a descrição da finalidade da saída dos produtos, in verbis:

“DO RETORNO DA MERCADORIA NÃO ENTREGUE

Art. 273. O estabelecimento que receber, em retorno, mercadoria por qualquer motivo não entregue ao destinatário, deverá:

I - emitir nota fiscal para documentar a entrada com menção dos dados identificativos do documento fiscal original, lançando-a no livro Registro de Entradas, consignando os respectivos valores nas colunas "ICMS - Valores Fiscais - Operações ou Prestações com Crédito do Imposto" ou "ICMS - Valores Fiscais - Operações ou Prestações sem Crédito do Imposto", conforme o caso;

II - manter arquivada a 1ª via da nota fiscal emitida por ocasião da saída, que deverá conter a indicação prevista no parágrafo único;

III - mencionar a ocorrência na via que ficou em poder do emitente ou em documento equivalente;

IV - exibir ao fisco, quando exigido, todos os elementos, inclusive os contábeis, comprobatórios de que a importância eventualmente debitada ao destinatário não tenha sido recebida.

Parágrafo único. O transporte da mercadoria em retorno será acompanhado pela própria nota fiscal emitida pelo remetente, cuja 1ª via deverá conter a indicação, no verso, efetuada pelo destinatário ou pelo transportador, do motivo de não ter sido entregue a mercadoria.”

Quanto às ferramentas e aos bens do ativo imobilizado (andaimes), não há a incidência do ICMS, nos termos do que dispõe o art. 3º, inc. XI, do RICMS, adiante transcrito, devendo ser informado no documento fiscal, no campo “Informações Complementares”, que a operação se refere a remessa de bem do ativo imobilizado com posterior retorno, bem como o dispositivo legal em  “Art. 3º O imposto não incide sobre (art. 4º da Lei n. 11.580/96):

XI - saídas de peças, veículos, ferramentas, equipamentos e de outros bens, não pertencentes à linha normal de comercialização do contribuinte, quando utilizados como instrumentos de sua própria atividade ou trabalho;”.

2. na locação de máquinas e equipamentos.

Primeiramente, esclarece-se que na locação de bens móveis, assim entendida aquela definida pelo Código Civil de 2002, nos artigos 565 a 578, não incide ICMS. Ocorre a locação quando uma das partes se obriga a ceder à outra, por tempo determinado ou não, o uso e gozo de coisa não fungível, mediante certa retribuição, devendo restituí-la, finda a locação, no estado em que foi recebida, salvo as deteriorações naturais ao uso regular (artigos 565 e 569, inc. IV do CC).

Na locação não há a transferência de propriedade do bem locado. Ao locatário é concedida a posse precária da coisa alugada. Logo, não há a circulação de mercadoria da coisa móvel dada em locação, por conseguinte não incide ICMS nessa operação.

A locação de coisas é onerosa e pressupõe a cessão de posse do objeto locado, que deverá ser, além de infungível¹(1), inconsumível. Pois, segundo Maria Helena Diniz, “se destinadas a serem consumidas, impossível seria a sua restituição pelo locatário ao término do contrato.” (Curso de Direito Civil, p. 239).(2)

2.1 Do bem móvel locado.

O locador é obrigado a entregar ao locatário a coisa alugada com todos os acessórios necessários ao seu funcionamento, de modo que possa servir ao uso a que se destina. Assim, quanto à coisa locada e aos seus acessórios existentes no ato da conclusão da entrega dessa, pronta para uso e gozo, não há a circulação de mercadoria, por conseguinte não ocorre a obrigação tributária relativa ao ICMS.

No entanto, ressalta-se que é característica inerente à locação de coisa a devolução dessa ao final do prazo contratual no estado em que foi recebida, salvas as deteriorações naturais provenientes de seu uso normal (art. 569 do CC). Logo, se não ocorrer a devolução do bem na forma em que foi entregue a operação não deve ser tratada como “locação” e sim como “compra e venda”, diferindo, então, o tratamento tributário, com incidência do ICMS, nos moldes da legislação.

Nesses termos, se a coisa locada se fixa ao solo ou ao imóvel de propriedade do locatário se torna parte integrante dessa propriedade, não podendo ser retirada sem sua destruição, não constituirá objeto de locação.

2.2 Da mercadoria utilizada na prestação de serviços de manutenção.

No que tange aos acessórios ou material utilizado para manutenção do equipamento cedido em locação, a partir do momento da mudança de posse do bem infungível locado, ainda que precária, havendo obrigação de fazer ou outras obrigações de dar que não a da coisa locada, a situação não é de simples locação, devendo ser analisada à ótica de incidência do ICMS.

Todos os serviços prestados e as mercadorias fornecidas para o bem móvel que se encontra na posse do locatário a título de reparo ou manutenção são de seu proveito, ou seja, de inteiro uso e gozo. Pois, por ser a locação um tipo contratual oneroso, estão previstas em seu valor pactuado as despesas provenientes de outras obrigações oriundas desse contrato; portanto, o locatário é quem arca com os custos durante o prazo de locação e esse é quem aproveita da prestação de serviço para manutenção ou reparação do bem, independentemente da existência de cláusula contratual que o estabeleça.

