Resposta à Consulta Nº 25810 DE 15/06/2022


 


ITCMD – Integralização de capital com transferência de bem imóvel do patrimônio dos sócios para sociedade limitada - Incremento patrimonial inferior a 2500 UFESPs. I. A transferência de imóveis do patrimônio dos sócios para a sociedade limitada para integralização do capital social da empresa não é hipótese de incidência prevista na legislação do ITCMD. II. Quando verificada na situação concreta a utilização formal de atos e negócios jurídicos estruturados desprovidos de essência negocial ou ainda, eivados de vícios para encobrir materialmente outros, de natureza diversa, para, assim, suprimir o real fato gerador da obrigação tributária, então, esses negócios poderão ser desconsiderados pela autoridade administrativa. III. Fica isenta do imposto a transmissão por doação cujo valor total entre os mesmos doador e donatário não ultrapassar 2.500 UFESPs no mesmo ano calendário.


Conheça a Consultoria Tributária

ITCMD – Integralização de capital com transferência de bem imóvel do patrimônio dos sócios para sociedade limitada - Incremento patrimonial inferior a 2500 UFESPs.

I. A transferência de imóveis do patrimônio dos sócios para a sociedade limitada para integralização do capital social da empresa não é hipótese de incidência prevista na legislação do ITCMD.

II. Quando verificada na situação concreta a utilização formal de atos e negócios jurídicos estruturados desprovidos de essência negocial ou ainda, eivados de vícios para encobrir materialmente outros, de natureza diversa, para, assim, suprimir o real fato gerador da obrigação tributária, então, esses negócios poderão ser desconsiderados pela autoridade administrativa.

III. Fica isenta do imposto a transmissão por doação cujo valor total entre os mesmos doador e donatário não ultrapassar 2.500 UFESPs no mesmo ano calendário.

Relato

1. A Consulente, sociedade limitada que tem as atividades de “holdings de instituições não-financeiras” (código 64.62-0-00 na Classificação Nacional de Atividades Econômicas – CNAE), de “outras sociedades de participação, exceto holdings” (código 64.63-8-00 na CNAE) e de loteamento de imóveis próprios (código 68.10-2-03 na CNAE), relata que foi constituída por quatro sócios, sendo dois deles com participação no capital social de 49,95% cada, e os outros dois com participação de 0,05% cada um.

2. Esclarece que os dois sócios, que detém 49,95% de participação cada, integralizaram o capital social com um bem imóvel pertencente a ambos em comunhão. Esse bem imóvel foi integralizado pelo valor histórico de R$180.000,00 constante na declaração do IRPF, de acordo com o artigo 23 da Lei 9.249 c/c o Decreto 9.580/2018, e os demais integralizaram o capital social com R$100,00 em dinheiro cada um.

3. Informa que solicitou o registro do contrato social no Oficial de Registro de Imóveis onde está localizado o imóvel, mas que o pedido foi indeferido pela possibilidade de incidência de ITCMD sobre doação no ato da integralização, considerando o valor atribuído ao bem imóvel inferior ao valor de mercado. Relata que o oficial citou as Respostas às Consultas 22.070/2020 e 25.122/2022, desta Consultoria Tributária.

4. Alega que a operação não configura doação, por faltarem o elemento objetivo – prejuízo patrimonial, e o elemento subjetivo – animus donandi, este inerente ao formato de distribuição do capital social, uma vez que os proprietários do imóvel detêm 99% do capital social. Apresenta tabela demonstrando que, considerando o valor de mercado do bem imóvel integralizado de R$341.463,00, teria havido incremento no patrimônio dos dois sócios minoritários no valor de R$259,16, com a correspondente redução no patrimônio dos dois outros sócios.

5. Assim, questiona se ocorreu o fato gerador do ITCMD em relação a essa integralização. Caso tenha ocorrido, indaga se a operação estaria isenta, e qual seria o procedimento para obter declaração de isenção/não incidência de ITCMD para apresentar ao ofício de registro de imóveis.

6. Anexa eletronicamente cópia do processo de registro da integralização do capital social da empresa através de imóvel no Oficial de Registro de Imóveis.

Interpretação

7. Inicialmente, registre-se que estamos partindo do pressuposto de que o valor de mercado do imóvel informado pela Consulente está correto, não sendo, portanto, validado por esta resposta.

8. Isso posto, observamos que, pelo próprio relato da Consulente, houve um prejuízo patrimonial para dois sócios e um acréscimo patrimonial da mesma ordem para os demais.

9. Dessa forma, é possível verificar que estão presentes na operação todos os elementos que caracterizam a doação, quais sejam: natureza contratual (existe um contrato social para constituição da entidade, que modifica direitos patrimoniais dos contratantes), aceitação (todos assinam o contrato de comum acordo), transferência patrimonial (dois sócios sofrem prejuízo patrimonial de R$ 259,16 cada um, ao passo em que os demais têm um acréscimo patrimonial de R$ 259,16) e animus donandi (os sócios têm a faculdade de integralizar o imóvel pelo valor de mercado ou pelo valor histórico; optando pelo valor histórico sem exigir quaisquer contrapartidas que compensem seu prejuízo patrimonial estarão praticando um ato de liberalidade).

10. Assim, ocorre o fato gerador do ITCMD por estarem presentes os elementos que caracterizam a doação. Entretanto, é necessário destacar que, conforme o artigo 6º, II, “a”, da Lei nº 10.705/2000, fica isenta do imposto a transmissão por doação cujo valor não ultrapassar 2.500 UFESPs. Desse modo, aplica-se o benefício da isenção caso o valor total das doações ocorridas no mesmo ano, para um mesmo doador e mesmo donatário, fique abaixo desse limite.