Logo, todas as mercadorias fornecidas ao bem locado em conjunto com a prestação de serviços, por se tratarem de operações relativas a circulação de mercadoria com bens fungíveis consumidos pelo locatário, estão sujeitas à obrigação tributária do ICMS, conforme preveem o inc. V, art. 2º da Lei Complementar nº 87/1996 e o inc. V, art. 2º da Lei nº 11.580/1996, combinados com o expresso na Lista de Serviços anexa à Lei Complementar (LC) nº 116/2003, item 14.01, in verbis:

“14.01 – Lubrificação, limpeza, lustração, revisão, carga e recarga, conserto, restauração, blindagem, manutenção e conservação de máquinas, veículos, aparelhos, equipamentos, motores, elevadores ou de qualquer objeto (exceto peças e partes empregadas, que ficam sujeitas ao ICMS).”

Esse entendimento é verificado em manifestações do STF no RE nº 116.121-SP (DJU 23.10.2000), RE nº 626.706-SP (2ª Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 24.9.2010), e também, com a discussão havida na Proposta de Súmula Vinculante (PSV) nº 35, em

4.2.2010, que deu origem à Súmula Vinculante nº 31, declarando “inconstitucional a incidência do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza - ISS sobre operações de locação de bens móveis”. E ainda, recentemente, os votos dos Ministros na decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça – STJ, no Resp 1.194.999-RJ, publicado no DJe 22.9.2010, permitem a análise da questão referente a contratos que conjuguem locação de bens móveis e prestação de serviço, ou mesmo outras obrigações que podem estar sujeitas a outros impostos, como o ICMS.

Esses julgados apontam que sobre a obrigação pura e simples de dar não incidiria imposto sobre serviços, no entanto, se incluídas outras obrigações no contrato o pacto se torna de natureza cumulativa, ou seja, misto. Nesse sentido, a decisão do STJ informa que o valor tributável, em relação ao ISS, deve ser apurado pela autoridade fiscal, em procedimento administrativo próprio, quando atribuído um valor global ao contrato. Consequentemente, o ICMS também incide nessa operação quando há o fornecimento de mercadorias, conforme item 14.1 da Lista de Serviços anexa à LC nº 116/2003.

Assim, embora os tribunais superiores não tenham ainda examinado um caso “in concreto” envolvendo esse tipo de operação mista, em que há a conjugação da locação com outras obrigações de dar e fazer que impliquem incidência do ICMS, a partir das manifestações de seus membros, na jurisprudência antes citada, é legítimo extrair o entendimento explicitado.

Isso porque, quando da aprovação da Súmula Vinculante nº 31 (PSV nº 35), foi abordada a possibilidade da locação vir acompanhada de uma obrigação de fazer como a prestação de serviços, uma vez que a proposta de texto inicialmente apresentada pelo Ministro Joaquim Barbosa tinha a seguinte redação: É inconstitucional a incidência do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza - ISS sobre operações de locação de bens móveis dissociadas da prestação de serviços. No entanto, por unanimidade, os Ministros acolheram a exclusão da expressão “dissociadas de prestação de serviços”, sugerida pelo Ministro Cezar Peluso, por entenderem que a súmula trata apenas da locação pura, relativa à obrigação de dar, apenas, e, segundo esse ministro, em qualquer outro caso em que haja também obrigação de fazer, ou seja, “contrato de locação de móveis e, ao mesmo tempo, prestação de serviço, a locação continua não suportando o imposto; o serviço sim”.

Depreende-se dos posicionamentos jurisprudenciais citados que na locação pura e simples, que constitui somente obrigação de dar o bem locado, não ocorre o fato gerador do ICMS. No entanto, se houver outras obrigações a ela agregadas, pressupõe-se análise em separado quanto à incidência desse imposto, como, por exemplo, a manutenção ou reparo com fornecimento de mercadorias ou somente esse, ainda que se destinem a ser agregados ao bem locado.

Assim, não há que se considerar essas demais operações como não tributadas.

2.3 Do fornecimento de mercadoria para consumo.

Verifica-se que é comum, atualmente, ocorrerem nos contratos nominados como de locação, operações de compra e venda, o que desnatura esse tipo contratual, podendo ser chamado de contrato de fornecimento, que agrega locação, prestação de serviço, compra e venda, empreitada e outros, se houver.

Assim, diante do exposto nas manifestações dos tribunais, de que o fornecimento de mercadorias com prestação de serviço existente no contrato de locação de coisas está sujeito às obrigações tributárias pertinentes, também se pode inferir que está no campo de incidência do ICMS o fornecimento de produtos dissociado de serviços prestados, considerados como acessórios fungíveis e consumíveis ou insumos para a máquina ou equipamento, os quais serão utilizados pelo locatário durante o uso do bem, tais como: dispositivos de armazenagem de dados, lâmpadas, “leds”, sensores, baterias, receptores de rádio, lentes, papéis de impressão utilizados na máquina ou equipamento etc.

Por ter caraterísticas estranhas à locação, o fornecimento de materiais durante o período locativo, necessários ao funcionamento do bem locado, submete-se ao ICMS por haver a circulação de mercadoria, uma vez que há a transferência de propriedade, pois o locatário detém a posse do objeto locado, ainda que precária. Logo, é consumidor de todas as peças e partes da máquina ou equipamento enquanto instituído em sua posse.

2.4 Considerações finais da locação.

No caso em que o acordo firmado (locação) contenha vários tipos contratuais nominados no Código Civil, cabe frisar que, para fins tributários, não importa o nome dado ao que foi pactuado entre as partes, mas sim os efeitos concernentes às obrigações advindas.

Há de se considerar, ainda, outras particularidades que devem ser observadas tanto em relação à empresa locadora quanto ao bem objeto de locação. Nesse sentido, o bem em questão deve estar devidamente incorporado ao ativo imobilizado da empresa locadora, observada a impossibilidade de apropriação de crédito (precedente: Consulta nº 70/2003). Quanto à empresa, essa deve ter dentre seus objetos sociais a “locação de coisas”.

Se necessária a determinação da base de cálculo do ICMS, por ter sido pactuado um preço global no contrato, a empresa deve observar o contido no art. 15 da LC nº 87/1996, reprisado no art. 8º da Lei nº 11.580/1996, adiante transcrito:

“Art. 8º Na falta dos valores a que se referem os incisos I e VIII do art. 6º , a base de cálculo do imposto é:

I - o preço corrente da mercadoria, ou de sua similar, no mercado atacadista do local da operação ou, na sua falta, no mercado atacadista regional, caso o remetente seja produtor, extrator ou gerador, inclusive de energia;

II - o preço FOB estabelecimento industrial a vista, caso o remetente seja industrial;

III - o preço FOB estabelecimento comercial a vista, na venda a outros comerciantes ou industriais, caso o remetente seja comerciante.

§ 1º Para aplicação dos incisos II e III deste artigo, adotar-se-á sucessivamente:

I - o preço efetivamente cobrado pelo estabelecimento remetente na operação mais recente;

II - caso o remetente não tenha efetuado venda de mercadoria, o preço corrente da mercadoria ou de sua similar no mercado atacadista do local da operação ou, na falta deste, no mercado atacadista regional.

§ 2º Na hipótese do inciso III deste artigo, se o estabelecimento remetente não efetuar vendas a outros comerciantes ou industriais ou, em qualquer caso, se não houver mercadoria similar, a base de cálculo será equivalente a setenta e cinco por cento do preço de venda corrente no varejo.”

No que diz respeito à forma de documentação das saídas, devem ser observadas as regras dispostas no RICMS para cada situação, sendo que:

1. na saída dos bens móveis destinados à locação, pertencentes ao imobilizado da empresa, a nota fiscal deve ser emitida tendo como destinatária a empresa locatária, sem destaque de ICMS, devendo ser mencionado o Código Fiscal de Operações e Prestações – CFOP 5.949 ou 6.949 (Outra saída de mercadoria ou prestação de serviço não especificado), constante no Anexo IV, Tabela I do RICMS, e o fato de se tratar de remessa para locação, com indicação dos dados do contrato;

2. nas saídas de peças de reposição, vinculadas à prestação de serviço de manutenção, bem como nas operações de compra e venda de mercadorias consumidas pelo locatário, deve ser emitida nota fiscal, sendo descrito esse como destinatário, com destaque do imposto. Especificamente em relação à atividade de manutenção, a legislação faculta o uso de Nota Fiscal-Ordem de Serviço, por estabelecimento prestador de serviços, conforme disciplinado nos artigos 146 e 147 do RICMS, combinados com o art. 206, § 1º, alínea “a”, desse mesmo diploma regulamentar, na qual, em linhas separadas, deverá constar o valor acumulado das mercadorias sujeitas ao ICMS e dos serviços gravados pelo imposto municipal;

3. no retorno dos bens móveis ou na devolução de mercadorias não empregadas na manutenção ou não consumidas pelo locatário, as operações devem observar o tratamento tributário a que está vinculada a operação de remessa, cabendo o creditamento em relação às mercadorias devolvidas, se for o caso, nos termos prescritos no Capítulo I do Título III do RICMS, que disciplina os procedimentos relativos à devolução e retorno de mercadoria.

3. Conclusão

A consulente deve observar as obrigações originárias das operações existentes em seus vários tipos contratuais pactuados quanto à existência do fato gerador do ICMS e consequente obrigação tributária.

Expõe-se, por fim, que o entendimento aqui exarado sobre operações relativas a contrato de locação conjugado com outras obrigações difere do manifestado na Consulta nº 187/2002, também relacionada à locação de bens móveis com fornecimento de materiais. Entretanto, cabe manifestar que aquela foi emitida em data anterior ao entendimento atual ressaltado nas manifestações dos tribunais quando da edição da Súmula Vinculante nº 31 e nas decisões proferidas antes mencionadas, sobretudo no Resp nº 1.194.999-RJ do STJ. Assim, revoga-se a referida consulta.

No que estiver procedendo de forma diversa do constante na presente resposta, deverá a consulente observar a adequação de seus procedimentos ao ora esclarecido.