11. Para melhor entendimento desta resposta, reproduzimos a seguir o exemplo e os esclarecimentos já mencionados no precedente citado, Resposta à Consulta 22070/2020, disponível no Portal da Secretaria da Fazenda (portal.fazenda.sp.gov.br):

“8.1. Dois senhores, A e B, proprietários de um imóvel (na proporção de 50% cada um), com valor de mercado de R$ 500.000,00 e valor histórico (constante das declarações de Imposto sobre a Renda) de R$ 200.000,00 resolvem, juntamente com um terceiro, C, constituir uma sociedade limitada. Para tanto, estabelecem no contrato social que o capital da empresa, formado por 300 mil quotas (com valor de R$ 1,00 cada quota) será realizado mediante a integralização do referido imóvel, por parte dos dois senhores, A e B, e por R$ 100.000,00 em dinheiro integralizado por C. As quotas serão divididas da seguinte maneira: 100 mil quotas para cada sócio.

8.2. Pode-se perceber, nesse caso, que:

8.2.1. Houve integralização do imóvel pelo valor histórico (permitida pelo artigo 23 da Lei 9.249/1995).

8.2.2. O valor (de mercado) das quotas resultantes da incorporação do imóvel ao capital social não é igual ao valor de mercado do imóvel integralizado. A empresa, que não tem nenhum passivo, possui como ativos um imóvel de valor R$ 500.000,00 e R$ 100.000,00 em dinheiro, somando R$ 600.000,00 de valor de mercado. As quotas sociais pertencentes aos senhores A e B estão registradas por R$ 200.000,00, no entanto, possuem valor de mercado de R$ 400.000,00.

8.2.3. O terceiro C, que integralizou o valor de R$ 100.000,00 em dinheiro, passou a ser proprietário de quotas sociais registradas pelo valor de R$ 100.000,00, mas que possuem valor de mercado de R$ 200.000,00.

8.3. Os senhores A e B possuíam um patrimônio de R$ 250.000,00 cada um (metade do imóvel que possuía valor de mercado de R$ 500.000,00) e com a constituição da empresa, nos termos estabelecidos, passaram a ter um patrimônio de R$ 200.000,00 cada um, representado por 100.000 quotas do capital social da empresa. As 100.000 quotas, conforme indicamos, estão registradas por R$ 100.000,00 reais, mas possuem valor de mercado de R$ 200.000,00 (33,33% do valor total de mercado da empresa, que é de R$ 600.000,00). É evidente que ambos sofreram um prejuízo patrimonial da ordem de R$ 50.000,00 cada um.

8.4. O terceiro C, por outro lado, sofreu um acréscimo patrimonial de R$ 100.000,00, uma vez que integralizou o valor de R$ 100.000,00 em dinheiro para a constituição da empresa e passou a ser titular de 100.000 quotas do capital social que, conforme indicamos, possuem valor de mercado de R$ 200.000,00.

8.5. No presente caso é possível se vislumbrar todos os elementos que caracterizam a doação, quais sejam:

8.5.1. Natureza contratual (existe um contrato social para constituição da entidade, que modifica direitos patrimoniais dos contratantes).

8.5.2. Aceitação (todos assinam o contrato de comum acordo).

8.5.3. Transferência patrimonial (os sócios A e B sofrem prejuízo patrimonial de R$ 50.000,00 cada um ao passo em que o sócio C tem um acréscimo patrimonial de R$100.000,00).

8.5.4. Animus donandi (os sócios têm a faculdade de integralizar o imóvel pelo valor de mercado ou pelo valor histórico. Optando pelo valor histórico sem exigir quaisquer contrapartidas que compensem seu prejuízo patrimonial estarão praticando um ato de liberalidade).

8.5.5. Se fizerem pelo valor histórico e receberem uma compensação financeira de R$ 50.000,00 cada um, do terceiro C, não há que se falar em doação, visto não ter havido nem prejuízo patrimonial, nem liberalidade. Se fizerem a integralização pelo valor de mercado, por sua vez, não haverá prejuízo patrimonial.

9. Nota-se, assim, que, sem o correspondente reflexo nas quotas do sócio integralizador, o valor do imóvel que ultrapassa o valor pelo qual ele é integralizado acaba por se configurar como uma transferência voluntária (doação) do patrimônio dos sócios integralizadores para o outro sócio, caracterizando-se, portanto, como hipótese de incidência do ITCMD.

10. Com efeito, não se pode perder de vista a possibilidade da utilização do instituto da integralização de capital social e da doação (regulados pelo direito civil e empresarial), para ocultar ou simular negócios jurídicos com objetivo de se esquivar do pagamento de tributos. Nessa situação, de acordo com o parágrafo único do artigo 116 do Código Tributário Nacional, a autoridade fiscal está autorizada a desconsiderar os atos e negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária. Consequentemente, quando verificada na situação concreta a utilização formal de atos e negócios jurídicos estruturados desprovidos de essência negocial ou ainda, eivados de vícios para encobrir materialmente outros, de natureza diversa, para, assim, suprimir o real fato gerador da obrigação tributária, então, esses negócios poderão ser desconsiderados pela autoridade administrativa, para que haja a autuação de acordo com o fato gerador materialmente praticado.”

13. Registre-se que não há necessidade de reconhecimento formal da isenção prevista no artigo 6º, II, “a”, da Lei nº 10.705/2000, pela Secretaria da Fazenda e Planejamento, para que o contribuinte dela usufrua.

14. Com esses esclarecimentos, consideramos dirimidas as dúvidas da Consulente.

A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.